Reunião ministerial: totalitarismo à vista
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5 anos atrásem

ARTIGO
Fábio Faversani, professor titular de História Antiga na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP)
Assisti à reunião ministerial de 22 de abril completa e cheguei a duas conclusões:
1) O governo Bolsonaro não tem rumo nenhum, nem para fazer o mal que deseja, e tem impulsos diferentes, sempre contra os interesses populares e muitas vezes em confronto aberto e direto com a democracia; e 2) que, apesar disso tudo, o eleitorado que apoia o governo não se afastará do presidente, mas, ao contrário, o que se vê ali galvaniza esse apoio e fortalece a militância em sua defesa, que é alimentada por um discurso que sustenta uma saída totalitária. Parece absurdo? Vejamos ponto a ponto.
A reunião tem início com o ministro Chefe da Casa Civil, general Braga Netto apresentando o esboço de um plano de recuperação da economia que ele alcunhou de “Plano Marshall brasileiro”. Esse apelido dado pelo militar já deixa claro um entendimento pífio, quer da economia, quer da história. O que se vê é uma lista na qual tudo é prioridade, confusamente lida, como um aluno apresentando seminário que não preparou. Um vexame!
Mas isso não assusta nem afasta o eleitor fiel de Bolsonaro. Para esses, só Paulo Guedes entende de economia e ninguém mais, nem o presidente, nem seus eleitores. Essa ideia da economia como um domínio técnico misterioso a ser gerido sem transparência, delegado a um todo poderoso que assegure que os interesses do “mercado” serão atendidos não é nova. Basta lembrar do papel de um Henrique Meirelles com Lula ou, pior, Joaquim Levy com Dilma. O problema é que Guedes também não entende muito de economia, como logo demonstrou, delirando com um Brasil que ia começar a voar e que a saída para a crise econômica se dará com investimentos privados exclusivamente (em nenhum lugar do mundo isso vai acontecer, muito menos no Brasil!). Para ele, acabar com desigualdades era coisa que o PT fazia e o governo de Bolsonaro não segue esse caminho. Para o eleitor de Bolsonaro é isso mesmo! Políticas de redução de desigualdades é sinônimo de dar bolsa para quem não trabalha (ideia absurda e antiliberal defendida largamente também pelo PSDB por seguidas campanhas) e que o governo deve ajudar apenas os ricos, os grandes empresários, que vivem com inúmeras dificuldades e são eles que geram riquezas, empregos.
Em outras palavras, Bolsonaro dá consequência a uma ideia muito difundida de que favorecer os pobres é favorecer mais pobreza e que isso não deu certo com o PT, quebrou o Brasil. O que se deve fazer é isso mesmo: favorecer os ricos, que vão gerar mais riqueza e fará o Brasil um país próspero, com muito investimento e empregos. Não se trata de reduzir as desigualdades, mas de escapar individualmente à pobreza. Nesse entendimento, quem fica pobre quando o mercado cresce é vagabundo. Cada um olha para si e pensa: “Eu não sou vagabundo; se os ricos começarem a ganhar mais eu vou ter oportunidade e vou ganhar mais!”. Quem tem que se preocupar, nesse sentido, é quem não correr atrás. O que uns chamam de precarizados, muitos se percebem como empreendedores, futuros casos de sucesso, que o Estado só atrapalha.
Como essa população cresce, um grande contingente sem direitos e sem perspectiva de ter aposentadoria vai sendo integrado como parte importante do eleitorado (cada vez mais importante do que aqueles com carteira assinada, com direitos). Assim, para muitos, não faz sentido a defesa de direitos, que são vistos como privilégio de vagabundos, pois são para cada vez menos pessoas que têm direitos. A cada vez que temos uma reforma trabalhista, uma reforma previdenciária diminui o número de pessoas que têm direitos… e elas não começaram com Bolsonaro. Para esse público, a visão econômica de Guedes, excludente, que aprofunda desigualdades e retira direitos, é motivo para aplauso. O Estado não vai nos proteger. Quem diz isso é petista demagogo ou, pior ainda, os privilegiados entre os privilegiados, os vagabundos entre os vagabundos, os funcionários públicos! Esse, como disse Guedes, o governo deve abraçar e colocar uma granada em seu bolso. Deveria gerar horror, especialmente quando a pandemia mostra que o serviço público é fundamental! Mas não…
Faz muitos anos e muitos governos que essa demonização do serviço público como privilégio, ineficiência e vagabundagem é reforçada. Nenhum eleitor de Bolsonaro se assusta com a ideia de colocar uma granada no bolso do funcionalismo público. Pelo contrário, todos que são contra a democracia e o acesso universal aos serviços básicos para todos puxam o pino da granada rindo! É horrível, é chocante, mas é assim. Para os bolsonaristas, Guedes está sendo sincero, correto e agrada o mercado. Isso que importa. A chave, afinal, há décadas é essa: agradar ao mercado sobre todas as coisas. Guedes repete a música de Raul Seixas: “A solução é alugar o Brasil!”
Depois, Bolsonaro faz um ataque à imprensa. Diz que são todos uns pulhas, inimigos a serem ignorados na melhor das hipóteses. Ao longo da reunião, o presidente retomará esses ataques. Qual eleitor de Bolsonaro não assina embaixo e se engaja nisso? Precisa ser lembrado que não foi Bolsonaro e seus eleitores que criaram palavras de ordem contra a imprensa? Xingar a Globo só se tornou hábito da direita recentemente. Tiveram com quem aprender. O pouco apreço à imprensa visto como mentirosa e odiosa não é novo e nem é exclusividade de bolsonaristas. A questão das concessões publicas para órgãos de imprensa, o domínio de uma imprensa corporativa e todos esses temas nunca foram debatidos e enfrentados no Brasil e nossa democracia frágil tem aí belos pés de barro.
Onyx Lorenzoni repete a mesma ideia de que o PT quebrou o Brasil e o governo Bolsonaro estava recuperando a economia. Veio a pandemia e a histeria que a acompanha prejudicou o governo, que deveria retomar o caminho original que estava levando o Brasil a voar. Obviamente, os indicadores do Brasil pré-pandemia eram os de “pibinho”. Não havia nenhuma economia pronta para voar. Mas a parte mais delirante é que o Brasil estava tendo amplo reconhecimento internacional positivo. A pergunta que fica é: em que planeta está esse senhor? O Brasil perdeu a confiança internacional especialmente, mas não apenas, por seu atrelamento automático aos EUA e por sua agenda ambiental desastrosa. A baixa confiança em uma recuperação econômica com um governo claramente sem projeto e uma Chancelaria olavista delirante completam o cenário desastroso.
