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memória e Justiça

Os mortos do 1º de abril de 1964

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Os primeiros mortos da ditadura civil-militar tinham ainda a lembrança do discurso de João Goulart para mais de um milhão de pessoas.

O primeiro dia do mês de abril é conhecido como o dia da mentira. Mas 1º de abril de 1964 não se trata de uma mentira na história do Brasil. Nenhuma anedota inocente deixaria 434 mortos e desaparecidos — conforme relatório final da Comissão Nacional da Verdade -, transformaria a tortura em prática estatal, cercearia a liberdade de imprensa, cassaria mandatos de opositores, censuraria músicas, filmes e peças de teatro e manteria uma lista de livros proibidos.

Para muitos, ventos golpistas começaram a soprar dez anos antes. Em 24 de agosto de 1954, Getúlio Vargas não viu outra saída para o cenário em que se encontrava completamente isolado politicamente e envolto em uma tentativa de assassinato a não ser dar um tiro no próprio peito.

Depois disso, três presidentes ocuparam interinamente a Presidência da República até o mineiro Juscelino Kubitscheck colocar em prática o seu ousado plano de 50 anos em cinco. Responsável pela idealização da moderna capital federal no centro do país, JK ainda é considerado símbolo de um governo moderno. O país estaria pronto para um salto para o progresso?

Nas eleições de 1960, a população transmitiu sua opinião diante de um quadro eleitoral confuso. Elegeu o candidato oposicionista Jânio Quadros para a sucessão de JK. O vice, no entanto, que também era eleito por voto popular, seguiu sendo o mesmo: João Goulart, o Jango.

O mandato de Jânio foi breve. Talvez já ouvindo o som do avanço dos militares, renunciou menos de oito meses após a posse. A partir do dia 7 de setembro de 1961 o trabalhista João Goulart assumiu a Presidência.

Mais de um milhão na central do Brasil pelas reformas estruturanes de Jango. Foto: Divulgação

A marcha dos golpistas estava cada vez mais perto quando Jango propôs um ousado programa de metas que visava, enfim, refundar o país. Na reforma agrária, previa expandir os direitos dos trabalhadores da cidade até o campo e desapropriação da terra que não cumprisse sua função social. Na educação, queria expandir o método Paulo Freire, que dava voz ativa aos oprimidos no processo de alfabetização. Na economia, propôs limitar a remessa de lucros das empresas estrangeiras. Também pensou em devolver o Partido Comunista Brasileiro à legalidade e estender o direito a voto aos analfabetos. Os militares, porém, acharam que Jango estava indo longe demais.

Reforma agrária, a primeira vítima

Foi no campo que as primeiras mortes da ditadura militar aconteceram. Mais precisamente no interior de Minas Gerais. O sonho da reforma agrária foi o primeiro que a ditadura militar tratou de pegar pelo pé e jogar no chão

No dia 13 de março de 1964, da Central do Brasil — no Rio de Janeiro — Jango falou ao Brasil mais profundo. Reunindo mais de um milhão de pessoas na capital carioca, o presidente destacou as ameaças à democracia. Não era o povo nas ruas, como faziam crer os defensores da tradição, família e propriedade. A verdadeira ameaça era quem, nas palavras do presidente, se mostram “surdos aos reclamos da nação pelas reformas de estrutura, principalmente a reforma agrária”.

Em algum rádio de pilha no interior de Minas Gerais sua voz ecoou na cabeça de três sonhadores: Paschoal Souza Lima, Otávio Soares da Cunha e seu filho Augusto Soares de Lima. Os três defensores da reforma agrária foram os primeiros mortos da ditadura militar.

Paschoal não chegou a ver nenhum dia do período obscuro que atingiu o Brasil por 21 anos. No dia 30 de março de 1964, estava reunido com lideranças do Sindicato dos Trabalhadores da Lavoura em Governador Valadares quando foi morto com um tiro na testa. Não há foto dele nos registros da Comissão Nacional da Verdade.

