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Deputada eleita do PSL faz campanha pela perseguição política de professores em sala

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Especulação de que deputada eleita seria nomeada Secretária da Educação pelo comandante Moisés já provoca levante na comunidade escolar

REPORTAGEM  ATUALIZADA EM: 2/11, às 22h30min

Nem tomou posse ainda, a militante do MBL, Ana Caroline Campagnolo, eleita deputada estadual em Santa Catarina pelo partido de Bolsonaro, já tenta instalar o terror político e a discórdia nas escolas públicas estaduais, violando as leis e a Constituição.  No domingo, antes da eleição do seu candidato ser consumada, ela espalhou um aviso nas redes sociais exortando estudantes catarinenses a filmarem ou gravarem “professores doutrinadores” em sala de aula que estariam hoje, segundo ela, “inconformados e revoltados” com a eleição de Bolsonaro. Parlamentares, entidades, advogados populares e gestores da educação pública se mobilizam hoje para pedir a impugnação do seu mandato.

Natural de Chapecó, no Oeste do estado, mas com domicílio eleitoral em Itajaí, a ativista do Projeto Escola Sem Partido incita os alunos a denunciarem os professores descontentes em suas páginas nas redes sociais, onde costuma posar em fotos ameaçadoras com armas de fogo. Filha de um Policial Militar da reserva e evangélica, depois de eleita, ela publicou um post onde afirma: “Acabou a paz da petezada!”. Noutro, ela posa com um cassetete policial com a inscrição “direitos humanos”, como forma de afronta aos professores dedicados ao ensino dos valores baseados na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Causando indignação nacional, a ofensiva viola vários preceitos legais de proteção às escolas, às crianças e adolescentes e à liberdade de cátedra e será motivo de uma ação coletiva de denúncia criminal no Ministério Público. No aviso que publicou e espalhou nas redes sociais, a militante do MBL derrotada na justiça num longo processo de perseguição contra sua orientadora de mestrado iniciado em 2013, escreve literalmente:

“Muitos deles não conterão sua ira e farão da sala de aula um auditório cativo para suas queixas político partidárias em virtude da vitória de Bolsonaro. Filme ou grave todas as manifestações político-partidárias ou ideológica. Denuncie!” (Ana Caroline Campagnolo, deputada eleita por Santa Catarina)

Hoje à tarde, o Sindicato dos Trabalhadores na Educação (Sinte) e vários outros sindicatos estaduais e municipais se reúnem com parlamentares, lideranças de movimentos de mulheres e movimentos sociais da Rede Nacional de Advogados Populares para apresentar uma queixa-crime contra a deputada. Um manifesto assinado por oito grandes sindicatos ligados à educação, incluindo a CUT (leia abaixo), foi publicado no final da tarde de hoje (29/10), na página do Sinte.  Entre vários flagrantes de desrespeito à legislação e aos direitos na área da educação, a ofensiva desrespeita a lei estadual 18.289 de 25 de janeiro de 2008, que proíbe expressamente o uso de celular em escolas públicas e particulares. O Estatuto da Criança e do Adolescente também não permite que alunos e professores sejam filmados em sala de aula sem a sua expressa autorização e a dos pais.

Os movimentos alegam ainda que o Projeto Escola Sem Partido não integra a política pública de educação em Santa Catarina. Além disso, as postagens da candidata ainda não empossada incitam à violência e à discórdia. “Todos que se sentirem ameaçados por ela podem registrar um Boletim de Ocorrência na Delegacia de Polícia e processá-la, pois sua ação fere a liberdade constitucional de cátedra e viola o direito à proteção de imagem”, afirma a advogada Daniela Felix.

Aluno aproveita o incentivo à deduragem e delata a própria inquisidora: doutrinação ideológica de quem mesmo?

Em postagens frequentes, ofensivas e ameaçadoras contra “a esquerdalha” e “petralhada”, as “feministas comunistas”, na qual aparece apontando armas de fogo, Carolina deixa claro que só se elegeu para infernizar a vida de educadores e de alunos que não compactuam com o seu projeto de sociedade falso moralista, excludente e violenta do pensamento único. Em termos concretos, ela acusa os outros do crime de “doutrinação ideológica” que ela mesma pratica e difunde, promovendo a intolerância política e doutrinando as mulheres a serem donas de casa e mães de família submissas, modelo que ela mesma, divorciada e dedicada à política, não segue.

Como se incitar o ódio contra os movimentos sociais, os partidos de oposição, o pensamento crítico, os grandes legados intelectuais da humanidade, as minorias, a liberdade de ensino não fosse uma doutrina, uma velha doutrina, exterminadora de povos e destruidora da vida em sociedade, chamada NAZIFACSISMO. Uma demonstração bem concreta da hipocrisia do seu projeto e da sua conduta é que durante a campanha do candidato extremista, ela foi trabalhar com a camisa de Bolsonaro. Ironizando o convite à deduragem na escola pública, um ex-aluno seu identificado no twitter como Sebastian (poetjjong), seguiu os seus conselhos e entregou a própria mestra por doutrinação:

“Professora, lembra do dia que vc usou uma camisa do bolsonaro nas aulas?? pq eu [lembro] sim! ainda por cima posando pra foto com aluno, tsc tsc…”

The Wall, Pink Floyd em analogia ao Escola Sem Partido

Ao final do primeiro turno, começou a correr a especulação de que a deputada seria nomeada secretária da Educação pelo comandante do Corpo de Bombeiros, Carlos Moisés da Silva, aposentado aos 40 anos, então candidato a governador pelo PSL, agora confirmado no segundo turno com mais de 71% dos votos. Pela reação da categoria de professores e também de alunos, caso esse boato se confirme, o que está desenhado para o novo governo é um quadro de guerra e de greve já de saída.

O comportamento persecutório da historiadora do negacionismo, que nega a Ditadura Militar, a tortura, o machismo e até o assassinato em massa de mulheres que foram queimadas vivas no histórico episódio de incêndio a uma fábrica na Inglaterra que marca a luta pelos direitos trabalhistas na Inglaterra, ganha contornos ainda mais doentios com detalhes revelados sobre sua vida pessoal.

Em Chapecó, a deputada vivia num apartamento adquirido pelo Minha Casa, Minha Vida, Programa de Habitação Popular promovido pelos governos do Partido dos Trabalhadores e foi casada com um militante do PT. Ela chegou a ingressar no Curso de Enfermagem da Universidade Fronteira Sul, criada no Governo Lula da Silva, mas desistiu. Pouco antes de se lançar como Bolsocandidata, ela se mudou para o município de Itajaí, no Norte do Estado, supostamente para aproveitar o Caixa 2 dos biliardários donos das lojas de departamentos do Sul do País, como Luciano Hang da Havan, ou Dalçoquio, que financiou a greve dos caminhoneiros. Através do esquema da Lava-Zap, eles financiaram políticos de extrema-direita como ela, sem nenhuma história de contribuição à sociedade, baseados apenas no discurso do falso combate à corrupção como cavalo de troia para implantar no Brasil um terrorismo de direita. Dizendo-se conservadora e cristã, Campagnolo disputou pela primeira vez um cargo eletivo e jamais ocupou qualquer função pública. Em outras palavras, a “nazipaquita” se elegeu surfando na onda extremista de Bolsonaro e computou 34 mil 825 votos. Sua campanha serviu de exemplo para bolsonaristas ameaçarem professores de perseguição em todo o país.