Mas, para o eleitor de Bolsonaro, ser amigo do Trump é tudo. Para esses, Trump não tem nenhum respeito internacional porque defende os EUA sobre todas as coisas. Bolsonaro também. É a luta contra o globalismo! Faz sentido? Nenhum! Mas é uma mensagem fácil de entender. O globalismo é ruim e o isolamento do Brasil é bom. Ficamos com Trump e de que nos importa o mundo? A relação com a China ocupa um lugar especial no pensamento anti-globalista e anti-comunista do eleitor de Bolsonaro. Para esses, ali é só comércio, sem ideologia. Isso foi repetido por Guedes. Alguém ainda precisa contar isso para os chineses. Enquanto eles não sabem, a posição do Brasil no mercado internacional vai se deteriorando. Adiante, Bolsonaro também reafirma essa confusão.
Mais adiante o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, delira que após a pandemia cinco ou seis nações vão se sentar para redefinir a ordem mundial. A nova globalização seria pautada em valores de liberdade e excluiria a China. Para o eleitor de Bolsonaro, nada demais. É um desejo, delirante. Se você disser para um eleitor de Bolsonaro que o Brasil não estará no centro de negociações sobre a ordem pós-pandemia e que, ao contrário, a China estará, ouvirá que você está torcendo contra o Brasil, que não é patriota e é comunista. Esse tipo de bobagem, de descalabro absurdo não afasta o eleitor de Bolsonaro, ao contrário, faz com que o sentimento de patriotismo se reforce.
O ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, apela para que as mentes estejam abertas para o momento extraordinário e que o Estado precisa ter um papel destacado e atuar para dar liquidez ao mercado, diferentemente do que se esperaria antes da pandemia. Diz o óbvio: o endividamento do governo vai ser enorme e Guedes e Onyx estão errados ao falar em retomar o rumo anterior. O governo deveria focar em dar liquidez ao mercado, ajudar quem precisa e reduzir desigualdades regionais e melhorar a infraestrutura. Atacou quem quer manter os dogmas de sempre, mesmo a situação sendo totalmente nova e exija respostas novas. Falou e ninguém ouviu.
Mas, bem ao final da reunião, Guedes retomou a palavra e disse que não é apegado a dogmas, mas sabe tudo sobre retomada da economia, estudou todos os casos importantes, Alemanha da década de 40, Chile da década de 70 – atualizadíssimo o “Posto Ipiranga”. Mesmo que não seja obviamente verdade, para o eleitor de Bolsonaro o que interessa é que Guedes é quem governa a economia e governa para o mercado, como outros antes dele. As fissuras são claras, e Braga Netto com seus planos desenvolvimentistas e Marinho com suas dúvidas sobre o dogma não mandam. Quem manda é Bolsonaro e Bolsonaro manda Guedes comandar. Essa confusão é a alegria dos apoiadores de Bolsonaro e sua aposta de que o PT quebrou o Brasil e a redenção está no “Posto Ipiranga”.
Qual o prazo de validade dessa promessa que não vai se cumprir? É impossível dizer. Mas uma crise econômica brutal vem aí e a renovação do bode expiatório está pronta: o PT quebrou o Brasil e, depois, a pandemia foi usada por governadores e prefeitos, além da imprensa, para disseminar o pânico e, com isso, quebrar o governo Bolsonaro. Para completar, o STF não permitiu que o governo federal conduzisse a situação, dando poder para governadores e prefeitos. Assim, STF se soma aos culpados pelas mortes e pela brutal crise econômica que virá. A resposta para a crise econômica será desmantelar o serviço público, cortar mais direitos, adotar medidas que favoreçam as grandes empresas e os mais ricos. Afinal, políticas que visem maior igualdade quebram o país. O Estado salva os ricos e daí para baixo é salve-se quem puder.
Depois, vem o Ricardo Salles, do Meio Ambiente, e declara que o governo deveria se aproveitar que há uma pandemia e passar todas as reformas infralegais sem nenhum debate. Para ele, a pandemia é uma oportunidade de ouro, pois a retirada de toda a proteção hoje existente seria fácil agora que a imprensa só fala em Covid. Sem a atenção da sociedade, restaria “passar a boiada”. O eleitor bolsonarista aplaude isso, de retirar a proteção ao meio ambiente, aos povos originários e quilombolas, tudo isso que só atrapalha. O discurso dele é que sem o Congresso e sem a sociedade para debater as medidas, o único obstáculo seria o Judiciário, que decide contra tudo que o governo tenta fazer de ilegal. Para o eleitor bolsonarista, o Judiciário protege quem não merece. A justiça é injusta. Merece ser atacada e desrespeitada. Nada novo.
O Presidente do BNDES, Gustavo Montezano, diz que concorda plenamente com Salles e que a pandemia é uma oportunidade impar para retirar tudo que atrapalha os negócios. A lógica do governo e dos eleitores que o apoiam é clara: proteger meio ambiente e populações vulneráveis é coisa de ONGs pilantras que controlam a imprensa e a Justiça. O debate público (ou mi-mi-mi) e a democracia atrapalham que o governo Bolsonaro faça o que é preciso fazer. Essas falas que são escandalosas e chocantes para quem tem apreço pela democracia, soam como música para eleitores de Bolsonaro que a desprezam como um empecilho.
Bolsonaro retoma a palavra para reclamar de seus ministros que só querem elogios e porque as críticas são todas para o presidente. Diz que ninguém pode deixar de defendê-lo e seguir o que ele “pensa”. Assim, o presidente afirma sua posição de que ele é mais importante do que qualquer ministro. Esse é um elemento novo e que tem sido muito bem aceito pelos bolsonaristas. A ideia é que os ministros devem ser fiéis ao presidente e devem se expor nas disputas políticas. Bolsonaro está lá para brigar. Isso inclui os ministros. No caso do Ministério da Justiça é dito que falta combate e são feitos vários ataques à inação de Moro.
O então ministro Sérgio Moro se manifesta a seguir e nada diz sobre as críticas de Bolsonaro claramente dirigidas a ele e às suas omissões na defesa do presidente. Ele apenas pede para incluir a segurança pública e o controle da corrupção no plano Pró-Brasil, apresentado na abertura da reunião. Ao eleitor bolsonarista, Moro aparece acovardado e sem compromisso com a proteção do governo. A recusa de Moro se dá porque ele não quer defender o governo, e não porque defender o governo ou o presidente, família e amigos é errado. Fosse errado, teria dito algo. Não disse nada. Para o eleitor bolsonarista, Moro é, assim, um egoísta arrogante que só pensa em si. Portanto, não há conflito moral ou ético na cobrança do presidente por proteção. As coisas seriam assim mesmo, sempre. As investigações não são feitas para apurar a verdade, crimes, mas, sim, para prejudicar as pessoas. A polícia não tem uma atuação republicana e impessoal. Sendo assim, se há uma investigação é porque alguém quer prejudicar alguém. No caso, opositores querem investigar Bolsonaro, sua família e amigos.
