Zé Dirceu: “Vocês estão fazendo o que o PT deveria estar fazendo!”

Por Santiago Gómez*, de Florianópolis

O ex-Chefe da Casa Civil do governo Luiz Inácio Lula da Silva, José Zé Dirceu, respondeu numa folha de caderno escolar, uma carta que o grupo de militantes Unidos Contra o Golpe (UCG) enviou para ele na prisão. Dirceu afirma que é preciso organizar as bases, reconhece que o UCG está fazendo o que PT deveria estar fazendo. Compartilha o risco de se centrar na campanha eleitoral, lembrando que deram o golpe na Dilma enquanto o partido tinha a atenção nas campanhas municipais. Pergunta: “Por que não estamos nas ruas com abaixo-assinados pela constituinte e Eleições já, ou contra os juros escorchantes?”. Salienta que o tema central é avaliar a força real.

Sem força real, social e política não vamos a lugar nenhum, repito. O PT realmente é forte, tem base social e eleitoral, Lula é Lula, mas a derrota somada à perda de apoio foi e é grande, agravada pela paralisia, em termos, natural, afinal”. Dirceu afirma que o PT tem que voltar ao governo: “para fazer reformas não só política e de renda, mas da riqueza, herança, fortuna, propriedade!”.

Em agosto de 2015 privaram, preventivamente, Dirceu da sua liberdade no marco da operação Lava Jato. É a sua terceira detenção prolongada. A primeira foi durante a anterior ditadura, a civil-militar, quando ele era um dirigente estudantil universitário; trocaram a liberdade dele e de outros companheiros pela do embaixador dos Estados Unidos do momento, Charles Elbrick. Em 2012, o condenaram a passar quase onze anos na cadeia, tirando a possibilidade dele fazer política. Concederam a prisão domiciliar em 2014 e em agosto de 2015, aqueles que não gostam das provas, mas sim das convicções, mandaram tirá-lo mais uma vez da arena política.

Dirceu respondeu uma carta enviada ao grupo Unidos Contra o Golpe, na sua maioria profissionais liberais, de esquerda, alguns do PT, outros do PCdoB, o PSOL e outros, que estão se organizando para articular força de base contra as forças golpistas, que pediram ao Dirceu uma avaliação e direção sobre o momento político do país e o plano de ação para o futuro. “Resistir e agir, denunciar e defender nosso legado, apresentar alternativas. Os exemplos citados são o caminho, as ocupações das escolas e o apoio real, concreto, dado por vocês! A ação da “Tocha Olímpica”. Essa é a luta que precisamos travar. Sem ela não vamos a lugar nenhum. (…) Temos apoio, vocês mesmos são testemunhas, 100 mil na Paulista, 40 mil no Recife, as pesquisas; agora é aprofundar as lutas, passar da resistência à ação direta, como no senado, nas vigílias, organizar o povo, seguir o exemplo dos secundaristas”.

Ante a falta de direção do PT, que Lula já cobrou no plenário de organização do próximo Congresso em junho desse ano, Dirceu destacou a burocracia do partido que não conseguiu se encontrar após o golpe. “Concordo plenamente sobre os riscos, de novo, de nos iludirmos com as eleições. É um processo difícil, por um lado é um direito e um espaço político fundamental. Lula tem chances reais. Mas, por outro lado, é um risco maior e o impeachment de Dilma diz tudo”. É preciso lembrar, que o impeachment de Dilma aconteceu enquanto a direção do PT tinha a sua atenção voltada para a possibilidade de assegurar cargos, travando, vez por outra, lutas internas.

É preciso cobrar do PT, encontrar no PT, por baixo, via horizontal, aliados, fugir da luta interna, concentrar-se na luta contra os golpistas e na mobilização, na ação, construir um programa alternativo. Ser uma força de oposição real e de pressão real entre nós, dentro de nós, “guerra aos castelos, paz nas choupanas”, salientou o dirigente, uma das pessoas que mais conhece sobre as facções do partido e as consequências das disputas internas.

Guerra aos golpistas e paz entre nós, unidade na ação, na luta, sem ilusões, mas dispostos a retomar não só o governo com luta, mas o poder, para isso, acumular forças de baixo para cima, na luta, na rua, na organização de conselhos, assembleias, reuniões, que devemos organizar para reivindicar, cobrar, dirigir e administrar, começar já organizar o poder popular!” Escreveu ele.

É bom lembrar que no último Plenário preparatório do Congresso do PT, Lula se diferenciou dos economistas do partido que consideram que o desenvolvimento é uma consequência do investimento privado e não o resultado das transferências de recursos desde o Estado aos setores populares para aumentar a demanda e movimentar o desenvolvimento.

Qual empresário vai investir onde a população não tem para comprar?”, perguntou Lula. “Para financiar o Estado de Bem Estar é preciso tributar e por fim à transferência brutal de renda social para o capital financeiro bancário via dívida interna e juros reais de 32% as empresas e consumidores”, afirmou Dirceu, mais uma vez na mesma linha que Lula.

Dirceu, fazendo uma comparação entre o golpe civil-militar e o golpe parlamentar-financeiro que estamos vivendo, afirmou: “Em 73-74, as greves recomeçaram e o MDB elegeu 16 senadores e uma bancada enorme de deputados, nem os líderes da oposição esperavam essa vitória, o povo simplesmente votou contra, como agora nas pesquisas, rejeitam Temer, querem eleições e a maioria que vota – quer Lula na Presidência”.

