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Observatório do Judiciário

O Brasil para inglês ver e o Brasil real

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Meu sucessor como presidente se coloca,
falsamente, como vítima de uma conspiração da ‘‘elite’’.
(FHC) (1)

Parece evidente que o Lula jamais será julgado de forma imparcial.
(FKC) (2)

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), 87 anos, buscou um dos arautos do capitalismo financeiro global para fustigar Lula: publicou uma matéria no Financial Times, jornal inglês, em que nega que Lula esteja sofrendo perseguição política. Nega que a democracia brasileira esteja em ruínas. Nega a vigência de um Estado de Exceção no país. Nega inconformidades no impeachment de Dilma Rousseff e no processo que condenou Lula.

O jurista Fábio Konder Comparato (FKC), 81 anos, denuncia que nunca houve democracia no Brasil. Denuncia que Lula, considerado um intruso pela oligarquia, nunca será julgado de forma imparcial. Denuncia que o Judiciário brasileiro sempre foi corrupto. Denuncia que há dois ordenamentos jurídicos no país: o oficial e o real.

Apenas uma letra (FHC e FKC) e todo um universo os diferenciam. Colocamos seus pensamentos lado a lado.

A condenação de Lula

FHC

“O ex-presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva tem todo o direito de defender o seu ponto de vista no país e no estrangeiro em relação aos processos judiciais que pesam sobre ele. Esses processos levaram à sua prisão, depois que um tribunal federal de apelação, em janeiro, manteve sua condenação por corrupção e lavagem de dinheiro.

A maneira pela qual Lula da Silva escolheu para defender-se para o mundo, no entanto, precisa ser contestada. Em um artigo recente, ele apresentou uma versão da história recente do Brasil que não carrega qualquer relação com a realidade. Isso seria um problema para os historiadores, não fosse ele o líder político influente que é.”

FKC

“A Operação Lava Jato manifestou uma estranha associação de alguns Procuradores da República com o juiz Sérgio Moro, para promover ações penais por corrupção, praticamente só contra políticos do PT e empresários a eles ligados.

A Operação acabou por provocar a destituição da presidente Dilma Rousseff pelo Congresso Nacional e a instalação de um novo governo federal, cuja atuação se destaca pela entrega de mão beijada da extraordinária riqueza das nossas jazidas de petróleo do pré-sal a estrangeiros, bem como pela redução escandalosamente inconstitucional dos direitos sociais, para benefício do grupo oligárquico dominante.

Logo a seguir, tivemos a esperada denúncia criminal do ex-presidente Lula, a fim de que ele não possa se candidatar à presidência em 2018. Atingido assim o verdadeiro objetivo da Operação Lava Jato, é de se esperar que ela venha desde logo a ser desmontada.” (FKC) (3)

O Estado de Direito

FHC

“O ex-presidente retrata o Brasil como uma democracia em ruínas, em que o Estado de Direito deu lugar a medidas arbitrárias concebidas para minar a ele e seu partido. Isso não é verdade.”

FKC

“Eu andei estudando recentemente a tradição judicial brasileira. O Judiciário no Brasil sempre foi corrupto. E isso não era dito, obviamente, pelos brasileiros, mas foi dito, sem exceção, por todos os viajantes estrangeiros.” (4)

O governo FHC

FHC

“Também não é verdade, como Lula da Silva afirma, que o Brasil estava sem rumo antes que ele assumisse a presidência em 2003. É só lembrar da bem-sucedida estabilização da economia, depois de anos de hiperinflação, que começou com o Plano Real lançado pelo ex-presidente Itamar Franco e continuado durante o meu governo. Este foi também um período marcado pela constituição de programas sociais que Lula da Silva expandiria seria posteriormente.”

FKC

“Logo no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, foram privatizadas nada menos do que oitenta empresas públicas, notadamente a Companhia Vale do Rio Doce, uma das maiores empresas mineradoras do mundo, a maior produtora mundial de minério de ferro, de pelotas e de níquel, além de produtora de manganês, ferroliga, cobre, bauxita, potássio, caulim e alumínio. (….)

Essa privatização, justificada à época pelo chamado Consenso de Washington – conjunto de dez recomendações do Fundo Monetário Internacional adotadas em 1990 – foi, na verdade, operada na bacia das almas.

