A violência obstétrica, parceira de mulheres pobres e negras, na verdade não escolhe alvos quando se trata do sistema público de saúde. É o caso do relato abaixo, de Aracelle Fonseca, garota inteligente e sagaz, que nunca teve medo de encarar a vida, muito menos cara feia. É jornalista, graduada também em Letras, e há alguns anos escolheu ser policial civil. Não se enquadra, portanto, na categoria que sofre o diabo em toda e qualquer circunstância e não tem ou não sabe onde e a quem reclamar.
É casada com um também policial civil. Portanto, são funcionários públicos do Estado de Minas Gerais. Por questão de princípio de cidadania, escolheram a maternidade do Instituto de Previdência do Estado de Minas Gerais (Ipsemg) para receber Cecília, uma garotinha muito amada e linda, que veio ao mundo há poucos dias, apesar de um monte de atropelos e absurdos. Viva a mamãe Aracelle, que não guarda silêncio da violência de que foram alvo ela e sua filhinha. Calar só perpetua o mal. Recebi a postagem da mãe de Aracelle, mas está no Facebook, providência de uma amiga de longa data. (Sulamita Esteliam, jornalista)
“Meu nome é Aracelle! Sou jornalista, formada em letras e Policial Civil. Antes de me tornar servidora do Estado de Minas Gerais, trabalhei por 9 anos no SINDPÚBLICOS-MG – Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público do Estado de Minas Gerais. Lá, aprendi que o IPSEMG – Instituto de Previdência dos Servidores Públicos de Minas Gerais, é patrimônio dos servidores. Aprendi a defendê-lo, a lutar por ele, a cobrar melhorias do governo! Quando me tornei servidora não pensei duas vezes: cancelei meu plano de saúde e me tornei beneficiária! Defensora que era, fiz propagandas positivas e defendia a ideia de que todos deveriam aderir ao plano para torná-lo forte e solidário, atendendo bem todas as classes de servidores públicos.
Engravidei no começo de 2019 e fiz meu pré-natal no IPSEMG. Nasci na maternidade do hospital Governador Israel Pinheiro (HGIP), hospital próprio do Instituto. E achava incrível poder ter minha filha lá! E assim passei minha gestação, tranquila, sem nenhum mal estar ou intercorrência. Praticando atividades físicas e sendo o mais saudável possível para conseguir ter um parto normal tranquilo e humanizado!
No dia 15/11/2019, com 40 semanas e 3 dias, começaram as tão esperadas contrações! Eu entrava em trabalho de parto naturalmente e aquilo me deixou muito feliz! Seguimos, meu marido e eu, pra maternidade do HGIP. Fomos atendidos por um médico que constatou uma dilatação de 3cm e contrações ritmadas! Surpresa número um: o médico disse que me examinaria novamente dentro de duas horas para ver se a dilatação teria evoluído… E que até lá eu poderia ficar andando pelo corredor do hospital, segurando nos corrimões e agachando a cada contração!
Eu estava com muita dor! Onde estava a tão esperada sala de pré-parto? O tão sonhado acolhimento? As bolas de Pilates? O chuveiro quente? A enfermeira carinhosa??? Éramos somente meu marido, eu e as dores das contrações em meio a pacientes, visitantes, faxineiros, atendentes! Éramos ninguém!
Passaram-se as duas horas e minhas dores estavam insuportáveis! Meu marido corre atrás do médico que resolve me examinar de novo, encontra uma dilatação de 5cm e decide, enfim, me internar. Ufa! Agora viria a tão sonhada sala de pré-parto… E ela veio! Uma maca velha, descascada e rodeada por cortinas. Ninguém me consolava… Ninguém me sentava na bola… Me furavam e iam embora! Furavam de novo! Eu chorava! Meu marido me carregou pra um banheiro com chuveiro que tinha num canto da sala. Ele tira minha camisola e me coloca no banho quente! Ele me pede calma… Ele agacha comigo a cada contração! Ele, eu, minhas contrações e mais ninguém!
