Estas famílias brigam por Memória Verdade e Justiça há mais de 30 anos. O reconhecimento formal no registro de óbito não é simbólico é a comprovação documental explícita de que o Estado é o responsável pelos assassinatos. Se a justiça não concede este direito, e retrocede no que já foi conquistado, o que dirá nos casos que acontecem no cotidiano das periferias.
Carta das famílias sobre impedimentos para a retificação de certidão de óbito para mortos e desaparecidos políticos da ditadura militar brasileira
O direito à verdade em caso de extermínio de opositores políticos em regimes totalitários implica no dever do Estado de proceder com o correto registro jurídico dos fatos para a posteridade. Nesse sentido, a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos, amparada na Lei 9.140 de 1995 e na legislação que criou a Comissão da Verdade, a ela conferindo poderes de reconhecimento e declaração de morte, vem requerendo, em diversos casos, a retificação da certidão de óbito falsos, redigidos durante a ditadura militar, fazendo constar como causa “morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto de perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora”. Mais de 5 destes requerimentos já foram aceitos por diversos cartórios.
No entanto, a retificação referente a Luiz Eduardo da Rocha Merlino, requerida ao 20º Cartório de Registro Civil da comarca da capital (Jardim América), foi negada em virtude da interpretação feita a partir da Lei de Registros Públicos, sobrepondo-se esta legislação ao direito à Verdade.
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Resposta semelhante foi dada pelo mesmo 20º Cartório de Registro Civil ao requerimento de retificação do registro de óbito de Gildo Macedo Lacerda, que conservou como causa o habitual “nada consta” da ditadura, expondo a verdade apenas no verso do documento.
Os familiares de Luiz Eduardo Merlino e de Gildo Macedo Lacerda protestam contra mais esta tentativa de ocultação da verdade sobre esses crimes de lesa-humanidade.
Todos os procedimentos que impedem o direito à verdade são parte constitutiva da engrenagem de produção do esquecimento dos crimes da ditadura, esquecimento esse que configura uma segunda morte para nossos mortos e desaparecidos políticos.
A não retificação dos certidão de óbito nos priva da reparação simbólica que é o reconhecimento da causa de suas mortes, executadas pelo Estado brasileiro. O esquecimento e a impunidade para com os crimes do passado sangrento fazem o país continuar a conviver com o abuso e a violência policial desenfreados nas favelas e periferias das cidades brasileiras.