Os compradores da Companhia do Rio Doce, por exemplo, beneficiaram-se de financiamento subsidiado pelo BNDES, não tendo sido levado em conta, no preço de venda das ações de controle, o valor potencial das reservas de ferro por ela possuídas, as maiores do mundo.

Contra essa operação de venda do controle público da Vale do Rio Doce foram intentadas mais de cem ações judiciais, nenhuma delas acolhida pelo Judiciário; o que bem demonstrou a submissão cabal dos magistrados à dominação da oligarquia empresarial, nacional e estrangeira.

Para completar esse quadro de completo abandono do princípio republicano e do Estado de Direito, logo no começo do seu mandato Fernando Henrique Cardoso iniciou tratativas junto ao Congresso Nacional para operar uma mudança constitucional, permitindo a sua própria reeleição como Presidente da República, incluindo nessas tratativas a compra de votos de vários deputados federais, que acabaram sendo judicialmente condenados. O Presidente, no entanto, saiu ileso de todo esse criminoso episódio, não tendo contra ele sido intentado em juízo procedimento algum.” (5)

Sobre a democracia brasileira

FHC

“Sua versão das últimas décadas da história brasileira é peculiar, na qual ele às vezes aparece como o salvador do povo e, por vezes, como vítima de uma conspiração da ‘elite’. Sua versão propicia, inadvertidamente, a deslegitimação do esforço coletivo que é o fundamento da democracia brasileira.”

FKC

“O governo verdadeiro da democracia, que nunca, jamais, em momento algum, vigorou no Brasil, é o regime político em que a soberania, ou seja, o poder supremo, pertence a quem? Ao povo. Acontece que a burguesia, muito mais inteligente, do que a gente imagina, já desde o século XVIII aceitou essa ideia, mas debaixo do pano era ela que dava as cartas no regime da chamada democracia representativa.” (6)

O impeachment de Dilma

FHC

“O impeachment e deposição da presidente Dilma Rousseff do cargo em 2016 não foi, ao contrário do que Lula da Silva afirma, um golpe de Estado. Foi o resultado de, entre outras coisas, a violação do seu governo de lei de responsabilidade fiscal do Brasil no período imediatamente anterior à eleição 2014.

O processo de impeachment seguiu todas as conformidades constitucionais, sob a supervisão do Supremo Tribunal brasileiro, no qual a maioria dos ministros foi nomeada por Lula da Silva e Dilma.”

FKC

“Haveria alguma personalidade com mais chances do que ele [o juiz Sérgio Moro] para enfrentar politicamente Luiz Inácio Lula da Silva?

Acontece que nenhum magistrado pode candidatar-se a algum posto eletivo no Brasil. Só restava, portanto, uma saída, que era inviabilizar a própria candidatura potencial de Lula, mediante a sua condenação criminal. Foi o que fez Sérgio Moro em sentença prolatada em julho de 2017. Logo em seguida, em flagrante violação de seus deveres de magistrado (Lei Complementar n. 35, de 14.03.1979, art. 36, III), o Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que atuou como segunda instância no respectivo processo, teceu publicamente rasgados elogios à sentença condenatória.

Não foi essa, porém, a única condenação criminal a Lula, como não tardou a se verificar.

Nesse meio tempo, nossos oligarcas prepararam e executaram em 2016 o afastamento de Dilma Rousseff da presidência da República, por meio de manobras ilegítimas, com a conivência do Ministério Público e do Poder Judiciário. O proveito para a oligarquia brasileira e o Estado norte-americano foi imediato e conspícuo, como se verá mais abaixo.” (5)

O devido processo

FHC

“A minha crítica não é motivada pelo antagonismo pessoal. Lula da Silva e eu lutamos juntos contra o regime autoritário que dominou o Brasil entre 1964 e 1985. Na sequência, quando concorremos como adversários em eleições democráticas, eu mantive uma relação construtiva com ele.

Lamento que o ex-presidente enfrente acusações adicionais de corrupção e lavagem de dinheiro. Mas o fato é que os processos judiciais em que ele esteve envolvido seguido o devido processo e foram realizadas em conformidade com a Constituição e o Estado de Direito.”