PETIÇÃO PÚBLICA PEDE IMPUGNAÇÃO DO MANDATO

 

Depois das denúncias, Caroline  deixou mais claro o caráter seletivo de sua perseguição. Também diz que estudantes podem usar “gravadores ou câmeras”

Logo após eleita, o primeiro gesto da musa do fascismo, que fará 28 anos em novembro, foi gravar um vídeo onde ao responder perguntas de internautas afirma que as verbas públicas não resolvem o problema da educação e também acusando a categoria dos professores de serem “dinheiristas, que só pensam no próprio salário”. Todo militante de perfil fascista ama dar publicidade a suas ações de crueldade política, de modo que o horror causado na sociedade encubra a sua mediocridade intelectual e espiritual e o salve do destino à invisibilidade por falta de outros talentos ou méritos.

As manifestações de repúdio e denúncias contra Campagnolo já começaram a aparecer no domingo (28/10) à noite e pelo movimento nas redes sociais devem originar uma avalanche de protestos. Além de emitir uma nota de repúdio, o Sindicato dos Trabalhadores na Educação de São José (município vizinho a Florianópolis) protocolou no início da tarde de segunda uma representação na Promotoria de Justiça da Capital, em que pede ‘medidas cabíveis’. Afirma a nota pública que a deputada eleita incita o descumprimento da lei do uso do celular e “promove a coação dos professores em sala de aula e o desrespeito aos educadores, comprometendo a didática pedagógica profissional”. A Secretaria de Estado da Educação também emitiu Nota Oficial a respeito e a Ordem dos Advogados do Brasil publicou em sua página uma contundente reprovação da conduta autoritária e anticonstitucional da deputada eleita.

Em petição pública já com 121 mil assinaturas (atualizado às 19 horas de hoje (29), professores, estudantes e comunidade escolar pedem a impugnação do mandato de Ana Caroline, alegando que a liberdade de expressão dos professores em sala de aula foi explicitamente atacada pelo seu anúncio. O abaixo-assinado denuncia Campagnolo de incitar o ódio ao afirmar inverdades contra professores e provocar um ambiente escolar insalubre. “Nas atribuições em sala de aula, os professores, sobretudo os da área de Humanas, não fazem doutrinação ao ensinarem seus conteúdos, mas os apresentam e promovem debates com a total lisura, respeitando o livre pensamento”. O documento diz ainda:

“Diante do ocorrido, pedimos que você professor, estudante, pais que prezam por uma Educação livre e democrática, compartilhem e nos ajudem a denunciar a tentativa de cerceamento que os professores já estão sofrendo por uma candidata que mesmo sem ter assumido está se valendo de autoritarismo para promover suas ideias de forma leviana e antidemocrática!”

A petição lançada no site Avaaz pedindo a impugnação da deputada colheu mais de 413 mil assinaturas até a noite de sexta-feira, 2 de novembro.

 

DE PERSEGUIDORA DA PRÓPRIA CLASSE À RÉ POR CALÚNIA E DIFAMAÇÃO

“Candidata armamentista porém fofa”, assim ela se define no Facebook, posando com modelo de arma rosa, especialmente fabricada para mulheres feito ela

Declarando-se “antifeminista” e “antipetista” radical, a jovem está envolvida em vários casos de perseguição à própria categoria. Graduada em História pela Universidade Comunitária Regional de Chapecó, ela também é professora de ensino médio em uma escola da rede pública estadual de Chapecó. No caso mais famoso, processou sua ex-orientadora de mestrado, a reconhecida historiadora Marlene de Fáveri, após infiltrar-se no Curso de Pós-Graduação em Teorias de Gênero da Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina como uma agente do Escola sem Partido. Marlene aprovou-a no curso pelo projeto de pesquisa intitulado Virgindade e famíliamudança de costumes e o papel da mulher percebido através da análise de discursos em inquéritos policiais da Comarca de Chapecó, que propunha um estudo sobre os casos de estupro na sua região durante a década de 80, simulando uma visão crítica sobre a violência da sociedade patriarcal.

Assim que ingressou no curso, Caroline começou a armar ciladas contra sua orientadora, filmando-a em sala de aula e divulgando suas falas de forma fragmentada e descontextualizada no Youtube e redes sociais. Paralelamente, manifestava nas redes suas posturas dogmáticas e insultantes contra os movimentos feministas e sociais estudados na pós, valendo-se de pensadores homens de posição ideológica de ultra direita e machista, como Olavo Carvalho. Esses e outros comentários desabonadores do próprio curso que ele frequentava foram alertadas à orientadora pelas próprias colegas de classe.

Quando isso ocorreu, a orientadora assinou a desistência de sua orientação, alegando incompatibilidade metodológica (o que é previsto no regulamento) e Caroline foi encaminhada para outro professor, identificado com ideologia de direita. Ela mudou seu tema de pesquisa para Segurança Pública, mas foi reprovada na banca pela má-qualidade teórica e escrita do trabalho Traços de Violência e por ter perdido todos os prazos regimentares. Depois de reprovada na qualificação, iniciou, em 2016, a perseguição judicial contra Marlene de Fáveri, alegando discriminação religiosa. Em setembro, o processo foi arquivado em primeira instância, na comarca de Chapecó e julgado improcedente por falta de provas. A inquisidora recorreu da decisão.

De perseguidora, a militante do Escola Sem Partido tornou-se ré quando no mês seguinte o processo foi revertido contra ela por crime de honra, calúnia, difamação e injúria na 3ª Vara Criminal de Florianópolis, em ação que corre em segredo de Justiça. Apoiada por mais de 30 entidades da América Latina, a historiadora Marlene de Fáveri questiona o uso de seu nome e imagem como exemplo de “doutrinação ideológica” em eventos do projeto Escola sem Partido e em publicações nas redes sociais, incluindo vídeos no Youtube e nas divulgações da ação cível indenizatória por perseguição ideológica contra a professora. Somados os crimes ultrapassam quatro anos e não havendo conciliação, podem levar à condenação com pena privativa de liberdade.  . Segundo os autos, os crimes contra a honra da professora foram cometidos em palestras, publicações em redes sociais

Leia matéria sobre o caso: https://docs.google.com/document/d/1AY00ZREJc3NdpZmDmUZTPQuYe8Yf3N55WWeO0lmmLuU/edit

 

OAB/SC repudia manifestação que pede a denúncia de profissionais da educação e impede a exposição do livre pensamento

29/10/2018

A Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Santa Catarina vem a público manifestar repúdio às manifestações que sugerem a denúncia da exposição de pensamentos político-sociais, e identificação de professores em Santa Catarina. Em que pese a polarização observada em todo o país no recente pleito eleitoral, a OAB/SC relembra a importância da preservação dos direitos constitucionais dos cidadãos e das garantias individuais e coletivas conquistadas a duras penas, em prol da construção e consolidação do regime democrático e republicano brasileiro.

A OAB/SC tem acompanhado com muita preocupação a disseminação de estímulos à perseguição, violência e intolerâncias diante da livre manifestação, incentivo ao anonimato como meio de ofender o direito à discordância de pensamentos. A instituição entende ainda como um agravante, insuflar alunos a agirem como censores/delatores dos seus próprios professores, numa cultura lamentável.

Por fim, a Ordem reitera a necessidade essencial do respeito à democracia, à Carta Constitucional e à legislação vigente, dentre elas a própria Lei Estadual n° 14.636/2008, que estabelece a proibição do uso de aparelhos celulares em sala de aula.

