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Deputados aprovam projeto de lei que pode privatizar distribuidoras da Eletrobras

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O Projeto de Lei 10.332/18 que facilita a privatização das seis distribuidoras subsidiárias do complexo Eletrobras, além de apropriar as concessões das usinas termelétricas, passou por resistência no Congresso mas foi aprovado nessa quarta, 04/07, no Plenário da Câmara dos Deputados.

Por 203 votos favoráveis a 123 votos contrários à proposta, o PL passará por mais duas votações nos dias 11 e 12 de julho para destacar as sugestões de mudança do texto original. Após concluir essa etapa o projeto será encaminhado ao Senado e caso seja aprovado, será conduzido para o presidente Michel Temer para sancioná-lo ou vetá-lo.

As distribuidoras Amazonas Energia, Ceron, Eletroacre, Ceal, Cepisa, Boa Vista Energia, estão localizadas no Norte e Nordeste do país e são responsáveis por levar energia a milhares de brasileiros. Elas podem ser vendidas pela bagatela de R$50 mil por unidade e encarregarão a dívida de R$ 11 bi a Eletrobras para garantir maior lucro ao novo proprietário das subsidiárias.

Ainda há indecisões sobre a privatização das subsidiárias, pois o ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, decretou a proibição da venda de estatais sem o consentimento do Congresso Nacional.

O projeto é de relatoria do deputado Júlio Lopes (PP/RJ), que é ex-secretário de transporte do estado do Rio durante a gestão de Cabral. Lopes é investigado na CPI dos Transportes e também foi acusado de receber 15,6 milhões da Odebrecht entre 2008 a 2014.

O governo golpista na contramão do mundo

Uma pesquisa publicada em maio pela CUT/Vox, concluiu que 55% dos brasileiros são contra as privatizações das estatais que estão ocorrendo no país. A maioria dos entrevistados alega que os preços dos produtos e serviços podem subir, trabalhadores terão os salários reduzidos, muitos serão demitidos e reconhecem que a esse tipo de comercialização não melhorará a economia.

Enquanto os países com as maiores economias do mundo estão investindo em suas empresas públicas, o Brasil está liquidando todas as estatais que operam em setores estratégicos, como água, energia, petróleo e gás, que geram lucro, produtividade a nação e incentivam projetos sociais que procuram mudar a realidade de toda a população.


* Fontes: As informações foram retiradas dos sites da FNU, Urbanitários DF, Rede Brasil Atual e Brasil de Fato

