Bruno Falci, historiador e membro do Jornalistas Livres, de Lisboa, comenta a situação da epidemia de coronavírus em Portugal
Talita: Portugal vive hoje algo parecido com o Brasil. Não há uma quarentena imposta, mas as pessoas precisam praticar esse isolamento. Como tem sido aí para você?
Bruno: A quarentena não é obrigatória em Portugal, mas o governo decretou estado de emergência justamente para ter legalmente uma brecha e poder aplicar essas medidas que são consideradas inconstitucionais. Por exemplo: obrigar as pessoas a ficarem em casa ou também fechar todas as instituições públicas como portos, aeroportos, fronteiras, escolas, universidades. Enfim, como tem acontecido aqui, em diversos países da Europa.
É bom lembrar que a Itália superou o número de mortos da China, e a França, como a Espanha e outros países tem adotado medidas drásticas contra a epidemia. Portugal já contabiliza três mortos e 785 casos. O país tomou medidas muito cedo, antecipadamente. Portanto, o crescimento aqui tem sido mais controlado. Ainda não é necessário que o estado aplique essas medidas que são permitidas no estado de emergência. Mas o cotidiano de todos mudo aqui completamente, o meu inclusive. A minha universidade foi fechada e eu faço aulas por videoconferência em casa. Todas as outras universidades adotaram o mesmo procedimento. As escolas também estão fechadas, o que impede os pais de irem trabalhar.
Na verdade, essa crise epidêmica tem criado muitos problemas para um setor da sociedade que são os imigrantes. Essa é a população mais afetada pela crise, tanto na questão do trabalho como na impossibilidade de pagar suas despesas mensais, sobretudo os imigrantes ilegais. Nesta categoria tem muitos brasileiros. Recebe-se relatos de ONGs, da Casa do Brasil de Lisboa, como também da Embaixada do Brasil, que tem recebido muitos pedidos de ajuda de brasileiros que não têm condições de pagar suas contas, seja em aluguel e conta de luz e gás. Esses imigrantes se dispõem até a trabalhar até mesmo sob quarentena obrigatória, de tão desesperados que se encontram.
É importante salientar que há dezenas de brasileiros sujeitos a este tipo de situação. Cíntia de Paula, presidente da Casa do Brasil de Lisboa, disse que os imigrantes são os mais vulneráveis, submetidos a situações precárias, e que muitas vezes sem contrato de trabalho, esta situação dificulta mais o acesso aos direitos sociais. Em Portugal, para se receber os direitos sociais é necessário contribuir e muito desses trabalhadores brasileiros recebem no regime de Recibo Verde. São eles os pequenos empreendedores, como são chamados no Brasil. Muitos brasileiros estão nessa situação. Mas, ainda bem que o governo português é de esquerda, do Partido Socialista. Agora, vive-se aqui o que se tem chamado de neo geringonça, um governo ainda aliado ao Partido Comunista e ao Bloco de Esquerda. Eles aprovaram uma lei contra os despejos, que eram realizados regularmente. As pessoas que não conseguiam pagar seus alugueis eram despejadas de suas casas.
Devido ao estado de emergência provocado pelo coronavírus foi aprovada uma lei proibindo despejar as pessoas de suas casas, mesmo que elas tenham dificuldades de cumprir com suas obrigações de pagamentos de alugueis. Outras medidas foram tomadas: aos pais que permanecerem em casa, tendo em vista o fechamento das escolas,o governo decretou que pagará dois terços dos salários para que possam ficar em casa cuidando de seus filhos. O governo aprovou ainda um auxilio de 438 euros para todos os trabalhadores portugueses afetados pelo coronavírus e que equivale no Brasil a mais ou menos 2.500 reais. Receberão também aqueles que trabalham no regime de Recibo Verde e que não têm um contrato de trabalho efetivo. É importante salientar que muitos imigrantes brasileiros não se encontram nem nesta categoria, pois são trabalhadores ilegais, que não têm o visto e que não têm nenhuma jurisdição sobre ele. São esses que terão a maior dificuldade de voltar para o Brasil, tendo em vista as fronteiras que foram fechadas.
Aqui em Portugal tem muitos brasileiros sem em diversas situações, inclusive turistas. Que estão sem dinheiro para pagar um hotel. A embaixada brasileira recebeu muitos pedidos de brasileiros que não conseguiram retornar ao pais. Finalmente o governo brasileiro tomou uma medida contratando a empresa Azul que fará o voo dessas pessoas ao Brasil. É bom ficar atento: há muitos pedidos de ajuda e nem todos são computados. Certas medidas foram tomadas pela Casa do Brasil de Lisboa e a Plataforma Geni, que tem acolhido certos pedidos de ajuda de imigrantes. A Plataforma é organizada por um coletivo de mulheres aqui em Lisboa e tem acolhido muitas mulheres imigrantes. A ajuda pode ser baseada em três eixos principais: psicológica, bens e utensílios e direitos trabalhistas.