Paulo Marcondes Brincas
Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Santa Catarina

José Sérgio da Silva Cristóvam
Presidente da Comissão Especial para Estudo e Parecer na Defesa de Liberdade de Expressão e Autonomia Universitária da UFSC

 

NOTA CONJUNTA DAS ENTIDADES REPRESENTATIVAS DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO DE SANTA CATARINA EM REPÚDIO ÀS MANIFESTAÇÕES DA CANDIDATA ELEITA ANA CAROLINA CAMPAGNOLO

29/10/2018

Os sindicatos representantes dos trabalhadores em educação das redes pública e privada municipal, estadual e federal do Estado de Santa Catarina denunciam com perplexidade a publicação da candidata eleita Ana Caroline Campagnolo (PSL), no último dia 28 de outubro, logo após a divulgação dos resultados do segundo turno das eleições 2018, na qual a mesma orienta estudantes a filmar os professores em sala de aula para denunciá-los por uma suposta “doutrinação”.

Esse tipo de ameaça publicada em rede social é um ataque à liberdade de ensinar do professor (liberdade de cátedra), tipicamente aplicado em regimes de autoritarismo e censura. É mais grave ainda por partir justamente de alguém recém-eleita para um cargo público, e que deveria fiscalizar o cumprimento das leis.
A sugestão de denúncia dos professores por estudantes caracteriza um assédio e uma perseguição em ambiente escolar, algo que remonta aos tempos da ditadura civil-militar brasileira.

A educação formal brasileira tem seus critérios estabelecidos na Constituição Federal de 88 e na Lei 9.394/96 – a LDB, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, cuja base é a gestão democrática e o pluralismo de ideias.
Os próprios sistemas de ensino, as escolas e os/as educadores/as têm autonomia para propor, em conjunto com toda a comunidade escolar, o currículo e demais atividades pedagógicas. Atitudes de provocação interferem de forma ilegal e inconstitucional no processo democrático de organização escolar, extrapolando a competência de fiscalização do trabalho escolar e do acompanhamento das atividades profissionais feitas pelas equipes pedagógicas.

O histórico da candidata eleita é repleto de perseguições, provocações e desrespeitos ao magistério, além de constantes manifestações públicas de incitação à violência. Já declarou que o problema da educação é que “os professores só pensam em dinheiro e seu salário”. Em sua página nas redes sociais, trata os professores como inimigos que precisam ser “desmascarados”.

Campagnolo também teve uma ação julgada improcedente contra uma professora da UDESC. Neste caso, mais de 30 entidades da América Latina se manifestaram a favor da professora Marlene e contra a candidata eleita.

A lei da mordaça (“Escola Sem Partido”) em que a deputada baseia seus ataques já foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e considerada censura e afronta à liberdade de expressão de estudantes e professores pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Na prática, Ana Caroline comete justamente aquilo de que acusa os docentes: o estímulo à violência e à barbárie. Há pouco tempo, repercutiram na internet imagens da candidata eleita segurando um cassetete com a expressão “direitos humanos” ou empunhando armas.

Os sindicatos representantes dos trabalhadores em educação repudiam mais essa ofensa e veem tal provocação como uma atitude antipedagógica prejudicial não apenas à educação – a qual deve ser sempre democrática, plural e livre de perseguições –, mas a toda a sociedade.

Ao contrário do que Campagnolo afirma, as melhorias na educação dependem sim de mais investimentos, especialmente no precarizado setor público – seja para materiais pedagógicos, infraestrutura, valorização salarial, inclusão, concurso público, redução do número de alunos por sala e outros.

Por fim, a candidata eleita deveria lembrar aos seus seguidores que as agressões e o desrespeito aos professores em sala de aula só vêm aumentando, e que tal posicionamento agrava a violência em um ambiente que deveria ser de civilidade, respeito, aprendizado e formação.

Não podemos permitir que a escola se transforme em palco desse autoritarismo populista que ataca e ameaça os estudantes, os trabalhadores e as trabalhadoras da educação. É preciso sempre lutar em defesa da educação democrática, plural, laica e de qualidade!

ASSINAM:
CUT-SC – Central Única dos Trabalhadores Santa Catarina
SINTE-SC – Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Santa Catarina
(FETRAM-SC) – Federação dos Trabalhadores Municipais de Santa Catarina
SINTRASEM – Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Florianópolis
SINTRAM-SJ – Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de São José
SITRAMPA – Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Palhoça
SINPROESC – Sindicato dos Professores no Estado de Santa Catarina
SINTRAFESC – Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público de SC

 

NOTA DE REPÚDIO

29/10/2018

Nós do Sindicato dos trabalhadores em educação da regional São José denunciamos a prática da Deputada Ana Carolina Campagnolo eleita para assumir o cargo de deputada estadual em SC em 2019, que em sua última postagem na noite do dia 28/10/2018 induz os alunos a descumprirem a LEI Nº 14.363, DE 25 DE JANEIRO DE 2008, que Dispõe sobre a proibição do uso de telefone celular nas escolas estaduais do Estado de Santa Catarina.

Tal postagem incita a coação dos professores em sala de aula, e promove o desrespeito aos educadores, comprometendo a didática pedagógica profissional.

A mesma por ser uma futura legisladora que deve cumprir com suas obrigações constitucionais não pode promover o descumprimento das leis. Nesse sentindo solicitamos ao MP que tomem as providências cabíveis.

Ingrid Assis
Dirigente de Assuntos Políticos
SINTE SJ

 

COMUNICADO

SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DE SANTA CATARINA

 

LEI Nº 14.363, DE 25 DE JANEIRO DE 2008

Procedência: Dep. Antonio Aguiar
Natureza: PL./0402.4/2007
DO: 18.289 de 25/01/08
Fonte: ALESC/Coord. Documentação
Dispõe sobre a proibição do uso de telefone celular nas escolas estaduais do Estado de Santa Catarina.
O GOVERNADOR DO ESTADO DE SANTA CATARINA,
Faço saber a todos os habitantes deste Estado que a Assembléia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica proibido o uso de telefone celular nas salas de aula das escolas públicas e privadas no Estado de Santa Catarina.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Florianópolis, 25 de janeiro de 2008
LUIZ HENRIQUE DA SILVEIRA
Governador do Estado

CORRESPONDÊNCIAS TERRORISTAS

Ainda na segunda-feira, o ex-vereador pelo PCdoB de Florianópolis, João Ghizoni, denunciou nas redes sociais o recebimento de uma correspondência apócrifa com remetente de Balneário Camboriú, que fica a meia hora de Itajaí, onde mora a deputada eleita. Dentro do envelope destinado ao diretório do PCdoB, em Florianópolis, havia duas folhas grampeadas, uma com montagens de fotos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na prisão, acompanhadas de ofensas ao candidato Fernando Haddad. A outra folha traz fotos da deputada eleita posando com armas de fogo e a mensagem ameaçadora em letras garrafais no alto da página: “PETISTAS: NÃO SE METAM COM BOLSONARO”. Outra mensagem abaixo das fotos finaliza o recado que lembra táticas terroristas de direita de última categoria: “DEPOIS NÃO DIGAM QUE EU NÃO AVISEI”.

ATUALIZAÇÕES:

MPSC DENUNCIA DEPUTADA POR “SERVIÇO ILEGAL DE CONTROLE POLÍTICO-IDEOLÓGICO DE PROFESSORES”

Enquanto instiga alunos a delatarem professores que não sejam neutros e imparciais, deputada se sente autorizada a propagar sua própria ideologia do ódio. Só que não!

