Conecte-se conosco

Entrevista

“A luta de classes nunca tirou férias neste país”

Publicadoo

em

 Em entrevista aos Jornalistas Livres e Brasil de Fato, o pesquisador e professor emérito da UFRJ, José Paulo Netto, analisa recentes manifestações de ódio contra determinados setores da sociedade a partir da formação social e da cultura política brasileira.

Manifestações de ódio, racismo, declarações machistas e ameaças verbais e físicas contra lideranças da esquerda têm sido constantes no último período no país. Segundo o professor José Paulo Netto, essas atitudes têm relação com a tentativa das classes dominantes de “afastar a massa do povo dos centros de decisão política”.

José Paulo Netto é doutor em serviço social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Foi vice-diretor da Escola de Serviço Social da UFRJ e do seu Programa de Pós-Graduação em Serviço Social, tendo título de professor emérito na instituição. Tradutor e organizador de textos de autores clássicos como Marx, Engels, Lênin e Lukács, em que se destaca como grande especialista, produziu obras teóricas e políticas sobre o capitalismo, serviço social e marxismo. É membro do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e atua em parceria com movimentos sociais, como o MST.

Em entrevista ao Brasil de Fato e aos Jornalistas Livres, ele faz uma análise das classes dominantes a partir da formação social brasileira, fala sobre o quadro político atual no país e sobre como atuam as elites em face da crise do capitalismo contemporâneo.

Para Netto, é justamente em momentos de tensões políticas e econômicas que “todo esse porão da sociedade brasileira, com um forte sentimento antipovo, antipopular, antimassa, racista e discriminador, vem à tona”.

Foto: Leandro Taques/Jornalistas Livres

Jornalistas Livres — Estamos presenciando a todo o momento ataques da direita brasileira que deixam explícitos o preconceito, o racismo e o sentimento de ódio contra determinados setores da sociedade. Como a nossa formação social pode nos ajudar a compreender essas atitudes?

Se analisarmos com cuidado a história brasileira, vamos encontrar algumas constantes que são traços constitutivos da nossa formação social e que, portanto, são elementos constitutivos da cultura política brasileira. Um traço muito visível de meados do século XIX em diante tem sido a capacidade das franjas das camadas mais ativas das classes dominantes em afastar a massa do povo dos centros de decisão política. Mesmo quando tivemos, ao longo do século XX, momentos de institucionalização mais ampla da participação política, tivemos elementos, mecanismos, meios e modos que constrangeram ou limitaram essa participação política a processos adjetivos. Costumo dizer que tivemos no Brasil um processo tardio, lento, desigual e sinuoso de socialização da política.

Isso ganhou certa magnitude com a derrota da ditadura instaurada em 1964. A constituição de 1988 consagrou direitos políticos essenciais, abriu caminho para se repensar direitos civis e, sobretudo, ampliou o leque dos direitos sociais no país. Com todas as desigualdades e assimetrias, creio que se pode dizer que no pós-1988 tivemos formalmente a institucionalização da cidadania moderna no Brasil. Entretanto, se observarmos o processo de luta contra a ditadura, de crise da ditadura e de transição democrática no Brasil, teremos a clara percepção dessa capacidade das franjas mais ativas das classes dominantes de encontrar meios de excluir a massa do povo de processos decisórios. Tivemos um processo de socialização da política, mas nem de longe um processo de socialização do poder político. Isso tem relação com o que eu chamo de linhas de continuidade na nossa história.

O senhor pode citar alguns exemplos disso?

O Brasil foi um país escravocrata. Em 1888 tivemos uma abolição inteiramente formal, em que não se criou nenhuma pré-condição para que o liberto pudesse construir sua vida autonomamente. Da noite para o dia foram libertos, mas sem ter terra, sem ter nada. Esta cultura escravocrata não desapareceu. Há exemplos recentes. As camadas médias (não necessariamente camadas oligárquicas) reagiram negativamente em face da legislação acerca do trabalho doméstico. Poderíamos citar outros exemplos como o acesso à universidade, historicamente elitista. É só observar a dimensão das nossas universidades e a população em condições etária e formal de ingressar ali.

Deste modo, podemos perceber que a sociedade foi construída para que muito poucos usufruíssem dos direitos formais que ela veio (bem ou mal) escrevendo no seu ordenamento jurídico-político. Em momentos de crise ou em momentos de tensão, em que se agudiza abertamente a luta de classes (para utilizar um jargão da esquerda), todo esse porão da sociedade brasileira, com um forte sentimento antipovo, antipopular, antimassa, racista e discriminador, vem à tona. O processo de transição da ditadura fez com que amplos setores tivessem vergonha do seu conservadorismo. Mas isso acabou.

