Pô, Diário, esse negócio de cloroquina é o seguinte: o Trump falou que era bom, tem apoiador meu que produz a bagaça e eu tinha que arranjar uma cura milagrosa, porque afinal de contas eu sou o Messias, pô!
Juntei as três coisas e eu apostei firme. Disse que isso aí ia curar aquilo lá e virei garoto-propaganda da cloroquina. O Bolsoquina! Até mandei o exército fazer um monte dessa droga de droga.
Eu achava que ia ficar com fama de milagroso e o exército podia posar de bonzinho na história toda.
Mas aí as pesquisas avançaram e desmentiram o milagre, o Trump deu pra trás, um monte de gente começou a morrer (o que as pessoas não fazem pra me prejudicar…), e o pessoal percebeu que a cloroquina não tirava ninguém da cova. Pelo contrário.
Só que eu já tinha dado a minha palavra e o exército estava produzindo o negócio à toda, torrando dinheiro público.
O que eu ia fazer? Voltar atrás? Dessa vez não dava. E olha que eu volto mais atrás que caranguejo.
Decidi que essa porcaria ia ser usada e ponto final. Se salvar unzinho só, a gente vai lá, filma e põe no programa eleitoral de 2022. A minha turma e os meus robôs espalham pra meio mundo pelo zap-zap e pronto: vai fazer mais sucesso que a mamadeira de piroca. Aposto que os bispos até vão dizer nos cultos: “Messias é o messias!”
O Mandetta e o Teich, que não quiseram cloroquinar comigo, mandei pro olho da rua.
Mas, como eu não sou bobo, já fiz uma Medida Provisória garantindo que “possíveis equívocos” cometidos por agentes públicos durante o combate à Covid-19 não podem ser punidos. Assim, eu e os médicos que usarem a cloroquina vamos ser que nem o 007: “com licença para matar”, kkk!
Só preciso achar um ministro da Saúde que assine o novo protocolo. Pelo jeito vai ser o general Pazuello mesmo. Ele não é médico e não vai manchar o currículo dele se morrer um montão de gente.
Eu acima de tudo! Cloroquina em cima de todos!
Por José Roberto Torero, autor de livros, como “O Chalaça”, e vencedor do Prêmio Jabuti de 1995. Além disso, escreveu roteiros para cinema e tevê, como em Retrato Falado para Rede Globo do Brasil. Também foi colunista de Esportes da Folha de S.Paulo entre 1998 e 2012.
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