Na época, João Pinheiro Neto era superintendente da Supra — Superintendência da Reforma Agrária — e entregaria na cidade as primeiras terras aos colonos cadastrados no sindicato. Por conta do clima político a solenidade foi cancelada. Os fazendeiros da região, reunidos em milícia para evitar qualquer tentativa de democratização de suas terras, cercaram e metralharam a sede do sindicato.

Augusta e Otávio Soares de Lima: a reforma agrária sofreu o primeiro golpe — Foto: CNV

O clima de “caça aos comunistas” já estava presente desde o primeiro momento daquele regime de exceção. Tanto que, dois dias depois, no primeiro dia do governo Castelo Branco, a mesma cidade de Governador Valadares foi novamente palco de duas mortes: Otavio Soares da Cunha e seu filho Augusto Soares da Cunha.

Também defensores da reforma agrária na região, ambos foram surpreendidos na frente de casa por fazendeiros que agiram em nome do Estado brasileiro. Augusto morreu na hora. O pai dele chegou a ser socorrido, mas faleceu três dias depois.

A família Soares conseguiu que se abrisse um inquérito para a investigação da morte de ambos, mas a Justiça Militar absolveu os acusados por “estarem trabalhando em nome da revolução” para os “batalhões patrióticos”. Os patriotas defensores do verde-e-amarelo vestiam verde-oliva a partir daquele dia primeiro de abril.

Estudantes como alvos

Bem longe dali, na capital pernambucana, estudantes tomavam conhecimento de que teriam que lutar para que a democracia retornasse ao Brasil. A sede do governo pernambucano, o Palácio Campo das Princesas, foi cercada pelo Exército que exigia a renuncia do então governador Miguel Arraes. Para “não trair a vontade dos que os elegeram”, Arraes se recusou a deixar o cargo, só saindo do palácio preso.

Jonas e Ivan: Mortos por defender o governo eleito — Foto: CNV

Automaticamente, estudantes ocuparam a Faculdade de Engenharia do Recife quando o Exército invadiu o prédio e expulsou todos. Nas ruas para defender o governador eleito e alertando a população contra o golpe militar que estava acontecendo, o grupo queria chegar até o palácio do governo. No caminho, foram surpreendidos por um piquete de militares que atirou para o alto. Os estudantes não se intimidarem e começaram a lançar pedras e cocos contra o grupo, que respondeu fazendo vários disparos em direção ao piquete. Desse confronto acabaram saindo dois mortos: Jonas José de Albuquerque Barros, de 17 anos; e Ivan Rocha Aguiar, de 23.

O primeiro desaparecimento político

Uma prática comum na ditadura brasileira era o desaparecimento de corpos. Ari de Oliveira Mendes foi o primeiro dos 210 cujos restos mortais nunca foram encontrados. Labibe Elias Abduch foi a primeira estrangeira. A primeira mulher. A primeira mãe

Nada se sabe sobre Ari nas 1996 páginas do volume dedicado aos mortos e desaparecidos políticos da Comissão Nacional da Verdade. Nem data de nascimento, nem pai, nem mãe. Labibe era dona de casa, natural da Síria, e foi pra rua como uma mãe preocupada em saber sobre seu filho que estava no Rio Grande do Sul.

Populares cercaram e tentaram invadir o clube militar carioca e foram reprimidos a bala. De acordo com o relatório da Comissão Nacional de Verdade, ambos vieram a óbito no Hospital Souza Aguiar. A edição do dia 2 de abril de 1964 do jornal carioca “O Globo” celebrava triunfante na capa: “ressurge a democracia!”.

Paschoal, Otavio, Augusto, Jonas, Ivan, Ari e Labibe morreram acreditando. Morreram sem ver no que se transformaria a ditadura que estava recém-parida naquele dia da mentira. Mas a história mostrou que tinham razão. Não há motivo maior de sair as ruas do que devolver a voz ao povo.

