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“Ciclovia não é orégano, e a cidade não é uma pizza!”

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Foto: Reprodução facebook com intervenção artística

A cidade de São Paulo acabou de completar 466 anos, e os quase 400 mil cidadãos que se locomovem diariamente de bicicleta por aqui não têm razões para comemorar. A política do “Acelera” que o elegeu infelizmente tem sido catastrófica desde o início para ciclistas e pedestres, que são os mais frágeis do trânsito.

Em 2019, ​o número de ciclistas assassinados nas ruas de São Paulo cresceu em inaceitáveis 64% em relação a 2018. Esses números não são só estatísticas: representam vidas, como a da Márcia, do pequeno Vítor, da Keila, do Rafael e de tantos outros cidadãos inocentes.

Não nos culpabilize: assuma suas responsabilidades!

As explicações divulgadas pela imprensa para essas tragédias ofendem a nossa inteligência. Baseadas em análises rasas e em preconceitos classistas, acabam sempre culpando as vítimas. As acusações infundadas tem punido especialmente os ciclistas de baixa renda que usam os aplicativos de entrega para sobreviver em um cenário econômico adverso.

Basta um olhar um pouco mais atento aos dados para entender que o aumento das fatalidades se concentrou nos ciclistas de meia-idade, não nos jovens. Também não podemos justificar assassinatos pelo suposto comportamento errático dos ciclistas no trânsito – tal acusação é preconceituosa e não comprova tamanha variação dos números de um ano para o outro.

O fato é que ​estamos sendo assassinados​. Mortes no trânsito não são acidentes, pois são evitáveis. Conclusões apressadas sobre os números não podem eximir a Prefeitura de São Paulo de sua responsabilidade para com a vida de seus munícipes. Nos últimos anos, o número total de fatalidades no trânsito até chegou a diminuir, mas ainda é pífia em relação às metas acordadas publicamente na Década de Ação pela Segurança no Trânsito, e que provavelmente não serão atingidas ao fim desta gestão.

Vale ressaltar que tal diminuição ocorreu somente entre os motoristas de carros e motos. Enquanto a fumaça dos veículos poluentes é priorizada, com as Marginais permitindo veículos trafegarem a mais de 90km/h, a fiscalização de infratores é afrouxada e ciclistas e pedestres seguem sendo punidos diariamente nas ruas.

4 anos e nenhuma ação

Muito tempo foi perdido. Chegamos ao 4o e último ano da gestão do PSDB na cidade, e ainda não avançamos um único centímetro nas implantação de novos espaços seguros para a mobilidade ativa.

A política de expansão de ciclovias, interrompida por vocês pelo mais puro antagonismo partidário, se transformou em longos anos de reuniões, audiências, planejamentos, planos, anúncios, mudanças e promessas vazias à comunidade. Mas até agora, não vimos rigorosamente nenhuma execução das conexões cicloviárias – promessa que consta no Plano de Governo apresentado à população nas eleições de 2016.

Planejamentos cicloviários têm sido feito constantemente pela CET desde os anos 80. Mas planejamento que não é executado não nos interessa. Queremos ciclovias nas ruas, não nos releases de imprensa.

Plano Cicloviário, sai ou não sai?

O novo Plano Cicloviário, anunciado para a imprensa no final de 2019, fez a promessa de construção de 173 km de novas ciclovias. Essas obras serão muito bem vindas caso elas sejam de fato concretizadas – o tempo é curto e o plano não conseguirá ser cumprido sem coragem política do Prefeito e competência de seu secretariado.

Não podemos deixar de pontuar que o plano poderia ser muito melhor caso ele tivesse de fato contemplado integralmente o trabalho das instâncias participativas como a Câmara Temática da Bicicleta e os vários workshops e audiências públicas feitas entre 2018 e 2019 sobre o assunto. Mas não: o plano ​mais uma vez exclui a periferia da cidade (onde a maioria dos ciclistas são assassinados, em regiões sem ciclovias). O anúncio propõe ainda ​remoções disfarçadas retoricamente de “remanejamentos” ​que não foram discutidos com a comunidade, mas acertados em lamentáveis conchavos políticos via Whatsapp com o baixo clero da Câmara de Vereadores.

Estamos quase em fevereiro e até agora a Prefeitura não iniciou nem aquilo que se propôs em 2018. Ouvimos muitas entrevistas, frases de efeito, mas não vimos nenhum avanço real nas ruas. Enquanto isso, o sangue dos ciclistas segue sendo derramado no asfalto.