Foto: Leandro Taques/Jornalistas Livres

Qual foi o impacto do PT na mudança dessa atmosfera política?

Eu diria que o PT teve um papel duplo. Pensando no PT como força de governo, a partir de janeiro de 2003, foram tomadas providências de caráter emergencial, mas que foram apresentadas como políticas duradouras de Estado e que beneficiaram objetivamente a massa mais pobre. Isso foi muito positivo. Ao mesmo tempo, isso foi feito no marco de uma orientação macroeconômica que privilegiou os grupos financeiros do país, que não restringiu em absoluto a fome lucrativa dos monopólios nacionais e internacionais. Isso criou uma situação paradoxal que pode ser observada ao cabo do mandato do Lula. Mas as elites jamais suportaram o significado simbólico de ter um trabalhador que tomava cachaça e falava errado na Presidência da República. O efeito PT (quando Lula se elege) é enorme do ponto de vista simbólico. Enfim um sujeito aparentemente igual à maioria da população chega lá.

“Marolinha”?

Lula elege sua sucessora no marco de uma crise econômica internacional gravíssima, a qual ele caracterizou como uma “marolinha”. Só que os efeitos daquela crise rebateram na periferia de formas distintas. Sob o governo dele, uma orientação macroeconômica conseguiu driblar bem esses efeitos. A articulação de economia política que funcionou nos dois governos dele não funcionou no governo Dilma. Não foi por incompetência da equipe gestora. Houve sim falhas técnicas, mas elas não são as mais importantes. Mas é que a “marolinha” virou um “tsunami”. Neste momento, aqueles mesmos grupos que foram altamente beneficiados no governo Lula põem para fora todo o seu preconceito de classe que vem acompanhado de manifestações de ódio de classe, de marcas racistas e, sobretudo, de uma entrada em cena, sem qualquer tipo de maquiagem, do velho elitismo brasileiro. Penso que este é o quadro em que estamos vivendo hoje.

Como este elitismo se expressa?

Penso que o processo eleitoral mostrou isso com clareza. Tivemos uma vitória eleitoral democrática que mostrou uma sociedade dividida. Não ponho em dúvida a legitimidade de vitória de Dilma. Mas não há duvida nenhuma que há uma legitimidade expressa eleitoralmente muito estreita em termos de maioria e que, portanto, é muito vulnerável. Exatamente sobre esta vulnerabilidade atuam as elites. Também operam através de uma mídia historicamente oficialista e porta voz de tudo aquilo que atravanca a conquista, a realização e a ampliação de direitos.

De 1888 a 2015, quando se tem uma crise (não no sentido de possibilidade de quebra do regime, mas uma crise financeira do Estado), se não há orientações claras e políticas claras em face desta dificuldade, o momento se torna ideal para que os segmentos mais retrógrados se apresentem como são. Temos uma composição do legislativo que me parece a mais anódina e amorfa dos últimos trinta anos e, portanto, facilmente catalisada com propostas de oportunismo meramente eleitoral. Os que querem desestabilizar tem um prato feito. Não sei como vai se desdobrar esse processo governativo, mas tenho a impressão de que a presidente Dilma vai travar uma guerrilha diária. Não se satisfaz a fome de leão do PMDB com alface.

Foto: Leandro Taques/Jornalistas Livres

O senhor utilizou os termos “luta de classes”, “ preconceito de classe” e “ódio de classe”. Com toda a complexidade da divisão socioeconômica e das ramificações do trabalho na nossa sociedade, ainda podemos falar em classes sociais?

Não tenho a menor dúvida. Classe social é uma categoria teórica que expressa elementos fundamentais da realidade em uma sociedade como a nossa. A sociedade brasileira tem hoje uma estrutura de classes muito complexa e eu desconheço qualquer estudo rigoroso e sério sobre isso. Não estou falando daqueles estudos publicitários que separam a nossa sociedade em classes A, B, C, D, etc., mas de estudos que tragam relações com os meios de produção e com a consciência de um projeto político. A luta de classes nunca tirou férias neste país. Ela esteve latente ou expressa ao longo desses últimos doze anos em manifestações referentes a determinados projetos de políticas públicas e em como fazer a orientação macroeconômica. Isso foi uma luta que atravessou o governo Fernando Henrique, o governo Lula e atravessa o governo Dilma. O que temos agora é uma emersão clara das posições de classe.

E como é possível mediar essas tensões?