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Copa do Mundo

OSVALDO ANTÔNIO DOS SANTOS – Morre um herói da nação brasileira, vítima da Covid-19

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OSVALDO ANTÔNIO DOS SANTOS – 14/08/1939 – 10/04/2020

OSVALDO ANTÔNIO DOS SANTOS 14/08/1939 – 10/04/2020

Nascido em 14 de Agosto de 1939, na Cidade de Arapuã, MG, Osvaldo Antônio dos Santos era filho de Gaspar Silvério de Oliveira e Maria Antônia dos Santos. Teve uma longa carreira profissional em várias empresas brasileiras e estrangeiras.

Militante da Vanguarda Popular Revolucionária, a VPR, de Carlos Lamarca, Osvaldo “Portuga”, como Osvaldo Antônio dos Santos era conhecido, foi preso em 23 de janeiro de 1969 juntamente com Pedro Lobo de Oliveira, Ismael de Souza e Hermes Camargo em uma chácara nas proximidades de Itapecerica da Serra. No local, os quatro foram surpreendidos pela Polícia Militar de Itapecerica da Serra e levados ao Quartel do II Exército, no Ibirapuera.

Da prisão no quartel, Osvaldo Antônio dos Santos foi transferido para o DEOPS, onde permaneceu até 13 de novembro de 1969 quando, junto com outros detentos, deu entrada no Carandiru onde ficou até 8 de dezembro de 1969. A última escala foi no Presídio Tiradentes, de onde saiu no dia 16 de junho de 1970.

A liberdade, porém, não veio fácil. Em 11 de junho de 1970, enquanto as atenções do país estavam voltadas para a Copa do México, o embaixador da Alemanha Ocidental, Ehrenfried Anton Theodor Ludwig Von Holleben, era sequestrado no Rio de Janeiro, numa ação conjunta da Ação Libertadora Nacional (ALN) e da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). As organizações guerrilheiras exigiram a libertação de 40 presos políticos, entre os quais estava o “Portuga”, que deveriam ser levados em voo fretado para a Argélia. Um manifesto contra a Ditadura foi divulgado em todas as redes de rádio e TV, furando a rigorosa censura imposta pelos militares.

 

Banido do território nacional, Osvaldo Antônio dos Santos chegou à Argélia e lá residiu por três meses. Posteriormente dirigiu-se a Cuba onde esteve de 1970 a 1971. Morou em Moçambique e na Alemanha. Retornou a Brasil com a Anistia Política. Foi casado com Denise Oliveira Lucena com quem teve dois filhos: Valter Bruno de Oliveira Santos e Renan Oliveira dos Santos.

Seu estado de saúde era delicado, pois teve câncer de próstata e apresentava um quadro de doença de Alzheimer. Faleceu nesta madrugada (10/04) vitimado pelo Covid-19. Estava internado no Hospital de Referência Emílio Ribas.

Não acontecerá o velório devido à letalidade da doença. O corpo de Osvaldo Antônio dos Santos será cremado em Embu das Artes, no Crematório Memorial Parque Paulista.

 

OSVALDO ANTÔNIO DOS SANTOS, PRESENTE!

 

 

 

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Ação Humanitária

Entenda a luta do povo Guarani pelo Parque Ecológico Yary Ty no Jaraguá-SP

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A Ocupação Yary Ty (CEYTY) comunica ESTADO DE EMERGÊNCIA DO TERRITÓRIO INDÍGENA da T.I. Jaraguá e convoca imprensa, parceiras e parceiros para comparecerem dia 04 de março, às 15h, no Fórum da 14a. Vara Federal, na Avenida Paulista 1682, para fortalecer na reza dos Guarani durante a audiência. A luta do povo Guarani no Jaraguá continua.

