Virada revirada

A Virada Cultural paulistana tem contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Município por causa de shows internacionais da edição de 2012


A duas semanas de sua realização, a Virada Cultural de São Paulo, o maior megaevento do país, experimenta uma saia justa daquelas de lycra molhada. No dia 5 de maio, o Tribunal de Contas do Município (TCM) fez publicar decisão no Diário Oficial da Cidade de São Paulo que condena a organização da mostra por dois contratos realizados na edição de 2012.

Os contratos rejeitados foram os da empresa Wilwill Produções Artísticas Ltda, de R$ 88 mil e R$ 118 mil, que se destinaram à contratação de artistas internacionais — entre eles o soulman Roy Ayers e sua banda e o contrabaixista Larry Graham e sua banda (Graham foi o inventor do slap, aquela técnica de solar com o dedão no baixo e tem entre seus fãs o baixista do Red Hot Chili Peppers, Flea).

O TCM concluiu que houve “graves irregularidades” nos contratos dos shows, realizados no palco República no dia 6 de maio de 2012. A primeira ilegalidade apontada foi a natureza jurídica da empresa por intermédio da qual os artistas foram contratados: não tinha nem notória especialização nem era do ramo (sua natureza jurídica era de editora). Não poderia ser enquadrada na rubrica de “inexigibilidade de licitação”, como foi.

Foto Jotabê Medeiros

O relator escreve que a empresa, que tinha sua sede “declarada na Rua Engenheiro Jorge Oliva 333, apto. 103 — Bloco A — Vila Mascote/SP”, era “paradoxalmente o mesmo local de residência de sua sócia e representante Edilvania do Nascimento Sousa”.

Edilvania chegou a ser ouvida em 2012 pelas autoridades, mas, segundo divulgado na época, negou ter conhecimento do contrato da empresa e dos fins aos quais se destinava. “Parece-me oportuno acentuar que todas essas operações foram realizadas nos dias 03/04 (solicitação de reserva), 17/04 (despachos de autorização) e 20/04/12 (assinatura dos Ajustes), no curto espaço de 17 dias, parecendo que todas essas atividades ocorreram a ‘toque de caixa’, como se diz na linguagem popular, para contratação de bandas estrangeiras”, afirmou o relator do TCM, Roberto Braguim.

O Tribunal também considerou os cachês um pouco elevados para a reputação dos artistas em questão. Segundo a decisão, o tribunal pede “apuração da responsabilidade do servidor José Mauro Gnaspini, e, eventual, responsabilidade civil da contratada”. A edição de 2012 foi a última da gestão de Gilberto Kassab, hoje ministro das Cidades do governo Dilma Rousseff. Em outubro daquele ano, foi eleito Fernando Haddad, mas a estrutura de realização da Virada permaneceu a mesma nas edições seguintes: o chefe da mostra continuou sendo o promotor de eventos e advogado José Mauro Gnaspini. O servidor foi multado duas vezes pelo TCM pelo caso de 2012, a contratação da produtora Wilwill (a multa é de R$ 611).

A Secretaria Municipal de Cultura informou que recorreu da decisão do TCM (leia abaixo a resposta completa da secretaria). A complexidade de um evento como a Virada (cujo sucesso é atestado em quase todas suas edições) implica numa dupla armadilha: se burocratiza demais, perde a capacidade de buscar o imprevisto, a novidade; se improvisa, pode levar a um limbo perigoso de gestão. A Virada 2015 terá 13 curadores, cada um com um cachê de R$ 6 mil.

O problema, para o TCM, é que a Virada 2012 pode ter ensejado outras ilegalidades, daí porque exige a adequação à lei. Que diz o seguinte: “Nas hipóteses de dispensa ou de inexigibilidade de licitação, deverá ser autuado processo especial, visando à formalização da contratação direta, mediante perfeita caracterização da exceção prevista em lei, fundamentadas razões para escolha do contratado e justificativa do preço”.

Abaixo, a íntegra da nota enviada ao blog pela Secretaria de Cultura:

A Secretaria Municipal de Cultura esclarece que com relação à decisão do Plenário do Tribunal de Contas do Município, referente às contratações de apresentações musicais durante a Virada Cultural 2012, a Procuradoria da Fazenda Municipal já recorreu no último dia 20 de maio.

José Mauro Gnaspini foi diretor da Virada Cultural desde a criação do evento, em 2005, até 2012. De 2013 em diante, passou a integrar a curadoria colegiada que formata coletivamente uma proposta para a sua realização, combinando ocupação da cidade com atrações culturais. A implantação da curadoria representou um grande avanço na forma como o evento é concebido, trazendo para dentro do processo um conjunto de representantes de diversas áreas artísticas e culturais.

Ainda que a Secretaria Municipal de Cultura pretenda imprimir mudanças significativas na concepção da 11 ª edição da Virada Cultural, que ocorrerá em 2015, ampliando sua dimensão lúdica e sua descentralização, o planejamento de tal atividade segue sendo extremamente complexo. Com isso, a presença de pessoas com experiência prévia em eventos dessa dimensão na composição da curadoria, visa assegurar, a partir da memória das Viradas Culturais anteriores, não recorrer em erros e buscar, permanente, assim como nas demais ações da Secretaria, atender aos interesses públicos.

Vale ressaltar que, além da ampla experiência prévia em Viradas Culturais do curador em questão, ele é graduado em Direito pela Universidade de São Paulo com mestrado e doutorado pela mesma instituição, José Mauro tem ampla experiência na área cultural, sobretudo musical, na qual atuou durante 25 anos como músico, produtor e empresário.

Por fim, enfatizamos, ainda, que todas as contratações são publicadas no Diário Oficial da Cidade de São Paulo e desde 2014 também no site oficial do evento e podem ser consultadas por qualquer interessado, a qualquer tempo.

Assessoria de Comunicação
Secretaria Municipal de Cultura

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