Eu percebo um dilaceramento do tecido social brasileiro do ponto de vista político. O que é preocupante, porque não estão em jogo projetos políticos, mas projetos de nação. Que sociedade nós queremos? Nós queremos uma sociedade onde quem tem orientação diferente é objeto de espancamento e onde o dissenso político é resolvido com ameaças físicas? Vivemos uma conjuntura internacional difícil, com ajustamento na divisão internacional do trabalho. Nós vamos nos inserir nisso de maneira subalterna ou soberana? Temos que vir a público para determinar com clareza que tipo de sociedade nós queremos e para chegar lá são possíveis vários meios.

Estamos com problemas que não vieram do governo Dilma, do governo Lula ou do governo Fernando Henrique. Eles vêm da nossa transição interrompida. Eu espero que tenhamos firmeza de princípios e sabedoria para resolvê-los sem romper um pacto civilizatório que fizemos pelos menos em 1988 e que, na minha opinião, está ameaçado por expressões de preconceito e ódio de classe. Não podemos repetir experiências traumáticas do passado, cujos resultados foram desastrosos para a massa do povo brasileiro, ainda que tenham sido excelentes para as suas elites.

Nesse sentido, penso que temos que olhar a política brasileira para além das expressões institucionais abastardadas, onde se troca ministério por voto no Congresso Nacional. Isto não é o Brasil. Isto é a expressão institucional da política brasileira. A política brasileira está nas universidades, nas fábricas, nas usinas, nos escritórios, no comércio e nas ruas.

Foto: Leandro Taques/Jornalistas Livres

O senhor é um grande especialista da obra de Marx, um nome que causa arrepio nas elites e nos setores mais conservadores da sociedade. Os intelectuais que se utilizam deste referencial teórico tem sido acusados de promover “doutrinação ideológica” nas universidades. O que o senhor pensa disso? É possível resgatarmos Marx para analisar a sociedade contemporânea?

Uma das coisas que mais tem me divertido na exposição do pensamento da direita brasileira (se é que ela pensa) é imaginar que os comunistas estão no poder. Isso é coisa do Olavo de Carvalho, não é? É uma calúnia contra o PT e contra os comunistas, mas deixemos isso de lado. Primeiro, eu diria que no universo cultural, resultado de experiências históricas e da batalha de ideias sob a hegemonia burguesa, o marxismo andou muito desprestigiado e muito desacreditado. No final da década de 1990 houve um acantonamento do pensamento marxista. Isso mudou nos últimos dez anos na universidade e fora dela. Houve um interesse renovado pelas ideias de Marx, não apenas no Brasil. Segundo, eu acho que Marx é um incômodo contemporâneo para nós. Essa crise sistêmica que o capitalismo está experimentando (pelo menos desde o início do século) está trazendo a discussão sobre uma série de projeções que Marx fez. Ele é extremamente atual. É impossível tentar compreender com seriedade as mutações econômicas dos últimos 30, 40 anos sem Marx.

Socialismo?

Não há solução para a crise do capitalismo. Ela é global não no sentido do globo, mas por ser uma crise ética, política, econômica e ecológica. O padrão de civilização capitalista se exauriu. Não adianta dar carros para todo mundo, pois não haverá lugar para jogá-los fora. Nós não podemos continuar nessas cidades que crescem loucamente sem nenhum planejamento. O capitalismo só tem a oferecer mais insegurança, mais instabilidade e mais violência. Nesse sentido, esgotado o capitalismo, a única alternativa para ele é o socialismo. Não posso ser original: “Ou o socialismo ou a barbárie”. E a barbárie já está aí pertinho. Sob esse aspecto, o socialismo é extremamente atual. Agora a questão é se essa atualidade é transformada em viabilidade. E eu não vejo essa viabilidade em curto prazo. O que me torna muito pessimista, pois quanto mais tardia a alternativa do socialismo, maior será a destruição que o capitalismo pode realizar.

Por que o senhor não vê essa alternativa no horizonte?

Porque o socialismo não resulta da crise e da exaustão do capitalismo, mas de um duro, longo e difícil processo em que massas organizadas de homens e mulheres mudam o curso da vida coletiva e individual. Eu não vejo isso se desenhando em curto prazo no horizonte. Vou dizer algo que já foi dito por Antônio Gramsci e que é adequado para pensar o agora: “Quando aquilo que é velho ainda não morreu e aquilo que é novo ainda não emergiu, nesses tempos de transição, revelam-se fenômenos que são verdadeiras sociopatias”. Estou convencido de que a ordem do capital, que é o velho, ainda não morreu e a ordem do futuro ainda não emergiu. Então estes são períodos históricos que oscilam entre o trágico e o dramático.