O negligência com o fim das Ciclofaixas de Lazer

Nem mesmo as pedaladas de domingo, uma deliciosa tradição da cidade há mais de 10 anos, saíram impunes da gestão do “Acelera”. O final do contrato de patrocínio das Ciclofaixas de Lazer, anunciado pela empresa com enorme antecedência, foi seguido com preguiça e inoperância da Prefeitura em comandar a continuidade do projeto, que é respaldado por lei.

O resultado disso é a privação a milhares de cidadãos de uma importante estrutura de lazer, saúde e que também foi decisiva para muitos paulistanos elegerem a bicicleta como meio de transporte. A saúde da cidade perde muito com tamanha negligência.

Requalificações de ciclofaixas: menos vermelho e muita desinformação

Após 37 longos meses de gestão a única ação real para os ciclistas são as recentes e atabalhoadas obras de “requalificação” das ciclofaixas. Apesar das bem vindas intervenções de recapeamento, elas têm sido feitas com sinalização de obra deficiente, via de regra colocando o ciclista em risco e deixando os ciclistas em dúvida se as estruturas voltarão a existir ou não. Com a prioridade de retirar parte a sinalização vermelha das ciclovias, ficou a clara impressão de que o objetivo da intervenção é mais semiótico e partidário do que econômico ou técnico. Enquanto isso, ciclofaixas implantadas em regiões mais afastadas, como a Ermelino Matarazzo, seguem esquecidas.

Sr. Prefeito, você ainda tem tempo pra entender que a pauta da bicicleta não é apenas um detalhe. Estamos falando de saúde pública, de sustentabilidade, de humanização do uso do espaço público, de qualidade de vida para todos os cidadãos. Não é à toa que as grandes cidades do mundo desenvolvido seguem investindo pesadamente no incentivo ao uso da bicicleta contra a poluição nas cidades, no combate à crise climática, contra a crise da mobilidade urbana.

Os dados da própria CET mostram que os locais onde as ciclovias foram implantadas apresentaram notável diminuição de incidentes com vítimas, independentemente do modo de transporte. Ou seja, ciclovias aumentam a segurança de todos ao redor delas. Mas nada acontecerá sem a compreensão da importância do que pedimos.

Você sabe que a nossa reivindicação é justa, inclusiva e benéfica à sociedade. Acima de qualquer discussão partidária, temos que concordar que a defesa da vida humana é um compromisso ético primordial para qualquer gestor. Desejamos que neste último ano de gestão você tenha saúde e coragem política para fazer o certo e encerrar o seu tempo na Prefeitura revertendo a tragédia humana que a política do “Acelera” causou aos cidadãos de São Paulo nos últimos 3 anos.

Pela nossas vidas

Mais amor Menos motor.

São Paulo, 27 de Janeiro de 2020

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mobilidade

PM reprime com bombas e gás lacrimogêneo 2º ato contra tarifas em SP

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2º Ato contra aumento das tarifas de ônibus e metrô em SP - Fotos de Lucas Martins, Jornalistas Livres

 

O segundo Ato Público convocado pelo Movimento Passe Livre (MPL) percorreu o centro de São Paulo, nesta quinta (9/jan). A manifestação opõe-se ao aumento das tarifas de ônibus e metrô, de R$ 4,30 para R$ 4,40, imposto pelo prefeito Bruno covas (PSDB) e pelo governandor João Dória Jr. (PSDB).

Dois manifestantes foram presos ao final do 2° ato contra o aumento das tarifas. Eles estão no 78° DP, sob a acusação de “danos ao patrimônio”.

O ato começou por volta das 17h na praça da Sé, região central, e seguiu até a praça da República, onde foi finalizado. Os manifestantes tentaram, então, entrar na estação do metrô da praça, visando a pular as catracas, em protesto simbólico contra as tarifas. A PM fechou a entrada, apenas deixando uma pequena passagem cercada dos dois lados. Os manifestantes se aproximaram com a faixa e após um primeiro contato, alguns objetos foram jogados em direção à linha da PM. Foi quando começaram os tiros de bombas de efeito moral e de gás.

Num momento em que a recessão econômica e o desemprego condenam as famílias trabalhadoras à pobreza, é inadmissível o aumento das tarifas.

Desempregado, o trabalhador fica sem o vale-transporte e, com o aumento, na prática, terá de andar a pé ou ficar confinado no seu bairro. Como ele vai procurar emprego?

E o serviço de ônibus é cada vez pior em São Paulo, com o fechamento de milhares de linhas, e a demissão de dezenas de milhares de motoristas e cobradores!

Diante de reivindicação mais do que justa, tudo o que João Doria Jr. e Bruno Covas oferecem é um contingente reforçado de policiais militares para intimidar os manifestantes!

Pela mobilidade urbana!

Contra o aumento das tarifas!

Veja cenas da manifestação!