Os 7cm de dilatação chegam e eu imploro pela anestesia… Vou para o bloco cirúrgico e uma anestesista trêmula chega, me fura várias vezes, deixa meu marido desesperado, mas consegue me anestesiar… Alívio! Continuo na batalha de fazer força a cada contração. Pressão cai e quase desmaio. Aplicam adrenalina e pressão sobe! Uma confusão! Me pedem pra ficar de pé e agachar nas contrações… Obedeço! Papai agacha comigo, segura na minha mão! Os médicos residentes conversam entre si e mexem no celular sem sequer olhar pra mim naquela situação em que eu tentava, com todas as minhas forças, trazer minha bebê ao mundo! Eu chorava… Estava exausta! Me pedem pra sentar na maca novamente… Tentam manobras manuais para encaixar o bebê… Me sinto insegura… Sinto aqueles residentes inseguros!
De repente, o cenário muda! Sou avisada de que o bebê entrou em sofrimento e seus batimentos cardíacos sobem de forma absurda! Há mecônio dentro de mim! Uma Cesárea de emergência precisava ser realizada! Mais anestesia naquelas mãos trêmulas… Um corte mal feito, grande e mal posicionado é realizado na minha barriga, minha bebê é retirada, meu útero lavado… Sou costurada de qualquer jeito! Me sinto abandonada, estranha… Mas quero ver minha neném… Cecília chegou linda e saudável às 22h50 daquele dia. Ufa! Naquele momento só o amor por ela era importante!
Vamos para o quarto e o abandono continua! Ninguém me limpa… Banho só na manhã seguinte… Um quarto pequeno, um banheiro pequeno, duas famílias, médicos escassos, alimentação ruim, acomodações para mãe e acompanhante desumanas! Nada que eu venha escrever aqui seria capaz de demonstrar o abandono em que a maternidade do IPSEMG se encontra… Saí de lá dois dias depois em pânico! E acho que me encontro um pouco assim até hoje, 15 dias depois, quando consigo escrever esse relato em meio a lágrimas!
Olho para a cicatriz em mim e choro! É nela que enxergo os maus tratos pelos quais passei! É nela que vejo a marca da violência obstétrica que sofri! Mas sei também que chegará o dia em que olharei para ela e não irei mais chorar… Porque será nela que terei orgulho de dizer que venci! Que minha filha, meu marido e eu vencemos… E tê-la em nossos braços é o que mais importa nessa vida! É o maior amor do mundo! E nada mais importa!
Já o IPSEMG? Feche a maternidade! Acabem com o Hospital! Ninguém mais precisa ser enganado e mal tratado dessa forma! Sejamos realistas! A defesa para a manutenção do IPSEMG a qualquer custo não pode continuar! Afinal, é a vida e a sanidade dos servidores e seus dependentes que devem ser prioridade na luta sindical!”
Sinceramente, não percebi esse descaso. Acho que foi normal não ter te internado de cara, provavelmente queria avaliar se era trabalho de parto desencadeado por isso te pediu p andar e reavaliar…( normal ). Durante o trabalho de parto é normal tb realizar toque (furar é por sua conta), ninguém é obrigado ficar ao seu lado durante trabalho de parto te paparicando e incentivando, a não ser seu marido ou seu acompanhante ou uma doula se vc quiser pagar…Inclusive foi anestesiada, reclamou até da forma como foi feito isso…add. Pode ocorrer sofrimento fetal agudo e mecônio, que bom que foi diagnosticado a tempo. A cesariana por ter sido de urgência pode ocorrer algumas imperfeições, mas nada exagerado, tanto que vc não evoluiu com infecção no pós operatório. Se quer luxo…um quarto grande com banheira, hidromassagem e gente p te paparicar pague por isso, procure um hospital , avalie as instalações, veja antes se está no seu nível,,,se te serve.