FKC

“Os grandes burocratas casavam-se com as filhas dos grandes fazendeiros, dos grandes senhores de engenho (…) O dinheiro público era considerado um patrimônio próprio desta sociedade, de grandes agentes estatais e grandes empresários. (…) Afinal das contas, é todo um velho costume. Acontece que a operação Lava Jato, como eu disse antes, ela veio entrar nesse campo e atacar esse velho costume. E, a meu ver, isso foi necessário para desmoralizar os petistas e os governantes ligados ao petismo. Mas, ao final das contas, teve um lado negativo para eles, americanos e seus asseclas brasileiros: é que ficou evidente que, ao final das contas, isso aqui não começou ontem com o Lula, vem de séculos.” (4)

Efeitos “colaterais” da operação Lava Jato

FHC

“O caso de Lula da Silva não é um caso isolado. No Brasil, existem os políticos de todos os partidos na prisão, muitos dos quais tiveram condenações mantidas por um tribunal de apelações. Entre eles incluem-se membros do meu próprio partido, o PSDB.”

FKC

“O que, porém, ninguém previra foi o espraiamento da Operação Lava Jato, de modo a atingir individualmente os próprios oligarcas; inclusive o Presidente da República, fato sem precedentes em nossa história republicana. Denunciado criminalmente duas vezes pelo Procurador-Geral da República, Michel Temer teve que prodigalizar uma ampla distribuição de benesses aos deputados federais, a fim de barrar o início do processo penal perante o Supremo Tribunal Federal. Tudo isso, enfim, parece assegurar que, segundo todas as probabilidades, a coligação oligárquica tradicional permanecerá como titular da soberania em nosso país durante um tempo indefinido.” (5)

Sobre o cumprimento de pena quando ainda cabe recurso

FHC

“O precedente para a prisão após uma condenação ser mantida por um tribunal federal de apelações decorre de um acórdão do Supremo Tribunal que é muito anterior à condenação de Lula da Silva. Pessoas condenadas começam a cumprir sua sentença sem que isso afete o seu direito de recorrer aos tribunais superiores.”

FKC

“O preceito fundamental da presunção de inocência, assegurado pelo art. 5º, incisos LVII e LXI, da Lei Maior, está sendo lesionado pela Presidente dessa Suprema Corte diante da insistente recusa de pautar o julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 54 – na qual se busca ver reconhecida a necessidade do trânsito em julgado de sentença condenatória para o início do cumprimento de pena, exatamente como previsto no Texto Constitucional.” (FKC e mais quatro juristas em petição ao STF) (7)

Sobre a (in)elegibilidade de Lula

FHC

“Além disso, a inelegibilidade de Lula da Silva para concorrer à presidência nas próximas eleições é resultado de uma iniciativa popular que recebeu mais de 1 milhão de assinaturas, foi aprovada pelo Congresso e assinado em lei por ele mesmo em 2010. A chamada Lei da Ficha Limpa, resultante de uma campanha da sociedade civil contra a corrupção, proíbe qualquer pessoa condenada por um tribunal de apelações de concorrer a um cargo eletivo.

A iniciativa popular que resultou na lei foi uma resposta direta ao escândalo do Mensalão, um esquema fraudulento de compra de descoberto em 2005. O desmantelamento desse esquema de corrupção não impediu outro, ainda maior, de ser perpetrado em alguns dos maiores empresas estatais, notadamente Petrobras. A investigação sobre este escândalo, conhecido como Lava Jato ou “Car Wash”, descobriu um esquema para desviar bilhões de dólares para Partido dos Trabalhadores de Lula da Silva.”

FKC

“No Brasil, desde a colonização até agora, existem dois ordenamentos jurídicos. Existe o ordenamento oficial, que em grande parte não é aplicado. E existe o ordenamento jurídico real, que é dado nas suas grandes decisões justamente pelos oligarcas. Na Constituição de 88 introduziu-se o plebiscito e o referendo. E um jurista que é mais ou menos conhecido no meio jurídico propôs, ao Conselho Federal da OAB, uma lei para regulamentar o plebiscito e o referendo. Evidentemente que essa lei nunca foi aprovada. Por quê? Porque o plebiscito e o refendo existem no ordenamento oficial, como mostra para o estrangeiro, ‘nós somos um povo civilizado, democrata etc.’, mas não pode existir na realidade.” (6)

O momento atual do Sistema de Justiça brasileiro

FHC

“O Brasil está passando por um processo doloroso mas necessário de remoralizar a sua vida pública, e as ações do Ministério Público Federal e do Poder Judiciário fazem parte deste processo.