O que Bolsonaro e seus eleitores esperam não é o funcionamento republicano das instituições, que nunca existiu. O que eles querem é que as instituições assegurem a sua impunidade, que não sejam feitas investigações que o comprometam, pois isso seria armação da oposição para prejudicar o governo. Sendo assim, ou as instituições funcionam para proteger Bolsonaro e sua família e amigos, ou vai mudar a pessoa lá na ponta, o chefe, o ministro. Historicamente, isso está na memória da população desde o famoso “Engavetador Geral da República”, que atuou no governo Fernando Henrique Cardoso. Mais recentemente e em sentido oposto, sob o comando do próprio Moro essa justiça injusta foi exposta, funcionando com uma celeridade e seletividade ímpares não para punir crimes, mas para destruir um setor político e muito especialmente inviabilizar a candidatura de Lula à Presidência. Sendo assim, parece claro que a justiça não funciona de forma republicana, mas serve para punir quem não tem força política.
O então Ministro Nelson Teich diz que primeiro é necessário enfrentar a pandemia porque, enquanto não houver resposta para a doença, o medo não permitirá que a adoção de nenhuma medida no campo econômico tenha sucesso. Expressa ainda sua preocupação que os hospitais particulares vão ter prejuízo nesse período de Covid por conta da restrição de atendimento a outros pacientes. Assusta um ministro da Saúde estar mais preocupado com lucros dos hospitais privados do que com a saúde pública? Com o fortalecimento do SUS? Assusta mais ainda essa passagem não ter sido comentada em lugar nenhum que eu tenha visto. Impressiona que o debate sobre como enfrentar a pandemia não se torna o centro do debate da reunião ministerial depois disso. Há um entendimento tácito, rapidamente expresso pelo presidente, de que a pandemia não é nada disso, muitos mortos por Covid são vítimas de comorbidades, segue o baile. Nada que assuste o eleitor de Bolsonaro que acha que a pandemia é uma invenção da extrema-imprensa e governadores e prefeitos de oposição para prejudicar o presidente com a ajuda do STF, que não permite que o governo federal atue.
Mais adiante, tais agentes públicos serão qualificados como “bosta”, “estrume”. O presidente do Banco Central diz nesse sentido que respeitar o teto dos gastos e a reforma da Previdência levaram à queda dos juros. Mas que há muito medo, gerado pela imprensa, e que por isso haverá dificuldades econômicas. As dificuldades econômicas não virão pela resposta insuficiente do governo, mas pelo medo incutido na população por prefeitos, governadores e imprensa, com apoio do STF. Reitero: o governo prepara a justificativa para a catástrofe econômica e a agenda de reformas que aprofundem a desigualdade, o desmonte do serviço público e a retirada de direitos. Vamos ter um mix de o PT quebrou o Brasil com a pandemia não permitiu nossa economia voar como base para um recuo sem precedentes na proteção aos trabalhadores, na qualidade do serviço público e na proteção a setores vulneráveis da sociedade.
O presidente da Caixa, Pedro Guimarães, fala dos ladrões, todos do PT, PMDB que cobravam 25% de juros. Afirma também que não deu dinheiro para a Band e por isso recebeu críticas da emissora. Menciona a seguir a detenção da filha de um deputado que teria desrespeitado o isolamento e diz que, se fosse com ele, pegaria suas 15 armas e seria matar ou morrer, mas não deixaria a polícia atuar. O governador do estado em que ocorreu o fato seria ladrão também. Reclama que todos são ladrões e não eram criticados. Agora, os que compõem o governo Bolsonaro não estão roubando e estão sendo atacados. Volta-se à cobrança por proteção. Essa contraposição é central: os outros são ladrões e mal intencionados e vale tudo para se contrapor a esses: descumprir a lei, desrespeitar direitos.
Por outro lado, proteger os seus também é marcado por um vale tudo. Sendo assim, a base de apoio do governo não trabalha com a distinção respeito ou desrespeito às leis. O pressuposto é que todos desrespeitam as leis, que são complicadas, difíceis de obedecer por cidadãos e governo. O que faz uns serem punidos, ou não, é o controle político das instituições. Assim, para o bolsonarismo é fundamental defender o desrespeito às leis e às instituições para alcançar seus fins. Atender à lei é obedecer aos tribunais, aos governadores, aos prefeitos, aos parlamentos. Para o bolsonarismo (e esse é um ponto fundamental!), cada vez mais a aposta totalitária sobe no sentido de existir só o Chefe Supremo e seu povo único, sem intermediação nenhuma (no máximo com a mediação das mídias sociais).
A ministra Damares Alves afirma que tudo é uma questão de valores e coloca a par dos povos tradicionais a existência de um 1,3 milhão ucranianos e fala que o STF deve retomar a pauta da liberação do aborto e que o Ministério da Saúde está tomado por feministas que só têm essa pauta. Afirma a seguir que houve um complô para transmitir a Covid para indígenas e que houve uma operação secreta com generais da Amazônia para conter isso que seria feito só para prejudicar Bolsonaro. Damares afirma que governadores e prefeitos estão violando direitos humanos ao prender pessoas que desrespeitam o isolamento. Anuncia que o Ministério está tomando providências, que vai jogar duro, que vai prender governadores. Isso tudo, que pode parecer chocante, para o eleitor bolsonarista é música: ataque às feministas, inimigos imaginários na Amazônia (ONGs talvez?), colocar na prisão os adversários políticos. O compromisso com uma saída autoritária para a crise que se forma no pós-pandemia está anunciado de forma explícita nessa reunião ministerial em vários momentos.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, desenvolve a ideia de que não há povos indígenas, ou povos tradicionais. Há um só povo, o povo brasileiro. A relação do governo deve ser direta com o povo e esse povo uno e indivisível deve ser atendido de forma direta, sem intermediação das instituições. O ministro da Educação expressa uma teoria totalitária e obviamente isso agrada bastante aos que apoiam Bolsonaro. Ele afirma que aceitou o convite para participar do governo para acabar com Brasília, pois a capital federal “é um cancro de corrupção e privilégio”. Interessante que ele afirma que tais características se mantêm sob o governo atual. Seu projeto é defender a liberdade e, diz ele, “por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia, começando pelo STF”.
Paradoxalmente, a defesa da liberdade é construída pelo encarceramento dos agentes públicos que formam “Brasília”. O Estado é o inimigo do governo Bolsonaro. As instituições são um obstáculo para que o governo liberte o povo. Há uma luta e é preciso que todos no governo se protejam uns aos outros. Queixa-se que está respondendo processos no Comitê de Ética da Presidência da República. Isso porque é militante e se coloca contra os privilégios. Os inimigos o perseguem e caberia aos amigos dar-lhe proteção e não ouvidos aos inimigos. A proteção, assim, não é apresentada mais uma vez como privilégio, mas como salvaguarda para lutar contra os privilegiados, contra “Brasília”. Afirma que a lei não é igual para todos e, claro, não deve ser. O problema é quem a lei vai favorecer.