Minha senhora não acho com nenhum cabimento sua reclamação, na minha opinião!!!
SUS pode ser privatizado com publicação de novo decreto de Bolsonaro
Conselho Nacional de Saúde rechaça a iniciativa, que pode dar os primeiros passos para jogar a saúde pública nas mãos da iniciativa privada e das operadoras de planos de saúde estrangeiras
Em plena pandemia, ou talvez por isso mesmo, o presidente Jair Bolsonaro lançou o Decreto 10.530, publicado nesta terça-feira, 27, que pretende dar os primeiros passos para a privatização do Sistema Único de Saúde (SUS), para quem as operadoras de planos de saúde norte-americanas têm os olhos voltados. A iniciativa foi rechaçada desde já pelo presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Fernando Pigatto, que chama de “arbitrariedade” a intenção do governo federal de privatizar as Unidades Básicas de Saúde (UBS) de todo o país.
“Vamos tomar as medidas cabíveis. Precisamos fortalecer o SUS contra qualquer tipo de privatização e retirada de direitos”, disse Pigatto.
Assinado ontem, 26, o decreto presidencial já está em vigor e institui a Estratégia Federal de Desenvolvimento para o Brasil para o período de 2020 a 2031 e baseado na visão neoliberal e privatista do governo Bolsonaro.
O decreto de Bolsonaro traz diretrizes econômicas, institucionais, de infraestrutura, ambiental e sociais – na qual estão eixos específicos sobre a saúde. Entre eles, “aprimorar a gestão do Sistema Único de Saúde (SUS), avançando na articulação entre os setores público e privado (complementar e suplementar)”. Conforme o documento, o avanço na articulação com o sistema privado de saúde vai aperfeiçoar o setor, “aumentando a eficiência e a equidade do gasto com adequação do financiamento às necessidades da população.”
Após tomar conhecimento do teor do decreto, Fernando Pigatto distribuiu a seguinte nota:
“Nós, do Conselho Nacional de Saúde, não aceitaremos a arbitrariedade do presidente da República, que no dia 26 editou um decreto publicado no dia 27, com a intenção de privatizar as unidades básicas de saúde em todo o Brasil. Nossa Câmara Técnica de Atenção Básica vai fazer uma avaliação mais aprofundada e tomar as medidas cabíveis em um momento em que precisamos fortalecer o SUS, que tem salvado vidas. Estamos nos posicionando perante toda a sociedade brasileira como sempre nos posicionamos contra qualquer tipo de privatização, de retirada de direitos e de fragilização do SUS. Continuaremos defendendo a vida, defendendo o SUS, defendendo a democracia.”
Notícia escondida
Em Porto Alegre, o jornalista Moisés Mendes tratou a questão em seu blog, observando que “os jornais esconderam a notícia sobre o decreto de Bolsonaro que abre a porteira para a privatização das Unidades Básicas de Saúde. Arranjaram um jeito de entregar um serviço essencial do SUS aos amigos de Paulo Guedes”, observou.
“A grande imprensa decidiu esconder a informação. O governo vai arranjar um jeito de transferir recursos públicos para quem atua como ‘operador’ privado na área da saúde. Vão depreciar ainda mais o serviço público e os quadros de servidores para contratar a parceirada da direita. O dinheiro que não existe hoje vai aparecer para construir unidades e remunerar parceiros. Que farão o quê?”, pergunta Moisés.
Segundo ele, o governo poderá até dizer que o sistema continuará público e universal, como manda a Constituição. “Mas a que custo? Quem pagará por essas parcerias é o setor público. Os parceiros vão entrar no negócio da saúde pública por desprendimento, para não ganhar nada?”, indaga o jornalista. “É preciso ver o que está camuflado nesse decreto que abre os estudos para a privatização do SUS, apenas começando pelas unidades básicas”, alertou.
