Intimidação contra a ocupação da Escola Estadual Pio Telles Peixoto

Pressões, intimidações e revolta. Foi este o clima que encontrei na Escola Estadual Pio Telles Peixoto, que fica na Vila Jaguara, zona noroeste de São Paulo, na sexta-feira, 13/11. A escola estava ocupada pelos estudantes, em protesto contra a reorganização escolar proposta pelo governador Geraldo Alckmin, que acarretará o fechamento de 94 escolas e o encerramento de ciclos e de turnos de ensino em muitas outras.

A Pio Telles Peixoto, que ensinava 251 alunos do 6º ao 9º ano do fundamental e mais 654 estudantes do ensino médio da 1ª à 3ª séries, além de 481 alunos da Educação de Jovens e Adultos, passará a ter apenas o ensino fundamental do 6º ao 9º ano.

Quando cheguei, percebi logo que a Secretaria de Educação tinha uma estratégia bem articulada para encerrar a ocupação e evitar que a mesma servisse de exemplo para outras escolas da região.

No portão dos alunos, para onde me dirigi na tentativa de entrar na escola, tive pouco êxito. Os estudantes, precavidos, me indicaram que tentasse entrar pela secretaria. Lá, funcionários antipáticos receberam-me.

Acabei entrando em contato com a primeira aluna que, entre tímida e receosa, concedeu entrevista a seguir, em que aborda como a reorganização deve impactar seus estudos:

Gravei sua fala e voltei para a entrada, onde tentaria novamente conversar com alunos e entrar. No portão, conversei com Rafael (membro do grêmio estudantil do Pio Telles Peixoto), que me contou que naquele momento ocorria uma reunião entre alunos e a Sra. Lúcia Regina Mendes Espagolla, dirigente da Região Norte 1 e subordinada direta do Secretário da Educação. Segundo ele, depois de tal reunião seria possível entrar. Vinte minutos depois, consegui entrar, por volta das 15h30.

Aqui vale um registro histórico…

Em 2012, Lúcia Regina Mendes Espagolla apareceu nos jornais em situação mais do que constrangedora….

Já ocupando a Diretoria Regional de Ensino Norte-1, que comanda 101 escolas estaduais de nove bairros da zona norte da capital, Lúcia Regina Mendes Espagolla “usou uma circular oficial e o site da instituição [Secretaria de Estado da Educação] para convocar dirigentes de escolas estaduais da capital a participar de reunião de apoio à campanha de José Serra (PSDB)”.

Segundo o jornal “Agora”, que fez reportagem sobre a atividade eleitoral desempenhada por Lúcia Regina Mendes Espagolla, diretores e vice-diretores entrevistados disseram que, “depois de disparar a circular, Lúcia Regina telefonou para seus subordinados ameaçando os que não comparecessem à reunião da campanha com a perda do cargo.”

Por causa do escândalo na época, a Secretaria de Estado da Educação foi obrigada a soltar uma nota, dizendo que, “ao tomar conhecimento do fato determinou o imediato afastamento da dirigente regional de ensino e instaurou procedimento administrativo de apuração”.

Mas isso foi em 2012.

De novo no batente, Lúcia Regina é um trator quando se trata de aplicar as diretrizes tucanas na administração escolar. Foi o que eu vi na escola ocupada.

O clima aparentemente ameno, sem a presença de policiais e com alunos espalhados pelo pátio, apenas servia para mascarar a real situação de intimidação a que estavam submetidos alunos e professores na escola.

Mas a verdade começou a aflorar quando conversei com um aluno que havia falado com a Sra. Lúcia…

Logo, ele denunciou que a dirigente, na tentativa convencê-lo a parar com a ocupação da escola, lhe ofereceu uma vaga no colégio em que ele desejava estudar. Vejam depoimento abaixo:

Alunos preferiram não ter o rosto filmado com receio de represálias

Já para os alunos que passarão para o 3º ano do Ensino Médio, a proposta foi outra… Lúcia Regina propôs que os estudantes encerrassem a ocupação em troca da promessa de continuidade dos estudos no Pio Telles Peixoto em 2016 — apesar da tal “reorganização escolar”.

Desconfiados, os alunos exigiram que essa promessa fosse selada em documento… É este que se vê aí, na sequência.

Documento dado aos alunos que fizessem acordo com a Dirigente

A tal “Ata de Reunião” está escrita em uma folha em branco, sem qualquer timbre, documento de identificação, nome da funcionária que assina, com uma redação bastante vaga, que efetivamente apenas se compromete a levar a proposta dos alunos a frente.

Ahahahahahaha!

Bons em interpretação de texto, os estudantes perceberam na hora a manobra. Tratava-se tão somente de um documento feito para criar entre os alunos uma falsa esperança de continuar da escola e, com base nisto, desestabilizar a ocupação.

Vejam depoimento sobre o acordo proposto:https://goo.gl/X8pH0R.

Trata-se de uma manobra anti-ética e vergonhosa para uma senhora que responde diretamente ao Secretário da Educação, Herman Jacobus Cornelis Voorwald.

Já seria bastante se parassem por aí as artimanhas da senhora Lúcia para dissuadir os alunos de reivindicarem seus direitos, mas não parou.

Ao longo de toda a tarde, membros da Secretaria de Educação presentes na escola tiravam fotos de alunos no pátio, sem pedir consentimento, como tentativa de intimidar. Em uma destas sessões fiz uma intervenção ao apontar a câmera para eles. Vejam como foi:

Minha ação, no entanto, foi pouco eficaz… E eles começaram a me fotografar também, como forma de me intimidar. Tudo para compor a estratégia de desmobilização em curso.

Os alunos, que ocupavam a escola desde o início do dia, e que tiveram uma comunicação bastante restritiva com os professores, devido às intimidações feitas, tiveram pouco tempo para pensar em como viabilizar a ocupação, o que fez com que a maioria optasse por sair da escola às 18h.

Cartaz fixado no pátio dos alunos

Resistiram cerca de 30 alunos, dentre os quais cerca de 10, que se propuseram a dormir na escola. Realizou-se uma nova reunião, onde alguns, desanimados com a evasão dos colegas e se sentindo contemplados com oacordo firmado com a Sra. Lúcia, acabaram por sugerir o fim de ocupação e o indicativo de uma possível retomada da mesma, com mais estrutura na próxima segunda-feira (16/11).

Enquanto conversavam sobre como fariam para colocar as carteiras e cadeiras no lugar novamente, funcionários da Secretaria de Educação, forçaram uma porta fechada e invadiram o pátio onde estavam os alunos, como uma maneira de forçar o fim da ocupação.

Superado tal momento, enquanto os alunos colocavam as cadeiras no lugar para deixar tudo como estava, ocorreu mais um episódio, protagonizado pelo Sr. Juvelino funcionário da Secretaria de Educação e identificado por ele mesmo como PCLP (ele não explicou o que é isso!), que em atitude extremamente autoritária pediu ao Rafael (professor de Sociologia da Escola) que se retirasse da mesma. O motivo: o fato de o professor não estar no seu horário de aula.

Veja o vídeo aí embaixo.

Este foi o último dos episódios de intimidação que presenciei durante a ocupação. A vitória obtida no Judiciário, cancelando todas as reintegrações de posse das escolas ocupadas pelo estudantes, certamente deve ser comemorada. Mas ainda não existe um final feliz para esta história… O melhor que se conseguiu até agora foi a certeza de que o movimentos dos alunos representa uma força que o governador não pode mais ignorar.

Cartazes fixados no pátio dos alunos

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