Foto: Leandro Taques/Jornalistas Livres

A esquerda fala em revolução, em protagonismo da classe operária e em tomada de consciência pela massa. Mas também defende que qualquer tipo de transição radical passa por uma formação séria dos trabalhadores. Como o senhor vê isso? E como essa formação de caráter teórico se transforma em prática?

Eu não penso que as massas revolucionárias serão massas teoricamente muito ilustradas. O que leva os trabalhadores a querer mudar de vida é o momento em que suas vidas se tornam insuportáveis. É evidente que camadas de trabalhadores letradas e informadas são muito mais capazes de tomar consciência dos seus interesses do que camadas trabalhadoras rústicas, mantidas na ignorância pelas classes dominantes. Acredito que a questão central seja a formação política dos militantes. Líderes e dirigentes não fazem a revolução. É inteiramente irrealista imaginar que o conjunto das classes trabalhadoras vai se transformar em líderes da transformação social. Segmentos que vão constituir as suas vanguardas (no plural) é que podem dirigir um processo de transformação social. O investimento na formação desses segmentos é absolutamente essencial. É preciso formação política com base teórica. Aqui não me refiro à agitação e propaganda ou doutrinação, mas sim a conhecimentos de teoria social que permitam discernir e distinguir o essencial do acessório, o substantivo do episódico.

Teoria e prática?

A teoria é absolutamente indispensável para a formação de vanguardas que sejam capazes de, em momentos de ruptura e de tensão social, dar orientações claras, lúcidas, sérias e responsáveis às massas. Rupturas sociais são sempre processos traumáticos. Não apenas no sentido da violência material, mas elas envolvem rupturas ideológicas, intelectuais, éticas, etc. Se lideranças não tiverem competência teórica e sabedoria política, o resultado dessas rupturas pode ser catastrófico. Pode ser a derrota de bandeiras e demandas generosas e legítimas. Isso significa que ninguém avança no domínio do progresso social, da universalização de direitos, da criação de condições de uma consciência e de uma nova cultura política só pela militância operativa. É preciso formação teórica e cultural. Eu me atreveria a dizer que sem isso não caminharemos.

Queria ser original, mas alguém já disse há cerca de 110 anos que “sem teoria revolucionária, não há revolução” [Lênin]. É preciso estudar, estudar e estudar para poder mobilizar e organizar com competência. Uma revolução não pode ser o arrebentar de uma represa de demandas reprimidas e de esperanças humilhadas. É sobre esse chão, sobre a indignação e sobre a revolta que corre a possibilidade de outro mundo. Mas ele tem que ser construído com cientificidade, competência e com uma palavra que está desgastada, que é a sabedoria.

Foto: Leandro Taques/Jornalistas Livres

Cultura

Conheça ClarinhaMar, jovem poeta PcD que fala de enfrentamento e persistência

ClarinhaMar (Clarinha Marinho) apareceu pra mim num vídeo recebido pelo whatsapp.

Publicadoo

em

Conheça ClarinhaMar, jovem poeta PcD que fala de enfrentamento e persistência

ClarinhaMar falava de enfrentamento, de vida, de persistência, de ponto e vírgula. Postei o vídeo no meu face e a repercussão foi enorme. Resolvi pesquisar até encontrá-la. E a encontrei no Instagram @ClarinhaMar. Essa é a entrevista dela, mulher, poetiza, universitária e palestrante que fala de muita coisa. Podemos encontrá-la também no Facebook Clara Marinho.

Por Janete Chargista, especial para os Jornalistas Livres.

E aqui uma canja da poesia que ClarinhaMar recita:

“O Oceano do Mundo Concreto
Nada sei dizer sobre grandes egos

De grandes feitos meu corpo tem vão
Não me atrevo a contar do que sou cego
Nessa sombra feita clara ilusão
Nunca entendi, mas sempre me calaram

Minha sã poesia não diz de amor
Deste, todas as bocas já falaram
Crucifixo de corações, torpor
E do oceano que sobrevivi

Tão real que me dói imaginar
Mundo, fel de ódio num doce servir
Tua boca fala do vazio, teu ser

E meu oceano se deixa afogar
Na palavra que luta com o morrer.”