Nem sempre me sinto confortável com as penas impostas ou com a expansão das detenções preventivas, em que o acusado é preso antes mesmo de seu primeiro julgamento em um tribunal inferior.”

FKC

“Como era de se esperar, os bons resultados das políticas implementadas pelo Governo Lula não deixaram de inquietar o poder oligárquico. Aproveitando-se do controle oligopólico que exerce há décadas sobre os meios de comunicação de massa, ele centrou seus ataques nos casos de corrupção ou prevaricação envolvendo ministros, que foram obrigados a deixar seus cargos.

Malgrado tais percalços, no entanto, o apoio popular a Lula não cedeu durante ambos os mandatos. Ao final do primeiro deles, em dezembro de 2006, uma pesquisa do Instituto Datafolha indicou que 52% dos entrevistados consideravam o seu governo ótimo ou bom; e em março de 2010, no último ano do segundo mandato, essa percentagem havia aumentado para 76%. Tais fatos voltaram a inquietar sobremaneira nossos oligarcas.” (7)

O país de FHC e o país de FKC

FHC

“É uma grave distorção da realidade, no entanto, para dizer que há uma campanha segmentada no Brasil para perseguir indivíduos específicos. O meu país merece mais respeito.”

FKC

“Durante anos … eu estou com 81 anos, até mais ou menos os 75 ou 76 anos, eu tinha esperança nesse país. Confesso que agora não tenho mais. É claro que a história é sempre feita de imprevistos e é possível que surja um imprevisto qualquer, a morte súbita de alguém ou um acontecimento extraordinário, mas dentro dos cânones constitucionais, eu não vejo saída.”

“Mas, então, por que o senhor continua?” Perguntou Rodolfo Lucena.

“Porque eu acho que tenho o dever de denunciar. Denúncia é importante. Se não produzir efeitos imediatos, ela acaba produzindo efeitos futuramente. E ela serve de exemplo. Eu disse que a mentalidade coletiva só se muda através de uma educação pública e educação pública organizada durante gerações, mas essa educação pública organizada durante gerações, ela é também estimulada pela denúncia. Porque se o crime coletivo ficar evidente para a população, os oligarcas não poderão escondê-lo. Eles vão tentar levar a coisa ao máximo que puderem sem cair no abismo, mas o que eu não sei é quando isso vai se dar.” (4)

Notas

1 Todas as citações ao ex-presidente FHC foram extraídas do artigo Lula da Silva’s vision of Brazil is a damaging fiction:
https://www.ft.com/content/7775bddc-a46c-11e8-a1b6-f368d365bf0e

2 Comparato: ‘Parece evidente que Lula jamais será julgado de forma imparcial’: https://www.redebrasilatual.com.br/politica/2018/07/comparato-parece-evidente-que-lula-jamais-sera-julgado-de-forma-imparcial

3 Contra o absolutismo do Judiciário, o controle social. Entrevista com Fábio Konder Comparato:
http://www.ihu.unisinos.br/noticias?id=560415:contra-o-absolutismo-do-judiciario-o-controle-social-entrevista-especial-fabio-konder-comparato-2&catid=159

4 Comparato fala a Tutameia sobre julgamento de Lula: https://youtu.be/wM2Csu4Ei68

5 Comparato: 2016, a grande revanche oligárquica:

Comparato: 2016, a grande revanche oligárquica

6 Prof Fábio Konder Comparato A oligarquia brasileira ao longo da história: https://www.youtube.com/watch?v=qyBr8cEjV_8&feature=youtu.be

7 Medida Cautelar na Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 54: https://www.conjur.com.br/dl/adpf-pt-pcdob-omissao-carmen-lucia.pdf

8 Essa matéria recebeu o selo 024-2018 do Observatório do Judiciário.

9 Para ler outras matérias do Observatório do Judiciário:
https://jornalistaslivres.org/categoria/observatorio-do-judiciario.

Ação Humanitária

Miguel: quantos como ele correm perigo nas casas das patroas de suas mães?