Acho que isso é bom que seja visto no Brasil, pois temos um governo que todos os dias desrespeita os direitos dos trabalhadores. Neste sentido, temos que ter muito cuidado com as medidas de exceção que podem ser aplicadas no Brasil, devida a crise epidêmica. É importante que as pessoas levem a sério o coronavírus, entendam que isso é uma pandemia global, que medidas drásticas precisam ser adotadas. Contudo, essas medidas, dependendo do governo, podem colocar a democracia em risco. Espero que nós superemos toda essa crise juntos. Força ao povo brasileiro.
Mais uma vez o Governo Federal edita uma Medida Provisória mal redigida e sem consultar os especialistas no assunto. Agora é a MP 934, de 1º de abril, que estabelece normas especiais para a educação básica e ensino superior no enfrentamento à pandemia de coronavírus. Com a paralisação das escolas e a necessidade de um isolamento social sem previsão por quanto tempo, centenas de milhares de famílias estão apreensivas sobre a possibilidade de se cancelar o ano letivo. Nesse sentido, uma MP que mostrasse claramente o caminho que o governo pretende seguir, era muito esperada. A MP 935 permite corretamente a flexibilização dos dias letivos necessários para se cumprir o ano com o mínimo de perda para os estudantes, mas mantém intacta a carga horária dos cursos, o que é contraditório.
No depoimento abaixo, o coordenador da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, Daniel Cara, critica a MP informando que a aposta governamental na tecnologia como “salvadora da educação” através do Ensino à Distância – EaD irá apenas aprofundar o abismo que já existe na educação e, consequentemente, na desigualdade social. Ele lembra que além de não dimensionar o número de alunos com acesso a computadores e internet rápida e estável, o governo ignora a necessidade de acompanhamento dos estudantes pelos pais, o que nem sempre é possível e as diferenças regionais no Brasil. Segundo ele, ao invés de solucionar o problema, o governo dá mais trabalho aos parlamentares que precisarão alterar a MP para que ela seja factível. Para Cara, esses erros grosseiros estão acontecendo porque o governo não está trabalhando de forma transparente e democrática. No caso da educação, o Ministério da Educação estaria ouvindo somente o Conselho Nacional de Educação, no qual muitos profissionais jamais pisaram numa sala de aula, não conhecem a realidade das escolas públicas e apenas referendam o que quer o MEC.
“É preciso que a MP seja alterada no Congresso Nacional para permitir os seguintes caminhos: a flexibilização precisa ser tanto nos dias letivos como na carga horária e a decisão de como vai ser a operacionalizada essa flexibilização cabe a cada sistema estadual e municipal de educação. A gente precisa reconhecer que em cada localidade vai ser tomada a melhor decisão e essa decisão tem que envolver secretários estaduais e municipais de educação, todos os profissionais da educação (não apenas os professores) e tem que mobilizar os familiares dos estudantes e os próprios estudantes. Esse é o caminho. Esse é o único caminho possível”.
Ouça abaixo o depoimento completo:
Pouco depois, Daniel Cara divulgou um texto mais completo analisando a MP. Veja abaixo:
A EDUCAÇÃO NA PANDEMIA DE COVID-19
Orientações e breve comentário sobre a Medida Provisória 934 que flexibiliza os dias letivos em 2020
E saiba por que Educação a Distância (EaD) não é solução
Por Prof. Dr. Daniel Cara
O presidente Jair Messias Bolsonaro editou a Medida Provisória (MP) 934. Ela flexibiliza, excepcionalmente, o cumprimento dos 200 dias no calendário letivo de 2020. Contudo, não reduz a exigência de 800 horas da chamada carga horária letiva.
Para a educação básica (que vai da educação infantil ao ensino médio), o texto não traz uma solução nova. Ele faz uso do que já está disposto no parágrafo segundo do art. 23 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, Lei 9.394/1996).
Esse comando legal permite, em respeito a “peculiaridades locais”, flexibilizar os 200 dias a critério dos sistemas de ensino, mas “sem com isso reduzir o número de horas letivas”, que é de 800 horas. É a mesma linha da MP 934, contudo troca-se a “peculiaridade local” pela crise causada pelo coronavírus.
