Causou comoção nas mídias sociais a “convocação” para uma marcha de apoio aos policiais envolvidos com a chacina de 01 trabalhadora e 09 trabalhadores rurais no município paraense de Pau d’ Arco, neste domingo, 24 de maio.
A chamada informa que a “Marcha em prol dos policiais da operação na fazenda Santa Lúcia” está sendo organizada por um coronel e um sargento da polícia militar, “Cel Barata” e “Sgt Haelton”, com o apoio de um vereador de Belém, “Sargento Silvano”.
A manifestação é considerada pelos críticos como uma ofensiva aberta contra os movimentos sociais, as organizações civis e as comissões de direitos humanos que contestam, com base nos depoimentos de sobreviventes e familiares das vítimas, a hipótese de confronto alegada pelas polícias militar e civil.
Em nota, a Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura rechaçou o ato. “Exigimos uma posição oficial do Governador Simão Jatene e do alto comando da segurança pública no Pará a respeito do uso de símbolos oficiais da Polícia Militar e da Polícia Civil nos materiais de divulgação de tais atos. Queremos saber se o Governo do Estado chancela oficialmente esse tipo de iniciativa absurda”, indaga a diretoria da federação, que assina o manifesto.
No texto, a Fetagri também manifestou solidariedade ao deputado estadual Carlos Bordalo (PT-PA), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), que divulgou no dia 30 um parecer assinado por três deputados, com base numa diligência realizada no dia 26 de maio, por meio da qual foram ouvidos relatos de sobreviventes e de parentes das vítimas.
Segundo o documento de 18 páginas, os relatos e indícios encontrados em campo apontam evidências de que não houve confronto.
“As perfurações de balas nas costas, nas nádegas, nos crânios por trás, além de indícios fortes de tiros à queima-roupa, indicam que houve tudo, menos um confronto. As circunstâncias desse massacre precisam ser averiguadas, as razões também. Mas o fato é que se criou um teatro de horror, porque se desfez a cena do crime, se transportou de uma forma completamente inapropriada os corpos das vítimas, se impediu as famílias de verem os corpos dos seus familiares. Eu lamento dizer à população do Pará que, pelas provas testemunhais que colhemos, houve um massacre violento, covarde e desumano, na Fazenda Santa Lúcia”, afirmou o parlamentar à imprensa no dia 30, reforçando a necessidade uma investigação mais aprofundada sobre o caso.
Questionado sobre os rumores de pressões por parte de parlamentares corporativistas e da ofensiva dos policiais que articulam a marcha contra os movimentos sociais e de defesa dos direitos humanos, ele aponta a entrada da Polícia Federal como um fato de grande importância para a transparência e isenção das investigações.
“Espera-se que essa ofensiva não comprometa as investigações e que o Estado realmente cumpra o que foi prometido pelo próprio governador Jatene, ou seja, uma investigação isenta. Particularmente não acreditamos que isso seja possível, uma vez que o episódio teve envolvimento claro de policiais da região. A entrada da Polícia Federal no caso, nesse sentido, é um elemento muito importante, para garantir mais transparência às investigações”, declarou Bordalo, por meio de sua assessoria de imprensa.
Críticas – Em vídeo veiculado pelo facebook no dia 31, uma semana após o anúncio da chacina, o governador Simão Jatene falou em isenção do Estado no procedimento de investigações sobre as mortes dos trabalhadores. No vídeo de quase 3 minutos e 40 segundos, ele não se pronunciou a respeito do uso dos logotipos das polícias ligadas ao Estado na chamada de apoio público aos policiais afastados dos cargos após os assassinatos.
Em seu blog, o jornalista Lúcio Flávio Pinto, reconhecido nacional e internacionalmente pela cobertura de pautas sobre os impactos sociais dos projetos de desenvolvimento e as violações de direitos humanos na Amazônia, criticou as declarações.
Segundo Lúcio Flávio, que é editor do independente Jornal Pessoal, o pronunciamento na forma de um vídeo mostrou-se como um “eficiente meio de comunicação, mas tosco e inadequado diante da gravidade do caso”, na medida em que “diante de situações explosivas e dramáticas”, o governador tem preferido “a solidão, que o preserva de questionamentos imediatos”.
O jornalista também questionou a comparação do caso em Pau d’ Arco com outros, como os assassinatos da missionária Dorothy Stang, em 2005, e do casal de ativistas ambientais Cláudio e Maria do Espírito Santo, em 2011. Para o governador, em ambos “a Polícia cumpriu rigorosamente seu papel, com apuração, identificação, prisão e entrega à justiça dos responsáveis”.
“A questão é que, nos dois casos, os assassinos foram pistoleiros profissionais, a mando de fazendeiros e madeireiros incomodados pela ação da freira americana e dos dois líderes locais. O gravíssimo no caso de Pau D’Arco é a volta da ação direta da polícia quase como milícia a serviço de terceiros interessados na eliminação do grupo atacado pela força policial”, contesta Lúcio.
“Independentemente das informações que ainda precisam ser produzidas, o que recomenda a prudência, a cautela e a honestidade apontadas pelo governador, para ‘evitar juízos prévios e precipitados’, já não há mais dúvida de que as mortes ocorreram por execução deliberada. Se as vítimas eram bandidos e se havia motivo para a polícia se prevenir, nada justifica a ação violenta, incompetente e – talvez – de má fé da polícia”, completa.