 

 

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Arte

Músicos são agredidos por guardas do Metrô

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A repressão à liberdade de expressão em São Paulo ganhou hoje um novo capítulo. Os artistas da banda Cantigas de Nylon, Matheus Lopes, Nelson Luques e Katriel Pessoa, que costumam se apresentar em bares, na rua e, eventualmente, em estações de transporte coletivo da capital, como ocorre normalmente nas mais importantes cidades do mundo, estão pagando alto por sua arte.

Na tarde desta quarta, 17 de outubro, o trio se apresentava numa estação do Metrô quando seus integrantes foram abordados com extrema violência pelos seguranças da empresa. Um dos seguranças deu um “mata-leão”no estudante de Artes da ETEC Carandiru, Matheus Lopes, que caiu desmaiado no canto. Seus companheiros foram afastados também de forma agressiva enquanto um dos seguranças gritava: “Já era, acabô! PT vai embora”! Nelson Luques, que postou o vídeo dessa reportagem da delegacia na Barra Funda, para onde foram levados detidos, contou ainda que outro segurança dizia baixo na sua orelha para atacá-lo, de modo a justificar uma possível nova agressão. “Se não lutarmos eles não vão matar apenas os nossos sonhos”, completou na postagem. Um outro vídeo ainda inédito mostraria as agressões contra os demais membros.

Matheus, apelidado de Sol, é conhecido na ETEC e nos bares onde toca para tirar o sustento pelo temperamento sempre dócil e prestativo. Segundo os amigos ouvidos por nossa reportagem, representantes do Sindicato dos Artistas de São Paulo conseguiram um advogado para tirar o trio da delegacia.

A banda pede calma a todos e diz que vai se pronunciar assim que puder, publicando o vídeo adicional e falando de outras agressões. 

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Artigo

O povo é um intruso no Parque do Povo

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Quem fizer uma pesquisa na internet à procura de imagens do Parque do Povo, um parque da prefeitura de São Paulo localizado no bairro do Itaim Bibi, uma região nobre de escritórios, comércio e residências da cidade, encontrará fotos de ciclistas, skatistas, corredores, crianças se divertindo nos brinquedos, cachorros correndo pelos gramados, pessoas praticando yoga e propagandas em inglês de academias particulares de ginástica que atendem seus clientes naquele espaço. No entanto, terá dificuldade de encontrar alguma foto das centenas de trabalhadoras e trabalhadores que diariamente tentam atravessar o parque em direção aos pontos de ônibus ou à estação de trem.

Portão fecham cinco horas antes do restante do parque, para dificultar acesso de trabalhadores que saem do serviço

O transporte público liga a região nobre do parque às periferias, onde reside a maior parte das pessoas que trabalham no seu entorno. Mesmo os que não trabalham no bairro, precisam atravessar ou circundar o parque para fazer a baldeação entre os ônibus e os trens. Um dos portões que lhes permitiriam fazer a travessia é fechado às 17 horas, cinco horas antes do parque encerrar suas atividades. Durante a semana, o gramado principal, que oferece o trajeto mais belo e curto entre os pontos de ônibus e a estação de trem, ganha uma cerca móvel que impede a passagem das pessoas. Nos fins de semana e feriados, quando o parque é frequentado prioritariamente pelos moradores da região, a cerca é retirada.

As trabalhadoras e trabalhadores não são impedidos de entrar no parque pelo portão principal, tampouco são impedidos de atravessá-lo em direção à estação de trem pelos caminhos pavimentados. No entanto, o portão fechado, justamente, no horário de maior movimento da estação e as cercas móveis do gramado principal parecem indicar que eles são tomados como intrusos naquele espaço público, parecem indicar que o povo é tomado como um intruso no Parque do Povo.

Tendo sido criado nos anos 30, o Parque do Povo já foi um espaço mais popular (SCIFONI, 2013). Como em outros lugares da cidade, o parque possuía vários campos de futebol de várzea, administrados por diferentes clubes e agremiações. Após as obras de retificação (1938-1958), o parque passou da margem esquerda à margem direita do Rio Pinheiros. Encostadas ao parque surgiram algumas favelas. Os clubes ofereciam escolinhas de futebol, tanto para os meninos que moravam nessas favelas, quanto para os que moravam nos prédios luxuosos do bairro.

Com o processo de redemocratização, os prefeitos da cidade assumiram posições muito diferentes a respeito das favelas e do parque. Na prefeitura de Mário Covas (1983-1985), o secretário da cultura e dramaturgo Gianfrancesco Guarnieri autorizou a instalação no parque do Circo-Escola Picadeiro e do Teatro Vento Forte (ABREU, 2009). Além de formarem inúmeros artistas e professores, e de estimular a criação de várias companhias, o circo e o teatro também desenvolveram escolas para as crianças das favelas da região (CALVINATO, 2003). Em 1987, numa parceria com o governo do Estado, o Circo-Escola Picadeiro ajudou a criar o Projeto Enturmando, que levou escolas de circo para diversas comunidades da periferia (MATHEUS, 2016).