Veja abaixo a entrevista exclusiva com ClarinhaMar

Veja mais entrevista da Janete Chargista: Delegado Antifascista Fernando Alves

Veja mais: Carta Denúncia, por Helena Zelic



AJUDE OS JORNALISTAS LIVRES A CHEGAR MAIS LONGE Se inscreva no nosso canal e não deixe de ativar as notificações no sininho para não perder nada * Siga os Jornalistas Livres nas redes: Instagram: https://www.instagram.com/jornalistas… Facebook: https://www.facebook.com/jornalistasl… Twitter: https://twitter.com/J_LIVRES Site: www.jornalistaslivres.org

Continue Lendo

Entrevista

Fim do isolamento no ABC é política, diz ex-prefeito de Santo André

Publicadoo

em

Nos últimos dias temos presenciado uma briga no ninho tucano da grande São Paulo, o motivo é o relaxamento da quarenta. Os prefeitos tucanos vem reclamando da falta de diálogo entre o governo estadual e as prefeituras do ABC. Parte dessa briga se dá pelo mau estar causado pelo pronunciamento do Prefeito da Capital, Bruno Covas, que pretende para os próximos dias implantar um relaxamento progressivo da quarentena e conta com apoio do Governador do Estado, João Dória também tucano.

Ao compararmos estatisticamente os números das cidades do ABC e a capital, números referentes ao COVID19, existe certa semelhança referente ao isolamento social. Enquanto na Capital Paulista o isolamento social mobilizou 53% da população, a região do ABC alcançou 50%. *

As semelhanças param quando passamos das estatísticas e pensamos em indivíduos, histórias de família e amigos. a região do abc é considerada atualmente um epicentros de proliferação do COVID19 na região sudeste, com números que pedem atenção, são 1073 infectados e 763 óbitos, algo próximo de 8% dos casos. Vale lembrar que somados a esse número, mais de 16 mil ainda aguardam os resultados dos testes.

A prefeitura de Santo André prometeu 100 mil testes desde o início de maio e até agora, o que podemos notar é apenas propaganda, muito menos que 10% da população foi de fato testada. A briga no ninho entre os prefeitos tucanos e o governador, tem deixado o PSDB em crise. Cabelo ou penas em pé. As eleições municipais previstas para ainda esse ano, parece configurar uma situação que divide caciques tucanos e seus agregados no ABC.

Conversamos com Carlos Grana, ex-prefeito de Santo André de 2013 a 2016, quando a região do ABC despontava como o famoso cinturão vermelho. Berço do novo sindicalismo, Santo André compõe parte do ABC paulista, conhecido desde o final dos anos 70 e início dos 80 como berço de um sindicalismo pujante e embrião do conhecido modo petista de governar, nos últimos 3 anos tem experimentado gestões tucanos. Falamos um pouco sobre como as prefeituras petistas deixaram os aparelhos públicos municipais de saúde, falamos ainda sobre Lockdown e conjuntura.

Jornalistas Livres: Como você vê esse conflito entre os prefeitos tucanos do ABC e Bruno Covas (prefeito da Capital) e qual o papel do governador nesse caso? Vale lembrar que Dória, disse que os prefeitos do ABC que pretendem flexibilizar a quarentena e reabrir comércio, não tem juízo.

CGrana: Nos aproximamos dos quase 90 dias de quarentena de quarentena no Estado de SP, não é mais quarentena, não é mesmo? O que está acontecendo hoje, é uma briga política, no campo da disputa partidária no centro do PSDB, veja que eles não conseguem falar a mesma língua, tanto governadores quando prefeitos do ABC paulista. O erro central ao meu ver, é quando tentam qualificar o plano de retomada SP, colocando alguns setores de serviços e manter a região metropolitana ainda em isolamento. Fato concreto é que nossa região está muito integrada a capital e outros pontos da região metropolitana que delimitam a capital paulista. Então colocar a região central em condição de maior flexibilidade e excluir dessa ótica a região metropolitana que está integrada a capital. Isso dificulta uma série de políticas de prevenção.

JL: Por exemplo, quais?

CGrana: Como é que se explica por exemplo, que aumentará a circulação de pessoas nos transportes coletivas que milhares de trabalhadores tomam diariamente rumo aos seus empregos? Formando assim um considerável deslocamento de força de trabalho para áreas díspares em políticas de isolamento social? Quero dizer de forma simples: com isso o abc seria duplamente prejudicado. A primeira e mais importante é com a saúde, pois revela falta de planejamento e logística na contenção do vírus e seu tratamento, já a segunda é a que revela a má coordenação e condução de programas de contenção dessa pandemia na região. O erro original é não levar em conta que a curva de contágio ainda está no ascendente, subindo todos os dias. Um erro brutal que custará vidas, cada vez mais próximas de nós. Os primeiros vitimados serão os trabalhadores e trabalhadoras. O comportamento dos tucanos no ABC em disparidade com a agenda do governador João Dória e do Prefeito da Capital. Aliás, as três posições mostram uma total falta de respeito com a vida e dignidade da pessoa humana. O compromisso deles é apenas eleitoral e não humanitário

JL: Você acredita que é momento de relaxar a quarentena? Quais métodos precisam ser aplicados para preservar a saúde da população?