Numa ação coletiva pública exemplar, o promotor do Ministério Público, Davi do Espírito Santo, entrou na justiça na terça-feira (30) para que a deputada estadual eleita por Santa Catarina, Ana Caroline Campagnolo (PSL) pague indenização de R$ 70 mil por criar um  “serviço ilegal de controle político-ideológico da atividade docente”. Por essa iniciativa, o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) pede a condenação por danos morais coletivos no valor de R$ 1,00 para cada um dos 71 mil 515 seguidores da deputada em uma rede social, tomando como critério de cálculo o potencial de compartilhamento de cada um. O dinheiro deve ser destinado ao Fundo para Infância e Adolescência (FIA), segundo a própria denúncia.

Ao solicitar o deferimento da liminar (decisão temporária), o promotor pede que ela se abstenha de manter qualquer tipo de controle ideológico das atividades dos professores e alunos de escolas públicas e privadas do estado. A defesa da deputada afirmou que vai aguardar citação formal para se manifestar sobre o caso.  O Ministério Público Federal (MPF) também investiga o caso e instaurou um inquérito sobre o assunto na segunda (29). No pedido de liminar, o MPSC pede à Justiça ainda que a deputada eleita seja obrigada a retirar das redes sociais o post que instiga a perseguição ideológica de professores e ainda que a operadora de celular bloqueie o canal divulgado pela parlamentar para envio dos vídeos resultantes desse processo de “deduragem política” nas escolas públicas.

A peça jurídica de admirável coragem e brilhantismo para esses tempos de adesão do judiciário à política da truculência, o promotor de justiça David do Espírito Santo foi firme em defesa da democracia constitucional e da liberdade de pensamento. Conforme ele, a deputada “implantou um abominável regime de delações informais, anônimas, objetivando impor um regime de medo”. Ao citar a Constituição Federal, ele destaca: “O direito à crítica pode e deve ser exercido na escola, sem cerceamentos de opiniões políticas ou filosóficas”, afirma o promotor. Nessa linha, a ação civil pública tem como objetivo, segundo o PMSC, “garantir o direito dos estudantes de escolas públicas e particulares do estado e dos municípios à educação segundo os princípios constitucionais da liberdade de aprender e de ensinar e do pluralismo das ideias”.

O uso de canais informais e privados para o recebimento de denúncias de supostas irregularidades ou desvios de conduta cometidas por funcionários públicos não tem é reconhecido pela legislação nacional, conforme argumentou o promotor. “É ilegal o uso de qualquer outro canal de comunicação de denúncias que não esteja amparado em uma ato administrativo válido”.

Embora atuasse como professora de Ensino Médio em Chapecó, Ana Caroline, mudou-se para Itajaí nas vésperas do lançamento de sua candidatura, por motivos ainda não esclarecidos. Na noite de domingo, ela fez uma publicação em redes sociais oferecendo um contato telefônico para alunos enviarem vídeos de professores em sala de aula que estejam fazendo “manifestações político-partidárias ou ideológicas”.

Decisão liminar proíbe deputada de impor “regime de medo e terror nas salas de aula”

postado em 01/11/2018, 17:37

 

A ordem liminar do Juiz da Vara da Infância e da Juventude da Capital foi expedida nesta quinta-feira/Foto: Catarinas

A deputada eleita para a Assembleia de Santa Catarina, Ana Caroline Campagnolo (PSL), terá que retirar do ar imediatamente a publicação que incentiva o controle das atividades dos professores e alunos das escolas públicas e privadas do sistema de ensino do Estado e dos municípios, postada em seu perfil do Facebook. Ela também está proibida de manter o “canal de denúncias” por ela criado sem qualquer amparo legal. Caso a liminar seja descumprida a multa diária é de mil reais.

Entenda o caso.  

A ordem liminar do Juiz da Vara da Infância e da Juventude da Capital foi expedida nesta quinta-feira (1/11) e atende ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público de Santa Catarina. Conforme o MP, a deputada violou princípios constitucionais como o da liberdade de expressão da atividade intelectual, científica e de comunicação, “e que deve ser exercida independentemente de censura ou licença (art. 5.º, IX, CF/88”), assim como da “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”, bem como do “pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas”, previstos nos arts. 206, II e III da Constituição Federal.

Ainda de acordo com a decisão, a atitude de Campagnolo infringe o direito dos estudantes, como crianças e adolescentes, à proteção contra toda forma de exploração (art. 227, caput, CF). “Sua conduta ao recomendar a realização de filmagens nas salas de aula representa, exploração política dos estudantes, pois está ligada à intenção de deles tirar proveito, político ideológico, com prejuízos indiscutíveis ao desenvolvimento regular das atividades escolares, quer pelo incentivo à desconfiança dos professores quer pela incitação dos alunos catarinenses ao descumprimento da Lei Estadual n. 14.363/2008, que proíbe o uso do telefone celular nas escolas (…)”.

Como explica o juiz Giuliano Ziembowicz, na decisão liminar, a deputada eleita teria

“implantado o que seria um regime de delações informais e anônimas, visando impor um regime de medo e terror nas salas de aula”. Além disso, estaria “desafiando e humilhando professores com suas postagens”.

Efeito em todo país

Segundo a decisão, as “mensagens produzem intranquilidade e animosidade nos ambientes escolares, com danos incomensuráveis à educação”. “As ações da requerida na rede social ‘Facebook’ têm gerado efeitos nos outros Estados da Federação, produzindo revolta generalizada dos educadores, que se veem intimidados com a referida atitude da requerida”.

O juiz defendeu que à deputada eleita, assim como a todos as/os cidadãs/os brasileiras/os, é assegurado o direito de exercer a livre manifestação de pensamento através das redes sociais. “No entanto, a publicação como a que está em tela possui conteúdo que vai além do exercício da liberdade de pensamento e expressão de ideias e críticas… fere diretamente o direito dos alunos de usufruírem a liberdade de expressão da atividade intelectual, científica e de comunicação”.

Em sua fundamentação, o Juiz faz menção ao posicionamento do ministro do STF Gilmar Mendes sobre a importância do debate nas universidades durante o julgamento, na quarta-feira (31), que suspendeu atos de fiscalização da Justiça Eleitoral em universidades públicas e privadas de diferentes estados.

“Bem mencionou que as universidades são ambientes de profícuo desenvolvimento do pensamento crítico, inclusive político e de circulação de ideias, onde nascem lideranças políticas vindas dos movimentos estudantis, algo que já foi muito mais presente no Brasil e que merece ser reavivado.”

Para o magistrado, essa realidade não deve ser diferente no ambiente da Educação Básica, pois, segundo ele, a discussão política deve fazer parte da realidade escolar, sempre com respeito às diversas opiniões, como deve ser. “Efetivando-se, assim, os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal e relativos ao tema, com importante incidência do pluralismo de ideias”, afirmou na decisão.

Quanto ao “canal de denúncias”, o Juiz segue a sustentação do Promotor de Justiça Davi do Espírito Santo na Ação Civil Pública. Diz que os serviços de recebimento de denúncias acerca da atuação de servidor público só podem ser realizados no âmbito do Poder Público, nunca por particulares, sob pena de ferir a Constituição Federal e o princípio da impessoalidade.

