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Sarney: “eles não aceitam nem parlamentarismo com ela”

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Corremos grande risco de nos enganar quando tentamos aprofundar uma análise antes que o calor dos acontecimentos se dissipe. No entanto, é preciso correr esse risco se queremos escolher de qual lado ficar, se queremos influir no desenrolar da história.

O que conseguimos enxergar, hoje, nessa disputa pelo poder no Brasil? Vamos tentar montar um quadro com as declarações feitas sobre a presidenta Dilma nas gravações vazadas e ações que ela tomou nesses 17 meses de seu segundo mandato, especialmente no campo econômico.

Dilma teve altos índices de popularidade, em seu primeiro mandato, até as manifestações de junho de 2013. Esses eventos, ainda que não consigamos entendê-los completamente, foram muito bem organizados para terem sido espontâneos. Sua aprovação desaba, mas mesmo assim vence as eleições em 2014, já tendo a oposição da elite política e econômica, bem como de ampla parcela da classe média.

Entendemos a designação de Joaquim Levy e a linha neoliberal adotada em 2015, ajuste das contas públicas e reajustes abruptos de preços públicos no meio de uma recessão, como uma tentativa de conciliação, como um gesto de Dilma para conquistar apoio ao seu governo, após uma eleição que evidenciou a divisão entre dois projetos de país. Um projeto centrado na questão social, na diminuição de desigualdade com forte intervenção do Estado, por um lado, e um projeto privatizante com redução do Estado e de direitos sociais, por outro.

A recessão, com aumento do desemprego, e a alta inflação foram resultantes das políticas adotadas por Levy e avalizadas por Dilma. Embora passível de discussão, a recessão e a inflação foram, no mínimo, agravadas pela busca de austeridade em meio a enorme incerteza política e debilidade econômica. De todo modo, a linha de política econômica adotada faz brotar críticas daqueles que votaram em Dilma. Seu nível de apoio político atingiu níveis assustadoramente baixos. A presidenta ficou quase só.

No entanto, não sabíamos, imaginávamos, mas não tínhamos certeza, das movimentações subterrâneas que agora são trazidas à luz pelas gravações que têm sido divulgadas. As medidas contrárias aos direitos sociais adotadas pelo governo interino e as revelações gravadas culpando Dilma por não interceder nas investigações de corrupção dão as cores do golpe em curso.
Ressaltemos que nunca houve tanta liberdade para que a Polícia Federal, o Ministério Publico e o Judiciário investigassem – o governo Dilma é o primeiro a abrir tamanho espaço.

Vamos lembrar que o delator Delcídio afirmou que quem detinha o poder em Furnas era Eduardo Cunha e que Dilma o desalojou. Delcídio afirma ser essa a razão da vingança do ex-presidente da Câmara. As gravações mostram, ainda, o presidente do Senado, Renan Calheiros, revelando com grande ênfase a ira dos ministros do Supremo Tribunal Federal com a presidenta.

A crença na independência do Judiciário, cantada em verso e prosa, fica absolutamente abalada e carente de explicações, quando o ex-presidente Sarney promete a Sérgio Machado que, sem advogado, não o deixará cair nas mãos de Sérgio Moro. As cartas da operação Lava-Jato são dadas pelos mais corruptos políticos?

As gravações “acusam” Dilma, sobretudo, de ter “deixado” as investigações da Lava-Jato se aprofundarem demais. Sarney e Machado, na gravação divulgada em 25/05, concordam que Dilma não se “solidarizou” nem com Lula. As revelações da investigação atingiram fortemente o Partido dos Trabalhadores e a base de sustentação do governo e trouxeram à luz esquemas de corrupção que, de fato, viscejaram nos governos petistas. A grande imprensa e a oposição foram extremamente eficientes em criar a impressão de que havia corruptos apenas no Partido dos Trabalhadores. Aproveitaram-se da imagem já arranhada do partido por conta do mensalão.

Vamos montar o mosaico?

