por Adelino Mendes
A questão não é se Ropni fala em nome dos Kayapó. Ele fala em nome dos índios. Fala porque conquistou essa condição de representatividade perante a sociedade não-indígena. É um processo, algo que iniciou-se há 40 anos. Não há ninguém com o peso de sua voz, com o carisma que lhe sobra e, com sua aparência, plasticidade que enfrenta e causa admiração, quase um “afresco” Maya.
Os índios, culturalmente, não obedecem a um líder, pelo contrário, por diversas vezes como eu já disse aqui, lideranças indígenas não ordenam ou mesmo determinam algo, cabe a elas dar exemplos de solidariedade, benevolência, simplicidade, coragem e maturidade.
No caso de Ropni, a gravidade da ocasião mais uma vez fez a hora e criou o homem à frente de “sua” gente. Surge então na figura de seu lábio deformado pelo botoque, algo próximo do que seria para nós, um estranho “bom selvagem” de Rousseau, uma liderança que luta pela preservação de todas as terras indígenas, bem diferente de uma liderança indígena em sua tradicional seara. Sua posição é de um indígena com representatividade global perante uma sociedade que historicamente possui governantes, que somos nós. Portanto, Ropni transcende sua cultura e toma lugar na luta pela preservação dos territórios indígenas e da floresta amazônica, tornando-se porta-voz dos povos da floresta, creditando aos índios o título de defensores da Amazônia. E é justamente aí, na territorialidade indígena que está o centro das discursões.
Adelino Mendes – Antropólogo doutorando no programa de Pós-graduação em História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ-HCTE). Mestre em Antropologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
imagens por Helio Carlos Mello© e capa por Eduardo Biral©