 

Principais tópicos da luta do povo Guarani no Jaraguá

Em visita à ocupação do povo Guarani na área do sonhado Parque Ecológico Yary Ty (CEYTY), descobrimos vários caminhos fraudulentos e mesmo criminosos trilhados pela Tenda Negócios Imobiliários, que tem como principais acionistas a AMBEV e o Itaú, e que estão garantindo à construtora tomar posse dessa área para construir até 11 torres de apartamentos a 200 metros de território indígena (T.I.), o que, por si só, transgride a Portaria Interministerial 060 de 2015. Mas as ações ilegais não param aí.

Entre as diversas contradições dessa especulação imobiliária está o fato dessa área ter sido classificada como ZEIS (Zona Especial de Interesse Social), sendo que já estava classificada como ZEPAM (Zona de Preservação Ambiental). Leia mais em “Outras Ações em Curso” no final do texto.

A área é considerada, ainda, uma Reserva de Biosfera, instrumento de preservação que incentiva uma gestão integrada e sustentável de recursos naturais.

522 árvores da Mata Atlântica já foram derrubadas pela Tenda na área, além de diversas espécies de animais mortas, como abelhas sem ferrão. Depois dessa ação, a comunidade Guarani do Jaraguá ocupou o local para impedir que essas devastações ambientais continuassem.

No dia 10 de março, a Tenda deve entrar nessa área continuar a derrubada de um total de 4 mil árvores, uma ação orquestrada com aval de uma juíza estadual, que pode calar diversas defesas garantidas por leis de preservação daquela área, considerada, ainda, área de amortecimento do Parque Estadual do Jaraguá. A ação da Tenda pode, ainda, acabar por isolar a comunidade Guarani e seu território demarcado, a 200mts dali, tornando praticamente inviável a manutenção e o desenvolvimento cultural Guarani naquele território, além de minar a preservação de uma das já poucas áreas verdes em São Paulo.

Jaraguá – São Paulo/SP – Fev/2020
crédito: Nair Benedicto/N Imagens

O chamado agora é para que todos os habitantes da cidade de São Paulo acordem para esse crime ambiental!

“Ontem nos reunimos com vários coletivos daqui para uma ação no dia 10 de março. Estaremos promovendo vários eventos e atividades na ocupação. Acabamos, de certa forma, sendo protagonistas aqui no Jaraguá. Mas essa luta é um dever de todos. Assim como estão vindo pessoas de outros países, o principal é que as pessoas que moram em São Paulo façam parte dessa resistência com a gente”, disse o líder Thiago Henrique, que nos conta os detalhes dos encontros líderes do povo Guarani no Jaraguá com a Tenda.

Entendendo todo o histórico da luta abraçada pelo povo Guarani no Jaraguá pela criação do Parque Yary Ty (CEYTY) e um Memorial da Cultura Guarani.

Mata Atlântica – Reserva Indígena Guarani – Jaraguá – São Paulo/SP – Fev/2020
crédito: Nair Benedicto/N Imagens

Depoimento de Thiago Henrique, líder da ocupação indígena no futuro parque:

“A Tenda Negócios Imobiliários comprou este terreno há mais ou menos dois anos. Aqui havia o Clube Sul Riograndense.  Por mais que fosse uma área privada, nossa comunidade sempre usou essa área, porque as pessoas da administração do clube entendiam que estávamos aqui antes do clube. Então, nunca barrou a comunidade de vir nadar no rio, pescar, brincar nas árvores, até porque nosso território aqui é a menor terra indígena demarcada por um governo federal – tem 1,7 hectares, onde meus avós iniciaram, de novo, a família Guarani aqui.

O clube faliu e a Tenda comprou este terreno, já com um projeto  de construção de apartamentos. Quando a Tenda nos procurou, no final de dezembro de 2019, disseram que iam construir cinco torres para 800 habitantes, que teriam que derrubar 4 mil árvores, que a gente não precisava se preocupar, pois já estava tudo licenciado, com alvará da prefeitura e autorização da FUNAI, e que eles só estavam avisando a gente.