A resposta do Ministro da Educação é clara: temos que ser protegidos e a Justiça não pode nos alcançar porque a Justiça é parte desses privilégios contra os quais estamos lutando. As noções de justiça e liberdade são entendidas de uma forma diferente por pessoas que apoiam Bolsonaro e os que se opõem a ele. E são esses entendimentos diversos que levam as pessoas a terem essas posições políticas diversas. Não é o contrário! Por isso é inútil querer convencer que o entendimento dado a esses valores por Bolsonaro é absurdo. Quem apoia Bolsonaro concorda com esses valores e quem se opõe a Bolsonaro discorda. O que está em disputa não é Bolsonaro, mas a adesão a valores democráticos e humanitários que são anteriores à aparição de Bolsonaro no centro do cenário político brasileiro. Bolsonaro sempre falou os absurdos que fala hoje. Revelar que Bolsonaro e seus ministros falam absurdos, como nesse vídeo, não vai tirar apoio dele. Pelo contrário, vai galvanizar ainda mais os que o apoiam em torno dele. A democracia brasileira é frágil e permitiu que ataques às instituições e à República fossem longe demais. E esses ataques vem de longe! As fórmulas todas usadas pelo ministro da Educação apontam claramente para uma ruptura institucional, representada por destruir “Brasília”.
Partindo da fala de Weintraub, o presidente diz que concorda com ele, que Brasília é perigosa e que ele mesmo se aproximou de quem não devia. Os privilegiados se afastam do povo. Bolsonaro diz que as pessoas não lembram, mas a liberdade foi assegurada por 1964 e que, caso o outro lado tivesse tomado o poder, a miséria seria geral no Brasil. A falsificação que o golpe de 1964 nos livrou do comunismo que dominava o poder no Brasil, como revisionismo histórico sem fundamento, só pode seguir sendo afirmado porque nossa democracia não teve uma justiça de transição vivida em outros países. Já virou rotina elogiar a ditadura no Brasil. O presidente recomenda, então, que todos se aproximem do povo, que no domingo saiam às ruas e rompam o isolamento (apesar das críticas que virão dos “bostas” de sempre). Reclama que a família é perseguida injustamente e aí diz que é preciso trocar todo mundo para que sua família não seja prejudicada. É preciso se defender e proteger os seus familiares e amigos. Lamenta que seja muito fácil impor uma ditadura nesse momento em que todos estão em casa. E defende que é por isso que quer que o povo se arme. O povo não vai permitir uma ditadura e vai defender a liberdade. “Povo armado jamais será escravizado.” E quem escraviza o povo? Os poderes constituídos, prefeitos e governadores “bostas” que fazem decretos para manter as pessoas em casa.
Bolsonaro condena que existam divisões dentro do governo e que haja ministros que sejam elogiados pela imprensa por seu bom trabalho, “apesar do presidente”. Apela para que todos se mantenham unidos porque o que “os caras querem é a nossa hemorroida, é a nossa liberdade”. O governo luta contra os “bostas” privilegiados e esses querem tirar a liberdade deles, incriminando-os. Se não houver proteção e informação para os que estão no governo, a ditadura dos “bostas” privilegiados se instaura e quem está no governo vai acabar na cadeia, perderá a liberdade. Há um embate no horizonte próximo e o que está em disputa é quem vai acabar na cadeia: os que estão no governo ou os que estão na oposição. Alguém vai perder a hemorroida. Quem não tem proteção, perde a liberdade. Não é possível que todos sejam livres. Há uma guerra aberta e uns vão prender aos outros. Tanto faz se crimes foram cometidos ou não. É o dilema da “libertoida”: todos que estão na política serão atacados em suas hemorroidas, mas quem tem proteção sairá livre. É isso que Bolsonaro esperava de Moro, que seguisse fazendo o trabalho que realizava antes de ser ministro: livrar amigos e prender inimigos.
Não existe impessoalidade e nem funcionamento institucional independente jamais. A fragilidade de nossa democracia levou a esse entendimento de que a justiça é sempre injusta. Importa controlá-la, pois a hipótese de seu funcionamento independente e impessoal inexiste. O que se colocou em disputa é quem controla a Justiça: “Curitiba”, “Brasília” ou Bolsonaro? “Curitiba” foi eliminada da disputa.
A reunião ministerial mostrou muita confusão, muito palavrão, ausência completa de planos para enfrentar a pandemia, quer do ponto de vista sanitário quer do ponto de vista econômico. A catástrofe se avizinha e é no conflito mais agudo que virá no pós-pandemia que o governo mostra elementos importantes em que busca uma unidade que ainda não tem.
Em primeiro lugar, no campo econômico, a ala militar reclama uma pauta desenvolvimentista e há uma ou outra voz que reclama políticas de proteção social. O próprio presidente demonstra que não adere totalmente à orientação de Guedes que é clara: aprofundar a concentração de riqueza, desmantelar o serviço público e retirar direitos.
Em segundo lugar, no campo político, aprofunda-se assustadoramente a saída autoritária. Isso está no cerne de toda a reunião ministerial. O pós-pandemia trará um aprofundamento dos ataques do governo às instituições e na aposta de que o governo deve se relacionar diretamente com o povo, um povo único, patriota e fiel ao Chefe Supremo. Aqueles que não estão de acordo são os privilegiados e devem ser neutralizados, presos e destruídos. Afinal, a liberdade dos inimigos significa um ataque à hemorroida do governo. Não pode haver oposição, pois a oposição obsta as ações do governo no curto prazo e os coloca na cadeia no final.
Em terceiro lugar, como base a essa unidade do povo, as noções de que direitos são privilégios e, portanto, proteção é coisa de gente “mimizenta” e direitos é coisa de feministas, gayzistas, abortistas etc. A unidade do povo é dada por uma pauta moral e econômica excludente, de ódio.
Unindo esses três elementos se vê claramente que a reunião ministerial aponta para um rumo em que a nossa frágil democracia está em grave risco. O fato de termos chegado até aqui mostra que as instituições falharam em exercer o tão falado sistema de pesos e contrapesos. Uma ruptura institucional é declaradamente desejada e tem apoio por parte da população que não tem qualquer apreço pela democracia. Esse grupo, que não é pequeno, não se afastará de Bolsonaro por ele desrespeitar as instituições e as leis. Pelo contrário, é isso que esses apoiadores do governo mais desejam. A cada arroubo autoritário, maior o apoio e agressividade desse setor.
De fato, temos um Judiciário que funciona mal e é venal. Está aí claramente uma imprensa corporativa que não tem compromissos sólidos com a democracia e que é alimentada pelos interesses mais obscuros de forma sistemática. Presente também se faz uma classe política largamente corrompida, desacreditada, e afastada dos interesses dos diversos segmentos das classes populares. Sobretudo, temos a precariedade e o limitado alcance dos direitos de cidadania. Foi esse conjunto de fragilidades que permitiu que ocorresse a eleição de Bolsonaro. Ou as instituições funcionam e dão um basta a esse curso claro de desrespeito à ordem democrática e à construção de uma saída autoritária para a crise ou a democracia brasileira perecerá com o caos pós-pandemia. A reunião ministerial deixou claro: ou é #foraBolsonaro ou é #tchauDemocracia.
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O caso Mariana Ferrer, por Honoré de Balzac
Enfim, “de todas as mercadorias deste mundo, a mais cara é sem dúvida a justiça”.
