Os severos cortes à educação brasileira, em todos os seus níveis, anunciados pelo governo Bolsonaro (PSL) nos últimos dias, provocaram em meu corpo dores físicas. Trabalhar com a educação nesse país já é muito desgastante por vários motivos, desde a falta de condições de trabalho, as muitas turmas e salas superlotadas, a violência, o desgaste emocional e psicológico, os BAIXOS SALÁRIOS PAGOS, dentre tantos outros motivos que levam centenas de professores e professoras a pedir licença médica por condições de estresse, depressão e a síndrome de burn-out, e até mesmo a largar o magistério. PROFESSOR NÃO É VAGABUNDO. Resiste quem consegue. Enquanto professora, eu posso dizer que o chão da sala de aula não está nada fácil e que o ódio que este governo tem de nós, professoras e professores, nos atinge em todos os âmbitos de nossas vidas. PRECISAMOS NOS PROTEGER.
A reforma da previdência, que ataca duramente as professoras e professores deste país, ao propor acabar com a aposentadoria especial, que existe justamente porque há um reconhecimento que a profissão docente é extremamente estressante, nos tira o nosso direito de se aposentar e nos obriga a trabalhar praticamente uma década a mais. O maldito projeto Escola Sem partido, ou melhor, Lei da Mordaça, não foi aprovado no congresso nacional porque é inconstitucional e inviabiliza a própria razão de ser da educação, que depende da liberdade de pensamento para existir enquanto tal. A função da escola se inviabiliza com a CENSURA, que é o que propõe de fato esse projeto, mesmo assim, ele parece estar legitimado na escola e na sociedade. A quantidade de professoras e professores sendo assediados, perseguidos, demitidos e respondendo a sindicâncias é enorme. PROFISSÃO DE RISCO. As denúncias só aumentam e revelam o quanto a censura já está entre nós. Esse projeto estimula o ódio e a consequente desvalorização dos docentes no país, seja na opinião pública, ao diminuir o trabalho docente como mera “doutrinação”, seja estimulando os alunos a filmar, expor e denunciar seus professores e professoras, numa campanha nacional encabeçada pelo MBL (Movimento Brasil Livre). Um dos efeitos mais nefastos e, propositalmente, é a lógica de colocar aluno contra professor e vice e versa. A união entre estudantes e professores é muito poderosa na sociedade e ameaça qualquer governo. A relação ensino-aprendizagem passa diretamente pela mediação entre os discentes e docentes e é uma relação muito mágica, afinal de contas, somos nós e eles em sala de aula, cotidianamente durante o ano inteiro e, em alguns casos, por mais de um ano de convivência. É UMA RELAÇÃO HUMANA, de carinho, amor, respeito e afeto.
O ataque a nós, professoras de sociologia e filosofia, é ainda maior, porque, inevitavelmente, os conteúdos de nossas aulas são os assuntos que eles querem censurar. As nossas aulas permitem a escola abordar temas que eles não querem que falemos em sala de aula e que, inclusive, eles querem reprimir e censurar na sociedade, como a discussão de gênero e sexualidade, o ensino da História e Cultura-Afro-Brasileira e a discussão sobre as doutrinas sociais (capitalismo, socialismo, comunismo e anarquismo). Quando eu pego o currículo mínimo de Sociologia do Estado do Rio de Janeiro, eu entendo o porquê eles têm tanto medo da nossa disciplina e, por isso, precisam reprimi-la veementemente.
Eu vejo a SOCIOLOGIA como ferramenta possível de compreensão da estrutura da sociedade brasileira e ensinar sociologia para alunos do ensino médio é possibilitar a esses jovens compreender os mecanismos de opressão dessa sociedade, dessa maneira, a educação se torna aquilo que Paulo Freire chamou de “PRÁTICA DA LIBERDADE”, isto é, “o meio pelo qual homens e mulheres lidam de forma crítica com a realidade e descobrem como participar na transformação de seu mundo”. Em tempos de FASCISMO, censura, repressão, apologia a ditadura militar e uma FALSA DEMOCRACIA, pensar é muito perigoso. Quem conhece a história da sociologia na educação básica desse país sabe que ela é intermitente, isto é, acompanha a vida política. Em períodos de expansão da democracia ela aparece nos currículos escolares, enquanto, em períodos ditatoriais e de repressão, ela desaparece das escolas. Portanto, a luta dos professores e professoras pela sociologia na escola é uma luta pela democracia. A retirada da disciplina e a perseguição aos docentes é um bom termômetro do nível de democracia ou não que estamos vivendo.
Em tempos de tantos ataques aos direitos da classe trabalhadora, nós, professoras da rede estadual de ensino do Rio de Janeiro, estamos há 5 anos sem reajuste salarial. O arrocho implementado na gestão do governador Pezão está acarretando a perda de poder aquisitivo dos salários que não são corrigidos anualmente, conforme determina a lei. A categoria já acumula mais de 28% de perdas salariais. Esse ano, o governador Wilson Witzel (PSL) já declarou que não haverá reajuste salarial para os servidores públicos do Estado do Rio de Janeiro. Diante de tantas desumanidades e adversidades, nós, professoras e professores deste Estado, devemos não somente ousar lutar, mas temos a responsabilidade de não esmorecer durante a jornada. Por nossos alunos e alunas, por nossa categoria, por nós mesmas, pela educação no Brasil, não nos abateremos e resistiremos com muita coragem. SOMOS REFERÊNCIA, para muitos jovens. NINGUÉM SOLTA A MÃO DE NINGUÉM.
Amanhã, em sala de aula, eu nem sei por onde começar o SEGUNDO BIMESTRE, pois acreditar que a escola é uma bolha, uma ilha e que está isolada da sociedade, com certeza não é a minha prática docente. Até porque a sociologia urge em discutir o que se passa na sociedade, portanto, amanhã nós vamos entrar em sala de aula de cabeça erguida, SEM MEDO e vamos discutir sobre a EDUCAÇÃO BRASILEIRA, ontem, hoje e amanhã. Vamos pensar sobre que escolas e universidades nós queremos! Vamos denunciar os cortes na educação do governo Bolsonaro e os impactos dessas medidas no chão de cada escola desse país. Cada educadora e educador, que luta e acredita numa educação melhor, mais justa e menos desigual, vai encontrar a sua resiliência dentro e fora de sala de aula. Nós não vamos desistir facilmente e nós estamos com os estudantes. A nossa luta unificou, é funcionário, estudante e professor! Eles querem a gente doente, triste, sem força e sem dinheiro, para nos enfraquecer, mas eles não vão conseguir. Como Conceição Evaristo diz, “eles combinaram de nos matar e nós combinamos de não morrer”.
CAROL QUINTANA, professora de sociologia, coordenadora do SEPE Teresópolis e ativista LGBT
CONTRA OS CORTES NA EDUCAÇÃO DO GOVERNO BOLSONARO!
NÃO A DESVINCULAÇÃO DO FUNDEB!
NÃO A REFORMA DA PREVIDÊNCIA!
NÃO A LEI DA MORDAÇA!
TODO APOIO A LUTA DOS ESTUDANTES E PROFESSORES! RUMO À GREVE GERAL DOS TRABALHADORES DA EDUCAÇÃO!