No entanto, diante da pandemia de Covid-19, ao flexibilizar o cumprimento dos 200 dias letivos sem reduzir a carga de 800 horas por ano, a MP gera enorme pressão, levando escolas públicas, privadas e sistemas estaduais e municipais de ensino a optar por quatro alternativas:
1) ampliação da educação em tempo integral;
2) conclusão do atual ano letivo em 2021;
3) reposição de aulas com atividades complementares;
4) Educação a Distância (Ead) – que não é uma solução.
Análise:
Vamos analisar cada uma dessas alternativas e, ao final, propor uma solução razoável.
1) A simples ampliação da “Educação em Tempo Integral” (EdTI) não vai acontecer. Não é possível construir escolas após o isolamento social. Nem abrir novas salas de aula. Não haverá dinheiro, nem tempo. E nem todos alunos poderão estudar por mais horas. Ou seja, ampliar a carga horária de 4 ou 5 horas diárias para 7 horas não será uma solução materialmente factível, salvo raras exceções de escolas e redes públicas.
Uma alternativa mais plausível seria aumentar em uma hora a carga horária diária. Cada escola ou sistema de ensino pode avaliar essa possibilidade, porém ela é de difícil execução: faltará infraestrutura e professores disponíveis para implementá-la. Mas esse é um caminho a ser considerado.
2) A alternativa de conclusão do ano letivo de 2020 em 2021 é correta, mas arriscada. Sendo sincero, na prática, essa MP nem cabe nesse momento, pois não sabemos quando terminará o isolamento social. Só essa resposta nos permitirá decidir com razoabilidade. E é justamente nas crises que precisamos tomar as melhores decisões. Contudo, sempre é importante lembrar: o calendário letivo pode divergir do ano corrente. Nada impede que o ano letivo de 2020 seja finalizado em 2021. Mas é preciso construir um amplo acordo para isso.
3) A reposição de aulas por atividades complementares também é uma alternativa, mas não vai dar conta de resolver todo o problema. Aqui é preciso voltar ao principal: não sabemos quando terminará o isolamento social.
4) Utilizar a Educação a Distância (EaD) para dar continuidade ao ano letivo. Considero isso inviável tanto em termos operacionais quanto em termos de justiça social.
Vale relembrar aqui o primeiro princípio da educação nacional inscrito no art. 206 da Constituição Federal: o ensino deverá ser ministrado garantindo a “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”. Sendo outro princípio fundamental a “garantia de padrão de qualidade”.
Ocorre que a EaD ampliará as desigualdades educacionais. Deixo claro que não sou contra utilizar EaD como um dos meios e recursos em processos educativos. Contudo, nem todos podem utilizá-la.
A EaD não é acessível universalmente. E não sendo universal, não pode se tornar a política educacional: o Brasil precisa superar o fato de que existe a educação para a elite e a educação para os mais vulneráveis, os mais pobres. É preciso que a educação seja de qualidade para todas e todos.
Nesse sentido, a questão é complexa. Aqui no Brasil, pelas desigualdades socioeconômicas, até a lição de casa é problemática. Já pensaram nisso? Nem todas e todos estudantes têm as mesmas condições para realizá-las. Imaginem um ano letivo cumprido em EaD.
Mas você ainda deve estar se perguntando: por que a Educação a Distância (EaD) amplia as desigualdades educacionais?
Basicamente porque nem todos estudantes têm: 1) computador, celular ou tablet; 2) acesso à Internet; 3) responsáveis que podem acompanhá-los; 4) casas que permitem o estudo; e 5) principalmente, autonomia de estudo. Aliás, a funcionalidade da EaD depende muito da idade do educando. Mas mesmo as universidades estão contra o uso indiscriminado dela. Vale reiterar: se mesmo para os universitários a EaD não serve, imagine para os estudantes de educação básica.
Assim, se você conhece algum gestor público ou “especialista” radicalmente a favor do uso da EaD, desconfie. Essa figura não se preocupa com o direito à educação.
Solução:
Em termos bem práticos, a solução é confiar as decisões às escolas, desde que sejam respeitadas normas e orientações que devem ser elaboradas democraticamente pelos sistemas estaduais e municipais de educação.
Porém, isso deve ser feito a partir de diretrizes nacionais acordadas, envolvendo toda a comunidade educacional – ou seja, essa não pode ser uma decisão a ser tomada unilateralmente pelo Ministério da Educação e/ou pelo Conselho Nacional de Educação. É fundamental reiterar isso, pois essa tem sido a prática há alguns anos.
