A suavidade retórica do Banco Central

Ilan Goldfajn e Henrique Meirelles (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

 

“Não há mal que sempre dure, nem bem que nunca se acabe.” A economia brasileira haverá de crescer um dia, independentemente dos erros de Levi e Meirelles. Teremos de ouvir, então, que voltamos ao caminho certo como resultado da austeridade, das reformas, do fim da “farra” com o dinheiro público.

A verdade, no entanto, é que a crise política, que vinha se formando desde a eleição de Lula em 2002, passando pelo ilegítimo “domínio do fato”, pela campanha midiática transformada em manifestações de rua de 2013, culminando com a rejeição do resultado das eleições de 2015, cobrou alto preço econômico dos brasileiros, especialmente daqueles em maior vulnerabilidade.

Verdade, também, é que as políticas econômicas, desde o início de 2015, só fizeram aprofundar a recessão e o desemprego, seu efeito mais perverso. Seguimos pelo caminho mais penoso. Mesmo tendo como contraexemplo mais recente as políticas adotadas pelos Estados Unidos, na crise financeira iniciada em 2008.

Os EUA verteram tanto dinheiro na economia quanto julgavam necessário para escapar da pior, e potencialmente mais danosa, crise econômica desde 1929. Sofreram, derraparam, mas escaparam. O desemprego estado-unidense bateu 10 % em um único mês, outubro de 2009, enquanto o nosso, que bateu 13,7% no primeiro trimestre desse ano, está acima de 10% desde o início de 2016.

É nesse quadro desalentador que o Banco Central reduz a taxa básica de juros da economia brasileira para 7,5% e vem nos informar, na ata de seu Comitê de Política Monetária (Copom) de outubro, que “o conjunto dos indicadores de atividade econômica divulgados desde a última reunião do Copom mostra sinais compatíveis com a recuperação gradual da economia brasileira”.

Há uma oposição importante entre as duas afirmações. Ou bem a economia está se recuperando e não precisamos de cortes alucinados de juros para tentar animá-la, ou estamos derrapando sem sair do lugar há quase três anos e precisamos, desesperadamente, empurrar potenciais investidores para que saiam da sombra e água fresca dos juros e invistam na economia real.

O Banco Central iniciou o mês de outubro do ano passado com uma taxa Selic em 14,25% ao ano. A taxa é hoje quase a metade da taxa de um ano atrás. Isso indica que “recuperação gradual” não é a denominação correta do paradeiro que estamos vivenciado. Se estivéssemos nos recuperando de modo satisfatório os cortes nos juros não seriam nem tão fortes e nem tão frequentes.

Se bem procurarmos, encontraremos que “o Copom entende que a conjuntura econômica prescreve política monetária estimulativa, ou seja, com taxas de juros abaixo da taxa estrutural”. Mas o que isso quer dizer? Bem, significa que a conjuntura econômica está dizendo, com todas as letras, que a economia brasileira está mal das pernas, que precisa de estímulo e que o único recurso que o governo quer usar é baixar os juros.

A ata afirma, ainda, que nas últimas reuniões do Copom, “debateram-se os dados mais suaves de atividade referentes ao mês de agosto, mas também a possibilidade de uma retomada mais forte à frente’. “Dados mais suaves” deve ser, possivelmente, o modo elegante de afirmar que nossa economia está patinando. O dicionário Houaiss ensina que suavidade é “efeito doce e muito agradável ou aprazível aos sentidos; doçura, maciez, delicadeza”.

Gostaria de ver os integrantes do Copom dizerem aos 13 milhões de desempregados brasileiros que os dados da atividade econômica de agosto foram “mais suaves”, mas que estamos no caminho certo.

 

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