“O princípio da impessoalidade, próprio da Administração Pública e que vem de encontro a qualquer direcionamento ideológico, ao contrário do que aparentemente proporciona o ‘canal de denúncias’ criado e utilizado pela requerida, onde existe expressa referência às eventuais discordâncias ideológicas que são objeto das pretendidas denúncias”, sustenta a liminar.

Sem base legal também é a implementação de serviço de controle político ideológico das atividades docentes, em prejuízo da liberdade de manifestação e de um universo de estudantes, composto fundamentalmente de crianças e adolescentes.

A Ação Civil Pública com pedido de liminar foi ajuizada pelo MPSC na terça-feira (30) com o objetivo de garantir o direito dos estudantes de escolas públicas e particulares do Estado e dos municípios à educação segundo os princípios constitucionais da liberdade de aprender e de ensinar e do pluralismo de ideias.

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4 Comments

4 Comments

  1. hellitonsm

    29/10/18 at 15:58

    Alguém sensato. Apesar que se ela corrigir o que ensina nos cursos de formação de professores, já melhoraria muito,

  2. Hélio

    29/10/18 at 18:21

    Babaca essa deputada, já se acha acima da lei. Fofa é o escambau.e

  3. Carlos Magno

    30/10/18 at 1:58

    CAPITÃ DO MATO na versão branca e feminina. Uma traidora dos colegas de profissão. Uma traidora do curso no qual se formou. Merece todo repúdio, merece ser jogada na lama fétida da imbecilidade e estupidez.

  4. Dei Horus

    31/10/18 at 10:29

    Que vergonha de pessoa! Mostrou ao Brasil inteiro como é ignorante e ridícula. Cada foto é uma vergonha diferente…

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O caso Mariana Ferrer, por Honoré de Balzac

Enfim, “de todas as mercadorias deste mundo, a mais cara é sem dúvida a justiça”.

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O caso Mariana Ferrer por Honoré de Balzac

Por Dirce Waltrick do Amarante*

Quando o escritor francês Honoré de Balzac teve acesso ao vídeo da audiência de Mariana Ferrer, ele decidiu escrever o Código dos homens honestos, isso nos idos de 1875, mas só agora estou tornando públicas suas palavras, que estavam sob segredo de justiça.  

Em uma análise bastante rigorosa, Balzac lembra, em primeiro lugar, que sabemos perfeitamente bem que “em princípio, ficou estabelecido que a justiça seria para todos, mas […]” . A tradução é de Léa Novaes, pois Balzac tinha dificuldade em escrever em português.

Dito isso, ele fala da figura do procurador. Em tempos idos, diz Balzac, os procuradores “levavam tão a sério o interesse de um cliente que chegavam a morrer por eles”. Além disso, eles “nunca frequentavam a sociedade”, e se a frequentassem eram vistos como “monstros”, mas hoje, “hoje tudo está monetarizado: já não se diz que Fulano foi nomeado procurador-geral, vai defender os interesses de sua província […]. Não, nada disso; o senhor Fulano acaba de conquistar um belo posto, procurador-geral, o que equivale a honorários de vinte mil francos […]”.

Balzac ia falar da figura do juiz e do defensor público, mas depois de tudo que assistiu ficou sem as palavras justas para descrevê-los.

Então, o escritor francês decidiu se debruçar sobre o papel do advogado, que “frequenta bailes, festas […] despreza tudo o que não é elegante”. E, diz Balzac, “Justiça seja feita aos advogados […]! São os decanos, os chefes, os santos, os deuses da arte de fazer fortuna com rapidez e com uma sagacidade que os torna merecedores de muitos elogios”.

Enfim, “de todas as mercadorias deste mundo, a mais cara é sem dúvida a justiça”.

Não citei na íntegra o texto do Balzac, porque foram esses os únicos fragmentos aos quais tive acesso, os outros foram apagados.  

*Formada em Direito, em 1992, na Universidade Federal de Santa Catarina

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O show de Trump: renovação ou cancelamento?

A eleição nos EUA e o destino da democracia na condição atualista

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Nos EUA voto popular não significa vitória. Biden terá mais votos do que Trump e ainda assim o resultado da eleição continuará indefinido por algum tempo. Apesar dos descalabros que marcaram a gestão Trump antes e durante a pandemia, o seu desempenho na atual corrida eleitoral será muito forte.

Mateus Pereira, Valdei Araujo e Walderez Ramalho, professores da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) em Mariana, MG

A disputa está sendo muito mais acirrada do que era inicialmente previsto pela maior parte dos institutos de pesquisa e da mídia americana, embora a cautela e o medo nunca deixaram de estar presentes. Sob esse ponto de vista, as eleições deste ano são como uma repetição do que vimos em 2016, ainda que o resultado possa ser a derrota eleitoral para Trump. Em 2016 foram os democratas que denunciaram a interferência russa, agora é o presidente-agitador que se apressa em questionar a legitimidade do pleito, sem mostrar nenhuma prova. Sabemos que no ambiente do atualismo provas têm como base apenas convicções.

Um sistema eleitoral que sobreviveu por séculos, sem grandes mudanças, pode ter se tornado obsoleto desde a eleição de Bush, em 2000. Um lembrete do possível declínio da democracia americana: das últimas oito eleições presidenciais desde 1992, os democratas venceram no voto popular as últimas sete, mas em apenas quatro ocasiões ganharam o colégio eleitoral e fizeram o presidente.

Acreditamos que as eleições nos EUA são um exemplo do confronto entre duas estratégias e duas concepções sobre fazer política: de um lado, Trump e sua promessa de eterna atualização da atualidade em modo nostálgico; e Biden, com sua aposta moderada no cansaço na agitação atualista que seu adversário republicano encarna e radicaliza, e a retomada da política em moldes liberais. Essa retomada é feita sem uma crítica efetiva ao modelo neoliberal abraçado pela cúpula do partido democrata. Uma aposta radical, como Sanders, teria se saído melhor? É difícil dizer, mas tudo leva a crer que não, tendo em vista o complicado xadrez do voto estado a estado.

A escolha entre as duas estratégias/concepções se mostrou muito mais difícil e apertada do que se imaginava. A tal “onda azul” anunciada por parte da imprensa estadunidense esteve longe de acontecer. De fato, Trump se mostrou eleitoralmente muito mais forte do que os analistas supunham. Considerando que esta não é a primeira vez que os institutos de pesquisa falharam em captar esse movimento no eleitorado americano, e considerando também que fenômeno semelhante ocorreu no Brasil em 2018, coloca-se a questão de saber se as tradicionais pesquisas de opinião tornaram-se de alguma forma obsoletas em um mundo atualista. Esse quadro muda pouco, mesmo com uma  eventual vitória de Biden ou pior, com uma inconveniente reeleição de Trump.

São vários fatores que devem ser considerados para avaliar essa questão. Os próprios institutos se apressaram a ensaiar algumas explicações ao público. O diretor da Trafalgar Group, Robert Cahaly, afirmou que muitos eleitores “esconderam”, como já havia acontecido, sua preferência por Trump por algum receio ou constrangimento social.[1] Não podemos desconsiderar algum tipo de boicote/sabotagem dos eleitores republicanos, já que na retórica do trumpismo as pesquisas de opinião fazem parte da mídia vendida. Outros recorreram à justificativa de que as pesquisas anteriores representavam apenas fotografias do momento específico em que as entrevistas foram feitas, e não o que se poderia esperar na eleição propriamente dita. Isso poderia ter sido de fato observado pela tendência de redução da vantagem de Biden nos últimos 15 dias. Afinal, o episódio da contaminação de Trump e sua rápida recuperação pode ter tido um saldo positivo, ao menos na mobilização de sua base, como já havíamos especulado em coluna anterior.

