Ativistas antirracistas rebatem ministro da Educação sobre “não existir povo negro”

Foto: Ricardo Albertini/Câmara dos Deputados

 

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, disse, recentemente, em um pronunciamento na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, que a deputada federal Talíria Petrone (PSOL-RJ) não teria o direito de representar os negros do país, porque “não existe povo negro, existe brasileiro de pele escura”.

O ministro citou, ainda, como argumento para atacar a deputada, que o avô dele tinha a pele mais escura do que a dela. “Meu avô era mais escuro que ela. Quando ela se atribui como grande defensora do povo negro, não sei quem lhe deu esse cargo”, acrescentou.

A deputada, que estava presente no debate da Câmara, acusou o ministro de desconhecer sobre educação pública, afirmando que ele é contra cotas raciais e que não tem informações sobre políticas afirmativas no ensino superior.

Questionada sobre o caso, a deputada contou à Fórum que vê a fala do ministro como uma tentativa de invisibilizar diversas problemáticas decorrentes do racismo. “Quando o Ministro diz que ‘não existe povo negro’ ele está apagando toda uma história de dor, mas também de resistência, que nosso país passou. Milhares de seres humanos foram sequestrados e escravizados. Esse história traz marcas para o Brasil até os dias de hoje”, respondeu Talíria.

Repercussão negativa

Após a declaração do ministro, o Portal Mídia 4P foi ouvir lideranças sobre esse episódio.

O historiador, mestre em Desenvolvimento e Gestão Social e militante do Coletivo de Entidades Negras (CEN) Marcos Rezende ressalta que, ao afirmar que não existe povo negro, mas um Brasil de pele escura, o ministro da educação não fala isso de forma despropositada.

“Ele visa criar novas narrativas acerca da população brasileira. Claro que ninguém dúvida da ignorância dele, pois ele já nos deu provas suficientes disso. No entanto, ele sabe que o conceito de raça é utilizado tanto socialmente, como também foi muito utilizado ‘cientificamente’, seja por Lombroso em escala mundial ou por Nina Rodrigues no Brasil”, ressalta.

Ele diz, ainda, que criaram perfis do criminoso padrão com a presença de todas as características físicas negras. “Mesmo rebatido por outros cientistas, até hoje a polícia se utiliza desse argumento, porque o racismo estrutura a sociedade brasileira”.

“O ministro tem como última forma acabar com a política de cotas e de ações afirmativas. Na verdade, ele segue a lógica, a cartilha do governo Bolsonaro, e, ao falar isso, ele sabe que a mensagem subliminar é: não existe raça, a raça é humana, uns mais claros e outros mais escuros, mas todos brasileiros. Tentando enfiar o conceito de nação brasileira goela abaixo”, acrescenta.

Rezende cita, também, dados do IBGE, que se utiliza da classificação racial no censo. “54% da população se declararam negros no último censo. Ou seja, para sermos o que o ministro deseja, uma nação brasileira, basta mudar a realidade da população negra em todos os indicativos sociais do país, e de quebra, inserir as contribuições dos povos negros no conceito desse novo Brasil que deseja criar. Só assim poderemos nos reconhecer enquanto integrantes dessa ‘nova nação brasileira”.

A educadora, liderança comunitária de Cosme de Farias e religiosa de matriz africana do Engenho Velho da Federação, Jandira Mawiusi, acredita que a declaração de Weintraub é reflexo do poder branco, elitista e colonizador que ele representa. “Ele está representando o governo dele. Quando o presidente se coloca a favor da ditadura, falar isso não é nada”, ressalta. Jandira é solidária com a parlamentar, representante de uma comunidade que não é pensada por homens brancos, como Weintraub, que estão no poder, no Brasil, há séculos.

“Talíria só devia ter pedido para ele fazer um comparativo: dentro das detenções brasileiras, para ver o número de homens e mulheres negros, da pele escura, e no cenário dele, no Legislativo, pra ver qual é o povo que está lá, se da pele branca ou da pele escura”, ironiza.

A socióloga, defensora dos direitos humanos e membro da Mahin Organização de Mulheres Negras, Vilma Reis, preferiu destacar a importância da presença de mulheres negras, como Talíria Petrone, no parlamento em um contexto de ataque aos direitos das minorias.

“Nós lutamos durante anos para que mulheres negras, como a nossa brilhante parlamentar Talíria Petrone, tivessem o direito de dizer e afirmar a sua negritude, na pluralidade de nossa população negra. Além disso a mandata de Talíria Petrone, assim como de outras parlamentares negras como Áurea Carolina, Erica Malunginho, Renata Souza, Andreia de Jesus e Mônica Francisco, é uma potente experiência de mandatos nacionais, que mudou a estética política brasileira e, neste momento terrível de ataque aos mínimos direitos que conquistamos ao custo de muita luta, elas no parlamento têm um papel decisivo no enfrentamento às narrativas coloniais, de senhores grotestos como o atual ministro da educação”, disse Reis.

*Colaborou Juliana Brito

COMENTÁRIOS

2 respostas

  1. Esse ministro é um falso, deve ser um dos robôs “criadores” de fakes.

  2. Concordo plenamente com a defesa da parlamentar Tailíria neste artigo. São tempos de horror para Brasil, cuja população votante escolheu um neonazi, fanático e ignorante (três caraterísticas que sempre vão juntas) como seu presidente e o bando de cretinos que o acompanham na “cruzada” de destruição e “queima”, tanto literalmente da mata nativa, quanto dos direitos humanos mais elementais que achávamos já adquiridos.

POSTS RELACIONADOS