“Noventa milhões em ação
Pra frente Brasil, do meu coração
Todos juntos, vamos pra frente Brasil
Salve a seleção!
De repente é aquela corrente pra frente, parece que todo o Brasil deu a mão!
Todos ligados na mesma emoção, tudo é um só coração!
Todos juntos vamos pra frente Brasil!
Salve a seleção!
(Pra Frente Brasil – Hino da Seleção Brasileira de 1970)
Durante a Copa do Mundo realizada no México, em 1970 a grande dúvida, que incomodava a parcela da população brasileira que tinha consciência política e que, portanto, se posicionava contra a ditadura, era se deveria ou não torcer ou até mesmo assistir aos jogos da Seleção Brasileira de Futebol.
A Seleção Brasileira de 1970 era a representante legítima do que havia de melhor no futebol brasileiro à época, diferentemente do que ocorre com a Seleção Brasileira dos dias de hoje.
Nomes como Pelé, Rivelino, Tostão e Carlos Alberto Torres faziam a festa da torcida nos times em que jogavam, aqui mesmo no Brasil.
Não havia, como na Seleção de hoje, os jogadores chamados de “estrangeiros”. Todos jogavam no Brasil, o que criava grande empatia com o torcedor. Qualquer pessoa na rua dizia de cor a escalação do time, inclusive dos times onde cada atleta daquela seleção atuava.
O futebol ainda não havia sido tomado de assalto pelas grandes marcas, pelos grandes anunciantes. Os atletas não tinham assinados contratos milionários, e se preocupavam mais em jogar bola do que com cortes de cabelo exóticos ou desfilar a bordo de carrões com roupas de gosto duvidoso.
Aliás nenhum daqueles atletas tinha histórico de envolvimento em escândalo de sonegação de impostos, por exemplo.
A Copa do Mundo de 1970 foi a primeira a ser transmitida pela TV, ao vivo, via satélite e em cores.
Mas vale ressaltar que a maioria dos brasileiros era bem pobre e não tinha TV, quem diria a cores.
A ditadura militar, com uma tremenda visão de comunicação de massas, organizou eventos em locais públicos, onde foram transmitidos todos os jogos, ao vivo e em cores.
Portanto a grande contradição que havia entre torcer ou não pela “Seleção Canarinho” de 1970 não estava relacionada diretamente com a qualidade técnica daquele time, que aliás era magnífica.
A contradição entre torcer ou não residia no fato de que aquela Seleção representava oficialmente o regime político do país comandado pela ditadura militar, ou seja, todo e qualquer sucesso do time era automaticamente transformado em dividendo político pela ditadura.
Não foi a toa que o ditador Médici em pessoa levantou a taça da conquista da Copa do Mundo das mãos do próprio capitão da Seleção, Carlos Alberto Torres.
O ditador Emílio Garrastazu Médici, aliás, torcedor fanático por futebol, fez questão de associar sua imagem pessoal à imagem da Seleção Brasileira, vencedora da Copa do Mundo.
A ditadura civil-militar colheu muitos dividendos com a conquista da Copa do Mundo do México em 1970. A vitória foi atribuída, mesmo que inconscientemente, à ideia de “eficiência” do regime, cuja influência se fez presente até mesmo na escalação do time que embarcou para o México.
João Saldanha, que era técnico da Seleção por méritos e aclamado por todo o Brasil, enfrentou a ditadura, fazendo valer sua decisão de não escalar Dario “Dadá Maravilha”, um centro avante mediano, mas sugestão do próprio Médici.
Resultado: foi substituído em cima da hora por Zagalo, um treinador medíocre, sem o menor brilho, absolutamente inexpressivo.
E Dadá Maravilha embarcou com a equipe.
O paralelo que busco estabelecer sobre o dilema que o torcedor de 1970 tinha e o torcedor de hoje tem, entre torcer ou não pela Seleção, é que a seleção de 1970, como narrei acima, mesmo representante da ditadura, era uma equipe que encantava, que enchia os olhos do mundo todo com seu futebol arte.
A seleção de hoje, além de ser medíocre, não tem a menor empatia com o povo brasileiro.
Suas cores e sua marca mais conhecida, a CBF, são instantaneamente relacionadas pelo povo ao golpe que roubou a democracia do país e o jogou na pior crise política de sua história.
O ídolo maior da Seleção de 1970, Pelé, nunca se apresentou como cidadão politizado, e não entrarei, pelo menos nesse artigo, no mérito de sua contribuição pessoal para a ditadura mas, diferentemente do ídolo da seleção de 2018, Pelé não contribui diretamente para a idiotização da população brasileira.
E se assim o fez, fez de uma maneira velada e quase à revelia, ouso dizer.
Em contrapartida fica impossível dissociar a imagem de Neymar, principal jogador da Seleção atual, com a imagem de sonegador de impostos, um criminoso sentado no banco dos réus, ou mesmo da em vídeo gravado junto com o amigo Aécio Neves, apoiando a candidatura daquele que em sua campanha dizia que “combateria a corrupção”, mas foi flagrado pedindo R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, além de ameaçar “matar antes da delação” o transportador da propina.
A Seleção Brasileira de 1970 ainda era a uma seleção de futebol, a despeito de ter sido cooptada e controlada pela ditadura.
Por pior que esse fato possa parecer, ainda dava para torcer por ela, valendo-se do argumento do futebol arte, do esporte enquanto cultura, do encantamento que aquele apanhado de jogadores muito acima da média exercia sobre o povo.
A seleção brasileira de 2018 é a seleção das grande marcas, a seleção do selfie, a seleção da meritocracia individual, a seleção dos escândalos, a seleção que dá manchetes pelo penteado de um jogador, ou das idas e vindas de seu relacionamento amoroso, mas que pouca ou nenhuma manchete dá por conta daquilo que seria, em tese, sua razão de existir: o futebol.
Não é uma seleção de futebol, é um grupo de representantes das marcas envolvidas no evento, meros anunciantes pagantes.
É uma Seleção que não encanta, não empolga, não emociona.
Não convence.
Vale lembrar os escândalos da CBF, que controla a Seleção, e como a imagem dessa mesma Seleção está ligada a Rede Globo de Televisão, a emissora que apoiou a ditadura que vigorava quando a Seleção de 70 ganhou a Copa, e que ajudou a desferir o golpe de 2016, quando esse arremedo de time de futebol, que alguns ainda, romanticamente, insistem em chamar de “seleção”, começou a ser convocado.
A seleção de hoje não tem empatia com o povo — quantos jogadores dessa seleção jogam no Brasil?
A verdade é que a Seleção Brasileira perdeu seu romantismo. Isso não é de hoje, mas com o golpe ficou mais aparente.
Tudo nos jogadores é falso, tudo muito estudado, tudo artificial, planejado.
São caras e bocas, sempre as mesmas declarações vazias de jogadores que jamais tomam partido sobre nada, absolutamente fúteis, alienados.
Apenas garotos propaganda de si mesmos e seus estilos de vida absolutamente inimagináveis para o povo brasileiro.
A conclusão a que chego é que acabou o amor entre a população brasileira e a seleção.
Duzentos e sete milhões sem ação
pro abismo Brasil, mas salve a Seleção!
Todos juntos vamos
pro abismo Brasil,
mas salve a Seleção!
De repente é aquela sensação de impotente
parece que todo o Brasil é um apagão
todos frustrados sem qualquer emoção
tudo é um só golpe povão
todos juntos vamos, pro abismo Brasil, Brasil,
mas salve a Seleção…
(Esse deveria ser o Hino da Seleção Brasileira de 2018)
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