ELEIÇÕES EM ISRAEL ESCANCARAM O RACISMO NO PAÍS

Como de costume, as eleições antecipadas convocadas em Israel para o próximo dia 9 de abril abriram a temporada de discursos populistas no país.

O protagonista, mais uma vez, é o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, líder do direitista Likud, há 13 anos no cargo, e que espera não só chegar a frente mais uma vez no resultado geral das urnas, mas, também, contar com um bom resultado dos seus parceiros de extrema-direita, para que juntos consigam formar um governo por maioria.

O principal adversário é um ex-comandante das forças armadas, Benny Gantz, de centro, que se coligou com influente ex-apresentador de telejornal Yair Lapid para formar o partido Azul e Branco. Assim como o adversário, ele dependerá também de bons desempenhos dos prováveis parceiros de centro e de esquerda para conseguir formar um novo governo.

O tom da disputa pode ser bem compreendido a partir de uma troca de mensagens feitas por meio das redes sociais nos últimos dias. Miri Regev, ministra da cultura em Israel e do mesmo Likud de Netanyahu, disse sábado, em uma entrevista para televisão, que, caso Gantz vença, “ele tentará governar com partidos árabes”. E foi logo criticada no Twitter pela apresentadora e modelo Rotem Sela, que pediu o fim do uso da retórica anti-árabe na campanha.

Em meio a esta polêmica, o próprio premiê usou a mesma rede para questionar a apresentadora e defender sua ministra: “Este não é um estado-nação de todos os povos, mas, em vez disto, é um estado-nação do povo judeu”, afirmou.

No que foi respondido por ela com um questionamento: “Querido D”us, também há cidadãos árabes neste país. Quando diabos alguém neste governo assumirá ao publico que o Estado de Israel é para todos os seus cidadãos e que somos todos iguais, inclusive árabes, druzos, LGBT e – pasmem – que esquerdistas são seres humanos?”

O debate ganhou as páginas dos principais jornais pelo mundo, com as palavras de Netanyahu, absolutamente incomuns para um chefe de Estado, recebendo manchetes em veículos como The New York Times, Washington Post e a influente emissora árabe Al-Jazeera. Todos destacando que o líder israelense assume que apenas judeus fazem parte de seu conceito de nação.

Nos bastidores, Netanyahu e seus parceiros ainda investem em manobras para enfraquecer os adversários por meio da burocracia estatal. Na semana passada, o Comitê Eleitoral do país, que é formado por parlamentares do Congresso e uma quantidade de delegados proporcional a sua distribuição, cassou a candidatura do líder do socialista Hadash, Ofer Kassif, e de todo partido árabe Balad, sob as acusações de que não reconhecem o caráter judeu do Estado e apoiam internacionalmente o terrorismo. O caso está agora nas mãos da Suprema Corte.

Acusado pela Procuradoria-Geral de corrupção, era esperado que Netanyahu tivesse mais dificuldades do que vem apresentando, porém outras vez o deslocamento do debate das politicas domesticas para o plano do conflito com os palestinos favorece sua reeleição, já que aciona um medo difuso entre os israelenses de ataques ou uma nova intifada.

Segundo pesquisa realizada pelo jornal Haaretz, se as eleições fossem realizadas agora, Netanyahu teria vantagem para formar o novo governo, pois, mesmo com uma previsão de votos menor que seu principal adversário, seria mais provável que ele conseguisse a maioria absoluta a partir de alianças com partidos ultrancionalistas e fundamentalistas religiosos, que representam principalmente as populações dos assentamentos judeus na Palestina e os praticantes ultraortodoxos do judaísmo.

A esquerda é enfraquecida pela opção pragmática de muitos eleitores que apostam em uma candidatura de centro para finalmente tirar Netanyahu do poder. Um fator que poderia mudar o panorama seria um aumento da participação de eleitores árabes no pleito, já que muitos tradicionalmente boicotam as eleições em solidariedade aos árabes em territórios ocupados (que não possuem direito ao voto).

Na ultima eleição realizada antes desta, Netanyahu pediu aos seus apoiadores pelo Facebook que “tivessem em mente a probabilidade de um alto comparecimento de árabes às urnas”, às vésperas da votação. Tem sido uma de suas táticas alardear uma possível alteração significativa no resultado provocada pela minoria interna para engajar fanáticos e supremacistas judeus.

Nas ruas, jornalistas da imprensa local reportam, como em outros períodos de campanha populista, um sentimento de hostilidade a partidos de esquerda, organizações de direitos humanos, e sobretudo a pessoas e organizações árabes, com casas pichadas com inscrições racistas e bandeiras de Israel movimentadas em sinal de provocação àqueles que alguns consideram que não deveriam fazer parte da nação.

No exterior, a disputa em Israel é observada de perto sobretudo por Donald Trump, que apostou pesado ao anunciar a transferencia da embaixada americana de Tel-Aviv para Jerusalem, mas também por outros partidos nacionalistas e potências do Oriente Médio, como Irã e Arábia Saudita. Em entrevista dada este domingo, Trump afirmou que teria 98% dos votos se fosse candidato ao governo israelense. Mas há dúvidas quanto a isso.

*Abaixo, os números da ultima pesquisa do Haaretz

 

 

Por:

Rodrigo Luis Veloso – Relações Internacionais do Instituto Ser LGBT+ e membro do Coletivo Judeus de Esquerda (COJE)

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