CGrana: O grande problema que identifico é a ausência da testagem em massa, de 20% ou mais da população. Isso nos causa uma incerteza muito grande, pela própria experiência de alguns países e regiões do mundo. Lugares onde as regras do isolamento social foram afrouxadas, mas tiveram que voltar atrás. Pois se trata de um vírus cuja vacina ainda não existe e o risco de novas ondas de contágio é algo que devemos sim nos preocupar, mais do que números para engrossar estatísticas, cada vida é história de alguém que amamos e faz parte de nossas vidas, não podemos nos entregar ao discurso frio e irresponsável em nome do mercado, sem vidas não existe produção, consumo e portanto economia. Essa conta é lógico precisa ter adiciona aos seus trágicos resultados, a contribuição do governo federal.

JL: Bolsonaro tem culpa quanto a esse prolongamento do isolamento social e derrocada da economia?

CGrana: Olha, pensemos apenas em meados de março, isso para usarmos datas e marcação temporal de quando alguns prefeitos, governos e chefes de estado no mundo todo começaram a pensar o isolamento social com base em estudos da OMS (Organização Mundial de Saúde). Isso criou muita preocupação por parte da população, preocupação pela falta de preparo do atual governo e a indústria de boatos que abastecia a narrativa anti-isolamento. Igor, já parou para pensar que se tivéssemos empregado um lockdown no início, já estávamos saindo e retomando a economia. Percebe o quanto esse discurso é falho ao colocar a economia na frente das vidas, ignorando matrizes importantes como o fortalecimento do que chamo de musculatura pública, sim estou falando como eles tem usado repetidas vezes esse discurso falso de defesa da economia para no final legitimar uma narrativa de morte aos pobres. Chega assustar como isso não fica visível, é cristalino e translúcido no discurso, eles querem causar uma tragedia ainda maior.

JL: Você foi prefeito de Santo André (2013-2016), poderia falar um pouco como tem visto a gestão de crise aplicada no município durante a pandemia? Pode falar sobre os testes que não chegaram e a importância deles?

CGrana: Fui prefeito de Santo André de 2013 a 2016, e um dos investimentos prioritários da minha gestão foi na saúde, pela constituição federal parte do investimento público municipal (orçamento do município) deve ser investido, para ser preciso 15%, em Santo André, enquanto fui prefeito, investimos 30% nessa área tão necessária. Por exemplo, estendemos o número de unidades e otimizados o serviço de SAMU, isso em parceria com o governo federal de então, precisamos lembrar. SAMU que é uma política pública aplicada pelo PT. Estendemos o atendimento das UPAS, criamos uma logística que capacitou e abasteceu as UBS distribuídas no município. O problema central tem sido a gestão atual, que insiste em fazer política, a exemplo do PSDB no governo estadual, ambos alheios e ignorando a importância de cada vida, economia é sobre pessoas e não mercado, quem não entendeu isso é tudo menos gestor público.

Por Igor Santos – Jornalista, historiador, cearense e morador do ABC Paulista.

*(Informações extraídas do Instituto ABC Dados)

Leita também Lula está solto, mas ainda não livre

Continue Lendo

Entrevista

Wadih Damous: “A tarefa imediata é colocar Bolsonaro para fora do Palácio do Planalto”

Publicadoo

em

Wadih Damous, ex-presidente da OAB/RJ e Alvaro Quintão da OAB/RJ. Card Jornalistas Livres
Por Bruno Falci e Nilce Costa para o Jornalistas Livres
Wadih Damous e Álvaro Quintão, conferenciam sobre a complexa e grave situação política, social e sanitária do Brasil , quando o Brasil assinala o segundo país mais infetado da covid19 no mundo. Dentro deste contexto, a ação da Polícia Federal, que  deflagrou na última terça-feira a Operação Placebo.