Confira abaixo como votou cada deputado

Parlamentar Partido Bloco Voto
Roraima (RR)
Abel Mesquita Jr. DEM Não
Carlos Andrade PHS Não
Hiran Gonçalves PP PpPodeAvante Não
Jhonatan de Jesus PRB Não
Maria Helena MDB Não
Remídio Monai PR Não
Total Roraima: 6
Amapá (AP)
André Abdon PP PpPodeAvante Sim
Cabuçu Borges MDB Sim
Euricelia Cardoso PP PpPodeAvante Sim
Jozi Araújo Podemos PpPodeAvante Sim
Marcos Reategui PSD Sim
Total Amapá: 5
Pará (PA)
Arnaldo Jordy PPS Não
Beto Salame PP PpPodeAvante Sim
Delegado Éder Mauro PSD Abstenção
Hélio Leite DEM Sim
Joaquim Passarinho PSD Sim
Júlia Marinho PSC Sim
Nilson Pinto PSDB Sim
Simone Morgado MDB Sim
Total Pará: 8
Amazonas (AM)
Átila Lins PP PpPodeAvante Não
Conceição Sampaio PSDB Não
Pauderney Avelino DEM Não
Prof. Gedeão Amorim MDB Não
Total Amazonas: 4
Rondonia (RO)
Expedito Netto PSD Não
Lucio Mosquini MDB Não
Luiz Cláudio PR Não
Marcos Rogério DEM Não
Total Rondonia: 4
Acre (AC)
Alan Rick DEM Não
Jéssica Sales MDB Não
Leo de Brito PT Não
Total Acre: 3
Tocantins (TO)
Carlos Henrique Gaguim DEM Sim
César Halum PRB Sim
Dulce Miranda MDB Não
Josi Nunes PROS PtbPros Abstenção
Lázaro Botelho PP PpPodeAvante Sim
Professora Dorinha Seabra Rezende DEM Sim
Vicentinho Júnior PR Sim
Total Tocantins: 7
Maranhão (MA)
Aluisio Mendes Podemos PpPodeAvante Não
Cleber Verde PRB Sim
Eliziane Gama PPS Não
Hildo Rocha MDB Sim
João Marcelo Souza MDB Sim
Julião Amin PDT Não
Juscelino Filho DEM Não
Luana Costa PSC Não
Pedro Fernandes PTB PtbPros Sim
Victor Mendes MDB Sim
Weverton Rocha PDT Sim
Zé Carlos PT Não
Total Maranhão: 12
Ceará (CE)
Adail Carneiro Podemos PpPodeAvante Sim
André Figueiredo PDT Não
Cabo Sabino Avante PpPodeAvante Não
Chico Lopes PCdoB Não
Danilo Forte PSDB Sim
Luizianne Lins PT Não
Macedo PP PpPodeAvante Sim
Odorico Monteiro PSB Não
Raimundo Gomes de Matos PSDB Sim
Vaidon Oliveira PROS PtbPros Sim
Vitor Valim PROS PtbPros Não
Total Ceará: 11
Piauí (PI)
Assis Carvalho PT Não
Capitão Fábio Abreu PR Não
Heráclito Fortes DEM Sim
Marcelo Castro MDB Abstenção
Rejane Dias PT Não
Total Piauí: 5
Rio Grande do Norte (RN)
Antônio Jácome Podemos PpPodeAvante Sim
Beto Rosado PP PpPodeAvante Sim
Felipe Maia DEM Sim
Rogério Marinho PSDB Sim
Zenaide Maia PHS Não
Total Rio Grande do Norte: 5
Paraíba (PB)
Aguinaldo Ribeiro PP PpPodeAvante Sim
André Amaral PROS PtbPros Sim
Benjamin Maranhão MDB Sim
Efraim Filho DEM Sim
Luiz Couto PT Não
Marcondes Gadelha PSC Sim
Pedro Cunha Lima PSDB Sim
Veneziano Vital do Rêgo PSB Não
Total Paraíba: 8
Pernambuco (PE)
Adalberto Cavalcanti Avante PpPodeAvante Sim
Augusto Coutinho Solidaried Sim
Betinho Gomes PSDB Sim
Daniel Coelho PPS Sim
Danilo Cabral PSB Não
Fernando Coelho Filho DEM Sim
Jarbas Vasconcelos MDB Sim
Jorge Côrte Real PTB PtbPros Sim
Kaio Maniçoba Solidaried Sim
Mendonça Filho DEM Sim
Pastor Eurico Patriota Não
Sebastião Oliveira PR Sim
Tadeu Alencar PSB Não
Wolney Queiroz PDT Não
Total Pernambuco: 14
Alagoas (AL)
Arthur Lira PP PpPodeAvante Sim
Cícero Almeida PHS Não
JHC PSB Não
Paulão PT Não
Pedro Vilela PSDB Sim
Total Alagoas: 5
Sergipe (SE)
Adelson Barreto PR Não
Fábio Mitidieri PSD Sim
João Daniel PT Não
Valadares Filho PSB Não
Total Sergipe: 4
Bahia (BA)
Alice Portugal PCdoB Não
Antonio Brito PSD Não
Antonio Imbassahy PSDB Sim
Benito Gama PTB PtbPros Sim
Cacá Leão PP PpPodeAvante Sim
Daniel Almeida PCdoB Não
Elmar Nascimento DEM Sim
Félix Mendonça Júnior PDT Não
João Carlos Bacelar PR Sim
José Carlos Aleluia DEM Sim
José Carlos Araújo PR Sim
José Nunes PSD Sim
José Rocha PR Sim
Márcio Marinho PRB Sim
Mário Negromonte Jr PP PpPodeAvante Sim
Nelson Pellegrino PT Não
Paulo Azi DEM Sim
Paulo Magalhães PSD Sim
Roberto Britto PP PpPodeAvante Sim
Ronaldo Carletto PP PpPodeAvante Sim
Valmir Assunção PT Não
Waldenor Pereira PT Não
Total Bahia: 22
Minas Gerais (MG)
Adelmo Carneiro Leão PT Não
Aelton Freitas PR Sim
Bilac Pinto DEM Sim
Dâmina Pereira Podemos PpPodeAvante Não
Delegado Edson Moreira PR Sim
Dimas Fabiano PP PpPodeAvante Sim
Domingos Sávio PSDB Sim
Eduardo Barbosa PSDB Sim
Eros Biondini PROS PtbPros Não
Jô Moraes PCdoB Não
Júlio Delgado PSB Não
Leonardo Monteiro PT Não
Leonardo Quintão MDB Sim
Lincoln Portela PR Não
Luis Tibé Avante PpPodeAvante Sim
Luiz Fernando Faria PP PpPodeAvante Sim
Marcelo Álvaro Antônio PSL Sim
Marcelo Aro PHS Sim
Marcos Montes PSD Sim
Marcus Pestana PSDB Sim
Mauro Lopes MDB Sim
Newton Cardoso Jr MDB Sim
Padre João PT Não
Patrus Ananias PT Não
Paulo Abi-Ackel PSDB Sim
Raquel Muniz PSD Sim
Reginaldo Lopes PT Não
Renato Andrade PP PpPodeAvante Sim
Rodrigo de Castro PSDB Sim
Rodrigo Pacheco DEM Sim
Saraiva Felipe MDB Sim
Stefano Aguiar PSD Sim
Tenente Lúcio PR Sim
Toninho Pinheiro PP PpPodeAvante Sim
Weliton Prado PROS PtbPros Não
Total Minas Gerais: 35
Espírito Santo (ES)