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https://www.youtube.com/watch?v=sMvyTtB070M

Se nesse momento a história da trágica morte do menino negro, Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, filho da empregada doméstica, Mirtes Renata Santana da Silva, fosse inversa em todas os seus detalhes: se ele fosse o filho branco da patroa, Sari Mariana Gaspar Corte Real, e tivesse morrido depois de despencar do 9º andar por desleixo e irresponsabilidade da empregada doméstica, certamente essa mulher negra estaria, neste exato momento, encarcerada.

Miguel Otávio Santana da Silva, 5 anos de vida, é vítima do racismo arraigado na vida cotidiana de pessoas como Sari, uma mulher que, ironicamente, possui sobrenome supremacista branco “CORTE REAL”.

Mas esse não é o pior dos detalhes. Nesse episódio trágico, a imprensa pernambucana, majoritariamente branca, portanto “limpinha”, não quis desagradar a mulher do prefeito da cidade de Tamandaré, Sérgio Hacker (PSB).

Até agora não há sequer uma menção realmente incisiva sobre a responsabilização de Sari na morte do menino.

O mesmo aconteceu com o delegado Ramón Teixeira, que acolheu o caso inicialmente. Preferiu preservar a identidade de Sari Mariana Gaspar Corte Real.

Sari não dispensou Mirtes por causa da pandemia. Sari não quis limpar sua própria merda, não quis varrer seu chão, não quis colocar  suas roupas na máquina de lavar, não quis cozinhar sua própria comida. Sari não quis levar seu cachorro para passear. Sari colocou a vida de sua empregada em risco, exposta à COVID-19. Sari matou o filho de Mirtes.

Que tipo de gente é essa?  Miguel, 5 anos, queria ver a mãe, que saiu para levar o cachorro da patroa a passear. Insistiu, fez birra, como qualquer criança faria. E não se curvou ao racismo de Sari. Por isso entrou no elevador. Por isso foi ao nono andar. Sozinho, porque Sari não se importa, não se importou com o fato de ele ser um menino. Ele era filho da empregada, não era nada. E ele caiu do nono andar. Ele morreu. Quando um filho morre, a mãe é a primeira que desce à cova. Era um filho negro. Na casa da patroa branca. A mãe negra, a empregada, não percebeu isso ainda. Em meio à dor, em estado de choque, ela humildemente lamenta a “falta de paciência” da patroa assassina.

Miguel

Miguel com sua mãe, Mirtes. Ao lado, Sari Corte Real, a patroa que colocou a empregada e seu filho em risco.

O FATO – O menino foi vítima de homicídio na terça-feira (2). Caiu do 9° andar da sacada de um prédio de luxo no Centro do Recife, em Pernambuco, conhecido como Torre Gêmeas. A informação inicial era de que, na hora do acidente, a empregada estaria trabalhando no 5° andar do prédio, mas hoje foi revelado que, na verdade, a empregada estava cumprindo a função de passear com os cachorros da família, enquanto a patroa cuidava de Miguel. Sari foi presa inicialmente, mas pagou uma fiança de R$ 20 mil e responde em liberdade, mesmo depois da divulgação de vídeos mostrando que Sari colocou Miguel sozinho no elevador de serviço, o único que dava acesso para a área desprotegida da qual o menino despencou para a morte. Os elevadores para pessoas como Mirtes e seu filho, na prática, ainda são diferentes no Brasil. E foi lá que a patroa o deixou.

Apartamento onde Miguel estava

Planta de um apartamento no prédio de luxo de Sari, marcado por corrupção e tragédia

 

Um corpo negro que vale 20 mil reais? Realmente vivemos um pesadelo legitimado pela racismo institucional do judiciário

Liana Cirne Lins, professora da Faculdade de Direito da UFPE, relatou em suas redes sociais que muitos têm defendido a tese de que, inclusive, houve homicídio DOLOSO, configurando dolo eventual. “Afinal, que adulto coloca uma criança de cinco anos, que está chorando pela mãe, sozinha, num elevador, e não calcula a possibilidade de um acidente?” Miguel não tinha intimidade com elevadores. Morava com os pais em uma casa pobre, num bairro humilde.

Sari sabia dos riscos e não faria o mesmo com os próprios filhos. Aliás, essa é uma pergunta que gostaríamos de fazer à patroa de Mirtes: como você acabaria com a birra de seus filhos?

Certamente Sari não os colocaria em risco. O centro desse debate é, sem dúvida, a herança de nossa cultura escravocrata e racista.