Aceite-se ou não essas justificativas, fato é que os institutos de pesquisa sairão dessas eleições com sua credibilidade e imagem pública mais arranhadas, sobretudo diante das especificidades do sistema eleitoral americano. Como afirmamos, muitos fatores concorrem para esse desgaste. Um deles está relacionado à condição atualista que caracteriza o nosso presente e como cada um dos candidatos se coloca frente a tal condição.

Trump é um político bastante sintonizado com o ambiente da comunicação atualista onde as provas dispensam comprovação factual. Seja nas redes sociais, seja em seus concorridos comícios, o presidente se revela um comunicador difícil de ser batido. Dentre os aspectos associados à condição atualista, destacamos a intensidade e velocidade sem precedentes do fluxo de notícias, em detrimento dos protocolos de verificação e checagem da informação veiculada. Esse ambiente infodêmico[2] é particularmente fértil para a produção de desinformação e sua disseminação como misinformação.[3] Além das informações imprecisas, para não dizer apenas falsas, que a infodemia trumpista ajuda a difundir, é preciso levar em consideração a agitação/ativação que produz. É como se a oposição se agitasse confusamente e a base trumpista se ativasse a cada um de seus comentários polêmicos. Assim, o uso constante das redes sociais para disseminar fake news ou comentários faz com que, seja de modo positivo ou negativo, o presidente esteja sempre no foco da mídia. O acúmulo de notícias sobre suas falas ou atos inconsequentes faz com que seja difícil recuperar qual foi o absurdo dito ou feito na semana anterior. Na condição atualista há um valor excepcional em estar mais atualizado (e exposto) que o seu adversário. 

Ainda assim, a manipulação das fake news como ferramenta política supõe uma linguagem organizada para se tornar eficaz. Essa afirmação pode soar chocante à primeira vista: como podemos atribuir coerência a um discurso fundamentado em desinformação e que frequentemente e sem o menor pudor afirma hoje o contrário do que disse ontem, como o exemplo do uso de máscaras na pandemia?[4] O ponto aqui é que a condição atualista coloca muitos obstáculos para que o passado, mesmo o mais recente, seja trazido à reflexão. Assim, quando confrontados com suas próprias contradições, políticos atualistas como Trump e Bolsonaro simplesmente atualizam suas narrativas e afirmações quando as anteriores se tornam insustentáveis. Com muita frequência, os seus discursos mudam em função da conveniência da atualidade, sem a mínima necessidade de se prestar conta da contradição com o que eles mesmos diziam no dia anterior.

Essa estrutura atualista do discurso político só se torna eficaz, porém, no interior de uma linguagem organizada e facilmente identificável pelo público que a compartilha, no interior de uma condição material de reorganização do mundo do trabalho e do capital. A crise de 2008, concentração de renda, neoliberalismo, capitalismo de vigilância e a formação do atual “precariado” são elementos, dentre outros, fundamentais para entender a emergência de líderes que governam e são eleitos por pequenas maiorias mobilizadas pela historicidade e ideologia atualista. Só assim podemos entender a força de Trump na eleição independente do resultado final, ainda que sua derrota  interesse a todos os democratas do mundo.

Trump lança mão de artifícios retóricos quando confrontado com suas afirmações evidentemente baseadas em mentiras e contradições, de tal maneira que ele consegue, mesmo em tais situações, transmitir e reforçar o código entre o seu público. O código se estrutura em uma lógica antagonista, na qual o portador é sempre vítima de perseguição por parte do establishment e da imprensa vendida para a “esquerda corrupta” ou as corporações globalistas.

O ponto principal a ser considerado é que para ser politicamente eficaz não é necessário que o código seja compartilhado por todos; mas que seja continuamente ativado junto aqueles que já o compartilham. Por mais que esteja sustentado em desinformações, o fato é que o código é bastante poderoso na ativação de afetos políticos centrais como o medo, ódio e ansiedade, vetores de forte engajamento e agitação política que Trump e Bolsonaro sabem tão bem promover.

O sucesso dessa estratégia se coaduna com a popularização das redes sociais e dos smartphones, bem como das novas tecnologias de processamento de dados manipulados para fins políticos. Nesse contexto, tornou-se possível criar e difundir mensagens sob medida para cada tipo de público, cada indivíduo ou grupo formula suas próprias percepções sobre o mundo a partir de narrativas (códigos) que não mais precisam ser expostos publicamente a todos para serem eficazes. Após alguns reconhecimentos iniciais, os algoritmos se encarregam de abastecer-nos das notícias que nos mobilizam, sempre com o mesmo teor e formato. Reforça-se, assim, o fenômeno das “bolhas”.[5] Esses códigos podem circular de forma subterrânea, de tal modo que o que parece absurdo e chocante para uns, é perfeitamente aceitável e normalizado para outros.

Esse ambiente de circulação de notícias e códigos é condizente com a ordem atualista de nosso tempo e, ao nosso ver, é um fator importante a ser considerado no desempenho surpreendente de Trump nestas eleições. E um dos preços a se pagar para tal sucesso é a radicalização do clima de agitação que tem marcado a nossa época. Esse quadro tem resultado inclusive em distúrbios psicológicos cada vez mais comuns, como o “transtorno do estresse eleitoral”, que segundo estimativas afeta sete em cada dez cidadãos estadunidenses.[6]

Os políticos atualistas claramente não se importam em pagar esse preço, na verdade eles têm lucrado com isso. Mas, ao fim e ao cabo, eles não podem evitar completamente os efeitos colaterais de suas apostas. Agitação e dispersão geram também cansaço no eleitorado. Biden e os democratas tomaram esse efeito como vetor de suas estratégias para estas eleições. Frente à irrefreável agitação de Trump, Biden se vendeu como a opção mais “centrista”, de moderação e convergência. A divergência entre as duas estratégias foi mais uma vez demonstrada logo após o fechamento da votação: enquanto Trump se apressou em declarar-se vencedor e dizer que irá judicializar a eleição em caso de derrota, Biden classificou tal postura como “ultrajante” e pregou calma aos seus apoiadores[7].

Mesmo que a vitória do democrata seja confirmada, é inegável que o preço desse lance foi bastante alto. A imprensa americana noticiou como parcelas importantes do eleitorado negro, que o próprio Biden afirmou ser “a chave para a vitória”, relataram estarem pouco motivados a votarem no candidato democrata.[8] O mesmo ocorreu entre parte do eleitorado hispânico, em especial na Flórida e no Texas. O conservadorismo nos costumes, a adesão a denominações evangélicas que tem crescido entre hispânicos e a tradição anticomunista dos cubanos, e agora também venezuelanos, na Flórida, são fenômenos a serem considerados. Enquanto fechamos essa coluna Trump ainda lidera na Pensilvânia, estado no qual o operariado branco migrou dos democratas para o trumpismo. No último debate, Biden acabou por reconhecer que teria que acabar com a exploração do altamente poluente gás de xisto, o que foi imediatamente explorado por Trump: “Eis uma declaração importante”, ironizou o presidente. Caso perca por margem apertada na Pensilvânia, onde os trabalhadores dessa indústria são amplamente sensíveis ao tema, talvez essa declaração tenha custado a eleição.