Como ponto de partida, defendo que o caminho será avaliar e combinar nacional e localmente as três primeiras alternativas acima listadas, excluindo a EaD como solução. Ela deve ser tratada apenas como um apoio.
Por último, antes mesmo do isolamento social acabar, precisamos acordar um “Pacto Nacional pelo Direito à Educação” pautado no PNE 2014-2024 (Plano Nacional de Educação).
Esse pacto deve representar um esforço pelo ensino-aprendizado de todos os estudantes do país, pois a educação só se realiza na relação entre educadores e educandos. E isso exige educação presencial de qualidade.
Por ora, é essencial que as escolas e as/os professoras/es mantenham contato com seus alunos, estimulando atividades, leituras, reflexões – desde que respeitado o isolamento social. Esse contato por voz, correio ou por meio de ferramentas virtuais é importante para a aprendizagem, mas principalmente para a saúde mental dos estudantes.
Precisamos sair mais fortes dessa pandemia de Covid-19. E a educação, que já é essencial, será ainda mais importante nesse momento de reconstrução.
Juntos vamos vencer essa crise.
Daniel Cara, Campanha Nacional pelo Direito à Educação
DOIS GUIAS: COMO EDUCAR CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA PANDEMIA DE CORONAVÍRUS?
Quais medidas devem ser tomadas para a proteção e educação das crianças e adolescentes?
Guias para mães, pais, comunidades escolares, professores e gestores.
Campanha Nacional pelo Direito à Educação e plataforma Cada Criança lançam dois guias de orientações
A Campanha Nacional pelo Direito à Educação e a plataforma Cada Criança/100 Milhões (“Livres, seguras e com direito à educação”) agradecem às dezenas de voluntários ligados à Rede da Campanha – destacados nos volumes – que contribuíram para a produção dos guias.
O presidente e o vice-presidente do Senado acabam de divulgar nota à imprensa em que dizem não termos no executivo uma “liderança séria, responsável e comprometida com a vida e a saúde da população”. A nota afirma, ainda, que “o Congresso continuará atuante e atento para colaborar no que for necessário para a superação dessa crise”.
No momento, o que o Congresso e o STF deveriam fazer é INTERDITAR IMEDIATAMENTE o presidente. Sem isso será impossível coordenar nacionalmente as ações contra a pandemia do Coronavírus
CRIAÇÃO DA ADAPS – ATAQUE AO SUS EM MEIO À CRISE DO CORONAVÍRUS
As entidades que subscrevem essa nota demonstram aqui sua profunda indignação à atitude oportunista de homologação pelo Governo Bolsonaro, em plena pandemia pelo Coronavírus, do Decreto 10.283, de 20 de março de 2020, que institui a Agência Para o Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde (ADAPS). Essa medida é potencialmente indutora de uma maior precariedade no âmbito da organização do Sistema Único de Saúde (SUS), e mais especificamente da Estratégia Saúde da Família (ESF).
Apesar do nome que poderia sugerir uma postura “desenvolvimentista”, a ADAPS é nada mais do que a criação de uma entidade do Terceiro Setor, denominada de Serviço Social Autônomo (SSA), um ente privado e não estatal (apesar de criada pelo governo) com natureza jurídica próxima a outras experiências como as Organizações Sociais de Saúde (OSS), só que agora com uma dimensão nacional, que irá usurpar atribuições antes da alçada da União, estados e municípios em relação ao ordenamento e funcionamento de serviços de atenção primária do país.
Com o estabelecimento dessa agência já se iniciaram as mensagens à médicos participantes do 13º ciclo do Projeto Mais Médicos para o Brasil (PMMB) que serão desligados dos serviços de saúde até o dia 25 de abril.
Ou seja, em plena pandemia, onde se precisa maximizar esforços de disponibilidade de força de trabalho, o Governo Bolsonaro irá realizar um “cavalo de pau” nas ações de provimento nacional para os serviços da Estratégia Saúde da Família, o que poderá piorar sobremaneira as condições de acesso da população à serviços de saúde em diversas das áreas mais vulneráveis socialmente do Brasil.
Possivelmente se implementará uma lógica de uberização na contratação de médicos, dentro dos parâmetros que serão dados pela criação da Carteira de Trabalho Verde-Amarela, e a fragilização da atual Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), pela reforma trabalhista que corre em paralelo.
Também chama a atenção a criação dessa agência no mesmo momento onde foram liberados R$ 10 bilhões de reais aos planos de saúde. Ou seja, possivelmente a ADAPS poderá ter relações como intermediadora para a contratação de serviços privados para prestação assistencial de saúde à população, aproveitando-se da situação de crise para realização de negócios duvidosos, visto o controle público muito mais frouxo a estes entes do terceiro setor por órgãos de controle como Tribunal de Contas e Corregedoria Geral da União.