Foi quando dissemos que não era assim que funcionava, que não íamos aceitar o corte de 4 mil árvores do nada.  E eles disseram que havia uma área dentro desse terreno, onde não poderiam construir, e seria cedida para nós contruirmos uma escola, na compensação para a prefeitura – uma área no meio do terreno, que é uma área de lagos (rs).  

Argumentamos, então, que não estávamos ali para negociar terra, mas sim a vida das árvores e queríamos um esclarecimento do Ministério Público, porque dentro de uma área de 8 km de uma terra indígena nenhum tipo de especulação ou obra pode ser feita sem um estudo de impacto ambiental e sócio-componente indígena (Portaria Interministerial 060, de 2015). Estamos a 200mts desse empreendimento.

Esse estudo determinaria quais seriam os impactos dentro da terra indígena e de que forma esses impactos podem ser minimizados ou compensados e se há a possibilidade de serem compensados, porque existem impactos que não têm como serem compensados.

A Tenda, então, argumentou que não precisava fazer isso, que estava isenta desse processo/estudo, pois a FUNAI já tinha dado a autorização, e que a Tenda não precisaria respeitar a legislação federal.

Mais uma vez trouxemos à Tenda a Portaria Interministerial  060, de 2015. Além dela, existe a Convenção 169 da OIT, adotada em Genebra, em 1989, e aprovada pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo 143, de 20 junho 2002,  e que nos garante que qualquer tipo de ação do Estado que venha ferir a comunidade de qualquer forma, causando qualquer tipo de impacto, temos que ter uma consulta prévia, livre e informada, de boa fé. Ou seja, o próprio Município de São Paulo não poderia ter dado uma autorização ou alvará, liberando uma obra aqui, sem antes ter consultado a comunidade, porque esse licenciamento da prefeitura, mesmo sendo ilegítimo, passa a ser criminoso quando fere a Convenção 169 da OIT, quando nos coloca em uma situação de vulnerabilidade e de risco.  

Entre os dias 7 e 9 de janeiro, levamos essa denúncia ao Ministério Público Federal, com essas alegações da Tenda. O Ministério Público, então, marcou uma audiência de conciliação mais pra frente. Mas, até a gente chegar a esse consenso, pedindo para que não houvesse mais cortes das árvores aqui, acabamos fazendo essa ocupação porque, do dia para a noite, a Tenda começou a derrubar árvores na área…

Em menos de dois dias cortaram 522 árvores.

Nossa ocupação é para deixar que nenhuma árvore a mais seja derrubada aqui.

Que nenhum tipo de empreendimento aconteça aqui de forma ilegal.

E que um estudo de impacto ambiental e sócio-componente indígena seja feito para podermos chegar a um consenso.

Desmatamento feito pela Tenda para construção de apartamentos no Jaraguá, próximo a Reserva Indígena Guarani – São Paulo/SP – Fev/2020
crédito: Nair Benedicto/N Imagens

Desmatamento feito pela Tenda para construção de apartamentos no Jaraguá, próximo a Reserva Indígena Guarani – São Paulo/SP – Fev/2020
crédito: Nair Benedicto/N Imagens

AS MENTIRAS DA TENDA E AS DEFESAS DO POVO GUARANI.

Quando ocupamos a área descobrimos que eles mentiram – não têm autorização para a derrubada de  4 mil árvores, mas estão pleiteando essa derrubada.

Falaram na implantação de cinco torres para 800 moradores, mas  quando vimos o projeto da Tenda, descobrimos que estão pleiteando um total de onze torres, divididas entre a parte de frente e de trás do terreno, dividido por um rio. Por isso o total dá 4 mil árvores.  Só que as pessoas da Tenda que vieram falar com a gente chegaram todas desinformadas, mesmo sendo da empresa. E acabaram expondo que seriam 4 mil árvores sem querer. Foi quando nós,  da comunidade Guarani, começamos a entender que a Tenda estava agindo com a mentira.