Para entender melhor essas flutuações teríamos que fazer algo pouco praticado durante a campanha, uma avaliação retrospectiva fundada em boa informação acerca das políticas públicas implementadas por democratas e republicanos, em especial nos governos Obama e Trump. O apoio ao republicano não é apenas resultado da mágica da comunicação, deriva também da tibieza das políticas democratas e dos acertos de Trump. Reforma do sistema criminal, política externa menos intervencionista, foco na economia e na criação de empregos, com bons resultados, ao menos até a pandemia.

A decisão das eleições primárias do Partido Democrata em nomear um candidato “centrista” para concorrer nessas eleições – ao contrário de uma opção mais radical do populismo de esquerda como Bernie Sanders – foi importante para unificar o partido (em especial o seu establishment) e angariar o apoio do eleitorado “cansado” da agitação radicalizada. Por outro lado, a figura moderada de Biden não se mostrou capaz de promover um grau de engajamento e mobilização do público à altura do seu adversário agitador, nem está claro ainda se seu discurso de união nacional conseguiu atrair eleitores de Trump. Essa diferença é importante em um contexto onde o voto não é obrigatório e, no caso particular das eleições deste ano, ainda mais desencorajado pela pandemia do coronavírus.

Mesmo assim, a moderação pode ter sido eficaz para para derrotar a agitação, mas não para desativá-la. E ainda não podemos assegurar como os EUA sairá dessas eleições, pois Trump continua sendo quem é. Há ainda o risco de o agitador perder e não aceitar sair, e as consequências disso poderão ser catastróficas. E mesmo que ele saia, o trumpismo – o negacionismo, o anti-esquerdismo, o desejo de retorno a um passado glorioso e mítico – ainda permanecerá em parcelas consideráveis da população.

O que tudo isso ensina para o campo democrático brasileiro, que tem de enfrentar a sua própria versão de agitador atualista? Desde o início da votação nos EUA, Bolsonaro disparou freneticamente uma série de tweets ressoando as alegações infundadas de seu ídolo sobre as eleições serem “fraudadas” a favor dos democratas, o que seria um risco para a “liberdade” e para o Brasil. Afinal, nosso agitador atualista tupiniquim sabe bem que a permanência de Trump é uma força de sustentação fundamental para ele. As relações entre EUA e Brasil deixaram de ser uma relação entre Estados, mas sim uma relação de “amizade” (leia-se emulação e, do nosso ponto de vista, subserviência) entre os chefes de turno da Casa Branca e do Palácio do Planalto.

Assim, e seguindo o estilo atualista de fazer política, Bolsonaro ressoa as afirmações sem fundamento de Trump, sem se preocupar com a veracidade e desprezando o princípio diplomático básico da impessoalidade. Mas Bolsonaro também tem seu próprio código “alternativo”, cujo enfrentamento é a tarefa prioritária das forças democráticas no Brasil, que deverá avaliar e tomar suas próprias escolhas para vencer o confronto. Assim como o trumpismo, nos Estados Unidos, o bolsonarismo é um fenômeno que não necessariamente depende da permanência de Bolsonaro no poder: ele mobiliza parcelas consideráveis da população através de seus discursos, que defendem o conservadorismo nos costumes, o liberalismo na economia, a luta contra “o sistema”, a religião e a admiração pelo militarismo.

Será que a aposta moderada e centrista será suficiente para derrotar o bolsonarismo aqui? Mesmo que por pouco? Ou, em nosso contexto particular, faz-se necessário redobrar a aposta na radicalização pela via da esquerda? Mesmo que a vitória de Biden seja confirmada, ainda não está claro qual das duas vias parece a mais indicada para o Brasil. Enfim, tudo indica um destino trágico da democracia liberal de “pequenas maiorias” em tempos de agitação atualista. Sem negar a nossa atual realidade, cabe a nós pensar e imaginar alternativas, por mais difícil que pareça ser em nosso atual nevoeiro e impregnados por uma sensação de asfixia. Além disso, a lentidão com que a apuração avança em alguns estados decisivos promete nos deixar hipnotizados pelos mapas eleitorais na expectativa da atualização decisiva.

(*) Mateus Pereira e Valdei Araujo escreveram o Almanaque da Covid-19: 150 dias para não esquecer ou o encontro do presidente fake e um vírus real com Mayra Marques. Ambos são professores de História na Universidade Federal de Ouro Preto, em Mariana (MG). Também são autores do livro Atualismo 1.0: como a ideia de atualização mudou o século XXI e organizadores de Do Fake ao Fato: (des)atualizando Bolsonaro, com Bruna Klem. Walderez Ramalho é doutorando em História na mesma instituição. Agradecemos à Márcia Motta e ao grupo Proprietas pelo apoio e interlocução nesse projeto.


[1] https://noticias.uol.com.br/colunas/thais-oyama/2020/11/04/o-eleitor-oculto-de-trump-e-o-novo-erro-dos-institutos-de-pesquisa.htm

[2] PEREIRA, Mateus; MARQUES, Mayra; ARAUJO, Valdei. Almanaque da COVID-19: 150 dias para não esquecer, ou a história do encontro entre um presidente fake e um vírus real. Vitória: Editora Milfontes, 2020.

[3] Usamos aqui um neologismo para dar conta da diferença que em inglês é mais clara entre a produção deliberada de notícias falsas (disinformation) e sua disseminação involuntária (misinformation).

[4] https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2020/07/20/trump-muda-discurso-e-agora-diz-que-usar-mascara-e-patriotico.htm

[5] EMPOLI, Giuliano Da. Os engenheiros do caos: como as fake news, as teorias da conspiração e os algorítimos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições. São Paulo: Vestígio, 2019.

[6] https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/10/quase-sete-em-cada-dez-americanos-relatam-transtorno-do-estresse-eleitoral.shtml

[7] https://br.noticias.yahoo.com/em-pronunciamentos-biden-prega-calma-e-trump-faz-acusacao-de-roubo-065922289.html

[8] https://www.aljazeera.com/news/2020/9/12/biden-battles-trump-lack-of-enthusiasm-among-black-voters

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Feminismo

Que tal ajudar Mariana Ferrer a obter Justiça?

Não basta lacrar. Um chamamento a todas as feministas e a todas as mulheres para que enfrentemos a misoginia dos tribunais brasileiros

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Mariana Ferrer chora durante julgamento em que foi humilhada o ofendida

A reportagem do Intercept Brasil sobre a denúncia de estupro da influencer Mariana Ferrer tornou-se viral nas redes. Sob o título JULGAMENTO DE INFLUENCER MARIANA FERRER TERMINA COM SENTENÇA INÉDITA DE ‘ESTUPRO CULPOSO’ E ADVOGADO HUMILHANDO JOVEM, o texto da repórter Schirlei Alves serviu de base para milhares e milhares de postagens sobre a excrescência jurídica que teria embasado a absolvição do empresário André de Camargo Aranha. Até as 15h30 de ontem (4/11), o Google devolvia 781.000 resultados, quando se procurava pela expressão “estupro culposo”. Memes, charges, textões e textinhos foram produzidos em escala industrial para provar que um estuprador havia conseguido sentença absolutória graças a uma invencionice jurídica obrada pela Justiça, com vistas a proteger um macho branco, amigo de poderosos e, ele mesmo, “filho do advogado Luiz de Camargo Aranha Neto, que já representou a rede Globo em processos judiciais”, segundo a reportagem do Intercept.