Carlos Manato PSL Sim
Dr. Jorge Silva Solidaried Não
Evair Vieira de Melo PP PpPodeAvante Sim
Givaldo Vieira PCdoB Não
Helder Salomão PT Não
Lelo Coimbra MDB Sim
Marcus Vicente PP PpPodeAvante Sim
Paulo Foletto PSB Não
Sergio Vidigal PDT Não
Total Espírito Santo: 9
Rio de Janeiro (RJ)
Alessandro Molon PSB Não
Alexandre Serfiotis PSD Sim
Alexandre Valle PR Sim
Altineu Côrtes PR Sim
Arolde de Oliveira PSD Sim
Aureo Solidaried Sim
Benedita da Silva PT Não
Cabo Daciolo Patriota Não
Celso Jacob MDB Sim
Chico Alencar PSOL Não
Clarissa Garotinho PROS PtbPros Não
Cristiane Brasil PTB PtbPros Sim
Ezequiel Teixeira Podemos PpPodeAvante Sim
Felipe Bornier PROS PtbPros Obstrução
Francisco Floriano DEM Não
Glauber Braga PSOL Não
Jandira Feghali PCdoB Não
Julio Lopes PP PpPodeAvante Sim
Leonardo Picciani MDB Sim
Luiz Carlos Ramos PR Não
Luiz Sérgio PT Não
Marcelo Matos PSD Sim
Miro Teixeira REDE Obstrução
Otavio Leite PSDB Sim
Paulo Feijó PR Sim
Pedro Paulo DEM Sim
Rodrigo Maia DEM Art. 17
Simão Sessim PP PpPodeAvante Sim
Soraya Santos PR Não
Wadih Damous PT Não
Walney Rocha Patriota Não
Total Rio de Janeiro: 31
São Paulo (SP)
Alex Manente PPS Sim
Alexandre Leite DEM Sim
Ana Perugini PT Não
Andres Sanchez PT Não
Antonio Bulhões PRB Sim
Arlindo Chinaglia PT Não
Arnaldo Faria de Sá PP PpPodeAvante Não
Arnaldo Jardim PPS Sim
Baleia Rossi MDB Sim
Beto Mansur MDB Sim
Capitão Augusto PR Sim
Carlos Sampaio PSDB Sim
Carlos Zarattini PT Não
Eduardo Bolsonaro PSL Sim
Eduardo Cury PSDB Sim
Evandro Gussi PV Sim
Fausto Pinato PP PpPodeAvante Sim
Flavinho PSC Não
Floriano Pesaro PSDB Sim
Gilberto Nascimento PSC Sim
Goulart PSD Sim
Herculano Passos MDB Sim
Ivan Valente PSOL Não
Jefferson Campos PSB Não
João Paulo Papa PSDB Sim
José Mentor PT Não
Junji Abe MDB Sim
Keiko Ota PSB Não
Lobbe Neto PSDB Sim
Luiz Lauro Filho PSB Não
Luiza Erundina PSOL Não
Mara Gabrilli PSDB Sim
Marcelo Ortiz Podemos PpPodeAvante Sim
Marcelo Squassoni PRB Sim
Marcio Alvino PR Sim
Miguel Lombardi PR Sim
Milton Monti PR Sim
Missionário José Olimpio DEM Sim
Nelson Marquezelli PTB PtbPros Sim
Nilto Tatto PT Não
Pr. Marco Feliciano Podemos PpPodeAvante Sim
Ricardo Izar PP PpPodeAvante Sim
Roberto Alves PRB Sim
Roberto de Lucena Podemos PpPodeAvante Sim
Rodrigo Garcia DEM Sim
Samuel Moreira PSDB Sim
Sérgio Reis PRB Sim
Silvio Torres PSDB Sim
Tiririca PR Sim
Valmir Prascidelli PT Não
Vanderlei Macris PSDB Sim
Vinicius Carvalho PRB Sim
Walter Ihoshi PSD Sim
Total São Paulo: 53
Mato Grosso (MT)
Fabio Garcia DEM Sim
Nilson Leitão PSDB Sim
Professor Victório Galli PSL Sim
Ságuas Moraes PT Não
Valtenir Pereira MDB Sim
Total Mato Grosso: 5
Distrito Federal (DF)
Alberto Fraga DEM Sim
Augusto Carvalho Solidaried Não
Erika Kokay PT Não
Izalci Lucas PSDB Sim
Rogério Rosso PSD Sim
Rôney Nemer PP PpPodeAvante Não
Vitor Paulo PRB Sim
Total Distrito Federal: 7
Goiás (GO)
Célio Silveira PSDB Sim
Delegado Waldir PSL Sim
Heuler Cruvinel PP PpPodeAvante Sim
João Campos PRB Sim
Lucas Vergilio Solidaried Sim
Magda Mofatto PR Sim
Marcos Abrão PPS Sim
Pedro Chaves MDB Sim
Roberto Balestra PP PpPodeAvante Sim
Thiago Peixoto PSD Sim
Total Goiás: 10
Mato Grosso do Sul (MS)
Fábio Trad PSD Sim
Mandetta DEM Sim
Tereza Cristina DEM Sim
Vander Loubet PT Não
Zeca do Pt PT Não
Total Mato Grosso do Sul: 5
Paraná (PR)
Alex Canziani PTB PtbPros Sim
Alfredo Kaefer PP PpPodeAvante Sim
Aliel Machado PSB Não
Assis do Couto PDT Não
Christiane de Souza Yared PR Não
Delegado Francischini PSL Sim
Diego Garcia Podemos PpPodeAvante Não
Edmar Arruda PSD Sim
Evandro Roman PSD Sim
Leandre PV Não
Luiz Carlos Hauly PSDB Sim
Luiz Nishimori PR Sim
Nelson Meurer PP PpPodeAvante Sim
Osmar Bertoldi DEM Sim
Osmar Serraglio PP PpPodeAvante Sim
Reinhold Stephanes PSD Sim
Rubens Bueno PPS Sim
Sandro Alex PSD Sim
Sergio Souza MDB Sim
Takayama PSC Sim
Toninho Wandscheer PROS PtbPros Sim
Zeca Dirceu PT Não
Total Paraná: 22
Santa Catarina (SC)
Celso Maldaner MDB Sim
Esperidião Amin PP PpPodeAvante Não
Geovania de Sá PSDB Não
João Rodrigues PSD Sim
Jorginho Mello PR Sim
Osvaldo Mafra Solidaried Não
Pedro Uczai PT Não
Rogério Peninha Mendonça MDB Sim
Ronaldo Benedet MDB Sim
Valdir Colatto MDB Sim
Total Santa Catarina: 10
Rio Grande do Sul (RS)
Afonso Hamm PP PpPodeAvante Não
Alceu Moreira MDB Sim
Bohn Gass PT Não
Carlos Gomes PRB Sim
Covatti Filho PP PpPodeAvante Sim
Danrlei de Deus Hinterholz PSD Não
Darcísio Perondi MDB Sim
Giovani Cherini PR Sim
Giovani Feltes MDB Sim
Heitor Schuch PSB Não
Henrique Fontana PT Não
Jerônimo Goergen PP PpPodeAvante Sim
Márcio Biolchi MDB Sim
Marco Maia PT Não
Marcon PT Não
Maria do Rosário PT Não
Onyx Lorenzoni DEM Sim
Osmar Terra MDB Sim
Paulo Pimenta PT Não
Pompeo de Mattos PDT Não
Renato Molling PP PpPodeAvante Sim
Sérgio Moraes PTB PtbPros Sim
Total Rio Grande do Sul: 22

