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Justica

A prisão dos pais condena os filhos?

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Por Leo Drumond e Natália Martino | Projeto Voz para os Jornalistas Livres

Nossa população carcerária é muito jovem e a maioria dos condenados têm filhos. Qualquer estatística ou uma simples observação dentro de unidades prisionais confirmam isso. Quase nada se sabe, porém, sobre essas crianças e adolescentes que crescem sem os pais, apartados pela cadeia. Os dados oficiais não os contemplam, não sabemos quantos são, com quem vivem ou que tipo de auxílio recebem. O senso comum já nos faz imaginar que eles são negativamente impactados pelas prisões dos pais e várias pesquisas confirmam isso. Ainda assim, não existem políticas públicas para eles. Por isso, o recente trabalho de Rafael Posada, apresentado como dissertação do seu mestrado na Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, é importante. Ele ilumina alguns dos aspectos mais cruéis e mais desconhecidos do Sistema Carcerário.

Vespasiano_MG, 10 de Abril de 2013 10 anos do Choque de Gestao Na foto, a detenta Shirley da Fonseca e seu filho Lazaro Henrique no Centro de Referencia a Gestante Privada de Liberdade. Foto: LEO DRUMOND / NITRO

A detenta S.F. com seu filho no Centro de Referencia a Gestante Privada de Liberdade (MG). Foto: Leo Drumond / VOZ

A partir de uma pesquisa com 718 pessoas presas de 19 estabelecimentos penais da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Posada chegou às seguintes conclusões. Entre os filhos daqueles que estão encarcerados, 9,7% já esteve ou está atualmente em situação de conflito com a lei. Quando o recorte é feito para aqueles que são menores de idade, entre 12 e 17 anos, a taxa é de 5,7%. É muito? Bom, a taxa de jovens infratores no Brasil corresponde, ainda de acordo com o pesquisador, a 0,1% dos adolescentes. Ou seja, ser filho de alguém que cumpre pena de privação de liberdade aumenta em 59% a chance de ser apanhado pelo Sistema de Justiça. Então, a resposta é sim, é muito.

Ibirite_MG, 18 de Abril de 2015 Projeto Maes do Carcere Na foto, Patricia, que esta em casa com condicional usando tornozeleira eletrônica Foto: LEO DRUMOND / NITRO

Na foto, a detenta P., que esta em casa com condicional usando tornozeleira eletrônica
Foto: Leo Drumond / VOZ

Os que acreditam que o “fruto não cai longe da árvore” e a criminalidade é uma tendência genética deveriam parar de ler este texto por aqui. Não estamos falando de biologia, estamos falando de dinâmicas sociais. Posada destaca que a maioria desses filhos já apresentava, antes do encarceramento de um dos pais, uma série de desvantagens econômicas que os colocavam mais vulneráveis e mais suscetíveis a entrar em conflito com a lei. Isso sem contar o aspecto do preconceito racial ainda determinante no Sistema de Justiça Criminal. A questão é que a prisão de um dos progenitores adiciona mais desvantagens em relação mesmo aos seus pares sem pais presos.

Sao Joao Del Rei_MG, 24 de agosto de 2016 A Estrela - Edicao de Sao Joao del Rei Imagem: A ESTRELA

Recuperando da APAC de São João Del Rei com seu filho durante a visita íntima. Foto: André Gustavo / A ESTRELA

 

Aos cuidados de uma nova família

Algumas observações feitas durante as entrevistas levaram o pesquisador a crer que parte do problema está no estigma criado ao redor dessas crianças e adolescentes. “Tem uma reunião de pais na escola e as pessoas dizem que a mãe daquele aluno não foi porque está presa. E ninguém está preparado para lidar com isso”. O pesquisador fala de discriminação entre os colegas e de perseguição policial. Segundo ele, alguns relatos indicam que esses jovens acabam sendo mais visados pelos policiais que patrulham suas comunidades. Há, ainda, mudanças nas condições financeiras e na rotina das crianças e adolescentes, sem contar o impacto de saber que os pais estão presos.

O mais determinante na perpetuação do ciclo de violência tende a ser a ruptura abrupta da estrutura familiar – o que é muitas vezes mais grave quando quem está presa é a mãe, que na maioria dos casos é a que tem a guarda e se responsabiliza pelo cuidado dos filhos. Assim, a pesquisa concluiu que as chances de um adolescente cuja a mãe está presa entrar em conflito com a lei é mais de 10 vezes maior do que nos casos dos pais encarcerados. Parte da explicação pode estar no fato de que, quando o pai está preso, o filho costuma permanecer com a mãe. É o que acontece em 57% dos casos. Mas quando é a mãe que está atrás das grades, apenas 12% dos filhos ficam com os pais e 34% acabam com os avós. No caso das mulheres presas, há ainda uma maior porcentagem de crianças que acabam em abrigos: 4,5%, contra 0,1% no caso dos pais.