A carta completa

24/02/17

Consuêlo, Nina, Lenin y Mário

Minha gratidão pela presença solidária e companheira. Boas novas, saudações revolucionárias ao UCG, eu não poderia receber melhor notícia! Um grupo plural, de reflexão e ação, é tudo que necessitamos.

Resistir e agir, denunciar e defender nosso legado, apresentar alternativas. Os exemplos citados são o caminho, as ocupações das escolas e o apoio real, concreto, dado por vocês! A ação da “Tocha Olímpica”. Essa é a luta que precisamos travar. Sem ela não vamos a lugar nenhum (sic). (Desculpe a separação errada).

Não há nada a acrescentar, vocês estão fazendo o que o PT deveria estar fazendo!

Por que não estamos nas ruas com abaixo-assinados pela constituinte e Eleições Já, ou contra os juros escorchantes?

Concordo plenamente sobre os riscos, de novo, de nos iludirmos com as eleições. É um processo difícil, por um lado é um direito e um espaço político fundamental. Lula tem chances reais. Mas por outro lado é um risco maior e o impeachment de Dilma diz tudo. E vocês tocam no ponto principal sem “força real, social e política”…não vamos a lugar nenhum, repito. O PT realmente é forte, tem base social e eleitoral, Lula é Lula, mas a derrota e a perda de apoio foi, e, é grande, agravada pela paralisia, em termos, natural, afinal.

Um ano sem conseguir fazer seu congresso e eleger uma nova direção. Fazer um balanço e definir a política para o novo período histórico que se abriu com o golpe e a regressão pós-neoliberal, e austeridade tardia, o desmonte do Estado e do bem-estar social.

Assim, 18 é uma oportunidade e um risco; agora nosso centro, nossa luta é contra o golpe, por eleições já e constituinte. E a denúncia das contra reformas e da justiça de exceção, sumária e política.

A cumplicidade, omissão, anuência do STF com o golpe e as ilegalidades do aparelho policial-judicial, são gritantes. A mídia retoma seu papel, articula, faz a narrativa, mobiliza e pressiona! Serve ao poder real, aos ricos, à propriedade!

O golpe, por outro lado, tirou a legitimidade do discurso moralista dos MBL, VEM PRA RUA e associados, todos estão já nos “cargos” do governo Temer. A classe média que foi para as ruas, agora é apoiadora de Geddel, Padilha, Jucá, Moreira e cia. De Temer!

Fica evidente a operação contenção da Lava Jato, um “basta” às ilegalidades para salvar o tucanato.

O caráter golpista e anti-PT-Lula da operação não resiste à luz do dia, à verdade.

As pesquisas e Raduan Nassar expressam o momento que vivemos, são extremos que precisam se unir, viver uma catarse!

Isso mesmo. Em 73-74, as greves recomeçaram e o MDB elegeu 16 senadores e uma bancada enorme de deputados, nem os líderes da oposição esperavam essa vitória, o povo simplesmente votou contra, como agora nas pesquisas, rejeitam Temer, querem eleições e a maioria que vota – quer Lula na Presidência.

Isso explica o ódio e o rancor dos procuradores e delegados, as contradições no STF, a postura da mídia: o medo da volta de Lula e da revolta popular.

Mas voltar para o governo para quê, para além de fazer justiça, restabelecer a legalidade, a democracia? Aqui entra a força real, social e política, para fazer reformas não só política e de renda, mas da riqueza, herança, fortuna, propriedade! A tributária, urbana, bancária. No modo de produzir e viver. Na energia, nos transportes, na agricultura, para sobreviver ao risco ambiental da Humanidade. Um programa democrático revolucionário, de democracia política, participativa, comunitária, direta. Colocando sob controle social os serviços públicos, as Empresas públicas, democracia social e econômica, não só com uma tributação progressiva, mas com uma economia Estatal, mista, solidária, cooperativa e com a participação nas Empresas privadas.

Para financiar o Estado de Bem Estar é preciso tributar e pôr fim à transferência brutal de renda social para o capital financeiro bancário via dívida interna e juros reais de 32% as empresas e consumidores.

Já me alonguei demasiado e minha letra piora!

Vocês estão no caminho certo, é preciso articular com outros grupos, vou ajudar!

Tenho escrito análises e textos, vou fazer chegar a vocês.

É preciso cobrar do PT, encontrar no PT, por baixo, via horizontal, aliados, fugir da luta interna, concentrar-se na luta contra os golpistas e na mobilização, na ação, construir um programa alternativo.

Ser uma força de oposição real e de pressão real entre nós, dentro de nós, “guerra aos castelos, paz nas choupanas”.

Guerra aos golpistas e paz entre nós, unidade na ação, na luta, sem ilusões, mas dispostos a retomar não só o governo com luta, mas o poder, para isso acumular forças de baixo para cima, na luta, na rua, na organização de conselhos, assembleias, reuniões, que devemos organizar para reivindicar, cobrar, dirigir e administrar, começar já organizar o poder popular!

Temos apoio, vocês mesmos são testemunhas, 100 mil na Paulista, 40 mil no Recife, as pesquisas; agora é aprofundar as lutas, passar da resistência à ação direta, como no senado, nas vigílias, organizar o povo, seguir o exemplo dos secundaristas.

Abraços Zé

* Correspondente Agência Paco Urondo no Brasil

COMENTÁRIOS

POSTS RELACIONADOS

O direito do trabalho ainda respira

Danilo Santana, estudante Direito da PUC-SP O Direito do Trabalho ainda respira. Mesmo que esteja por aparelhos, ainda existe uma salvação, apesar dos esforços do