Eu tenho um político de estimação

Nathaly Munarini em Brasília – novembro de 2016 na manifestação contra a PEC 55.

Aos 8 anos eu me vi inserida na política. Meus pais eram da articulação do PT aqui na cidade e eu era aquela criança que corria entre vereadores, professores, sindicalistas, prefeito e pessoas do partido. Ia a todos os comícios, reuniões, enxerida desde pequena, eu queria saber o porque do porque do porque e quem é. E todos me falavam. Me ensinavam. Meu pai, professor, sempre com a orientação política de esquerda, me dizia como aconteciam as coisas e era muito honesto quanto suas posições políticas.

Um fato me marcou muito. Antes do Lula ganhar em 2002, eu ouvi meus pais dizerem ”a Nathaly infelizmente não fará faculdade, a não ser que ela estude muito, a gente nunca vai conseguir pagar os estudos pra ela, vai ser difícil.” Eles não sabiam que eu estava atrás do armário brincando. Até hoje acho que eles não sabem. Eu nunca vou me esquecer daquilo.

Eu era, definitivamente, uma criança nascida e criada no seio político. E eu me apaixonei pelo Lula. Quem me conhece, sabe. Sabe como eu gosto dele por N motivos. É claro que em relação a sua passagem como presidente, eu tenho inúmeras críticas. Muitas mesmo. Algumas delas, coloca em cheque a minha crença de que de fato, ele governou pra esquerda. Isso é doloroso de admitir, mas é um exercício necessário pra nossa formação crítica-ideológica sobre política. Mas há enormes recortes e análises a serem feitos. E agora eu vou falar, pessoalmente, sobre eles.

Numa entrevista da Dona Marisa em 2002, ela disse que ao chegarem em Brasília pela primeira vez, ela disse ao Lula: ”Querido, tem certeza de que você quer isso? Que quer enfrentar esses caras? Eles vão engolir você!”. Ela disse ao entrevistador, que Lula estava com uma camiseta do sindicato, uma calça simples e um sapato que usava para trabalhar, muito simples, como sempre andava. Mas ela também disse, que quando falou isso pra ele, ela olhou nos olhos dele e ele não disse nada. Os olhos dele estavam brilhando, como nunca haviam brilhado antes. Ele nem sequer escutou o que ela disse. Com toda certeza, era óbvio que ele não iria desistir. Ele continuou, e todo o resto, nós sabemos.

Não estou aqui para falar sobre as minhas críticas ao seu governo e sobretudo sobre o PT. Isso eu deixo pra outra oportunidade. Sou humana, e hoje o que me toma, é a emoção e o sentimento.

É, eu amo o Lula. Aquele cara que quase me fez fugir de casa quando veio para Dourados. Minha mãe sabia que eu era muito maluquinha e não me deixou ir no acampamento Itamarati com os colegas da família. Eu chorei o dia inteiro.

Eu nasci numa época que meus pais não tinham nem ideia de quando poderiam ter um carro. A gente não viajava, não comia coisas gostosas, não tinha pequenos luxos. A gente não passava necessidade, mas sabíamos muito bem do nosso lugar na sociedade.

Eu queria estudar na Universidade, eu queria muito fazer faculdade. E quando ele ganhou, tudo que era muito difícil e inacessível, se tornou real, se tornou possível. Se tornou verdade. Conseguimos ter o que a gente nem sonhava em ter. Um carro. Um terreno comprado com dinheiro ”vivo”. Eu na escola com esperança nas Universidades que estavam sendo construídas. O Brasil saindo do mapa da fome. As mulheres conquistando direitos, com tanta dificuldade. Eu nunca vi minha família tão feliz. As minhas vontades, é claro que continuavam, a gente nunca foi rico.
Mas agora a gente se sentia parte de uma sociedade que era nossa. A gente era gente de verdade.

Eu sempre fui privilegiada por estudar em escolas particulares. Eu ganhava bolsa de estudos porque sempre fui atleta e tinha notas muito altas. Mérito? Não pra minha concepção.
Eu simplesmente tive uma oportunidade que condizia com minha educação, que mesmo sem luxos, era a necessária.

Eu era agradecida por tudo isso. Eu não entendia nada sobre política. Nada mesmo. Nada do que entendo hoje. Eu nem sequer compreendia a questão de direita/esquerda. Mas eu sabia quem eu era na sociedade. E sabia que era de uma classe baixa. Eu tinha consciência de que pra ter o que os meus colegas tinham, era preciso muito mais esforço. E eu sabia que naquele momento, algo estava caminhando para que essas diferenças não fossem mais tão discrepantes.

Tudo isso, eu compreendi no governo do Lula. Falem o que quiserem, não existiu governo que mais olhou pra nós, pobres, classe média, classe média alta. Nós saímos do mapa da fome. Nós conseguimos ter Universidades. Nós conseguimos viajar de avião e ter um carro. Isso ninguém vai conseguir me convencer do contrário. NINGUÉM.

É claro que não consigo ultrapassar minha noção de justiça e jamais passaria a mão na cabeça dele se tudo isso que dizem fosse verdade. Eu só acho que do jeito que as coisas procederam, há algo muito errado. Há uma nítida perseguição. Há um desespero intenso em incriminar um ser humano. E isso eu jamais vou aceitar.

”Mas ah, e se conseguirem provar?” Se conseguirem de fato provar, sem utilizar desses mecanismos fajutos e sórdidos, pode ter certeza, eu serei uma das primeiras a chorar. E levando em conta toda a atual conjuntura política, judiciária e do nosso executivo, ainda que consigam provar algo, eu vou duvidar. Porque só estão perseguindo ele. E a Justiça é cega. Não perseguidora.
A Marisa disse na entrevista, que quando eles chegaram em Brasília, nos anos 80, muitos falavam ”quem ele pensa que é?”

”Um sindicalista, nordestino e analfabeto!”

E hoje só consigo pensar, quem ele pensou que era? Quando sua própria companheira advertiu-o sobre o risco que corria. Quando todos os calhordas da elite acusavam de comer criancinhas, quando ele sabia de onde estava vindo e da luta que começava a solidificar a partir de seus impulsos. Quem o Lula pensou que era para quebrar a lógica da extrema direita e colocar um cara como ele no Congresso Nacional? Na Presidência?

Eu só queria dizer essas coisas no dia de hoje. Não quero ataques, nem ofensas. Adotem o político de vocês e escrevam textões sobre eles.
A diferença é que eu tenho um político de estimação e tenho coragem de me posicionar de maneira clara e concisa. Deixo os bandidos de estimação pra vocês!

*Nathaly Munarini é formada em Direito na UFGD – Universidade Federal da Grande Dourados, militante e ativista de esquerda.

COMENTÁRIOS

2 respostas

  1. Lindo texto! Gostaria de te-lo escrito. Talvez com uma história diferente, mas consciente do que foi melhorado na vida das pessoas. Por isso eu também tenho um político de estimação Lula lá!

  2. Que belo e emocionante texto!!! Humano, demasiado humano, Nathaly Munarini — e que faz lembrar daquela estudante. também de Dourados-MS, que num comício do PT em Campo Grande, pediu ao Lula uma Universidade para a nossa cidade. Lembra disso? Claro, você sabe o que aconteceu, e que a Universidade Federal é uma realidade. Parabéns pela coragem de prestar esse feliz depoimento.

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