Outra declaração importantíssima de Liana Cirne é sobre o local e a data simbólica do homicídio: “O local é nas famigeradas Torres Gêmeas, esse lugar horroroso que tem essa energia do mal, do crime, da corrupção. Elas são um aborto em nossa paisagem e cenário de vários escândalos, desde que a [construtora] Moura Dubeux as ergueu, entre liminares. Nesse momento, mais do que em outros, queria que a sentença demolitória do juiz Hélio Ourém tivesse sido executada. Sobre a data: Miguel morreu no dia em que a PEC das Domésticas completou cinco anos! E é assim que se celebra o aniversário da legislação de proteção das Domésticas, o que diz muito sobre nosso país, que não superou sua herança escravagista.”

Os Jornalistas Livres se solidarizam demais, profundamente, com mais esse fato absurdo, horroroso, que tem como alimento o racismo.

Miguel, presente!

 

 

 

Leia mais sobre o racismo que mata no Brasil:

A Polícia de Wilson Witzel matou João Pedro, um jovem estudante. Ele poderia ser seu filho

 

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Democracia

Juízes paulistas chamam ato dia 21/1 a favor da justiça do trabalho

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Do site da Amantra-2

 

Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região – AMATRA-2, maior entidade regional da magistratura da Justiça do Trabalho, diante das declarações do Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, sobre a possível extinção da Justiça do Trabalho, esclarece à sociedade brasileira que:

1) a Justiça do Trabalho existe há mais de 70 anos e mantém êxito na pacificação social entre os interesses dos trabalhadores e das empresas, pois ao aplicar os direitos sociais trabalhistas, conserva a ordem no conflito de classes;

2) em toda sua história, também cumpre papel fundamental para a erradicação do trabalho escravo e do trabalho infantil, além de garantir a responsabilização pelos acidentes do trabalho (mais de 1.500 por dia em 2017 – AEAT de 2017), triste destaque do Brasil no cenário mundial;

3) no decorrer de sua atuação, o Brasil alcançou o menor índice de desemprego da história (4,3% em dezembro/2014 – IBGE), o que demonstra não haver qualquer correlação entre a atual crise do mercado de trabalho e a Justiça do Trabalho;

4) a Justiça do Trabalho está presente em diversos países do mundo, como: Reino Unido, Alemanha, França, Itália, Portugal, Espanha, Bélgica, Austrália, entre outros.

5) atualmente, é o ramo do Poder Judiciário mais célere e eficaz no cumprimento de suas funções constitucionais;

6) a magistratura do trabalho se capacitou em tempo recorde para melhor atender toda a sociedade brasileira, diante das mudanças advindas da reforma trabalhista.; e

7) por todas essas razões, conclui que as declarações de início de mandato do Presidente da República merecem maior reflexão e conhecimento sobre o tema, porque não há como conceber a evolução de uma ideia contrária aos interesses de toda a Pátria brasileira.

8) Aproveitamos para convidar a todos os integrantes da magistratura e sociedade civil para debatermos sobre o tema no evento conjunto em favor da Justiça do Trabalho que ocorrerá em frente ao Fórum Ruy Barbosa, no dia 21/01/2019, às 10 horas.

São Paulo, 06 de janeiro de 2019.

Farley Roberto Rodrigues de Carvalho Ferreira

Presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região

Veja evento no facebock  do ato publico contra a proposta do novo governo de fechar a Justiça do Trabalho:

https://www.facebook.com/events/359376608190217/

Frente Associativa da Magistratura e do MP divulga nota pública em defesa da Justiça do Trabalho

NOTA PÚBLICA

A FRENTAS – Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público, congregando mais de 40 mil juízes e membros do Ministério Público, com respeito às declarações feitas pelo presidente da República Jair Bolsonaro, em entrevista divulgada nesta quinta p.p. (3/1), vem a público manifestar-se nos seguintes termos.