Resultado da votação

Sim: 203
Não: 123
Abstenção: 3
Total da Votação: 329
Art. 17: 1
Total Quorum: 330
Obstrução: 2

 

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Geral

O caso Mariana Ferrer, por Honoré de Balzac

Enfim, “de todas as mercadorias deste mundo, a mais cara é sem dúvida a justiça”.

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O caso Mariana Ferrer por Honoré de Balzac

Por Dirce Waltrick do Amarante*

Quando o escritor francês Honoré de Balzac teve acesso ao vídeo da audiência de Mariana Ferrer, ele decidiu escrever o Código dos homens honestos, isso nos idos de 1875, mas só agora estou tornando públicas suas palavras, que estavam sob segredo de justiça.  

Em uma análise bastante rigorosa, Balzac lembra, em primeiro lugar, que sabemos perfeitamente bem que “em princípio, ficou estabelecido que a justiça seria para todos, mas […]” . A tradução é de Léa Novaes, pois Balzac tinha dificuldade em escrever em português.

Dito isso, ele fala da figura do procurador. Em tempos idos, diz Balzac, os procuradores “levavam tão a sério o interesse de um cliente que chegavam a morrer por eles”. Além disso, eles “nunca frequentavam a sociedade”, e se a frequentassem eram vistos como “monstros”, mas hoje, “hoje tudo está monetarizado: já não se diz que Fulano foi nomeado procurador-geral, vai defender os interesses de sua província […]. Não, nada disso; o senhor Fulano acaba de conquistar um belo posto, procurador-geral, o que equivale a honorários de vinte mil francos […]”.

Balzac ia falar da figura do juiz e do defensor público, mas depois de tudo que assistiu ficou sem as palavras justas para descrevê-los.

Então, o escritor francês decidiu se debruçar sobre o papel do advogado, que “frequenta bailes, festas […] despreza tudo o que não é elegante”. E, diz Balzac, “Justiça seja feita aos advogados […]! São os decanos, os chefes, os santos, os deuses da arte de fazer fortuna com rapidez e com uma sagacidade que os torna merecedores de muitos elogios”.

Enfim, “de todas as mercadorias deste mundo, a mais cara é sem dúvida a justiça”.

Não citei na íntegra o texto do Balzac, porque foram esses os únicos fragmentos aos quais tive acesso, os outros foram apagados.  

*Formada em Direito, em 1992, na Universidade Federal de Santa Catarina

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Geral

O show de Trump: renovação ou cancelamento?

A eleição nos EUA e o destino da democracia na condição atualista

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Nos EUA voto popular não significa vitória. Biden terá mais votos do que Trump e ainda assim o resultado da eleição continuará indefinido por algum tempo. Apesar dos descalabros que marcaram a gestão Trump antes e durante a pandemia, o seu desempenho na atual corrida eleitoral será muito forte.

Mateus Pereira, Valdei Araujo e Walderez Ramalho, professores da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) em Mariana, MG

A disputa está sendo muito mais acirrada do que era inicialmente previsto pela maior parte dos institutos de pesquisa e da mídia americana, embora a cautela e o medo nunca deixaram de estar presentes. Sob esse ponto de vista, as eleições deste ano são como uma repetição do que vimos em 2016, ainda que o resultado possa ser a derrota eleitoral para Trump. Em 2016 foram os democratas que denunciaram a interferência russa, agora é o presidente-agitador que se apressa em questionar a legitimidade do pleito, sem mostrar nenhuma prova. Sabemos que no ambiente do atualismo provas têm como base apenas convicções.

Um sistema eleitoral que sobreviveu por séculos, sem grandes mudanças, pode ter se tornado obsoleto desde a eleição de Bush, em 2000. Um lembrete do possível declínio da democracia americana: das últimas oito eleições presidenciais desde 1992, os democratas venceram no voto popular as últimas sete, mas em apenas quatro ocasiões ganharam o colégio eleitoral e fizeram o presidente.

Acreditamos que as eleições nos EUA são um exemplo do confronto entre duas estratégias e duas concepções sobre fazer política: de um lado, Trump e sua promessa de eterna atualização da atualidade em modo nostálgico; e Biden, com sua aposta moderada no cansaço na agitação atualista que seu adversário republicano encarna e radicaliza, e a retomada da política em moldes liberais. Essa retomada é feita sem uma crítica efetiva ao modelo neoliberal abraçado pela cúpula do partido democrata. Uma aposta radical, como Sanders, teria se saído melhor? É difícil dizer, mas tudo leva a crer que não, tendo em vista o complicado xadrez do voto estado a estado.

A escolha entre as duas estratégias/concepções se mostrou muito mais difícil e apertada do que se imaginava. A tal “onda azul” anunciada por parte da imprensa estadunidense esteve longe de acontecer. De fato, Trump se mostrou eleitoralmente muito mais forte do que os analistas supunham. Considerando que esta não é a primeira vez que os institutos de pesquisa falharam em captar esse movimento no eleitorado americano, e considerando também que fenômeno semelhante ocorreu no Brasil em 2018, coloca-se a questão de saber se as tradicionais pesquisas de opinião tornaram-se de alguma forma obsoletas em um mundo atualista. Esse quadro muda pouco, mesmo com uma  eventual vitória de Biden ou pior, com uma inconveniente reeleição de Trump.

