São nove horas da manhã, corro o olhar para não desistir.
Todo dia é dia de índio, me atropela a ciência em manhã na metrópole. De súbito cruzo gente nativa na via, cortando meu asfalto, minhas faixas. Gente isolada, de recente contato, de repente na rua da cidade.
Faz silêncio no trânsito, os homens não sabem, mas sozinhos no mundo os Piripkura andam, extinção de um rumo, caminham entre tantas pernas. Querem a vida, ainda.
Nem tanto drama, mas uma opção pela vida deslocar os últimos homens de um povo à maior cidade, metrópole antropofágica. Coisa daqueles que trazem coragem, refúgio ou atitude. Era Tamadua e Baitá, a irmandade em tão frágil aliança, tão infinito remordimento, tão preponderante cuidado nesse momento; pura convicção nos zelos com a vida entre médicos resolutos.
A problemática dos impactos socioambientais negativos para os Piripkura emerge oficialmente como questão a ser tratada pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI) em 1984, a partir de estudos iniciados pela Operação Amazônia Nativa (OPAN), mas desde 1890 há relatos de conflitos entre os Kawahíwa e não-índios. As informações coligidas nessas referências permitem dizer que os massacres sofridos pelos Piripkura contribuíram fortemente para desestruturar sua organização social e os levaram a estabelecer contato com pessoas vinculadas aos empreendimentos agropecuários instalados no interior de seu território tradicional a partir da década de 1970. Na atualidade, a Frente de Proteção Etnoambiental Madeirinha-Juruena (FPE-MJ) tem confirmada a existência de três sobreviventes, sendo uma mulher (Rita Piripkura) e dois homens (Tikum e Monde’i). Rita vive fora de seu território tradicional desde 1980, mas os outros, com os quais a FPE-MJ fez contato pela primeira vez, em maio de 1989, ainda vivem na TI-PRK, arredios ao contato com a sociedade envolvente. – Uso de recursos naturais pelos Índios Piripkura no Noroeste de Mato Grosso: uma análise do Conhecimento Ecológico Tradicional no contexto da política expansionista do Brasil na Amazônia Meridional – Tarcísio da Silva Santos Júnior, Jair Catabriga Candor, Ana Suely Arruda Câmara Cabral.
http://periodicos.unb.br/index.php/ling/article/view/26663/18868
O Hospital São Paulo, hospital universitário da Escola Paulista de Medicina, da Universidade Federal de São Paulo EPM/UNIFESP, recebe pacientes indígenas desde a década de 1960, quando tiveram início as atividades do Projeto Xingu, programa de extensão universitária, na Terra Indígena do Xingu/MT.
Assim como chegaram, partiram, mais fortes, levando mais vida, enganando o tempo, a multidão, fugindo de nós nos matos de suas almas, terra longe, longe, o corpo que se vai.
A curva de um rio, um túnel de luz na cabeça, um breve olhar na grande aldeia dos brasileiros.
Chama sem pavio, luz sem lâmpada, um trem para estrelas. Lá se vai mais um dia.
*imagens por Helio Carlos de Mello – ©Acervo Projeto Xingu / EPM-UNIFESP.