Na prefeitura de Jânio Quadros (1986-1988), colocou-se em prática um plano de “desfavelamento” que, ao fim e ao cabo, apenas promoveu a remoção de algumas favelas que ficavam na região do Parque do Povo (FRANÇA, p. 2009). Em novembro de 1986, as 70 famílias da Favela da Cidade Jardim foram levadas para um conjunto habitacional na Estrada do Campo Limpo; em maio de 1988, foi a vez das 800 famílias da Favela Juscelino Kubitschek serem encaminhadas para conjuntos habitacionais localizados na Rodovia Raposo Tavares e na periferia da Zona Leste.

Atentos às pressões das empresas de construção civil junto ao poder público, em 1987, um conjunto de intelectuais, de artistas, de moradores e de representantes dos clubes de futebol de várzea, do circo e do teatro fundaram a Associação Amigos do Parque do Povo (SCIFONI, 2013). Havia um projeto da construtora Mendes Júnior de construir um shopping center no local do parque. Em 1994, referendando um detalhado estudo que destacava a importância social e cultural das atividades realizadas no Parque do Povo, o CONDEPHAAT aprovou o seu tombamento.

Em 2001, durante a prefeitura de Marta Suplicy (2001-2004), após onerosas batalhas judiciais dirigidas individualmente aos clubes de futebol de várzea, ao circo e ao teatro, a Associação dos Amigos do Itaim Bibi (SAIB) conseguiu a interdição das entradas do parque. O argumento sustentado foi que as atividades daquelas entidades estavam se desviando das suas finalidades esportivas e culturais e degradando as dependências do Parque do Povo (SCIFONI, 2013). Nesse sentido, essas entidades não estariam cumprindo os termos do tombamento. Em 2006, mesmo sem ter a autorização do CONDEPHAT, a prefeitura de Gilberto Kassab (2006-2012) apresentou um projeto de reformulação do parque que seria financiado por empresas da construção civil. Em outubro de 2007, ocorreu o despejo dos clubes de futebol de várzea, do Circo-Escola Picadeiro e das 42 famílias que residiam no local (PAGNAN, 2007). Graças à intervenção do Ministério da Cultura, o Teatro Vento Forte conseguiu manter suas instalações no Parque do Povo (SCIFONI, 2013).

Numa reflexão sobre a palavra povo, o filósofo Giorgio Agamben (2014) argumenta que, em português e em outras línguas europeias modernas, povo significa o sujeito político ou o conjunto das pessoas que têm o direito de participar da política, pelo menos numa democracia e, também, a classe dos sujeitos pobres e deserdados que estão excluídos do campo das decisões políticas. Quanto menos os pobres dividirem espaço com os não-excluídos, menos as palavras povo e democracia irão expor suas contradições no interior de uma sociedade de classes. Com a estratégia de mostrar ao povo que ele é um intruso, o Parque do Povo parece pretender retirar das trabalhadoras e trabalhadores a vontade de promover uma nova partilha do sensível naquele lugar.

 

 

 

Bibliografia:

 

ABREU, Ieda. Ilo Krugli: poesia rasgada. São Paulo Imprensa Oficial, 2009.

AGAMBEN, Giorgio. O que é um povo? Análise de uma fratura biopolítica. In. FOLHA DE S.PAULO, 16 de novembro de 2014.

CALVINATO, Andrea. Uma experiência em teatro e educação: a história do menino navegador Ilo Krugli e seu indomável Ventoforte. Dissertação (Mestrado em Artes) – Universidade de São Paulo, 2003.

FRANÇA, Elisabete. Favelas em São Paulo (1980-2008). Das propostas de desfavelamento aos projetos de urbanização: a experiência do Programa Guarapiranga. Tese (Doutorado em arquitetura e urbanismo) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2009. 

PAGNAN, Rogério. Prefeitura inicia despejo no Parque do Povo, In. FOLHA DE S.PAULO, 16 de outubro de 2007.

SCIFONI, Simone. Parque do Povo: um patrimônio do futebol de várzea de São Paulo. Anais do Museu Paulista, v. 21, n. 2. jul-dez. 2013.

MATHEUS, Rodrigo. As produções circenses dos ex-alunos das escolas de circo de São Paulo, na década de 1980 e a constituição do circo mínimo. Dissertação (Mestrado em Artes) – Universidade Estadual Paulista, 2016.

 

 

 

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