São vários fatores que devem ser considerados para avaliar essa questão. Os próprios institutos se apressaram a ensaiar algumas explicações ao público. O diretor da Trafalgar Group, Robert Cahaly, afirmou que muitos eleitores “esconderam”, como já havia acontecido, sua preferência por Trump por algum receio ou constrangimento social.[1] Não podemos desconsiderar algum tipo de boicote/sabotagem dos eleitores republicanos, já que na retórica do trumpismo as pesquisas de opinião fazem parte da mídia vendida. Outros recorreram à justificativa de que as pesquisas anteriores representavam apenas fotografias do momento específico em que as entrevistas foram feitas, e não o que se poderia esperar na eleição propriamente dita. Isso poderia ter sido de fato observado pela tendência de redução da vantagem de Biden nos últimos 15 dias. Afinal, o episódio da contaminação de Trump e sua rápida recuperação pode ter tido um saldo positivo, ao menos na mobilização de sua base, como já havíamos especulado em coluna anterior.

Aceite-se ou não essas justificativas, fato é que os institutos de pesquisa sairão dessas eleições com sua credibilidade e imagem pública mais arranhadas, sobretudo diante das especificidades do sistema eleitoral americano. Como afirmamos, muitos fatores concorrem para esse desgaste. Um deles está relacionado à condição atualista que caracteriza o nosso presente e como cada um dos candidatos se coloca frente a tal condição.

Trump é um político bastante sintonizado com o ambiente da comunicação atualista onde as provas dispensam comprovação factual. Seja nas redes sociais, seja em seus concorridos comícios, o presidente se revela um comunicador difícil de ser batido. Dentre os aspectos associados à condição atualista, destacamos a intensidade e velocidade sem precedentes do fluxo de notícias, em detrimento dos protocolos de verificação e checagem da informação veiculada. Esse ambiente infodêmico[2] é particularmente fértil para a produção de desinformação e sua disseminação como misinformação.[3] Além das informações imprecisas, para não dizer apenas falsas, que a infodemia trumpista ajuda a difundir, é preciso levar em consideração a agitação/ativação que produz. É como se a oposição se agitasse confusamente e a base trumpista se ativasse a cada um de seus comentários polêmicos. Assim, o uso constante das redes sociais para disseminar fake news ou comentários faz com que, seja de modo positivo ou negativo, o presidente esteja sempre no foco da mídia. O acúmulo de notícias sobre suas falas ou atos inconsequentes faz com que seja difícil recuperar qual foi o absurdo dito ou feito na semana anterior. Na condição atualista há um valor excepcional em estar mais atualizado (e exposto) que o seu adversário. 

Ainda assim, a manipulação das fake news como ferramenta política supõe uma linguagem organizada para se tornar eficaz. Essa afirmação pode soar chocante à primeira vista: como podemos atribuir coerência a um discurso fundamentado em desinformação e que frequentemente e sem o menor pudor afirma hoje o contrário do que disse ontem, como o exemplo do uso de máscaras na pandemia?[4] O ponto aqui é que a condição atualista coloca muitos obstáculos para que o passado, mesmo o mais recente, seja trazido à reflexão. Assim, quando confrontados com suas próprias contradições, políticos atualistas como Trump e Bolsonaro simplesmente atualizam suas narrativas e afirmações quando as anteriores se tornam insustentáveis. Com muita frequência, os seus discursos mudam em função da conveniência da atualidade, sem a mínima necessidade de se prestar conta da contradição com o que eles mesmos diziam no dia anterior.

Essa estrutura atualista do discurso político só se torna eficaz, porém, no interior de uma linguagem organizada e facilmente identificável pelo público que a compartilha, no interior de uma condição material de reorganização do mundo do trabalho e do capital. A crise de 2008, concentração de renda, neoliberalismo, capitalismo de vigilância e a formação do atual “precariado” são elementos, dentre outros, fundamentais para entender a emergência de líderes que governam e são eleitos por pequenas maiorias mobilizadas pela historicidade e ideologia atualista. Só assim podemos entender a força de Trump na eleição independente do resultado final, ainda que sua derrota  interesse a todos os democratas do mundo.

Trump lança mão de artifícios retóricos quando confrontado com suas afirmações evidentemente baseadas em mentiras e contradições, de tal maneira que ele consegue, mesmo em tais situações, transmitir e reforçar o código entre o seu público. O código se estrutura em uma lógica antagonista, na qual o portador é sempre vítima de perseguição por parte do establishment e da imprensa vendida para a “esquerda corrupta” ou as corporações globalistas.

O ponto principal a ser considerado é que para ser politicamente eficaz não é necessário que o código seja compartilhado por todos; mas que seja continuamente ativado junto aqueles que já o compartilham. Por mais que esteja sustentado em desinformações, o fato é que o código é bastante poderoso na ativação de afetos políticos centrais como o medo, ódio e ansiedade, vetores de forte engajamento e agitação política que Trump e Bolsonaro sabem tão bem promover.

O sucesso dessa estratégia se coaduna com a popularização das redes sociais e dos smartphones, bem como das novas tecnologias de processamento de dados manipulados para fins políticos. Nesse contexto, tornou-se possível criar e difundir mensagens sob medida para cada tipo de público, cada indivíduo ou grupo formula suas próprias percepções sobre o mundo a partir de narrativas (códigos) que não mais precisam ser expostos publicamente a todos para serem eficazes. Após alguns reconhecimentos iniciais, os algoritmos se encarregam de abastecer-nos das notícias que nos mobilizam, sempre com o mesmo teor e formato. Reforça-se, assim, o fenômeno das “bolhas”.[5] Esses códigos podem circular de forma subterrânea, de tal modo que o que parece absurdo e chocante para uns, é perfeitamente aceitável e normalizado para outros.