Na foto, o garoto A., que vive com sua mãe em unidade prisional para grávidas e lactantes. Foto: LEO DRUMOND / VOZ

Na foto, o garoto A., que vive com sua mãe em unidade prisional para grávidas e lactantes.   Foto: Leo Drumond / VOZ

 

Ao se analisar o impacto da prisão na vida dos filhos dos condenados, Posada também tratou da vida pregressa dos presos e algumas questões merecem destaque. Mais de um quarto das mulheres entrevistadas disseram ter vivenciado a prisão de um dos pais antes de serem presas e entre os homens a porcentagem é de 12,5%. Além disso, 20% dos homens e 32% das mulheres declararam terem sido vítimas de violência na infância. Quando o assunto é escolaridade, fica evidente de que classe social estamos falando. Mais de 50% das mulheres e de 60% dos homens têm escolaridade muito baixa, ou seja, não completaram nem o Ensino Fundamental. “A população carcerária é caracterizada por biografias nas quais a intervenção do sistema educativo é precária, enquanto a intervenção do sistema penal é total”, salienta Posada.

O trabalho de Posada é essencial por levantar estatísticas até então inexistentes. Torna ainda mais óbvio o que já se diz há anos: não haverá redução de criminalidade sem programas de universalização de educação e de oportunidades e sem se repensar o Sistema de Justiça Criminal voltado para a segregação de determinados grupos – especialmente no quesito Lei de Drogas. Os que defendem o encarceramento em massa, que enfrentem calados a violência dos filhos daqueles que prenderam.

 

Sobre o pesquisador

Colombiano, Rafael Posada é antropólogo e iniciou sua trajetória de trabalho com a população carcerária por um motivo banal, que ele atribui à sorte: “foi o emprego que consegui”. Atuou, assim que saiu da faculdade,  em uma pesquisa realizada pelo governo colombiano nas cadeias do país. Conta que tinha todos os preconceitos que qualquer um tem com essa população. “Quando comecei a trabalhar, todos me diziam para ter cuidado, que eles eram nervosos, perigosos. Aí cheguei para fazer a pesquisa e o guarda me deixou sozinho com 50 presos. Pensei ‘nossa, eles vão me matar’”, recorda-se. Não mataram. “Me trataram normalmente e eu entendi com o tempo que atrás de alguém que cometeu o homicídio é também um pai, um tia, um parente de alguém. Ou seja, podia ser um parente seu. É um ser humano”, diz. Posada nunca mais mudou de área e agora já está no doutorado analisando de forma mais detalhada os dados coletados para a dissertação do mestrado.

Justica

Justiça suspende reintegração de posse no RN e evita despejo de 2 mil pessoas em comunidade pesqueira

Empresa Incorporadora Teixeira Onze não conseguiu provar propriedade do terreno no município de Enxu Queimado, onde vivem 2.389 pessoas de 554 famílias

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Por Mirella Lopes, da agência Saiba Mais

O desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte Vivaldo Pinheiro suspendeu o despejo de 554 famílias na comunidade pesqueira tradicional Exu Queimado, em Pedra Grande. O pedido de reintegração de posse do terreno havia sido acatado pelo juiz de primeira instância, mas revertido pelo desembargador. Ele avaliou que a empresa Incorporadora Teixeira Onze não conseguiu provar a posse da área.

No local, vivem 2.389 moradores de uma comunidade pesqueira fundada há mais de 100 anos, distante 150 quilômetros de Natal (RN). Das 810 moradias, 97% está situada na zona rural. O conflito na região começou em 2007, mas se intensificou durante a fase de pandemia da Covid-19 com ameaças e incêndio de barracos, como relatam alguns moradores.

“Os barracos foram montados há 4 meses para evitar que a empresa avance sobre a área. Não houve agressão física, mas eles contrataram dois seguranças para retirar os barracos, só que não conseguiram. Oito dias depois, dois barracos foram incendiados. Eles chegaram à comunidade em 2007 colocando cercas nas terra, o que não aceitamos porque as áreas sempre foram coletivas, os terrenos nunca tiveram donos, a comunidade foi fundada por pescadores que se alojaram na praia para ficar mais perto do trabalho, que é a pesca. Moramos aqui há mais de 100 anos e a empresa foi formalizada só pra comprar as terras”, denuncia Leonete Roseno do Nascimento, moradora de Enxu Queimado.

