“Quando andei em terras sem mato grosso, sem ouro, o que encontrei foi morte, foi choro, foi falta de rima. Criança cheia de água no olho, terra lisa de árvore, gente escondida no mato pintadas de preto na cara, vermelho forte no peito e arco em punho.
Gente com medo e alerta. Gente bonita. Mulheres velhas, bem velhas, dançando como fadas, na solidão grande dos campos de cana e numa solidão de árvores. Tudo seria triste não fosse índio. Tudo seria fraco não fosse palavra e solo. Aqui é morte que encontro na busca da terra sem males.
Sinto um vazio de mim brasileiro no horizonte, uma ausência de pátria, um país não cidadão. Já não sei qual é a fronteira da razão quando crianças choram de medo diante de fazendeiro e policial, nem entendo lavoura no solo cheio de casas no meio de gente .
Em bando me recebem, índios guarani-kaiowás, cantando, em apelo, em beira de covas, corpos desaparecidos na relva, pés no chão batendo forte, pegando suave nas mãos.
Penoso entender o afeto entre a dor de tantos. Aqui solidão é palavra grande e funda , com cabaça entre os dedos. Na terra nua, limpa e desinfetada do agronegócio, surge o índio, impávidos cocares e límpidos chocalhos como armas do espírito, movimentos secretos na hora da defesa, aos quatro cantos cardeais.
Som de tratores e caminhonetes se misturam a gritos e estalidos de tiros. Em poesia pobre a imprensa local versa a dor da aldeia.
Suporta-se com paciência a cólica alheia, como bem escreveu Nelson Rodrigues em 68 citando Machado de Assis.
Bicas incorrem dentro da alma no Mato Grosso do Sul, lágrima é água salgada.