Esse ambiente de circulação de notícias e códigos é condizente com a ordem atualista de nosso tempo e, ao nosso ver, é um fator importante a ser considerado no desempenho surpreendente de Trump nestas eleições. E um dos preços a se pagar para tal sucesso é a radicalização do clima de agitação que tem marcado a nossa época. Esse quadro tem resultado inclusive em distúrbios psicológicos cada vez mais comuns, como o “transtorno do estresse eleitoral”, que segundo estimativas afeta sete em cada dez cidadãos estadunidenses.[6]

Os políticos atualistas claramente não se importam em pagar esse preço, na verdade eles têm lucrado com isso. Mas, ao fim e ao cabo, eles não podem evitar completamente os efeitos colaterais de suas apostas. Agitação e dispersão geram também cansaço no eleitorado. Biden e os democratas tomaram esse efeito como vetor de suas estratégias para estas eleições. Frente à irrefreável agitação de Trump, Biden se vendeu como a opção mais “centrista”, de moderação e convergência. A divergência entre as duas estratégias foi mais uma vez demonstrada logo após o fechamento da votação: enquanto Trump se apressou em declarar-se vencedor e dizer que irá judicializar a eleição em caso de derrota, Biden classificou tal postura como “ultrajante” e pregou calma aos seus apoiadores[7].

Mesmo que a vitória do democrata seja confirmada, é inegável que o preço desse lance foi bastante alto. A imprensa americana noticiou como parcelas importantes do eleitorado negro, que o próprio Biden afirmou ser “a chave para a vitória”, relataram estarem pouco motivados a votarem no candidato democrata.[8] O mesmo ocorreu entre parte do eleitorado hispânico, em especial na Flórida e no Texas. O conservadorismo nos costumes, a adesão a denominações evangélicas que tem crescido entre hispânicos e a tradição anticomunista dos cubanos, e agora também venezuelanos, na Flórida, são fenômenos a serem considerados. Enquanto fechamos essa coluna Trump ainda lidera na Pensilvânia, estado no qual o operariado branco migrou dos democratas para o trumpismo. No último debate, Biden acabou por reconhecer que teria que acabar com a exploração do altamente poluente gás de xisto, o que foi imediatamente explorado por Trump: “Eis uma declaração importante”, ironizou o presidente. Caso perca por margem apertada na Pensilvânia, onde os trabalhadores dessa indústria são amplamente sensíveis ao tema, talvez essa declaração tenha custado a eleição.

Para entender melhor essas flutuações teríamos que fazer algo pouco praticado durante a campanha, uma avaliação retrospectiva fundada em boa informação acerca das políticas públicas implementadas por democratas e republicanos, em especial nos governos Obama e Trump. O apoio ao republicano não é apenas resultado da mágica da comunicação, deriva também da tibieza das políticas democratas e dos acertos de Trump. Reforma do sistema criminal, política externa menos intervencionista, foco na economia e na criação de empregos, com bons resultados, ao menos até a pandemia.

A decisão das eleições primárias do Partido Democrata em nomear um candidato “centrista” para concorrer nessas eleições – ao contrário de uma opção mais radical do populismo de esquerda como Bernie Sanders – foi importante para unificar o partido (em especial o seu establishment) e angariar o apoio do eleitorado “cansado” da agitação radicalizada. Por outro lado, a figura moderada de Biden não se mostrou capaz de promover um grau de engajamento e mobilização do público à altura do seu adversário agitador, nem está claro ainda se seu discurso de união nacional conseguiu atrair eleitores de Trump. Essa diferença é importante em um contexto onde o voto não é obrigatório e, no caso particular das eleições deste ano, ainda mais desencorajado pela pandemia do coronavírus.

Mesmo assim, a moderação pode ter sido eficaz para para derrotar a agitação, mas não para desativá-la. E ainda não podemos assegurar como os EUA sairá dessas eleições, pois Trump continua sendo quem é. Há ainda o risco de o agitador perder e não aceitar sair, e as consequências disso poderão ser catastróficas. E mesmo que ele saia, o trumpismo – o negacionismo, o anti-esquerdismo, o desejo de retorno a um passado glorioso e mítico – ainda permanecerá em parcelas consideráveis da população.

O que tudo isso ensina para o campo democrático brasileiro, que tem de enfrentar a sua própria versão de agitador atualista? Desde o início da votação nos EUA, Bolsonaro disparou freneticamente uma série de tweets ressoando as alegações infundadas de seu ídolo sobre as eleições serem “fraudadas” a favor dos democratas, o que seria um risco para a “liberdade” e para o Brasil. Afinal, nosso agitador atualista tupiniquim sabe bem que a permanência de Trump é uma força de sustentação fundamental para ele. As relações entre EUA e Brasil deixaram de ser uma relação entre Estados, mas sim uma relação de “amizade” (leia-se emulação e, do nosso ponto de vista, subserviência) entre os chefes de turno da Casa Branca e do Palácio do Planalto.

Assim, e seguindo o estilo atualista de fazer política, Bolsonaro ressoa as afirmações sem fundamento de Trump, sem se preocupar com a veracidade e desprezando o princípio diplomático básico da impessoalidade. Mas Bolsonaro também tem seu próprio código “alternativo”, cujo enfrentamento é a tarefa prioritária das forças democráticas no Brasil, que deverá avaliar e tomar suas próprias escolhas para vencer o confronto. Assim como o trumpismo, nos Estados Unidos, o bolsonarismo é um fenômeno que não necessariamente depende da permanência de Bolsonaro no poder: ele mobiliza parcelas consideráveis da população através de seus discursos, que defendem o conservadorismo nos costumes, o liberalismo na economia, a luta contra “o sistema”, a religião e a admiração pelo militarismo.