Os moradores contam que duas pessoas de Recife se apresentaram como donos do local, venderam terrenos sem que a comunidade soubesse e começaram uma campanha de regularização.

“Eles tentaram vender as terras pra Prefeitura pra tentar fazer a regularização, mas nem a prefeitura aceitou. Foi aí que nós nos unimos e fizemos um movimento. Nós não aceitamos que a empresa, que não tem função social, nem nada construído na comunidade, se apresente como proprietária”, reage Leonete, que também é educadora popular e esposa de pescador.

Em Enxu Queimado, localidade de Pedra Grande, 97% dos moradores vivem na zona rural (foto: divulgação)

Os moradores conseguiram apoio e uma equipe de advogados populares na causa. Em um vídeo, um engenheiro civil de uma empresa que presta serviço à empresa Teixeira Onze oferece a transferência do imóvel para o nome do morador que não tem escritura pública. O advogado Gustavo Freire, que representa os moradores, denunciou a prática à justiça:

“Eles reivindicam a propriedade de toda a área, entram com uma ação possessória com base nesses títulos de propriedade e, por fora, tentam fazer com que as pessoas regularizem as suas posses pra que possam vender pra eles. Em resumo: se dizem donos da terra ao mesmo tempo que se colocam à disposição pra comprar essa mesma terra. A decisão do TJRN acatou nossa tese que isso não é possível”, explicou.

Ele ressalta, também, que apesar de reivindicar a posse do terreno, a empresa nunca esteve lá.

“Ela não planta, mora ou edifica. Você não pode reivindicar uma posse que nunca exerceu. Ela (a empresa) está pedindo de volta algo que nunca foi dela”, argumenta.

Foi esse argumento da posse exercida de fato pelos moradores que o Tribunal de Justiça do RN levou em consideração para decidir pela permanência da comunidade de pescadores.

A equipe da Agência Saiba Mais tentou entrar em contato com o número disponibilizado no vídeo da empresa, mas nossas chamadas não foram atendidas, nem as mensagens respondidas.

Com a decisão do desembargador Vivaldo Pinheiro, a Incorporadora não pode mais recorrer. No entanto, ainda é possível tentar reverter o mérito, mas se não conseguirem, terão que esperar o processo ser sentenciado para, então, recorrer novamente.

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#EleNão

EDITORIAL – HOJE É DIA DE LUTO! PERDEMOS O MENINO GABRIEL

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Gabriel e Lula: aniversário no mesmo dia: 27/10

Gabriel e Lula: aniversário no mesmo dia: 27/10

Gabriel e Lula: aniversário no mesmo dia: 27/10

Perdemos um camarada valoroso, um menino negro encantador de feras, um sorriso no meio das bombas e da violência policial, um guerreiro gentil que defendeu com unhas e dentes a Democracia, a presidenta Dilma Rousseff durante todo o processo de impeachment, e o povo brasileiro negro e pobre e periférico, como ele.

Gabriel Rodrigues dos Santos era onipresente. Esteve em Brasília, na frente do Congresso durante o golpe, em São Paulo, nas manifestações dos estudantes secundaristas; em Curitiba, acampando em defesa da libertação do Lula. Na greve geral, nas passeatas, nos atos, nos encontros…

O Gabriel aparecia sempre. Forte, altivo, sorrindo. Como um anjo. Anjo Gabriel, o mensageiro de Deus

Estamos tristes porque ele se foi hoje, no Incor de São Paulo, depois de um sofrimento intenso e longo. Durante três meses Gabriel enfrentou uma infecção pulmonar que acabou levando-o à morte.

Estamos tristíssimos, mas precisamos manter em nossos corações a lembrança desse menino que esteve conosco durante pouco tempo, mas o suficiente para nos enriquecer com todos os seus dons.

Enquanto os Jornalistas Livres estiverem vivos, e cada um dos que o conheceram viver, o Gabriel não morrerá.

Porque os exemplos que ele deixou estarão em nossos atos e pensamentos.

Obrigada, querido companheiro!

Tentaremos, neste infeliz momento de Necropolítica, estar à altura do Amor à Vida que você nos deixou.