Dilma foi reeleita. A campanha sistemática dos meios de comunicação tradicionais mobilizou grande parte da classe média e elites econômica e política na oposição a ela. Ela tentou um programa econômico conciliador, mas perdeu apoio de quem a elegeu, sem conseguir novos apoios. Nenhuma medida que enviou ao Congresso, para fazer frente à crise econômica, foi aprovada. Sem holofotes, políticos e empresários investigados ou temerosos com as investigações tramaram sua queda. Contavam com a ira do Judiciário contra ela. “Não tem nenhuma saída para ela”, profetizou Sarney para o delator Sérgio Machado.

Não contavam, no entanto que, mesmo com críticas profundas ao Partido dos Trabalhadores, diversos setores perceberíamos o golpe. Percebemos a seletividade e a morosidade suspeitas do Judiciário, percebemos o rancor que Dilma gerou nos políticos por não impedir as investigações, percebemos o enfurecimento da elite econômica e da classe média por garantir direitos sociais aos mais pobres, percebemos quantos investigados compõem o governo interino, percebemos que a democracia está suspensa. Percebemos, com os primeiros atos do governo interino, que conquistas importantes na renda dos mais pobres, na habitação, na cultura, na saúde, na educação, estão sendo destruidas.

Percebemos o golpe e decidimos enfrentá-lo. Não tem mesmo saída para ela?

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2 Comments

2 Comments

  1. Pingback: Sarney: “eles não aceitam nem parlamentarismo com ela” | Jornalistas Livres | BRASIL S.A

  2. ALEXANDRE SOARES DE CARVALHO

    30/05/16 at 10:12

    Excelente editorial! Vocês dão aula de jornalismo e cidadania pra esta imprensa golpista que temos.

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#EleNão

Moradores da Maré são bailarinos em espetáculo com temporada na Suiça

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Foto: Andi Gantenbein, de Zurique, Suíça, para os Jornalistas Livres

Denúncias sobre os atuais tempos de antidemocracia, assassinatos da população preta, pobre e periférica e o da vereadora Marielle Franco aparecem em cartazes erguidos pelos bailarinos de “Fúria”, espetáculo de Lia Rodrigues, considerada uma das maiores coreógrafas brasileiras da atualidade e uma das mais engajadas na realidade política do país.

A foto é da noite deste sábado (16), durante apresentação do grupo brasileiro no ‘Zürcher Theaterspektakel’, em Zurique, Suíça.

No Brasil, Fúria estreou em Abril, no Festival de Curitiba. A montagem evidencia, de maneira crítica, relações de poder, desigualdades, e as interligações entre racismo e capitalismo.

O espetáculo foi concebido no Centro de Artes da Maré, na Maré, RJ. O local foi inaugurado em 2009, e o projeto nasceu do encontro de Lia Rodrigues Companhia de Danças com a Redes da Maré. Os bailarinos são moradores da favela e de periferias do RJ.

Fruto dessa mesma parceria é a Escola Livre de Dança da Maré que resiste, em meio ao caos do governo violento de Witzel contra as favelas do RJ.

 

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Temer/Kassab preparam ataque ao seu direito à Internet

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O método Temer de solapar direitos dos cidadãos brasileiros tem novo alvo: a Internet. Sem qualquer discussão prévia, os golpistas querem mudar a composição do Comitê Gestor da Internet.

A consulta pública determinada pelo governo, sem diálogo prévio com os membros do Comitê e com apenas 30 dias de duração, certamente pretende aumentar o poder e servir apenas aos interesses das empresas privadas. As operadoras de telefonia têm todo o interesse do mundo em abafar as vozes de técnicos, acadêmicos e ativistas que lutam pela neutralidade da rede, por uma Internet livre, plural e aberta.

Veja, abaixo, a nota de repúdio ao atropelo antidemocrático da consulta pública determinada por Temer/Kassab. A nota é da Coalizão Direitos na Rede que exige o cancelamento imediato desta consulta.

Nota de repúdio

Contra os ataques do governo Temer ao Comitê Gestor da Internet no Brasil

A Coalizão Direitos na Rede vem a público repudiar e denunciar a mais recente medida da gestão Temer contra os direitos dos internautas no Brasil. De forma unilateral, o Governo Federal publicou nesta terça-feira, 8 de agosto, no Diário Oficial da União (D.O.U.), uma consulta pública visando alterações na composição, no processo de eleição e nas atribuições do Comitê Gestor da Internet (CGI.br).