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5 anos atrásem
07/11/20
O caso Mariana Ferrer por Honoré de Balzac
Por Dirce Waltrick do Amarante*
Quando o escritor francês Honoré de Balzac teve acesso ao vídeo da audiência de Mariana Ferrer, ele decidiu escrever o Código dos homens honestos, isso nos idos de 1875, mas só agora estou tornando públicas suas palavras, que estavam sob segredo de justiça.
Em uma análise bastante rigorosa, Balzac lembra, em primeiro lugar, que sabemos perfeitamente bem que “em princípio, ficou estabelecido que a justiça seria para todos, mas […]” . A tradução é de Léa Novaes, pois Balzac tinha dificuldade em escrever em português.
Dito isso, ele fala da figura do procurador. Em tempos idos, diz Balzac, os procuradores “levavam tão a sério o interesse de um cliente que chegavam a morrer por eles”. Além disso, eles “nunca frequentavam a sociedade”, e se a frequentassem eram vistos como “monstros”, mas hoje, “hoje tudo está monetarizado: já não se diz que Fulano foi nomeado procurador-geral, vai defender os interesses de sua província […]. Não, nada disso; o senhor Fulano acaba de conquistar um belo posto, procurador-geral, o que equivale a honorários de vinte mil francos […]”.
Balzac ia falar da figura do juiz e do defensor público, mas depois de tudo que assistiu ficou sem as palavras justas para descrevê-los.
Então, o escritor francês decidiu se debruçar sobre o papel do advogado, que “frequenta bailes, festas […] despreza tudo o que não é elegante”. E, diz Balzac, “Justiça seja feita aos advogados […]! São os decanos, os chefes, os santos, os deuses da arte de fazer fortuna com rapidez e com uma sagacidade que os torna merecedores de muitos elogios”.
Enfim, “de todas as mercadorias deste mundo, a mais cara é sem dúvida a justiça”.
Não citei na íntegra o texto do Balzac, porque foram esses os únicos fragmentos aos quais tive acesso, os outros foram apagados.
*Formada em Direito, em 1992, na Universidade Federal de Santa Catarina
O show de Trump: renovação ou cancelamento?
A eleição nos EUA e o destino da democracia na condição atualista
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5 anos atrásem
06/11/20por
Aloisio Morais
Nos EUA voto popular não significa vitória. Biden terá mais votos do que Trump e ainda assim o resultado da eleição continuará indefinido por algum tempo. Apesar dos descalabros que marcaram a gestão Trump antes e durante a pandemia, o seu desempenho na atual corrida eleitoral será muito forte.
Mateus Pereira, Valdei Araujo e Walderez Ramalho, professores da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) em Mariana, MG
A disputa está sendo muito mais acirrada do que era inicialmente previsto pela maior parte dos institutos de pesquisa e da mídia americana, embora a cautela e o medo nunca deixaram de estar presentes. Sob esse ponto de vista, as eleições deste ano são como uma repetição do que vimos em 2016, ainda que o resultado possa ser a derrota eleitoral para Trump. Em 2016 foram os democratas que denunciaram a interferência russa, agora é o presidente-agitador que se apressa em questionar a legitimidade do pleito, sem mostrar nenhuma prova. Sabemos que no ambiente do atualismo provas têm como base apenas convicções.
Um sistema eleitoral que sobreviveu por séculos, sem grandes mudanças, pode ter se tornado obsoleto desde a eleição de Bush, em 2000. Um lembrete do possível declínio da democracia americana: das últimas oito eleições presidenciais desde 1992, os democratas venceram no voto popular as últimas sete, mas em apenas quatro ocasiões ganharam o colégio eleitoral e fizeram o presidente.

Acreditamos que as eleições nos EUA são um exemplo do confronto entre duas estratégias e duas concepções sobre fazer política: de um lado, Trump e sua promessa de eterna atualização da atualidade em modo nostálgico; e Biden, com sua aposta moderada no cansaço na agitação atualista que seu adversário republicano encarna e radicaliza, e a retomada da política em moldes liberais. Essa retomada é feita sem uma crítica efetiva ao modelo neoliberal abraçado pela cúpula do partido democrata. Uma aposta radical, como Sanders, teria se saído melhor? É difícil dizer, mas tudo leva a crer que não, tendo em vista o complicado xadrez do voto estado a estado.
A escolha entre as duas estratégias/concepções se mostrou muito mais difícil e apertada do que se imaginava. A tal “onda azul” anunciada por parte da imprensa estadunidense esteve longe de acontecer. De fato, Trump se mostrou eleitoralmente muito mais forte do que os analistas supunham. Considerando que esta não é a primeira vez que os institutos de pesquisa falharam em captar esse movimento no eleitorado americano, e considerando também que fenômeno semelhante ocorreu no Brasil em 2018, coloca-se a questão de saber se as tradicionais pesquisas de opinião tornaram-se de alguma forma obsoletas em um mundo atualista. Esse quadro muda pouco, mesmo com uma eventual vitória de Biden ou pior, com uma inconveniente reeleição de Trump.
São vários fatores que devem ser considerados para avaliar essa questão. Os próprios institutos se apressaram a ensaiar algumas explicações ao público. O diretor da Trafalgar Group, Robert Cahaly, afirmou que muitos eleitores “esconderam”, como já havia acontecido, sua preferência por Trump por algum receio ou constrangimento social.[1] Não podemos desconsiderar algum tipo de boicote/sabotagem dos eleitores republicanos, já que na retórica do trumpismo as pesquisas de opinião fazem parte da mídia vendida. Outros recorreram à justificativa de que as pesquisas anteriores representavam apenas fotografias do momento específico em que as entrevistas foram feitas, e não o que se poderia esperar na eleição propriamente dita. Isso poderia ter sido de fato observado pela tendência de redução da vantagem de Biden nos últimos 15 dias. Afinal, o episódio da contaminação de Trump e sua rápida recuperação pode ter tido um saldo positivo, ao menos na mobilização de sua base, como já havíamos especulado em coluna anterior.
Aceite-se ou não essas justificativas, fato é que os institutos de pesquisa sairão dessas eleições com sua credibilidade e imagem pública mais arranhadas, sobretudo diante das especificidades do sistema eleitoral americano. Como afirmamos, muitos fatores concorrem para esse desgaste. Um deles está relacionado à condição atualista que caracteriza o nosso presente e como cada um dos candidatos se coloca frente a tal condição.