O documento que eles dizem ter da FUNAI é, na verdade,  um documento informativo de um setor da FUNAI, dizendo que esse terreno não está dentro da aldeia, com a FUNAI deixando claro que aquele papel não era nenhum tipo de autorização de construção. Mas a Tenda pegou esse documento e tentou usá-lo de má fé, dizendo que a FUNAI tinha autorizado a construir sem o estudo.

Tudo que a Tenda tem é um documento fraudulento da prefeitura, e essa informação da FUNAI, que o terreno não é um terreno tradicional Guarani. 

A única coisa que a gente diz para a Tenda é: a partir de agora vocês não vão cortar mais nenhuma árvore, nenhum empreendimento vai ser feito. E o caminho para vocês agora é aceitar o termo de transferência de potencial construtivo da prefeitura e construir em outro lugar e aqui ser feito um parque para a população, visando o meio ambiente, a ecologia, a permacultura, a agrofloresta, a criação de abelhas nativas sem ferrão.

Decidimos que a nossa luta continua.

A própria Tenda criou um cemitério de árvores aqui, a partir do momento que derrubou 522 árvores e tem que ser responsabilizada por esse tipo de ação.

Os impactos já estão aí: Mata Atlântica dizimada, diversas abelhas nativas sem ferrão foram mortas aqui com esse desmatamento, como as arapuás e uruçus amarelas, além de cobras, pássaros… Desde 2016 passamos a criar abelhas sem ferrão em nossa aldeia, pois estavam sumindo e conseguimos expandir essas espécies para o território e aí vem a Tenda e mata também as abelhas que estávamos fortalecendo.

Para nós, tudo isso é um crime inaceitável”

Mata Atlântica – Reserva Indígena Guarani – Jaraguá – São Paulo/SP – Fev/2020
crédito: Nair Benedicto/N Imagens

OUTRAS AÇÕES EM CURSO

Como publicado na Folha Noroeste de 26 de fevereiro de 2020,há dois projetos de lei protocolados na Câmara Municipal, ambos de autoria do vereador Eliseu Gabriel. Um deles muda o zoneamento local, hoje classificado como ZEIS (Zona Especial de Interesse Social), para Zona de Preservação Ambiental (ZEPAM). O segundo propõe transformar a área em questão em parque municipal. Já o vereador Gilberto Natalini entrou com duas representações junto aos Ministérios Públicos Federal e Estadual com o objetivo de garantir a integridade física dos índios e impedir que mais árvores nativas sejam derrubadas. No documento, o parlamentar questiona o fato do terreno ser classificado como ZEIS estando ele inserido numa ZEPAM. A área, inclusive, é considerada uma Reserva de Biosfera (instrumento de preservação que incentiva uma gestão integrada e sustentável dos recursos naturais)”.

O povo Guarani que hoje ocupa a área do sonhado Parque Ecológico Yary Ty (CEYTY) já plantou mudas de novas árvores onde as nativas foram derrubadas, além de estar em curso a limpeza da vegetação e a instalação de jardins filtrantes com plantas macrófitas, para recuperar as águas do lago, que estão sendo analisadas.


RESUMO – ALERTA DA SITUAÇÃO

DIA 4 DE MARÇO, 14HSCONVOCAÇÃO – 14a. Vara Federal, Avenida Paulista, 1682.

Audiência de conciliação na Justiça Federal para tratar sobre essas questões, quando o povo Guarani, através de sua assessoria jurídica – a Comissão Yvyrupa, que representa os povos Guaranis, além de uma representação da OAB e do CIMI (Conselho Indigenista Missionário) – farão os trâmites legais de dizer que a obra é inviável e que, embora os Guaranis não estejam brigando pela posse do terreno, isso não significa que o cinturão verde de São Paulo, assim estabelecido pela UNESCO, deva ser devastado, como a Tenda quer.

