“Choram marias e clarices no solo do Brasil”

Ato interreligioso por Vladimir Herzog reuniu 8 mil pessoas na Praça da Sé (fonte: Instituto Vladimir Herzog)

Ivo Herzog, filho de Clarice e Vladimir, o jornalista torturado até a morte pela ditadura civil-militar no Brasil em 1975, escreve nota sobre a condenação do país pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.

#ParaQueNãoSeEsqueça

#ParaQueNuncaMaisAconteça

Na última quarta-feira, 4 de julho, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil pela não investigação e falta de julgamento e punição aos responsáveis pela tortura e assassinato em 24 de outubro de 1975 do então diretor de jornalismo da TV Cultura, Vladimir Herzog. O tribunal internacional também considerou o Estado culpado pela violação ao direito à verdade e à integridade pessoal, em prejuízo dos familiares de Herzog (veja matéria do El País a respeito aqui). A versão oficial sobre a morte segue sendo a farsa, comprovada pela foto abaixo, de um suicídio (para um relato histórico do fato, acesse aqui o blog Zona Curva, de onde tiramos algumas das fotos publicadas nessa matéria). O assassinato revoltou a sociedade civil, levando milhares de pessoas a acompanharem o ato ecumênico em sua memória celebrado pelo rabino Henry Sobel (que garantiu o sepultamento do corpo dentro do cemitério israelita, o que seria proibido se ele tivesse se suicidado) e o cardeal de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns, entre outras autoridades.

A foto oficial de Herzog morto. É impossível se matar por enforcamento tendo os joelhos dobrados.

Leia a seguir a nota de Ivo Herzog:

“Choram marias e clarices no solo do Brasil”

“Há 43 anos atrás eu perdi meu pai. Assassinato violentamente. Uma pessoa de paz, que gostava de pescar, fotografar a família, de astronomia. Eu tinha 9 anos, meu irmão 7 e minha mãe 34. Ele morreu por desejar que todos tivessem o direito à livre manifestação em um Estado democrático.
Pude conhecer-lo pouco. Ficaram 43 anos de luta para que provássemos que ele foi barbaramente torturado e assassinado. Ficou a luta, capitaneada por Clarice Herzog, pela Verdade e pela Justiça.
Não encontramos esta resposta no país que meu pai adotou como pátria. Tivemos que buscar nas Cortes Internacionais.
Finalmente, hoje, saiu a sentença tão aguardada. Resultado de um processo doloroso que consumiu nossa família.
O Brasil TEM que investigar os crimes da Ditadura. O Brasil precisa ter, como política de Estado, a Verdade e a Justiça, se queremos ter um país melhor, menos violento, justo.
Agradeço ao empenho da CEJIL neste processo.
Termino agradecendo uma lutadora implacável: minha mãe que dedicou TODA sua vida para que a verdade sobre a morte do pai de seus filhos viesse a tona. E que a justiça fosse feita.
Obrigado mãe.”

O título utilizado para a nota é um verso da canção O Bêbado e a Equilibrista, de Aldir Blanc e João Bosco, que ficou super conhecida na voz de Elis Regina (veja aqui) e que além de citar a esposa de Herzog, ainda fala do exílio do sociólogo Herbert José de Souza, o Betinho, criador do Fome Zero e irmão do cartunista Henfil.

A fotógrafa Elvira Alegre, do jornal EX- registra o desespero de Audálio Dantas, presidente do Sindicato de Jornalistas do Estado de São Paulo, no velório de Vladimir Herzog. A foto só foi publicada anos mais tarde e não integrou a matéria do EX-
Lembrar esses fatos e exigir a restituição da verdade e da memória histórica do período da ditadura é fundamental para evitar novos períodos ditatoriais que nos ameaçam HOJE. Um exemplo claro é um candidato militarista que em entrevista no dia seguinte à condenação do Estado Brasileiro pelo caso Herzog novamente negou que houve uma ditadura e reafirmou que “suicídio acontece, pessoal pratica suicídio” (se tiver estômago para assistir, o trecho sobre Herzog está a partir do minuto 28. A íntegra da entrevista aqui).

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