Trump é um político bastante sintonizado com o ambiente da comunicação atualista onde as provas dispensam comprovação factual. Seja nas redes sociais, seja em seus concorridos comícios, o presidente se revela um comunicador difícil de ser batido. Dentre os aspectos associados à condição atualista, destacamos a intensidade e velocidade sem precedentes do fluxo de notícias, em detrimento dos protocolos de verificação e checagem da informação veiculada. Esse ambiente infodêmico[2] é particularmente fértil para a produção de desinformação e sua disseminação como misinformação.[3] Além das informações imprecisas, para não dizer apenas falsas, que a infodemia trumpista ajuda a difundir, é preciso levar em consideração a agitação/ativação que produz. É como se a oposição se agitasse confusamente e a base trumpista se ativasse a cada um de seus comentários polêmicos. Assim, o uso constante das redes sociais para disseminar fake news ou comentários faz com que, seja de modo positivo ou negativo, o presidente esteja sempre no foco da mídia. O acúmulo de notícias sobre suas falas ou atos inconsequentes faz com que seja difícil recuperar qual foi o absurdo dito ou feito na semana anterior. Na condição atualista há um valor excepcional em estar mais atualizado (e exposto) que o seu adversário.
Ainda assim, a manipulação das fake news como ferramenta política supõe uma linguagem organizada para se tornar eficaz. Essa afirmação pode soar chocante à primeira vista: como podemos atribuir coerência a um discurso fundamentado em desinformação e que frequentemente e sem o menor pudor afirma hoje o contrário do que disse ontem, como o exemplo do uso de máscaras na pandemia?[4] O ponto aqui é que a condição atualista coloca muitos obstáculos para que o passado, mesmo o mais recente, seja trazido à reflexão. Assim, quando confrontados com suas próprias contradições, políticos atualistas como Trump e Bolsonaro simplesmente atualizam suas narrativas e afirmações quando as anteriores se tornam insustentáveis. Com muita frequência, os seus discursos mudam em função da conveniência da atualidade, sem a mínima necessidade de se prestar conta da contradição com o que eles mesmos diziam no dia anterior.
Essa estrutura atualista do discurso político só se torna eficaz, porém, no interior de uma linguagem organizada e facilmente identificável pelo público que a compartilha, no interior de uma condição material de reorganização do mundo do trabalho e do capital. A crise de 2008, concentração de renda, neoliberalismo, capitalismo de vigilância e a formação do atual “precariado” são elementos, dentre outros, fundamentais para entender a emergência de líderes que governam e são eleitos por pequenas maiorias mobilizadas pela historicidade e ideologia atualista. Só assim podemos entender a força de Trump na eleição independente do resultado final, ainda que sua derrota interesse a todos os democratas do mundo.

Trump lança mão de artifícios retóricos quando confrontado com suas afirmações evidentemente baseadas em mentiras e contradições, de tal maneira que ele consegue, mesmo em tais situações, transmitir e reforçar o código entre o seu público. O código se estrutura em uma lógica antagonista, na qual o portador é sempre vítima de perseguição por parte do establishment e da imprensa vendida para a “esquerda corrupta” ou as corporações globalistas.
O ponto principal a ser considerado é que para ser politicamente eficaz não é necessário que o código seja compartilhado por todos; mas que seja continuamente ativado junto aqueles que já o compartilham. Por mais que esteja sustentado em desinformações, o fato é que o código é bastante poderoso na ativação de afetos políticos centrais como o medo, ódio e ansiedade, vetores de forte engajamento e agitação política que Trump e Bolsonaro sabem tão bem promover.
O sucesso dessa estratégia se coaduna com a popularização das redes sociais e dos smartphones, bem como das novas tecnologias de processamento de dados manipulados para fins políticos. Nesse contexto, tornou-se possível criar e difundir mensagens sob medida para cada tipo de público, cada indivíduo ou grupo formula suas próprias percepções sobre o mundo a partir de narrativas (códigos) que não mais precisam ser expostos publicamente a todos para serem eficazes. Após alguns reconhecimentos iniciais, os algoritmos se encarregam de abastecer-nos das notícias que nos mobilizam, sempre com o mesmo teor e formato. Reforça-se, assim, o fenômeno das “bolhas”.[5] Esses códigos podem circular de forma subterrânea, de tal modo que o que parece absurdo e chocante para uns, é perfeitamente aceitável e normalizado para outros.
Esse ambiente de circulação de notícias e códigos é condizente com a ordem atualista de nosso tempo e, ao nosso ver, é um fator importante a ser considerado no desempenho surpreendente de Trump nestas eleições. E um dos preços a se pagar para tal sucesso é a radicalização do clima de agitação que tem marcado a nossa época. Esse quadro tem resultado inclusive em distúrbios psicológicos cada vez mais comuns, como o “transtorno do estresse eleitoral”, que segundo estimativas afeta sete em cada dez cidadãos estadunidenses.[6]

Os políticos atualistas claramente não se importam em pagar esse preço, na verdade eles têm lucrado com isso. Mas, ao fim e ao cabo, eles não podem evitar completamente os efeitos colaterais de suas apostas. Agitação e dispersão geram também cansaço no eleitorado. Biden e os democratas tomaram esse efeito como vetor de suas estratégias para estas eleições. Frente à irrefreável agitação de Trump, Biden se vendeu como a opção mais “centrista”, de moderação e convergência. A divergência entre as duas estratégias foi mais uma vez demonstrada logo após o fechamento da votação: enquanto Trump se apressou em declarar-se vencedor e dizer que irá judicializar a eleição em caso de derrota, Biden classificou tal postura como “ultrajante” e pregou calma aos seus apoiadores[7].
Mesmo que a vitória do democrata seja confirmada, é inegável que o preço desse lance foi bastante alto. A imprensa americana noticiou como parcelas importantes do eleitorado negro, que o próprio Biden afirmou ser “a chave para a vitória”, relataram estarem pouco motivados a votarem no candidato democrata.[8] O mesmo ocorreu entre parte do eleitorado hispânico, em especial na Flórida e no Texas. O conservadorismo nos costumes, a adesão a denominações evangélicas que tem crescido entre hispânicos e a tradição anticomunista dos cubanos, e agora também venezuelanos, na Flórida, são fenômenos a serem considerados. Enquanto fechamos essa coluna Trump ainda lidera na Pensilvânia, estado no qual o operariado branco migrou dos democratas para o trumpismo. No último debate, Biden acabou por reconhecer que teria que acabar com a exploração do altamente poluente gás de xisto, o que foi imediatamente explorado por Trump: “Eis uma declaração importante”, ironizou o presidente. Caso perca por margem apertada na Pensilvânia, onde os trabalhadores dessa indústria são amplamente sensíveis ao tema, talvez essa declaração tenha custado a eleição.
Para entender melhor essas flutuações teríamos que fazer algo pouco praticado durante a campanha, uma avaliação retrospectiva fundada em boa informação acerca das políticas públicas implementadas por democratas e republicanos, em especial nos governos Obama e Trump. O apoio ao republicano não é apenas resultado da mágica da comunicação, deriva também da tibieza das políticas democratas e dos acertos de Trump. Reforma do sistema criminal, política externa menos intervencionista, foco na economia e na criação de empregos, com bons resultados, ao menos até a pandemia.