Também é comentado a situação das minorias, o desprezo neste momento para estas camadas.  Uma forte avaliação e formas de um novo governo través do PT, no intuito de retirar a extrema direita do poder,

Wadih Damous, ex-deputado federal, advogado trabalhista, que foi presidente da OAB – Ordem os Advogados do Brasil, no Rio de Janeiro, por dois mandatos. Damous é militante do Partido dos Trabalhadores desde a sua fundação, quando ainda fazia o curso de direito na  UERJ – Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

Na presidência da OAB no Rio, uma das bandeiras de Damous foi o lançamento da Campanha pela Memória e pela Verdade, em prol da abertura dos arquivos da ditadura militar. Nesta trajetória, traçou um paralelo do combate à tortura durante o governo militar com o questionamento do instituto da delação premiada, consagrado pela Lava Jato, que virou uma dos fundamentos de sua atuação parlamentar. Teve procuração para atuar como advogado de defesa do ex-presidente Lula quando este se encontrava detido na carceragem de Curitiba.

ex-deputado federal,  advogado trabalhista, que foi presidente da OAB – Ordem os Advogados do Brasil, no Rio de Janeiro, por dois mandatos. Damous é militante do Partido dos Trabalhadores desde a sua fundação, quando ainda fazia o curso de direito na  UERJ – Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

Na presidência da OAB no Rio, uma das bandeiras de Damous foi o lançamento da Campanha pela Memória e pela Verdade, em prol da abertura dos arquivos da ditadura militar. Nesta trajetória, traçou um paralelo do combate à tortura durante o governo militar com o questionamento do instituto da delação premiada, consagrado pela Lava Jato, que virou uma dos fundamentos de sua atuação parlamentar. Teve procuração para atuar como advogado de defesa do ex-presidente Lula quando este se encontrava detido na carceragem de Curitiba.

Quanto a operação Placebo, Wadih Damous não confere qualquer credibilidade quanto ao governador Wilson Witzel, mas defende que a operação poderia ter sido elaborada de melhor forma.

“Eu não sabia o que se passava, quando ouvia de casa, helicópteros a sobrevoar o local, ao verificar e deparei com a polícia federal fazia operação no palácio Guanabara, e nas propriedades particulares do governador Wilson Witzel do Rio de Janeiro e sua mulher.  Esta operação poderia ter sido feita com descrição, apesar da profunda ojeriza que sinto pelo governante e seu governo, mas eu prezo muito a ordem jurídica. É coisa grave, ela estaria repetindo Adriano Anselmo com Sérgio Cabral, usando o escritório de advocacia para celebrar contratos com fornecedores do Estado.”

Quanto ao governo Bolsonaro e as decisões a serem tomadas, e a enfrentamento a pandemia, Wadih menciona que nada é feito e a política da pandemia irá prosseguir.

“Bolsonaro é um aliado da pandemia, é negacionista, confirma que é uma gripezinha. É contra o isolamento social e participa em atos públicos com aglomeração de pessoa. Bolsonaro diz que ainda irá acontecer com muito mais gente”

E acrescenta:

Como os governadores estão na linha de frente no enfrentamento a pandemia e muitas vezes tem que contornar os obstáculos legais e administrativos na compra de equipamentos, para salvar vidas, estes vão ser perseguidos, investigados e sofrer tentativa de desmoralizados por parte de Bolsonaro e a PF.

Quem votou em Bolsonaro sabia em quem votava. Crivela é o homem do Bolsonaro na cidade do Rio de Janeiro, já pensa em flexibilizar a quarentena e ele tem que ser contido nisso. O Brasil está num índice macabro. O Brasil hoje é um país amaldiçoado, não vamos poder entrar em outros países, seremos apontados como agentes da pandemia”.

No que diz respeito a mudança urgente do governo atual:

“Não há como nós aceitarmos Bolsonaro à frente do governo até 2022, o Brasil acaba junto. O Brasil não aguenta assistir passivamente esta estratégia de Bolsonaro, que é simplesmente exterminar pobre e sanear a Previdência Social com extermínio de pobre.

Saídas como o impeachment, é custosa, Rodrigo Maia não tem prazo para aprovar isso, ele tem o poder de arquivar. O impeachment é um teatro político, embora tenha regras jurídicas, o que prevalece é a política. Teríamos que caçar a chapa Bolsonaro/Mourão”.

Garante que a esquerda, tem que reconstruir sua identidade.

A polarização na política brasileira, está se dando pela direita e extrema direita, a esquerda está fora, eu defendo que a esquerda tem que reconstruir sua identidade, construir uma agenda anticapitalista. Neste momento somos o epicentro da pandemia e do desemprego. Frente Ampla é algo mais “amplo”, acho que devemos de reunir esforços e que ela aconteça. Eu defendo uma Frente Ampla em defesa do Estado de direito, mas eleitoralmente, eu defendo uma frente de esquerda para enfrentar o fascismo nas próximas eleições. A tarefa imediata é colocar Bolsonaro para fora do Palácio do Planalto”.