Entidades apontam ainda que entre a população negra, quilombolas, mulheres, pessoas presas e moradores de favelas são os mais afetados
Por Alane Reis e Naiara Leite
No último sábado (8) o Brasil alcançou a marca de 100 mil mortes em decorrência do coronavírus. De acordo com a 11ª Nota Técnica divulgada pelo Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (NOIS) da PUC-RJ, entre o número de óbitos, negros são 55% dos vitimados, contra 38% dos brancos. A mesma pesquisa aponta que as pessoas que não concluíram o ensino básico apresentam taxas três vezes maiores de letalidade (71%) ao adquirirem a doença do que pacientes com nível superior (22,5%).
A pandemia tem escancarado as violências do racismo na vida da população negra, das periferias e favelas, dos quilombos e comunidades rurais de todo país. Condições de moradia, saneamento básico, uso de transporte público, ocupações em postos de serviços essenciais fazem com que negros se exponham mais ao risco de adquirirem a doença. Mas além disso, as vulnerabilidades sociais têm agravado a situação da população negra no contexto atual: aumento do índice de pessoas convivendo com a fome e o não acesso a renda básica para suprir as necessidades fundamentais; o desemprego ou o dia a dia dos trabalhos informais; o não acesso a manutenção da educação em método home office; o crescimento das violências do Estado e doméstica; entre outros fatores, expõem as pessoas negras a diversas ameaças à vida e ao bem estar.
Como forma de enfrentar esta realidade a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Democracia e dos Direitos Humanos apresentou no dia 13 de julho um requerimento, para realização de audiência pública junto a Comissão Externa de Enfrentamento à Covid-19 (CEXCORVI) com o objetivo de discutir e incidir nos impactos do coronavírus nas populações negras e quilombolas.
A Frente Parlamentar é presidida pelo deputado Marcelo Freixo (PSOL – RJ) e é formada por representantes da Câmara, do Senado e da sociedade civil. De acordo com Paola Gersztein, assessora do Instituto de Estudos Sócio-econômicos (INESC) na coordenação do GT de Direitos Humanos da Rede de Advocacy Colaborativo (RAC), o objetivo da audiência é a escuta de especialistas que representam a população negra acerca dos impactos da pandemia e a urgente visibilização que o tema merece, para que assim sejam tomadas medidas necessárias para a proteção e a garantia de direitos. “Nosso objetivo é denunciar, visibilizar e exigir providências do Estado que sempre tratou essas vidas como supérfluas, em um genocídio que se perpetua desde que a primeira pessoa negra foi violentamente arrancada de seu território e escravizada nessas terras”, afirma.
Paola Gersztein destaca que além da formalização do requerimento, as organizações da sociedade civil que compõem a Frente tem buscado apoio junto aos gabinetes dos deputados que fazem parte da CEXCORVI para que a realização da reunião técnica não tarde ainda mais. “Nesse processo, algo já ficou claro: a demora na concretização deste pedido é uma inequívoca expressão de racismo institucional”, enfatizou.
Ação comunitária feita por moradores do Complexo do Alemão (RJ)
O “Novo Normal” do Congresso
Desde o início da pandemia os trabalhos do Congresso Nacional têm sido realizados de maneira virtual. A sociedade civil, por meio da Frente Parlamentar, lançou um manifesto pressionando a garantia de sua participação no processo legislativo e a transparência das decisões tomadas pelo parlamento. Nenhuma medida proposta no manifesto foi acatada pelo presidente da câmara Rodrigo Maia (DEM – RJ). E neste cenário, parlamentares demoram para votar pautas essenciais como PLs de proteção às mulheres, indígenas e quilombolas; e ainda tentam pautar retrocessos de direitos, como foi o caso do “PL da grilagem”.