 

 

Leia mais sobre quem foi o Gabriel nesta linda reportagem do Anderson Bahia, dos Jornalistas Livres

 

Grande personagem da nossa história: Gabriel, um brasileiro

 

 

 

 

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Coronavírus

#JusticeForFloyd em Portugal: atos antirracistas tomaram conta do país neste último sábado.

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por Isabela Moura e Luiza Abi Saab, Jornalistas Livres em Portugal

 

 

Os atos antirracistas #JusticeForFloyd tomaram conta de Portugal neste último sábado, 06 de junho de 2020. As principais cidades de Portugal foram ocupadas por milhares de manifestantes em atos antirracistas que pediam justiça para George Floyd. Os atos aconteceram principalmente nas cidades de Lisboa, Coimbra, Porto e Braga.

 

Em LISBOA, a manifestação  levou milhares de pessoas em marcha até à Praça do Comércio – importante espaço de reivindicação política da capital portuguesa. O encontro em Lisboa foi articulado entre diversas organizações, estavam previstos três atos em dias diferentes, mas as iniciativas foram unificadas em apenas um ato.

O contexto português e a questão da colonização foram abordagens presentes nos cartazes e nas vozes que se fizeram ouvir. José Falcão, da SOS Racismo, afirma que é necessário mudar o currículo escolar para que se possa saber de fato o que foi o passado português. “A história deste país é só a história do colonialismo, não é das vítimas do colonialismo, não é das pessoas que lá estavam a quem não pedimos autorização par ir. Onde ficamos durante 500 anos a escravizar as pessoas e essa história nunca é contada”, justifica o integrante de umas das associações que organizou a manifestação de sábado.

Mayara Reis, escritora de 25 anos e uma das vozes intervenientes menciona também a importância da educação nesse combate:  “É preciso falar sobre isso nos manuais de história, falar sobre o Tratado de Tordesilhas, porque Portugal não é inocente”.  “Não foi nossa escolha, foi escolhido por nós. O futuro que eu estou a ter agora vem disso”, refere a escritora sobre as decisões históricas que marcaram o passado colonial de países  como  a terra de onde veio – a Guiné-Bissau.

 

Em Lisboa, 06/06/2020. Foto de Geraldo Monteiro.

 

Em Lisboa, 06/06/2020. Foto de Geraldo Monteiro.

 

Em Lisboa, 06/06/2020. Foto de Geraldo Monteiro.

 

 

 

No PORTO o ato aconteceu na Avenida dos Aliados. Em referência ao norte americano George Floyd, assassinado pela polícia dos Estados Unidos, vários manifestantes trouxeram consigo os dizeres “I Can’t Breathe”, em português, “Não Consigo Respirar”. As reivindicações ecoavam pela avenida com o grito “Nem mais uma morte”, denunciando também os casos de racismo em Portugal.

 

Porto, 06/06/2020. Foto de Pedro Kirilos.

 

Porto, 06/06/2020. Foto de Pedro Kirilos.

 

Porto, 06/06/2020. Foto de Pedro Kirilos.

 

Porto, 06/06/2020. Foto de Pedro Kirilos.

 

 

 

Em COIMBRA a manifestação aconteceu na Praça da República, próxima à Universidade de Coimbra e foi organizada por estudantes da cidade. Centenas de pessoas se reuniram no local, seguindo as regras de segurança da Direção Geral de Saúde de Portugal (DGS).
O ato contou com depoimentos, gritos por reivindicações da luta antirracista e uma performance que representava Jesus negro interpretando trecho do texto “A Renúncia Impossível”, de Agostinho Neto.

 

 

Coimbra, 06/06/2020. Foto de Daniel Soglia.

 

Coimbra, 06/06/2020. Foto de Raoni Arraes.

 

Coimbra, 06/06/2020. Foto de Daniel Soglia.

 

Coimbra, 06/06/2020. Foto de Raoni Arraes.

 

 

 

Em BRAGA, a manifestação “Vidas Negras Importam” uniu cerca de 300 pessoas que prestaram sua solidariedade aos atos por George Floyd que acontecem há 10 dias nos Estados Unidos. Os presentes também denunciaram a violência policial contra negros, lembrando os casos de vítimas como Cláudia Simões e Alcindo Monteiro.

 

Braga, 06/06/2020. Foto de Rafa Lomba.

 

Braga, 06/06/2020. Foto de Rafa Lomba.

 

Braga, 06/06/2020. Foto de Rafa Lomba.

 

Braga, 06/06/2020. Foto de Rafa Lomba.

 

 

 

 

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