DIA 10 DE MARÇO – MOBILIZAÇÃO GERAL

Diversos eventos e atividades estão sendo organizadas pelo povo Guarani na área ocupada, junto a coletivos da cidade, no mesmo dia em que a Tenda deve novamente entrar no terreno, depois de ganhar, recentemente, uma reintegração de posse emitida irregularmente por uma juíza estadual, que será executada pela Polícia Militar do Estado de São Paulo, conforme comprova ofício emitido pela própria PM, no qual consta, ainda, a necessidade de uso de armamentos de impacto controlado, como armas de choque e VANT – Veículo Aéreo Não Tripulado, como drones, uma clara declaração de guerra ao povo Guarani e a Ocupação Yary Ty. A reintegração de posse foi emitida apesar de todo o levantamento apresentado, esclarecendo tratar-se de um empreendimento ilegal e o fato de uma juiza estadual ter tomado uma decisão ilegítima, ao atuar sobre uma questão federal, colocando em risco a integridade física da comunidade Guarani, em uma ação na qual a juíza não tem representatividade alguma.

Reserva Indígena Guarani – Jaraguá – São Paulo/SP – Fev/2020
crédito: Nair Benedicto/N Imagens

Reserva Indígena Guarani – Jaraguá – São Paulo/SP – Fev/2020
crédito: Nair Benedicto/N Imagens

Reserva Indígena Guarani – Jaraguá – São Paulo/SP – Fev/2020
crédito: Nair Benedicto/N Imagens

 

Entrevista e edição: Sonia Maia

Fotos: Nair Benedicto e Fausto Chermont

 


Links:

Participe ativamente dessa luta, que também é nossa.

Marque presença na ocupação, principalmente no dia 10 de março. Compartilhe, assine petições, impulsione doações.

Petição pela criação do Parque Ecológico Yary Ty (CEYTY) e o Memorial da Cultura Guarani > https://secure.avaaz.org/po/community_petitions/prefeitura_de_sao_paulo_criacao_do_parque_ecologico_yary_ty_ceyty_e_memorial_da_cultura_guarani/

Existe Guarani em SP > https://www.facebook.com/existeguaraniemsp/

Tenonderã Ayvu > https://www.facebook.com/tenonderaayvu/

Portaria Interministerial 060 de 2015

http://www.lex.com.br/legis_26632223_portaria_interministerial_n_60_de_24_de_marco_de_2015.aspx

Convenção 169 da OIT

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5051.htm


 

 

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Ditadura

Ato/Instalação no MPF: Tributo e Esperança!

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Texto de Cecilia Figueira e Moniquinha Simões

Nesta 5ª feira 12 de dezembro, em frente ao STF na Rua Frei Caneca, ocorreu o Ato/Instalação Tributo e Esperança.
Há mais de 6 meses este local vem sendo palco de manifestações de denúncia e sensibilização para os procuradores e demais funcionários que trabalham no STF assim como para os transeuntes. Os manifestantes, participantes dos Coletivos que compõem o CCD-LL, Comitê dos Coletivos pela Democracia e por Lula Livre, quinzenalmente estão lá. Esta ação do CCD-LL faz parte das ações nacionais realizadas juntamente com Coletivos de vários Estados do Brasil do grupo Lula Livre Nacional.
Com faixas, cartazes e megafone, sempre procuram chamar a atenção para o compromisso e responsabilidade do STF na defesa da Lei, da Justiça e a da Democracia, ameaçadas desde o golpe de 2016 e especialmente com a prisão arbitrária de Lula.

Neste dia 12 de dezembro o Ato teve como objetivo denunciar as arbitrariedades, resgatar a memória dos tempos da ditadura e do dia em que foi instituído o Ato Institucional número 5, já que dia 13 é dia dos Direitos Humanos. O AI-5 estabeleceu a censura, cassou direitos políticos, instalou regime de exceção, permitiu que governantes, realizassem prisões, torturas até a morte para os suspeitos de serem contra o regime. Muitos tombaram em decorrência dessas atrocidades.