Lida toda a sentença de 51 páginas do juiz do caso, Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, entretanto, constata-se que, em nenhum momento da sentença é dito que houve “estupro culposo” contra a jovem. Ao contrário, é dito que não existe essa tipificação e que o estupro é necessariamente doloso. Portanto, está errada a formulação do título do Intercept Brasil.

Está tão errada que o próprio site The Intercept Brasil foi obrigado, às 21h54, nada menos do que 19 horas e 50 minutos depois de publicada a história, a fazer uma “atualização” que diz assim:

“A expressão ‘estupro culposo’ foi usada pelo Intercept para resumir o caso e explicá-lo para o público leigo. O artíficio é usual ao jornalismo. Em nenhum momento o Intercept declarou que a expressão foi usada no processo.”

O Intercept faz como a música de Tom Zé: “Eu tô te explicando pra te confundir. Eu tô te confundindo pra te esclarecer.” Uma explicação que confunde. E, sim, o Intercept disse que a sentença inédita baseou-se no “estupro culposo”.

É só ler o título indigitado de novo:

JULGAMENTO DE INFLUENCER MARIANA FERRER TERMINA COM SENTENÇA INÉDITA DE ‘ESTUPRO CULPOSO’ E ADVOGADO HUMILHANDO JOVEM

Com as redes ajudando a espalhar a bobagem, todo mundo louco atrás de cliques, de “bombar”, da lacração, poucos deram-se ao trabalho de ler a sentença que, sim, absolveu o réu André de Camargo Aranha por “falta de provas”.

Uma pena.

Se, em vez da lacração, tivessem mirado no fato em si da absolvição do crime de estupro “por falta de provas”, talvez tivessem ajudado muito mais. Sabe-se que a cada 8 minutos uma mulher ou menina é estuprada no Brasil. Mas a maior parte desses crimes jamais será nem sequer investigada pela falta de indícios e elementos probatórios, já que ocorrem escondidos e, preferencialmente, sem testemunhas.

Mariana Ferrer, diz a sentença, não conseguiu provar a acusação que fez contra André de Camargo Aranha. Será? Está na sentença que o exame toxicológico não apontou o consumo de substâncias estupefacientes, como seria de se esperar se ela tivesse ingerido involuntariamente alguma droga do tipo “Boa Noite Cinderela”. A maioria das testemunhas ouvidas, várias mulheres inclusive, disse que a vítima não cambaleava e que não parecia dopada. As câmeras internas do Café de la Musique, onde teria ocorrido o estupro, mostram Mariana Ferrer subindo para um camarote e descendo, seis minutos depois, sem necessidade de ajuda (e de salto!!!!, como faz questão de ressaltar a sentença). Teria transcorrido nesses seis minutos o crime de estupro, de que Mariana Ferrer não tem memória.

Mas Mariana Ferrer diz ter inúmeras provas irrefutáveis do estupro e que nem sequer foram levadas em consideração pelo julgador.

E, no entanto, todas as mulheres sabem da dificuldade de “provar” a violência sexual, quando ela ocorre entre quatro paredes, sem testemunhas. Mariana Ferrer não seria exceção. Nos trechos da vídeo-conferência que foi o julgamento, assombra a solidão da menina que denuncia, vítima de outros homens violentos, que a acusam de ser (ela sim), um monstro querendo prejudicar a reputação de um “pobre milionário”.

Como sempre acontece, a vítima deixa de ser vítima para se transformar no monstro sensual e ardiloso que precisa ser contido. A qualquer custo.

A verdade é que Mariana Ferrer estava sozinha.

Desde o dia em que alega ter sido estuprada (15/dezembro/2018), Mariana Ferrer tem pedido ajuda pelas redes sociais e tem narrado todo o sofrimento e a depressão que a assolam em decorrência do fato.

Quem foi ajudá-la a reunir provas? Quem foi ajudá-la a colher testemunhos que aumentassem a credibilidade de sua acusação? Quem foi ao Café de la Musique, onde ocorreram os fatos julgados, procurar indícios de que ali funcionaria um “abatedouro” de meninas destinadas ao gozo masturbatório de machos alfa? Quem?

Ou achamos razoável condenar alguém sem elementos probatórios que apoiem a denúncia?

Não, não é razoável.

Apenas a voz da vítima não pode embasar uma condenação. E quem defende isso precisa saber que abdicar de provas é apenas a reedição do velho punitivismo, é vingança. Não é Justiça. Pior, resultará na condenação sem provas dos mesmos criminalizados de sempre: os pretos, pobres e periféricos.

A única forma de evitar a perpetuação desse ciclo perverso requer de nós nós, feministas, que encaremos o estupro, cada estupro, como um problema nosso!

Temos de ajudar as vítimas a robustecer as provas da violência que sofreram. Temos de afrontar a Justiça machista, exigindo a presença de mulheres no julgamento. Tem de ser um trabalho nosso enfrentar a misoginia cuspida e escarrada de gente como Cláudio Gastão da Rosa Filho, o advogado de defesa de André de Camargo Aranha, que humilhou e ofendeu Mariana Ferrer enquanto exibia fotos dela que nada tinham a ver com o processo! Que nenhuma mulher mais tenha de enfrentar um julgamento de estupro apenas diante de homens, na solidão absoluta, como acontecia com as antigas feiticeiras.

Temos de incentivar a solidariedade entre nós, mulheres, para que acolhamos as vítimas, em vez de fingir que se trata de um problema só delas. Não há mulher ou menina que não tenha sido atacada ao menos uma vez em sua vida pela violência sexual. E nós sabemos disso em nossos próprios corpos!

É o pai, é o tio, é o avô, é o tarado que mostra o pinto para a adolescente, é o abusador que se acha no direito de ejacular na mulher dentro do trem lotado…

Temos de organizar o “Socorro Feminista”, para apoiar as mulheres que decidem denunciar a violência sexual.

Os tribunais brasileiros são câmaras de tortura contra mulheres, negros, indígenas e pobres em geral. As cenas de humilhação de Mariana Ferrer não são, infelizmente, exceções. São a regra.

É preciso atuar sobre esse front.

Então, precisamos entender que não se trata de um problema privado de Mariana Ferrer o desenlace de sua denúncia. É de todas nós!

Lembro da França, em 1971, quando uma mulher foi presa e julgada pelo crime de aborto, na época punível com a pena de morte pela guilhotina!

Em vez de “solidariedades”, textões de repúdio, e essas lacrações inúteis, 343 mulheres, entre elas as atrizes Catherine Deneuve e Jeanne Moreau, assinaram o manifesto escrito por Simone de Beauvoir, e assumindo que haviam feito, elas também, um aborto. A força desse texto e a coragem das signatárias empolgaram intelectuais como Françoise Sagan e Annie Leclerc, jornalistas conhecidas, de muitas feministas, a começar por Antoinette Fouque, da advogada Gisèle Halimi ou ainda da deputada socialista Yvette Roudy. Todas declararam ter realizado um aborto, como forma de quebrar o tabu de uma injustiça social.

A Justiça no Brasil é machista, é racista e é classista. Só incidindo juntas sobre ela será possível mudar esse regramento que sempre condena a vítima e libera o agressor.

Mariana Ferrer deve recorrer da sentença em primeira instância. Agora, é organizar a luta para mudar o rumo da História. Quem se dispõe?

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