A Emenda Constitucional (EC 95), chamada da EC do Teto de Gastos, aprovada em 2016 pelo Congresso, resultou na perda de 20 bilhões de reais entre 2018 e 2020 para a saúde pública no Brasil. Os cortes limitaram a capacidade de uma resposta rápida e eficiente à pandemia da Covid-19, prejudicando principalmente as populações mais vulneráveis – ou seja, negras –, que dependem exclusivamente do SUS.
Ainda assim, o Congresso Nacional autorizou desde 20 de março, R$ 500 bilhões de reais para enfrentamento a Covid-19 no Brasil, não só para a saúde, mas diversas ações. Deste montante, apenas 54% já foram executados, o que é insuficiente considerando que é recurso específico para o enfrentamento da crise sanitária, já contamos com quatro meses do decreto de calamidade.
Carmela Zigoni, representante do Fórum Permanente pela Igualdade Racial (FOPIR) na Frente Parlamentar, destaca que ao analisarmos as ações específicas do governo em enfrentamento à pandemia, a melhor execução é a do Auxílio Emergencial, pois trata-se de transferência direta da Caixa Econômica Federal para as contas dos beneficiários. “Do recurso geral destinado ao enfrentamento à pandemia, R$ 254,2 bilhões são reservados ao pagamento do auxílio, e 65,7% deste recurso já foram executados. No entanto, outras ações estão com execução aquém do necessário para a sociedade, como auxílio financeiro aos estados e municípios, com 50,4%; e o benefício emergencial para manutenção do emprego e renda, com execução de apenas 37,4%. A ação específica de enfrentamento da Covid executou somente 47% do recurso disponível, após 4 meses de crise sanitária”, informa Zigoni, que também é assessora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC) e atua no monitoramento do orçamento público.
Os impactos da baixa execução orçamentária é um dos fatores responsáveis para que alcançássemos a triste marca de 100 mil mortos em quatro meses de pandemia. Ainda segundo Zigoni, “se a política fosse feita de maneira responsável, certamente o número de vitimas letais da covid-19 seria menor, principalmente entre negros e quilombolas, cujos territórios não acessam as políticas públicas necessárias”.
Ressalta-se que a política de promoção da igualdade racial e enfrentamento ao racismo foi completamente desmontada após a publicação da EC 95. O Programa 2034: Promoção da Igualdade Racial e Superação do Racismo sofreu uma queda de 80% de seus gastos entre 2014 e 2019, passando de R$ 80,4 milhões para R$ 15,3 milhões no período; quando comparamos 2019 e 2018, a queda foi de 45,7%. A despeito de todas as legislações, conferências nacionais e estruturação da política de igualdade racial desde 1988, o PPA 2020-2023 do Governo Bolsonaro extinguiu o Programa de Promoção da Igualdade Racial e Enfrentamento ao Racismo, bem como qualquer menção às palavras racismo e quilombolas.
Situação da população negra dos Quilombos
Organizações da sociedade civil desde o início da pandemia denunciam que os povos tradicionais, incluindo as comunidades quilombolas, seriam os mais afetados com o contexto, justamente pelo não acesso a direitos fundamentais anteriores. De acordo com a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), até o dia 11 de agosto, foram 4.102 casos e 151 óbitos nas comunidades quilombolas. Um destaque revelador da negligência do governo com esta população, é que estes números estão sendo coletados pela própria CONAQ.
“Desde o primeiro óbito, no estado de Goiás, a CONAQ começou o monitoramento diretamente com as lideranças porque o acesso aos dados pelas secretarias de saúde e Ministério é muito complicado. A gente sabe que o número é muito maior do que isso, mas da nossa forma é como estamos conseguindo dialogar com a sociedade sobre a Covid nos quilombos”, afirma Selma Dealdina, quilombola que integra a secretaria da CONAQ.
