Protestos ocorreram em seis estados, nesse domingo (26/4), e reuniram cerca de 500 pessoas em SP
O ato em defesa da democratização da comunicação foi acompanhado pelo aparato policial. Havia ao menos seis viaturas e quatro motos para escoltar a manifestação, que percorreu alguns quilômetros entre a Avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini e a sede da Rede Globo. Na parede da entrada principal, pichações e cartazes chamavam a emissora de “mentirosa”, “procurada”, “assassina” e “golpista”.
As acusações estampadas na parede da Globo estão ancoradas, segundo os manifestantes, na postura conservadora da emissora. “Continua contrária às reformas estruturais e segue com discurso de criminalização dos movimentos sociais e dos defensores dos direitos humanos”, avalia a comunicadora Marina Cardoso, do Coletivo Intervozes. Para ela, a Rede Globo se mantém ao lado das forças conservadoras no Brasil desde 1964, com a ditadura militar, mesmo que pareça haver um ajuste recente. “Para que não seja atacada frontalmente faz, por exemplo, o mea-culpa quanto a apoiar o golpe militar. E esse ajuste de posicionamento também acontece quando a Globo coloca um programa como o [Profissão Repórter] do Caco Barcellos para discutir a redução da maioridade penal, mas fora do horário nobre.”
A questão da maioridade penal vem ganhando espaço na programação da Globo nos últimos meses. De acordo com Thiago Ferreira, secretário de políticas educacionais da União Nacional dos Estudantes (UNE), a emissora tem investido em um forte apelo emocional repetidamente.
“Quer que a população se convença de que a construção de mais cadeias é melhor do que a de mais escolas”, pontua Ferreira.
Um dos profissionais que cobriu o protesto foi um cinegrafista que não quis se identificar. Ele afirmou ser ex-funcionário da emissora e fez críticas à construção das reportagens. “As grandes empresas de comunicação de TV, rádio e impresso têm rabo preso com os empresários e governos estaduais e federal e não consigo ver uma mudança em curto ou longo prazo. Se não rolar uma mudança de valores das pessoas com um pouco mais de visão do que acontece no país, a coisa vai ficar na mesma”, acredita.
A implementação de mudanças no setor foi uma das demandas mais importantes do protesto de domingo. “Os defensores de direitos humanos precisam olhar para a democratização dos meios para conseguir vencer as próximas barreiras”, propõe Marina.
Vida fora da TV
“Minha história nunca passou e nunca vai passar na televisão”, afirmou Joaquim Coelho, 67 anos, trabalhador sem-teto que sofreu reintegração de posse na mesma Berrini. “Eu luto por terra e parece que não querem mostrar o direito que temos”, disse, ao lado da esposa Ilda Santos, de 64 anos.
A percepção de Carlos Guimarães, professor da rede estadual de São Paulo, é de que a cobertura da TV não aborda as demandas dos trabalhadores de maneira equilibrada. “Estamos em uma greve há mais de 40 dias e o Jornal Nacional faz um discurso que propõe diminuir a nossa luta, como se o governo de São Paulo tivesse feito reajuste de nossos salários e nós estivéssemos protestando sem motivo real”, denuncia.
O estudante Yuri Talacimon está no terceiro ano do curso de jornalismo. Ele também questiona a postura dos veículos tradicionais, mas a partir do mundo acadêmico. “Meus professores dão valor absoluto à grande mídia, a ponto de desconsiderarem outras formas de narrativa e de jornalismo colaborativo. A grade curricular vai nesse sentido também. Por sorte, saímos às ruas para mostrar que isso pode ser diferente e não temos de nos submeter a um grupo que domina a audiência.”
Do movimento negro, a militante do Levante Popular da Juventude, Beatriz Lourenço, sugere que nos 50 anos da Globo, a questão racial seja também observada. “As novelas são exemplos de estereótipos. Mas o pior é como se omite o extermínio da juventude negra no país ao citar que jovens foram mortos por serem bandidos”, diz Beatriz, mostrando a negligência ao tratar do tema. “Existe uma parcela da sociedade que é morta apenas por ser negra e jovem.”