  1. Não é real a recorrente afirmação de que a Justiça do Trabalho existe somente no Brasil. A Justiça do Trabalho existe, com autonomia estrutural e corpos judiciais próprios, em países como Alemanha, Reino Unido, Suécia, Austrália e França. Na absoluta maioria dos países há jurisdição trabalhista, ora com autonomia orgânica, ora com autonomia procedimental, ora com ambas.
  2. A Justiça do Trabalho não deve ser “medida” pelo que arrecada ou distribui, mas pela pacificação social que tem promovido ao longo de mais de setenta anos. É notória, a propósito, a sua efetividade: ainda em 2017, o seu Índice de Produtividade Comparada (IPC-Jus), medido pelo Conselho Nacional de Justiça, foi de 90% (noventa por cento) no primeiro grau e de 89% (oitenta e nove por cento) no segundo grau.
  3. A Justiça do Trabalho tem previsão textual no art. 92 da Constituição da República, em seus incisos II-A e IV (mesmo artigo que acolhe, no inciso I, o Supremo Tribunal Federal, encabeçando o sistema judiciário brasileiro). Sua supressão – ou unificação – por iniciativa do Poder Executivo representará grave violação à cláusula da independência harmônica dos poderes da República (CF, art. 2º) e do sistema republicano de freios e contrapesos. O mesmo vale, a propósito, para o Ministério Público, à vista do que dispõe o art. 128 da Carta, em relação à iniciativa ou aval da Procuradoria Geral da República. Em ambos os casos, ademais, esforços de extinção atentam contra o princípio do desenvolvimento progressivo da plena efetividade dos direitos sociais, insculpido no art. 26 do Pacto de San José de Costa Rica, de que o Brasil é signatário.
  4. Por tais razões, a FRENTAS repele qualquer proposta do Poder Executivo tendente à extinção, à supressão e/ou à absorção da Justiça do Trabalho ou do Ministério Público do Trabalho, seja pela sua inconstitucionalidade, seja pela evidente contrariedade ao interesse público.

GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO}

Presidente da ANAMATRA – Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho e Coordenador da FRENTAS

FERNANDO MARCELO MENDES

Presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasileiro (Ajufe)

VICTOR HUGO PALMEIRO DE AZEVEDO NETO

Presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp)

JAYME MARTINS DE OLIVEIRA NETO

Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB)

ÂNGELO FABIANO FARIAS DA COSTA

Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT)

ANTÔNIO PEREIRA DUARTE

Presidente da Associação Nacional do Ministério Público Militar (ANMPM)

ELÍSIO TEIXEIRA LIMA NETO

Presidente da Associação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (AMPDFT)

FÁBIO FRANCISCO ESTEVES

Presidente da Associação dos Magistrados do Distrito Federal (Amagis-DF)

 

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Observatório do Judiciário

Feliz Natal, presidente Toffoli?

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Definitivamente Toffoli passou para a história do Brasil como o ministro presidente do STF que, no mesmo dia, cometeu 2 grandiosos absurdos.

O primeiro foi não concluir, no último dia de trabalho dos ministros do STF, nesse mês do natal de 2018, a votação sobre a medida liminar que suspendeu o indulto de natal do ano passado. Proceder a votação da dita liminar teria levado menos da metade do tempo que gastou a PGR para se auto vangloriar no seu hipócrita discurso.

O segundo grandioso feito de Toffoli no mesmo dia, foi caçar (termo mais apropriado que cassar) a liminar deferida pelo ministro Marco Aurélio que, de fato, é o único que luta pela sobrevivência da Constituição.

A grandiosidade dos feitos do presidente do STF, Dias Toffoli, não será esquecida.

Especialmente por que daqui a poucos dias será dia de natal e milhares se lembrarão dele – seja quem por direito não deveria estar preso, seja quem, por consequência do direito do presidente da República, já deveria ter passado o ano de 2018 indultado, ou seja, livre.

O presente de natal dado antecipadamente por Toffoli é arrasador. É a prisão, é manter milhares de pessoas presas. Até as cartas de súplicas escritas pelos presos, Toffoli não quis mais ler. Dias atrás, ordenou que não fossem mais entregues no endereço do STF. Assim, lavou as mãos e, sem o menor constrangimento, decretou o natal sem decreto de indulto natalino… do ano passado.

Paz, palavra tão utilizada nos dias em torno ao dia de natal, será difícil se concretizar. Já se mostrou, de fato, impossível nas viagens de avião, dado os pedidos para chamar a polícia federal para calar os atrevidos que perderam o pudor de achincalhar ministros do STF. Se assistindo a esses achincalhes atrevidos ficávamos constrangidos, nos colocando no lugar do indivíduo caçoado, agora não temos mais dúvida e muito menos pena – ministros do STF, comprovadamente, estão fazendo por merecer.

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