Dealdina destaca que até o acesso a informação sobre a situação real do contágio e prevenção ao covid é um desafio enfrentado pelos quilombolas. Realidade vivenciada em muitas comunidades sem o mínimo de acesso a internet e a radiodifusão. “A gente teve várias situações de praticamente linchamento dentro dos quilombos porque muitas pessoas não entenderam que pacientes quilombolas que contraíram o covid estavam curados. O que demonstra o alto nível de violação do direito à informação nos quilombos”. A liderança quilombola denuncia que antes da pandemia a saúde sempre foi um problema sério nos quilombos. “As comunidades não têm acesso a posto de saúde, a médico da família, então, nessa época, também não temos nada garantido”.
Quilombo de Alcântara, no Maranhão
As Mulheres negras
É um grupo destacado no texto do requerimento apresentado pela Frente Parlamentar como vulnerável neste contexto. Um exemplo disso diz respeito a situação das trabalhadoras domésticas no período da pandemia. Como herança e manutenção da cultura escravocrata (racista e sexista), a maioria dos trabalhadores domésticos no Brasil (62,5%) são mulheres negras, de acordo com dados publicados pelo DIEESE (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos).
A Deputada Federal Áurea Carolina (PSOL – MG), autora do Projeto de Lei (PL 2477/2020), que propõe a garantia da integridade do salário para trabalhadoras domésticas e a manutenção de todos os direitos trabalhistas durante o estado de calamidade pública, comenta a importância de construir uma política que defenda essas trabalhadoras.
“As terríveis mortes de Cleonice, infectada com covid-19 pela patroa que voltou da Itália, e Miguel Otávio, que há dois meses caiu do prédio onde sua mãe trabalhava, foram causadas por negligência e desumanização, decorrências diretas do racismo estrutural. Esses casos reforçam a urgência pela aprovação do projeto de lei 2477/20, para proteger as trabalhadoras domésticas durante a pandemia e garantir a elas o direito ao isolamento”, comenta a deputada.
Outro projeto de lei sobre o trabalho doméstico no período da pandemia que merece destaque é o PL 3977/2020, de autoria dos deputados federais Benedita da Silva (PT – RJ) e Helder Salomão (PT – ES). O projeto propõe que os empregadores domésticos que liberaram as trabalhadoras para o isolamento social mantendo a remuneração tenham desconto de abatimento equivalente no pagamento do Imposto de Renda.
O trabalho doméstico já foi pauta em destaque na agenda pública brasileira no contexto da pandemia algumas vezes. A morte de Cleonice, a primeira vítima letal da Covid-19 no Brasil, foi uma delas. Outra situação emblemática foi quando o governador do estado do Pará, Helder Barbalho (MDB), decretou que entre as medidas de prevenção e contenção da pandemia no estado, o trabalho doméstico deveria ser considerado como atividade essencial.
Enquanto isso, após cinco anos de cortes de recursos na política de mulheres, em 2020 o Ministério de Direitos Humanos (MDH) teve 425 milhões em recursos autorizados, porém, menos de 3% tinha sido gasto até maio deste ano. Carmela Zigoni destaca que “as mulheres negras periféricas e quilombolas são as mais vulneráveis no contexto da Covid-19, e é urgente que a ministra Damares Alves realize políticas com estes recursos para aliviar a violência e insegurança destas mulheres”.
Mulher Quilombola
População negra encarcerada
As prisões brasileiras registraram no início de junho um aumento de 800% nos casos de infecção pelo novo coronavírus em relação a maio, segundo balanço divulgado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça). A situação da população carcerária no Brasil é outro contexto explícito do funcionamento do racismo institucional. O país possui a terceira maior população carcerária do mundo, com quase 800 mil pessoas presas, segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen). Deste total, 65% são negros. A superlotação e as condições de baixa higienização nos presídios preocupam especialistas, ativistas e familiares de presos desde o início da pandemia.