Composto por representantes do governo, do setor privado, da sociedade civil e por especialistas técnicos e acadêmicos, o CGI.br é, desde sua criação, em 1995, responsável por estabelecer as normas e procedimentos para o uso e desenvolvimento da rede no Brasil.

Referência internacional de governança multissetorial da Internet,

o Comitê teve seu papel fortalecido após a

promulgação do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014)

e de seu decreto regulamentador, que estabelece que cabe ao órgão definir as diretrizes para todos os temas relacionados ao setor. A partir de então, o CGI.br passou a ser alvo de disputa e grande interesse do setor privado.

Ao publicar uma consulta para alterar significativamente o modelo do Comitê Gestor de forma unilateral e sem qualquer diálogo prévio no interior do próprio CGI.br, o Governo passa por cima da lei e quebra com a multissetorialidade que marca os debates sobre a Internet e sua governança no Brasil.

A consulta não foi pauta da última reunião do CGI.br, realizada em maio, e nesta segunda-feira, véspera da publicação no D.O.U., o coordenador do Comitê, Maximiliano Martinhão, apenas enviou um e-mail à lista dos conselheiros relatando que o Governo Federal pretendia debater a questão – sem, no entanto, informar que tudo já estava pronto, em vias de publicação oficial. Vale registrar que, no próximo dia 18 de agosto, ocorre a primeira reunião da nova gestão do CGI.br, e o governo poderia ter aguardado para pautar o tema de forma democrática com os conselheiros/as.

Porém, preferiu agir de forma autocrática.

Desde sua posse à frente do CGI.br, no ano passado, Martinhão – que também é Secretário de Política de Informática do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações – tem feito declarações públicas defendendo alterações no Comitê Gestor da Internet. Já em junho de 2016, na primeira reunião que presidiu no CGI.br, após a troca no comando do Governo Federal, ele declarou que estava “recebendo demandas de pequenos provedores, de provedores de conteúdos e de investidores” para alterar a composição do órgão.

A pressão para rever a força da sociedade civil no Comitê cresceu,

principalmente por parte das operadoras de telecomunicações,

apoiadoras do governo.

Em dezembro, durante o Fórum de Governança da Internet no México, organizado pelas Nações Unidas, um conjunto de entidades da sociedade civil de mais de 20 países manifestou preocupação e denunciou as tentativas de enfraquecimento do CGI.br por parte da gestão Temer. No primeiro semestre de 2017, o Governo manobrou para impor uma paralisação de atividades em nome de uma questionável “economia de recursos”.

Martinhão e outros integrantes da gestão Kassab/Temer também têm defendido publicamente que sejam revistas conquistas obtidas no Marco Civil da Internet, propondo a flexibilização da neutralidade de rede e criticando a necessidade de consentimento dos usuários para o tratamento de seus dados pessoais. Neste contexto, a composição multissetorial do CGI.br tem sido fundamental para a defesa dos postulados do MCI e de princípios basilares para a garantia de uma internet livre, aberta e plural.

Por isso, esta Coalizão – articulação que reúne pesquisadores, acadêmicos, desenvolvedores, ativistas e entidades de defesa do consumidor e da liberdade de expressão – lançou, durante o último processo eleitoral do CGI, uma plataforma pública que clamava pelo “fortalecimento do Comitê Gestor da Internet no Brasil, preservando suas atribuições e seu caráter multissetorial, como garantia da governança multiparticipativa e democrática da Internet” no país. Afinal, mudar o CGI é estratégico para os setores que querem alterar os rumos das políticas de internet até então em curso no país.

Nesse sentido, considerando o que estabelece o Marco Civil da Internet, o caráter multissetorial do CGI e também o momento político que o país atravessa – de um governo interino, de legitimidade questionável para empreender tais mudanças –

a Coalizão Direitos na Rede exige o cancelamento imediato desta consulta.