Será que a aposta moderada e centrista será suficiente para derrotar o bolsonarismo aqui? Mesmo que por pouco? Ou, em nosso contexto particular, faz-se necessário redobrar a aposta na radicalização pela via da esquerda? Mesmo que a vitória de Biden seja confirmada, ainda não está claro qual das duas vias parece a mais indicada para o Brasil. Enfim, tudo indica um destino trágico da democracia liberal de “pequenas maiorias” em tempos de agitação atualista. Sem negar a nossa atual realidade, cabe a nós pensar e imaginar alternativas, por mais difícil que pareça ser em nosso atual nevoeiro e impregnados por uma sensação de asfixia. Além disso, a lentidão com que a apuração avança em alguns estados decisivos promete nos deixar hipnotizados pelos mapas eleitorais na expectativa da atualização decisiva.

(*) Mateus Pereira e Valdei Araujo escreveram o Almanaque da Covid-19: 150 dias para não esquecer ou o encontro do presidente fake e um vírus real com Mayra Marques. Ambos são professores de História na Universidade Federal de Ouro Preto, em Mariana (MG). Também são autores do livro Atualismo 1.0: como a ideia de atualização mudou o século XXI e organizadores de Do Fake ao Fato: (des)atualizando Bolsonaro, com Bruna Klem. Walderez Ramalho é doutorando em História na mesma instituição. Agradecemos à Márcia Motta e ao grupo Proprietas pelo apoio e interlocução nesse projeto.


[1] https://noticias.uol.com.br/colunas/thais-oyama/2020/11/04/o-eleitor-oculto-de-trump-e-o-novo-erro-dos-institutos-de-pesquisa.htm

[2] PEREIRA, Mateus; MARQUES, Mayra; ARAUJO, Valdei. Almanaque da COVID-19: 150 dias para não esquecer, ou a história do encontro entre um presidente fake e um vírus real. Vitória: Editora Milfontes, 2020.

[3] Usamos aqui um neologismo para dar conta da diferença que em inglês é mais clara entre a produção deliberada de notícias falsas (disinformation) e sua disseminação involuntária (misinformation).

[4] https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2020/07/20/trump-muda-discurso-e-agora-diz-que-usar-mascara-e-patriotico.htm

[5] EMPOLI, Giuliano Da. Os engenheiros do caos: como as fake news, as teorias da conspiração e os algorítimos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições. São Paulo: Vestígio, 2019.

[6] https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/10/quase-sete-em-cada-dez-americanos-relatam-transtorno-do-estresse-eleitoral.shtml

[7] https://br.noticias.yahoo.com/em-pronunciamentos-biden-prega-calma-e-trump-faz-acusacao-de-roubo-065922289.html

[8] https://www.aljazeera.com/news/2020/9/12/biden-battles-trump-lack-of-enthusiasm-among-black-voters

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Feminismo

Que tal ajudar Mariana Ferrer a obter Justiça?

Não basta lacrar. Um chamamento a todas as feministas e a todas as mulheres para que enfrentemos a misoginia dos tribunais brasileiros

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A reportagem do Intercept Brasil sobre a denúncia de estupro da influencer Mariana Ferrer tornou-se viral nas redes. Sob o título JULGAMENTO DE INFLUENCER MARIANA FERRER TERMINA COM SENTENÇA INÉDITA DE ‘ESTUPRO CULPOSO’ E ADVOGADO HUMILHANDO JOVEM, o texto da repórter Schirlei Alves serviu de base para milhares e milhares de postagens sobre a excrescência jurídica que teria embasado a absolvição do empresário André de Camargo Aranha. Até as 15h30 de ontem (4/11), o Google devolvia 781.000 resultados, quando se procurava pela expressão “estupro culposo”. Memes, charges, textões e textinhos foram produzidos em escala industrial para provar que um estuprador havia conseguido sentença absolutória graças a uma invencionice jurídica obrada pela Justiça, com vistas a proteger um macho branco, amigo de poderosos e, ele mesmo, “filho do advogado Luiz de Camargo Aranha Neto, que já representou a rede Globo em processos judiciais”, segundo a reportagem do Intercept.

Lida toda a sentença de 51 páginas do juiz do caso, Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, entretanto, constata-se que, em nenhum momento da sentença é dito que houve “estupro culposo” contra a jovem. Ao contrário, é dito que não existe essa tipificação e que o estupro é necessariamente doloso. Portanto, está errada a formulação do título do Intercept Brasil.

Está tão errada que o próprio site The Intercept Brasil foi obrigado, às 21h54, nada menos do que 19 horas e 50 minutos depois de publicada a história, a fazer uma “atualização” que diz assim:

“A expressão ‘estupro culposo’ foi usada pelo Intercept para resumir o caso e explicá-lo para o público leigo. O artíficio é usual ao jornalismo. Em nenhum momento o Intercept declarou que a expressão foi usada no processo.”

O Intercept faz como a música de Tom Zé: “Eu tô te explicando pra te confundir. Eu tô te confundindo pra te esclarecer.” Uma explicação que confunde. E, sim, o Intercept disse que a sentença inédita baseou-se no “estupro culposo”.

É só ler o título indigitado de novo:

JULGAMENTO DE INFLUENCER MARIANA FERRER TERMINA COM SENTENÇA INÉDITA DE ‘ESTUPRO CULPOSO’ E ADVOGADO HUMILHANDO JOVEM

Com as redes ajudando a espalhar a bobagem, todo mundo louco atrás de cliques, de “bombar”, da lacração, poucos deram-se ao trabalho de ler a sentença que, sim, absolveu o réu André de Camargo Aranha por “falta de provas”.

Uma pena.