Leonardo Santana, assessor de advocacy da Rede de Justiça Criminal, comenta que a pandemia do coronavírus ao atingir o sistema prisional, expos pessoas presas e trabalhadores à morte. “A superlotação torna impossível o distanciamento exigido para conter a propagação do vírus. Além disso, a ausência de equipes de saúde, água e itens de higiene contribui para que os números sobre a doença nas unidades prisionais sejam proporcionalmente superiores ao da população em liberdade. A visita de familiares foi suspensa em todo o Brasil e com ela a assistência material que supre em parte a omissão estatal, agravando o quadro de desespero intra e extramuros”, comenta Santana.
De acordo com as informações do Depen até o dia 3 de julho apenas 2,18% dos mais de 748 mil presos no país foram testados. O Conselho Nacional de Justiça, através da Recomendação 62, listou orientações ao Judiciário para evitar contaminações em massa da Covid-19 no sistema prisional e socioeducativo. A Recomendação vem sendo ignorada pelo sistema de Justiça. No Legislativo, os projetos de lei 978/2020 e 2468/2020 construídos em conjunto pela sociedade civil e parlamentares pretendem dar uma resposta para o problema.
Diante deste contexto as organizações da sociedade civil que compõem a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Democracia e pelos Direitos Humanos tem pressionado o Congresso Nacional para cobrar dos poderes executivos a realização de ações que protejam a população negra no Brasil. A sociedade civil segue pressionando o Congresso para agendamento da audiência, onde os parlamentares poderão ouvir especialistas nos temas da saúde e do orçamento, além de organismos internacionais e movimentos negros. Os poderes executivos seguem dando sinais do afrouxamento das medidas de isolamento, mas os números de contágio e morte continuam crescendo a cada dia. “O vírus é invisível, mas as ações do governo de descaso com nossas vidas são bastante visíveis. Somos nós que estamos morrendo e o cenário é desolador”, reafirmou Selma Dealdina, liderança quilombola da CONAQ.
Boca de Rango é um mini-documentário que mostra a realidade de quem está vivendo essa pandemia na linha da necessidade e do medo. Um documento audiovisual do tempo de agora. Um grito sobre as nossas urgências.
O Teatro de Contêiner Mungunzá tornou-se, neste momento, um importante ponto de assistência social e defesa dos diretos humanos do centro de São Paulo, no bairro de Santa Ifigênia.
Boa de Rango. 600 pessoas são atendidas diariamente com entregas de refeições, kits de higiene, cobertores, águas, roupas, cestas básicas e máscaras, movimentando também uma rede de, aproximadamente, 40 trabalhadores(as) ativistas no território.
Maria De Lourdes Da Fonseca Santos
04/12/19 at 18:09
Hospital sucateado pelo descaso dos governos de Minas Gerais . Absurdo dos absurdos. Sou a avó da Cecília.
Lidia
06/12/19 at 15:37
Que absurdo, que tristeza… Que haja alguma providência
Flávio Rocha
05/04/20 at 16:57
Sinceramente, não percebi esse descaso. Acho que foi normal não ter te internado de cara, provavelmente queria avaliar se era trabalho de parto desencadeado por isso te pediu p andar e reavaliar…( normal ). Durante o trabalho de parto é normal tb realizar toque (furar é por sua conta), ninguém é obrigado ficar ao seu lado durante trabalho de parto te paparicando e incentivando, a não ser seu marido ou seu acompanhante ou uma doula se vc quiser pagar…Inclusive foi anestesiada, reclamou até da forma como foi feito isso…add. Pode ocorrer sofrimento fetal agudo e mecônio, que bom que foi diagnosticado a tempo. A cesariana por ter sido de urgência pode ocorrer algumas imperfeições, mas nada exagerado, tanto que vc não evoluiu com infecção no pós operatório. Se quer luxo…um quarto grande com banheira, hidromassagem e gente p te paparicar pague por isso, procure um hospital , avalie as instalações, veja antes se está no seu nível,,,se te serve.
Minha senhora não acho com nenhum cabimento sua reclamação, na minha opinião!!!