A decisão das eleições primárias do Partido Democrata em nomear um candidato “centrista” para concorrer nessas eleições – ao contrário de uma opção mais radical do populismo de esquerda como Bernie Sanders – foi importante para unificar o partido (em especial o seu establishment) e angariar o apoio do eleitorado “cansado” da agitação radicalizada. Por outro lado, a figura moderada de Biden não se mostrou capaz de promover um grau de engajamento e mobilização do público à altura do seu adversário agitador, nem está claro ainda se seu discurso de união nacional conseguiu atrair eleitores de Trump. Essa diferença é importante em um contexto onde o voto não é obrigatório e, no caso particular das eleições deste ano, ainda mais desencorajado pela pandemia do coronavírus.
Mesmo assim, a moderação pode ter sido eficaz para para derrotar a agitação, mas não para desativá-la. E ainda não podemos assegurar como os EUA sairá dessas eleições, pois Trump continua sendo quem é. Há ainda o risco de o agitador perder e não aceitar sair, e as consequências disso poderão ser catastróficas. E mesmo que ele saia, o trumpismo – o negacionismo, o anti-esquerdismo, o desejo de retorno a um passado glorioso e mítico – ainda permanecerá em parcelas consideráveis da população.

O que tudo isso ensina para o campo democrático brasileiro, que tem de enfrentar a sua própria versão de agitador atualista? Desde o início da votação nos EUA, Bolsonaro disparou freneticamente uma série de tweets ressoando as alegações infundadas de seu ídolo sobre as eleições serem “fraudadas” a favor dos democratas, o que seria um risco para a “liberdade” e para o Brasil. Afinal, nosso agitador atualista tupiniquim sabe bem que a permanência de Trump é uma força de sustentação fundamental para ele. As relações entre EUA e Brasil deixaram de ser uma relação entre Estados, mas sim uma relação de “amizade” (leia-se emulação e, do nosso ponto de vista, subserviência) entre os chefes de turno da Casa Branca e do Palácio do Planalto.
Assim, e seguindo o estilo atualista de fazer política, Bolsonaro ressoa as afirmações sem fundamento de Trump, sem se preocupar com a veracidade e desprezando o princípio diplomático básico da impessoalidade. Mas Bolsonaro também tem seu próprio código “alternativo”, cujo enfrentamento é a tarefa prioritária das forças democráticas no Brasil, que deverá avaliar e tomar suas próprias escolhas para vencer o confronto. Assim como o trumpismo, nos Estados Unidos, o bolsonarismo é um fenômeno que não necessariamente depende da permanência de Bolsonaro no poder: ele mobiliza parcelas consideráveis da população através de seus discursos, que defendem o conservadorismo nos costumes, o liberalismo na economia, a luta contra “o sistema”, a religião e a admiração pelo militarismo.
Será que a aposta moderada e centrista será suficiente para derrotar o bolsonarismo aqui? Mesmo que por pouco? Ou, em nosso contexto particular, faz-se necessário redobrar a aposta na radicalização pela via da esquerda? Mesmo que a vitória de Biden seja confirmada, ainda não está claro qual das duas vias parece a mais indicada para o Brasil. Enfim, tudo indica um destino trágico da democracia liberal de “pequenas maiorias” em tempos de agitação atualista. Sem negar a nossa atual realidade, cabe a nós pensar e imaginar alternativas, por mais difícil que pareça ser em nosso atual nevoeiro e impregnados por uma sensação de asfixia. Além disso, a lentidão com que a apuração avança em alguns estados decisivos promete nos deixar hipnotizados pelos mapas eleitorais na expectativa da atualização decisiva.
(*) Mateus Pereira e Valdei Araujo escreveram o Almanaque da Covid-19: 150 dias para não esquecer ou o encontro do presidente fake e um vírus real com Mayra Marques. Ambos são professores de História na Universidade Federal de Ouro Preto, em Mariana (MG). Também são autores do livro Atualismo 1.0: como a ideia de atualização mudou o século XXI e organizadores de Do Fake ao Fato: (des)atualizando Bolsonaro, com Bruna Klem. Walderez Ramalho é doutorando em História na mesma instituição. Agradecemos à Márcia Motta e ao grupo Proprietas pelo apoio e interlocução nesse projeto.
[1] https://noticias.uol.com.br/colunas/thais-oyama/2020/11/04/o-eleitor-oculto-de-trump-e-o-novo-erro-dos-institutos-de-pesquisa.htm
[2] PEREIRA, Mateus; MARQUES, Mayra; ARAUJO, Valdei. Almanaque da COVID-19: 150 dias para não esquecer, ou a história do encontro entre um presidente fake e um vírus real. Vitória: Editora Milfontes, 2020.
[3] Usamos aqui um neologismo para dar conta da diferença que em inglês é mais clara entre a produção deliberada de notícias falsas (disinformation) e sua disseminação involuntária (misinformation).
[4] https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2020/07/20/trump-muda-discurso-e-agora-diz-que-usar-mascara-e-patriotico.htm
[5] EMPOLI, Giuliano Da. Os engenheiros do caos: como as fake news, as teorias da conspiração e os algorítimos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições. São Paulo: Vestígio, 2019.
[6] https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/10/quase-sete-em-cada-dez-americanos-relatam-transtorno-do-estresse-eleitoral.shtml
[7] https://br.noticias.yahoo.com/em-pronunciamentos-biden-prega-calma-e-trump-faz-acusacao-de-roubo-065922289.html
[8] https://www.aljazeera.com/news/2020/9/12/biden-battles-trump-lack-of-enthusiasm-among-black-voters
Feminismo
Que tal ajudar Mariana Ferrer a obter Justiça?
Não basta lacrar. Um chamamento a todas as feministas e a todas as mulheres para que enfrentemos a misoginia dos tribunais brasileiros
Publicadoo
5 anos atrásem
05/11/20
A reportagem do Intercept Brasil sobre a denúncia de estupro da influencer Mariana Ferrer tornou-se viral nas redes. Sob o título JULGAMENTO DE INFLUENCER MARIANA FERRER TERMINA COM SENTENÇA INÉDITA DE ‘ESTUPRO CULPOSO’ E ADVOGADO HUMILHANDO JOVEM, o texto da repórter Schirlei Alves serviu de base para milhares e milhares de postagens sobre a excrescência jurídica que teria embasado a absolvição do empresário André de Camargo Aranha. Até as 15h30 de ontem (4/11), o Google devolvia 781.000 resultados, quando se procurava pela expressão “estupro culposo”. Memes, charges, textões e textinhos foram produzidos em escala industrial para provar que um estuprador havia conseguido sentença absolutória graças a uma invencionice jurídica obrada pela Justiça, com vistas a proteger um macho branco, amigo de poderosos e, ele mesmo, “filho do advogado Luiz de Camargo Aranha Neto, que já representou a rede Globo em processos judiciais”, segundo a reportagem do Intercept.
Lida toda a sentença de 51 páginas do juiz do caso, Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, entretanto, constata-se que, em nenhum momento da sentença é dito que houve “estupro culposo” contra a jovem. Ao contrário, é dito que não existe essa tipificação e que o estupro é necessariamente doloso. Portanto, está errada a formulação do título do Intercept Brasil.