Homenagem aos Mortos e Desaparecidos: militantes trabalhadores, cidadãos comuns

Segundo a Comissão da Verdade os Mortos e Desaparecidos foram identificadas 434 pessoas, mortas vítimas da ditadura, na maioria homens mas também mulheres, com idade que variava de 20 a 60 e tantos anos. Muitos jovens estudantes, trabalhadores das mais diversas profissões, cidadãos comuns, trabalhadores… Operários, bancários, costureira, alfaiate, agricultores, camponeses, seringueiro, estivador, eletricista, taxista, vendedor, empregada doméstica, dona de casa, pedreiro, sapateiro, ferreiro, comerciante, mecânico, tipógrafo, escriturário, ascensorista, corretor de imóveis, motorista, lojista, seminarista, religioso, sacerdote, metalúrgico, ferroviário, farmacêutico, pianista, ator, design gráfico, designer de moda, fotógrafa, restaurador, escultor, soldado, militar, salva vidas, policial, piloto militar, jornalistas, políticos e profissionais de nível universitário como professor, professor universitário, médicos, psiquiatra, dentista, advogado, engenheiro, geólogo, procurador, veterinário, químico, enfermeira, tradutor. Muito poucos entre eles, ativistas e guerrilheiros.
Em Ato singelo e cheio de emoção, com as faixas estendidas na calçada: “AI-5 Nunca Mais; Não ao Estado opressor; O Brasil precisa de Paz, Lula Livre” e com muitas Flores do Coletivo Flores pela Democracia, prestou-se homenagem aos Mortos e Desaparecidos.
Aos poucos, os vasos que circundavam as faixas foram preenchidos com as Flores pela Democracia que reproduziam a fala do papa Francisco ”A Paz é um bem que supera qualquer barreira, porque é um bem de toda a Humanidade”.
Para cada nome pronunciado de companheiro ou companheira morto, torturado ou ainda desaparecido, os participantes da ação gritavam juntos: presente! e uma Flor, era depositada com delicadeza nos vasos.

AI 5 e Ditadura Nunca Mais!

 

Impressionava aos passantes verificar que as pessoas lembradas eram cidadãos comuns, exercendo profissões identificadas com as suas. A todo momento, fazia-se pelo megafone um paralelo sobre o momento sombrio em que estamos vivendo, chamando-se a atenção para as ameaças que vem sendo feitas de volta ao AI 5 e se conclamava ao STF para assumir seu compromisso e responsabilidade na garantia das leis e da manutenção do Estado democrático.
Flores eram distribuídas para os transeuntes. Denunciar as arbitrariedades de ontem e as arbitrariedades que vem ocorrendo hoje, sensibilizar para a importância da resistência e da luta para que AI-5 nunca mais aconteça, denunciar o extermínio das populações periféricas e mortes de lideranças do campo que vem ocorrendo, homenagear os companheiros mortos, torturados e desaparecidos durante a ditadura militar de 64 no Brasil. Um tributo aos que lutaram e tombaram conclamando por justiça social, direitos e democracia.

Nossas Flores Lutam pela Democracia

Um apelo ao povo brasileiro para que se unam, lutem junto com o STF para que esta corte aja constitucionalmente, evitando que o país viva novamente a ruptura com o Estado democrático.
Na porta do STF foi deixado um vaso com Flores, sinal de alerta e de esperança! Mensagem dada, Flores pela Democracia. Uma simbologia da luta por Justiça e garantia da Paz e do Estado Democrático, tributo e homenagem aos que tombaram, convite à participação popular nas ruas, nos locais de trabalho, nos movimentos sociais, partidos. Quem irá pegá-las?
“Deixaram suas Flores
Tributo e Esperança
Quem irá pegá-las?
O vaso com as Flores de proporções tão diminutas ante a edificação frondosa do MPF no coração da Avenida Paulista buscam brechas pra florescer
Buscam e caminham pelas brechas
Procuram o olhar solto e direto que só é possível na liberdade
Viva o Estado Democrático!
Nossas Flores lutam pela democracia”

 

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