Se, em vez da lacração, tivessem mirado no fato em si da absolvição do crime de estupro “por falta de provas”, talvez tivessem ajudado muito mais. Sabe-se que a cada 8 minutos uma mulher ou menina é estuprada no Brasil. Mas a maior parte desses crimes jamais será nem sequer investigada pela falta de indícios e elementos probatórios, já que ocorrem escondidos e, preferencialmente, sem testemunhas.

Mariana Ferrer, diz a sentença, não conseguiu provar a acusação que fez contra André de Camargo Aranha. Será? Está na sentença que o exame toxicológico não apontou o consumo de substâncias estupefacientes, como seria de se esperar se ela tivesse ingerido involuntariamente alguma droga do tipo “Boa Noite Cinderela”. A maioria das testemunhas ouvidas, várias mulheres inclusive, disse que a vítima não cambaleava e que não parecia dopada. As câmeras internas do Café de la Musique, onde teria ocorrido o estupro, mostram Mariana Ferrer subindo para um camarote e descendo, seis minutos depois, sem necessidade de ajuda (e de salto!!!!, como faz questão de ressaltar a sentença). Teria transcorrido nesses seis minutos o crime de estupro, de que Mariana Ferrer não tem memória.

Mas Mariana Ferrer diz ter inúmeras provas irrefutáveis do estupro e que nem sequer foram levadas em consideração pelo julgador.

E, no entanto, todas as mulheres sabem da dificuldade de “provar” a violência sexual, quando ela ocorre entre quatro paredes, sem testemunhas. Mariana Ferrer não seria exceção. Nos trechos da vídeo-conferência que foi o julgamento, assombra a solidão da menina que denuncia, vítima de outros homens violentos, que a acusam de ser (ela sim), um monstro querendo prejudicar a reputação de um “pobre milionário”.

Como sempre acontece, a vítima deixa de ser vítima para se transformar no monstro sensual e ardiloso que precisa ser contido. A qualquer custo.

A verdade é que Mariana Ferrer estava sozinha.

Desde o dia em que alega ter sido estuprada (15/dezembro/2018), Mariana Ferrer tem pedido ajuda pelas redes sociais e tem narrado todo o sofrimento e a depressão que a assolam em decorrência do fato.

Quem foi ajudá-la a reunir provas? Quem foi ajudá-la a colher testemunhos que aumentassem a credibilidade de sua acusação? Quem foi ao Café de la Musique, onde ocorreram os fatos julgados, procurar indícios de que ali funcionaria um “abatedouro” de meninas destinadas ao gozo masturbatório de machos alfa? Quem?

Ou achamos razoável condenar alguém sem elementos probatórios que apoiem a denúncia?

Não, não é razoável.

Apenas a voz da vítima não pode embasar uma condenação. E quem defende isso precisa saber que abdicar de provas é apenas a reedição do velho punitivismo, é vingança. Não é Justiça. Pior, resultará na condenação sem provas dos mesmos criminalizados de sempre: os pretos, pobres e periféricos.

A única forma de evitar a perpetuação desse ciclo perverso requer de nós nós, feministas, que encaremos o estupro, cada estupro, como um problema nosso!

Temos de ajudar as vítimas a robustecer as provas da violência que sofreram. Temos de afrontar a Justiça machista, exigindo a presença de mulheres no julgamento. Tem de ser um trabalho nosso enfrentar a misoginia cuspida e escarrada de gente como Cláudio Gastão da Rosa Filho, o advogado de defesa de André de Camargo Aranha, que humilhou e ofendeu Mariana Ferrer enquanto exibia fotos dela que nada tinham a ver com o processo! Que nenhuma mulher mais tenha de enfrentar um julgamento de estupro apenas diante de homens, na solidão absoluta, como acontecia com as antigas feiticeiras.

Temos de incentivar a solidariedade entre nós, mulheres, para que acolhamos as vítimas, em vez de fingir que se trata de um problema só delas. Não há mulher ou menina que não tenha sido atacada ao menos uma vez em sua vida pela violência sexual. E nós sabemos disso em nossos próprios corpos!

É o pai, é o tio, é o avô, é o tarado que mostra o pinto para a adolescente, é o abusador que se acha no direito de ejacular na mulher dentro do trem lotado…

Temos de organizar o “Socorro Feminista”, para apoiar as mulheres que decidem denunciar a violência sexual.

Os tribunais brasileiros são câmaras de tortura contra mulheres, negros, indígenas e pobres em geral. As cenas de humilhação de Mariana Ferrer não são, infelizmente, exceções. São a regra.

É preciso atuar sobre esse front.

Então, precisamos entender que não se trata de um problema privado de Mariana Ferrer o desenlace de sua denúncia. É de todas nós!

Lembro da França, em 1971, quando uma mulher foi presa e julgada pelo crime de aborto, na época punível com a pena de morte pela guilhotina!

Em vez de “solidariedades”, textões de repúdio, e essas lacrações inúteis, 343 mulheres, entre elas as atrizes Catherine Deneuve e Jeanne Moreau, assinaram o manifesto escrito por Simone de Beauvoir, e assumindo que haviam feito, elas também, um aborto. A força desse texto e a coragem das signatárias empolgaram intelectuais como Françoise Sagan e Annie Leclerc, jornalistas conhecidas, de muitas feministas, a começar por Antoinette Fouque, da advogada Gisèle Halimi ou ainda da deputada socialista Yvette Roudy. Todas declararam ter realizado um aborto, como forma de quebrar o tabu de uma injustiça social.

A Justiça no Brasil é machista, é racista e é classista. Só incidindo juntas sobre ela será possível mudar esse regramento que sempre condena a vítima e libera o agressor.

Mariana Ferrer deve recorrer da sentença em primeira instância. Agora, é organizar a luta para mudar o rumo da História. Quem se dispõe?

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