Era 2013 e os índios em polvorosa mantinham-se. As janelas e portas se fechavam, tudo mentia, desafinado. Tudo foi tão rápido, vejo hoje, mas e as caras, seguem com suas marcas? Insone ocasionalmente, nessas noites frias, sempre me encontro, insônias aos golpes nos surpreendem.
Os do sul sei que ao norte abriram terras, na facilidade de doações que os militares ofereciam aos aventureiros a partir de 1970. Não ficou pau sobre pau. Tudo segue verdinho do Mato Grosso do Sul à Alta Floresta no século 21 e por Rondônia e Pará se espalha a voracidade do agronegócio. O verde escuro do mato em verde claro de soja se consome.
Em 23 de outubro de 2014, às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais, Dilma Roussef finalizava sua carta aberta aos povos indígenas: “Gostaria de dizer a vocês que manteremos os compromissos com o fortalecimento da Fundação Nacional do Índio; com a melhoria do atendimento à Saúde Indígena; com a qualidade da Educação Escolar Indígena; com a articulação para a aprovação, pelo Congresso Nacional, do Conselho Nacional de Política Indigenista e do Estatuto dos Povos Indígenas; com o acesso das comunidades indígenas a políticas nacionais, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e outras, além de avançar na regulamentação e aplicação do direito de consulta livre, prévia e informada, conforme a Convenção 169 da OIT.
Conto com o apoio de vocês para, nos próximos quatro anos, enfrentarmos juntos os desafios e cumprirmos com os compromissos, garantindo o bem viver para todos os povos indígenas no Brasil.”
2015 foi ano de martírio para os Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, frívolos compromissos dispersados entre graves denúncias. Tudo foi uma guerra e um massacre desde 2010 e as mulheres no poder sabiam disso.
Artionka Capibaribe escreveu à época: A terra é basicamente a questão em torno da qual se mobilizam as tensões voltadas aos índios. A queda de braço no Congresso entre essas posições antagônicas saiu das fronteiras dos conhecimentos e políticas especializadas de maneira mais estrondosa, em 2012, com a aprovação da lei do “Novo Código Florestal” (NCF) (Lei Ordinária n.12.651/2012), doravante NCF, que veio revogar a Lei n.4.771 de 1965. Dentre as alterações que introduziu, o NCF flexibilizou a legislação que regulamenta a conservação e o reflorestamento de “Áreas de Preservação Permanente” (APP), ou seja, áreas de florestas frágeis localizadas em regiões de risco, como as que compõem as nascentes e margens dos cursos d’água natural, manguezais, restingas e topos de morro; reduziu as áreas de “Reserva Legal” (RL), i.e., de cobertura de vegetação nativa nos imóveis rurais; e anistiou as multas daqueles que desmataram APP e áreas de RL até 22 julho de 2008. O recado da lei é muito claro: desmatar é Legal.
A CPI da Funai e do Incra (RCP – 22/2013) é parte da campanha feita pelos ruralistas para mudar o rito demarcatório, buscando desqualificar o processo administrativo. Essa campanha tem nos laudos antropológicos realizados pela Funai seu alvo preferencial. Para tanto, os ruralistas pressionam o governo, ao mesmo tempo que acionam seus aliados dentro dele. Foi desse modo que, em maio de 2013, lograram obter uma declaração da ministra chefe da Casa Civil da Presidência da República, Gleisi Hoffmann, pela qual a Embrapa, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o Ministério do Desenvolvimento Agrário passariam a avaliar os estudos antropológicos realizados pela Funai.
O martírio indígena pouco sensibilizou Dilma Rousseff e Gleisi Hoffman, agora empossada presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores. Mas ser presidente de partido político nessa altura do golpe não altera muito o drama e sina dos povos indígenas, quando a água do banho já foi embora junto com a criança. É preciso que fique claro que não basta o cocar na cabeça para acertar contas com o que se fez antes. Cocar significa transmissão de valores, representa força, poder e o ciclo da vida. Sem compromisso, é apenas fantasia em claros cabelos.