É repudiável que um processo diretamente relacionado à governança da Internet seja travestido de consulta pública sem que as linhas orientadoras para sua revisão tenham sido debatidas antes, internamente, pelo próprio CGI.br. É mais um exemplo do modus operandi da gestão que ocupa o Palácio do Planalto e que tem pouco apreço por processos democráticos.

Seguiremos denunciando tais ataques e buscando apoio de diferentes setores,

dentro e fora do Brasil,

contra o desmonte do Comitê Gestor da Internet.

 

8 de agosto de 2017, Coalizão Direitos na Rede

 

Notas

1 A Coalizão Direitos na Rede é uma rede independente de organizações da sociedade civil, ativistas e acadêmicos em defesa da Internet livre e aberta no Brasil. Formada em julho de 2016, busca contribuir para a conscientização sobre o direito ao acesso à Internet, a privacidade e a liberdade de expressão de maneira ampla. O coletivo atua em diferentes frentes por meio de suas organizações, de modo horizontal e colaborativo. A nota está em https://direitosnarede.org.br/c/governo-temer-ataca-CGI/ .

2 Para ouvir a entrevista, à Rádio Brasil Atual, de Flávia Lefévre, conselheira da Proteste e representante do terceiro setor no Comitê Gestor da Internet, que afirma que as mudanças visam a atender interesses do setor privado e ferem caráter multiparticipativo do Comitê: https://soundcloud.com/redebrasilatual/1008-enrevista-flavia-lefevre

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FRAGMENTO E SÍNTESE

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Ligar a tv logo cedo num pequeno quarto de hotel no interior do país é desentender-se dos fatos nos telejornais matutinos. Abre-se a janela e uma menina vai à escola à beira do rio, um menino faz gol de bicicleta entre guris e o homem ergue a parede de sua casa.  Tudo tão distinto das ruas em alvoroço de protestos urbanos ou políticos insanos.  No rincão o que se busca é continuar vivo entre chuvas e trovões, sem não ou talvez. Tudo é certo. Sem modernidades calam ou arremedam nossa urbanidade, gente que se defende com pimentas e ervas, oração e vizinhança. Voz sem boca, boca sem voz, essa gente não é parte nas notícias selvagens dos jornais distantes.  Se resolvem entre cozidos, arte, bola e santos. No país de tantos cantos, muitos voam fora da asa e sem golpes entre si vão tocando suas mazelas e graça.

Mas vivemos tempos obscuros, a noite persiste em nossos avançados quinhentos e tantos anos e muitos santos. Dizem que burro velho é difícil se corrigir nos hábitos. Em manhã chuvosa na grande São Paulo, ligo a tv e o notbook, as janelas se abrem antes que a cortina deixe entrar o novo dia. Surpreendente ver na tv o deputado Jair Bolsonaro afirmando em um clube israelita na cidade do Rio, que se presidente for, não teremos mais terras indígenas no país. Ao mesmo tempo o computador expõe na rede social a opinião de meu amigo Ianuculá Kaiabi Suiá, jovem liderança do Parque Indígena do Xingu, onde leio ao som do deputado que ladra:

Jair Bolsonaro, obrigado por você existir. Graças a você, hoje, temos noção de quanto a população brasileira carece de conhecimento, decência, consciência, juízo, amor e que carrega um imenso sentimento de ódio sem saber o porque. Sim, sim, não sabem. Um exemplo? Veja a bandeira de quem te aplaude, é de um povo que, assim como nós, sofreu as piores atrocidades cometidas pelas pessoas que pensavam como você. Enfim, eu não sei se essa parcela do povo brasileiro pode ser curada, mas vou pedir para um pajé fumar um charuto sagrado e revelar se o espírito maligno que se apossou da tua alma pode ser desfeita com uma grande pajelança.

Ianuculá sabe o que diz, sabe de todo martírio vivido pelos povos originários, e mesmo assim se propõe a consultar o mundo dos espíritos.

 

É deus e diabo na terra do sol, a mesma terra que ofende também abriga e anuncia uma mostra de cinema indígena nos próximos dias. Terra de etnias e corpos na terra, a cidade maravilhosa do Rio não se calará diante do fascismo desses tempos sombrios, acompanhe.

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