Está tão errada que o próprio site The Intercept Brasil foi obrigado, às 21h54, nada menos do que 19 horas e 50 minutos depois de publicada a história, a fazer uma “atualização” que diz assim:
“A expressão ‘estupro culposo’ foi usada pelo Intercept para resumir o caso e explicá-lo para o público leigo. O artíficio é usual ao jornalismo. Em nenhum momento o Intercept declarou que a expressão foi usada no processo.”
O Intercept faz como a música de Tom Zé: “Eu tô te explicando pra te confundir. Eu tô te confundindo pra te esclarecer.” Uma explicação que confunde. E, sim, o Intercept disse que a sentença inédita baseou-se no “estupro culposo”.
É só ler o título indigitado de novo:
JULGAMENTO DE INFLUENCER MARIANA FERRER TERMINA COM SENTENÇA INÉDITA DE ‘ESTUPRO CULPOSO’ E ADVOGADO HUMILHANDO JOVEM
Com as redes ajudando a espalhar a bobagem, todo mundo louco atrás de cliques, de “bombar”, da lacração, poucos deram-se ao trabalho de ler a sentença que, sim, absolveu o réu André de Camargo Aranha por “falta de provas”.
Uma pena.
Se, em vez da lacração, tivessem mirado no fato em si da absolvição do crime de estupro “por falta de provas”, talvez tivessem ajudado muito mais. Sabe-se que a cada 8 minutos uma mulher ou menina é estuprada no Brasil. Mas a maior parte desses crimes jamais será nem sequer investigada pela falta de indícios e elementos probatórios, já que ocorrem escondidos e, preferencialmente, sem testemunhas.
Mariana Ferrer, diz a sentença, não conseguiu provar a acusação que fez contra André de Camargo Aranha. Será? Está na sentença que o exame toxicológico não apontou o consumo de substâncias estupefacientes, como seria de se esperar se ela tivesse ingerido involuntariamente alguma droga do tipo “Boa Noite Cinderela”. A maioria das testemunhas ouvidas, várias mulheres inclusive, disse que a vítima não cambaleava e que não parecia dopada. As câmeras internas do Café de la Musique, onde teria ocorrido o estupro, mostram Mariana Ferrer subindo para um camarote e descendo, seis minutos depois, sem necessidade de ajuda (e de salto!!!!, como faz questão de ressaltar a sentença). Teria transcorrido nesses seis minutos o crime de estupro, de que Mariana Ferrer não tem memória.
Mas Mariana Ferrer diz ter inúmeras provas irrefutáveis do estupro e que nem sequer foram levadas em consideração pelo julgador.
E, no entanto, todas as mulheres sabem da dificuldade de “provar” a violência sexual, quando ela ocorre entre quatro paredes, sem testemunhas. Mariana Ferrer não seria exceção. Nos trechos da vídeo-conferência que foi o julgamento, assombra a solidão da menina que denuncia, vítima de outros homens violentos, que a acusam de ser (ela sim), um monstro querendo prejudicar a reputação de um “pobre milionário”.
Como sempre acontece, a vítima deixa de ser vítima para se transformar no monstro sensual e ardiloso que precisa ser contido. A qualquer custo.
A verdade é que Mariana Ferrer estava sozinha.
Desde o dia em que alega ter sido estuprada (15/dezembro/2018), Mariana Ferrer tem pedido ajuda pelas redes sociais e tem narrado todo o sofrimento e a depressão que a assolam em decorrência do fato.
Quem foi ajudá-la a reunir provas? Quem foi ajudá-la a colher testemunhos que aumentassem a credibilidade de sua acusação? Quem foi ao Café de la Musique, onde ocorreram os fatos julgados, procurar indícios de que ali funcionaria um “abatedouro” de meninas destinadas ao gozo masturbatório de machos alfa? Quem?
Ou achamos razoável condenar alguém sem elementos probatórios que apoiem a denúncia?
Não, não é razoável.
Apenas a voz da vítima não pode embasar uma condenação. E quem defende isso precisa saber que abdicar de provas é apenas a reedição do velho punitivismo, é vingança. Não é Justiça. Pior, resultará na condenação sem provas dos mesmos criminalizados de sempre: os pretos, pobres e periféricos.
A única forma de evitar a perpetuação desse ciclo perverso requer de nós nós, feministas, que encaremos o estupro, cada estupro, como um problema nosso!
Temos de ajudar as vítimas a robustecer as provas da violência que sofreram. Temos de afrontar a Justiça machista, exigindo a presença de mulheres no julgamento. Tem de ser um trabalho nosso enfrentar a misoginia cuspida e escarrada de gente como Cláudio Gastão da Rosa Filho, o advogado de defesa de André de Camargo Aranha, que humilhou e ofendeu Mariana Ferrer enquanto exibia fotos dela que nada tinham a ver com o processo! Que nenhuma mulher mais tenha de enfrentar um julgamento de estupro apenas diante de homens, na solidão absoluta, como acontecia com as antigas feiticeiras.
Temos de incentivar a solidariedade entre nós, mulheres, para que acolhamos as vítimas, em vez de fingir que se trata de um problema só delas. Não há mulher ou menina que não tenha sido atacada ao menos uma vez em sua vida pela violência sexual. E nós sabemos disso em nossos próprios corpos!
É o pai, é o tio, é o avô, é o tarado que mostra o pinto para a adolescente, é o abusador que se acha no direito de ejacular na mulher dentro do trem lotado…
Temos de organizar o “Socorro Feminista”, para apoiar as mulheres que decidem denunciar a violência sexual.
Os tribunais brasileiros são câmaras de tortura contra mulheres, negros, indígenas e pobres em geral. As cenas de humilhação de Mariana Ferrer não são, infelizmente, exceções. São a regra.
É preciso atuar sobre esse front.
Então, precisamos entender que não se trata de um problema privado de Mariana Ferrer o desenlace de sua denúncia. É de todas nós!
Lembro da França, em 1971, quando uma mulher foi presa e julgada pelo crime de aborto, na época punível com a pena de morte pela guilhotina!
Em vez de “solidariedades”, textões de repúdio, e essas lacrações inúteis, 343 mulheres, entre elas as atrizes Catherine Deneuve e Jeanne Moreau, assinaram o manifesto escrito por Simone de Beauvoir, e assumindo que haviam feito, elas também, um aborto. A força desse texto e a coragem das signatárias empolgaram intelectuais como Françoise Sagan e Annie Leclerc, jornalistas conhecidas, de muitas feministas, a começar por Antoinette Fouque, da advogada Gisèle Halimi ou ainda da deputada socialista Yvette Roudy. Todas declararam ter realizado um aborto, como forma de quebrar o tabu de uma injustiça social.
A Justiça no Brasil é machista, é racista e é classista. Só incidindo juntas sobre ela será possível mudar esse regramento que sempre condena a vítima e libera o agressor.
Mariana Ferrer deve recorrer da sentença em primeira instância. Agora, é organizar a luta para mudar o rumo da História. Quem se dispõe?
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