O que pensa o PT com a saída do Freixo:

“A posição oficial do PT no Rio de Janeiro é manter a frente esquerda que eu acho que não acontecerá, que se dava ao nome do Marcelo Freixo, era  o candidato mais viável. O argumento correto não dava pra manter a candidatura por causa da fragmentação da esquerda , não conseguiu unir o PT com outros partidos, assim abandonando a candidatura. Nós não vamos apoiar candidato do PSOL e ponto. Em termos de representatividade na sociedade, me parece que a candidata Benedita preenche bem. Nós vamos continuar a defendendo a frente esquerda, os partidos tem que se sentar e ter maturidade e emergir um nome”.

Álvaro Quintão, começou a militância política por volta dos 16 anos e sendo eleito para a diretoria do sindicato dos metalúrgicos do Rio de Janeiro com apenas 20 anos.

Foi filiado ao PT, onde atuou ativamente na década de 80 contribuindo com a construção do PT e participou ativamente das campanhas que levaram Lula à presidência do Brasil.

Posteriormente, fez faculdade de Direito, e passou a militar na advocacia, sendo eleito presidente do Sindicato dos Advogados do Rio de Janeiro e Conselheiro da Ordem dos Advogados no Rio de Janeiro.

Atualmente, além da Presidência do Sindicato dos Advogados, exerce o Cargo de Secretário-Geral e Presidente da Comissão dos Direitos Humanos na OAB/RJ.

Como advogado atua na área Trabalhista, assessora diversos sindicatos, entre estes, o Sindicato dos Trabalhadores da Aviação, visto neste momento de pandemia ser um dos mais afetado.

Na qualidade de advogado vem participando de várias Negociações Coletivas com base nas normas que estão sendo criadas neste período de pandemia.

Álvaro Quintão, refere que desde a Lava Jato, o Brasil perdeu toda sua legitimidade, tratando-se de um processo mais político do que jurídico, que acabou por dar a oportunidade do atual governo.

“A situação que nos encontramos hoje, já não é nova, voltando a 2014/2015, quando a famigerada operação Lava Jato esqueceu de investigar e de julgar de acordo com a constituição e com as leis. Preferiu fazer daquele processo, um processo político, nós já avisávamos que correríamos riscos muito grande, estava abrindo naquele momento a caixa de pandora”.

E ainda conclui que:

“Eduardo Cunha que presidia a Câmara Federal, fazendo toda barbaridade para levar o Brasil onde chegou, encontrava esse ego naquela operação, naqueles julgamentos mais político do que jurídico que aconteciam em Curitiba, e isso vem acontecendo. Isto acabou contribuindo para eleição deste presidente, que me recuso a dizer o nome”.

Como Presidente da Direção dos Direitos Humanos na OAB/RJ, afirma que as minorias são as mais prejudicadas; pobres, negros, mulheres e índios. Instituições preferem não se manifestar. O tempo é de ditadura e o Brasil se tornou o país do espetáculo, garante.

“Todas chamadas minorias, o que estavam mais fragilizados sentiu na pele esse aumento da violência e da discriminação. O que a gente não vê, são certas instituições que preferem não se manifestar. São trinta e cinco pedidos de impeachment do atual presidente e nenhum destes pedidos, foram sequer analisados. O Brasil tem vivido nos últimos anos um país de espetáculo”.

E ressalta: Vivemos mais tempos de ditadura do que de democracia.

“O governo está mais preocupado é em colocar os pobres e negros nas ruas como os moradores de periferias, enquanto a elite econômica, continuam fazendo sua quarentena voluntária em casa. A política econômica na europa, os governos abrem mão do orçamento, o Brasil não tem intenção de investir”.

Quando se refere a Marcelo Freixo:

“Existe sim resistência de alguns partidos, um dos candidatos da esquerda que já tinha inclusive, o seu apoio pelo PT resolveu retirar sua candidatura, que foi o Marcelo Freixo, porque tem encontrado em outros partidos resistência nesta frente de esquerda que todos nós sonhamos. Tem que se tirar o chapéu ao PSOL, PT e PCdoB, que tem demonstrado a disposição para se buscar uma unidade de fato dos partidos de esquerda. A esquerda tem sim que buscar um candidato viável para as eleições presidenciais. Trabalhar pela união da esquerda, para construir uma base”.

VEJA ABAIXO A ENTREVISTA COMPLETA

Continue Lendo

Trending