Tal distorção surge no mesmo momento em que se ampliam a demanda de investimentos para os serviços públicos do Sistema Único de Saúde (SUS), que tem se mostrado “a grande ponta de lança” na luta contra o Coronavírus, apesar das dificuldades enfrentadas pelos seus profissionais como melhores condições de trabalho, de proteção individual, de testagem de casos e de ações vigilância em saúde mais efetivas em plena pandemia, mas que têm sido bravamente aplaudidos pela população que percebe o SUS como o principal braço do Estado frente às demandas de saúde mais diretamente colocadas.
Assim alertamos sobre as conseqüências à médio prazo da implementação da ADAPS. Diversas experiências nacionais mostram que a grande extensão não só da terceirização na contratação de profissionais de saúde, como da gestão de serviços, NÃO É UM MODELO SUSTENTÁVEL E ESTÁVEL para organização da gestão do SUS, bem como grandes portas para corrupção e de caixa 2 para campanhas eleitorais.
Exemplos dessas situações são episódios como o total desmonte em curso na Atenção Primária à Saúde (APS) da cidade do Rio de Janeiro, a CPI da Saúde pela Assembléia Legislativa do estado de São Paulo, e a crise com a Cruz Vermelha, no estado da Paraíba, para elencar problemas de ampliação de gestão por Organizações Sociais de Saúde (OSS); e também merece atenção a crise da experiência de Serviço Social Autônomo (SSA), no estado Acre, dentre vários outros episódios em todo o país.
O entendimento de que a contratação pelo terceiro setor é um modelo alternativo aos limites de contratação de pessoal impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), diante do teto estabelecido, não tem mais unanimidade junto aos órgãos de controle, que vem considerando esse modelo de contratação como burla aos procedimentos habituais de transparência, isonomia e providência a serem respeitados pelas instituições públicas, inclusive diante dos escândalos cada vez mais frequentes.
Assim recomendamos frente a esta medida intempestiva do Governo Bolsonaro, as seguintes medidas de fortalecimento do SUS diante da crise instalada:
1- Manter a contratação e a atuação dos médicos participantes do Projeto Mais Médicos pelo Brasil (PMMB), experiência claramente estabelecida como exitosa ação de provimento de profissionais médicos para a Estratégia Saúde da Família (ESF);
2- Sustar a implementação da ADAPS, havendo maior debate com as instâncias de controle social do SUS antes de sua criação;
3- Revogação da Portaria nº 2.979, de 12 de novembro de 2019, que estabelece mudanças no financiamento de custeio da Atenção Primária à Saúde no país, visto que elas poderão aprofundar o processo de desfinanciamento da APS em diversos municípios brasileiros mais sensíveis à crise em curso;
4- Revogação da Emenda Constitucional 95 (EC 95), que congelou os gastos sociais por um período de 20 (vinte) anos;
5- Alteração da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) com a retirada dos investimentos e despesas com pessoal nas áreas da saúde, educação e assistência social do teto estabelecido pela LRF, podendo assim garantir a expansão de força de trabalho de profissionais de saúde em momento de crise como o atualmente instalado;
6- Suspender a tramitação das contra-reformas propostas pelo Governo Bolsonaro, como a trabalhista, a tributária, a da Administração do Estado e dos Fundos Públicos, pois é necessário nesse momento ampliar medidas de proteção social frente às dificuldades vividas pela nossa população;
7- Revogar a Medida Provisória nº 927, lançada na surdina no dia 22 de março de 2020, autorizando empresas a suspenderem empregados por quatro meses, deixando os trabalhadores sem salários, o que fragiliza ainda mais medidas de proteção, ampliado medidas de arrocho ao trabalhador e assalariados.
8- Garantia de renda mínima para todos os cidadãos e cidadãs de nosso país, a partir de recomendações dadas pela própria Organização Mundial de Saúde (OMS).
Assinam a nota
1- Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares (RNMMP)
2- Associação Paulista de Saúde Pública (APSP)
3- Associação Brasileira de Saúde mental (ABRASME)
4- Associação Brasileira de Economia da Saúde (ABRES);
5- Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (CEBES);
6- Associação Brasileira Rede Unida;
7- Sociedade Brasileira de Bioética (SBB)
8- Forum de Trabalhadores de Saúde Mental de Pernambuco;
9- Nucleo Estadual da Luta Antimanicomial de Pernambuco – Libertando Subjetividades;
10 – Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (RENILA);