Uma ocupação de moradia pegou fogo na madrugada desta terça-feira (01) na capital de São Paulo, o prédio veio a baixo no início da manhã deste 1º de maio. O prédio ficava na região central, próximo ao Largo do Paissandu, na esquina da Avenida Rio Branco com a Rua Antônio de Godoi, e fazia parte do MLSM (Movimento de Luta Social por Moradia).
De acordo com a prefeitura, cerca de 150 famílias, totalizando 400 pessoas, eram cadastradas como moradores da ocupação. Ricardo, que se apresentou a reportagem como uma das lideranças do movimento, falou em 180 famílias. Muita gente.
O prédio de 24 andares e 11 mil metros quadrados era da Polícia Federal e estava ocioso desde 2003, quando o orgão se mudou para a Lapa. De acordo com moradores, a ocupação ocorreu entre 2008 e 2009.
Ana Paula e sua família, 7 filhos e 2 netos, eram parte dos moradores mais antigos, moravam há 10 anos no prédio. “A gente começou a escutar um barulho, a gente estava dentro de casa, achamos que era tiro, quando olhamos na janela, meu filho viu que era fogo no 5o andar. Aí meu filho saiu pra cima avisando todo mundo, ele falou: ‘mãe desce com as crianças avisa todo mundo que tá pegando fogo no prédio’ mas teve gente que ficou no prédio, não deu para salvar”
Embora o Corpo de Bombeiros não tenha liberado uma lista oficial de desaparecidos, diversos moradores relataram que quem estava nos andares mais baixos conseguiu sair, mas que os moradores dos andares mais altos, do 6o ao 10o, haviam subido para fugir do fogo e estavam no edifício no momento que ele desabou.
De acordo com relatos, o fogo começou por volta das 1h30 da madrugada no 5o andar. A causa ainda é desconhecida e diversas hipoteses são levantadas. Alguns moradores relatam que o foco teria sido a explosão de um butijão de gás. Outros uma possível briga. Gerivaldo Araújo, que foi porteiro da ocupação, não descarta incêndio criminoso. De acordo com o morador, a ocupação estava sofrendo ameaças há tempos. Ele explicou à reportagem que, por ficar em uma área valorizada, central e próxima ao metrô, a ocupação era muito visada pela especulação imobiliária e mal vista pela vizinhança.
Tudo é ainda muito nebuloso, e lideranças do movimento social temem que o incêndio sirva como motivo para acentuar a já existente criminalização dos movimentos de moradia. Benedito, advogado da Central de Movimentos Populares – CMP, falou em entrevista aos Jornalistas Livres, que teme que o incêndio dê início a uma onda de reintegrações de posse.
Os prédios ao redor foram todos desocupados, e ainda não se sabe se existe risco de novos desmoronamentos.
Cesar, da coordenação da Assistência Social, nos informou que chegaram na região ainda na madrugada. A prefeitura ofereceu aos moradores abrigo no CTA 3, uma espécie de Albergue, mas que a maioria dos moradores optou por não ir ao abrigo. Até o fechamento desta reportagem, mais de 250 pessoas, cerca de 46 famílias haviam sido cadastradas.
Para os moradores, o albergue é uma solução temporária e não resolve a questão principal da moradia.
O atual prefeito Bruno Covas (PSDB) esteve no local e em coletiva de imprensa informormou que está em contato com a cruz vermelha e que ela irá fazer o atendimento inicial às vítimas. O prefeito irformou que em um segundo momento “a prefeitura deverá dar o melhor tratamento aos sem teto”
O prefeito informou que o Estado irá colaborar com aluguel social e que as pessoas estão sendo encaminhadas para centros de acolhida para que elas tenham onde “passar pelo menos o dia e a noite de hoje, e se for necessãrio os dias subsequentes”
Questionado sobre politicas habitacionais disse que “essa e uma ação conjunta com o governo do estado e federal”. Jornalistas também questionaram se a possibilidade de aluguel social havia sido oferecida antes da tragédia, Covas disse que não, pois não haveriam recursos. Segundo ele, após a tragédia o Estado estado transferiria esses recursos.
O prefeito se manifestou sobre a normalização do tráfego “hoje às 16h a CET vai divulgar um plano para facilitar o trabalho dos bombeiros na remoção dos escombros”.
Michel Temer também esteve presente no local, mas saiu às pressas ao som de chingamentos e gritos de Fora Temer.
A Ocupação
De acordo com os moradores, a ocupação era organizada e todos viviam bem. Os moradores eram em sua grande maioria trabalhadores de baixa renda, e todos contribuíam com uma taxa de R$ 80 que servia para a manutenção do prédio.
Os moradores com os quais a reportagem conversou moravam há pelo menos 4 anos na ocupação.
No dia 10 de março, segundo a secretaria do municipio, havia cerca de 150 famílias, com 400 pessoas, ocupantes do prédio. Desse total, 25% são famílias estrangeiras. Esse cadastro foi realizado para identificar a quantidade de famílias, o grau de vulnerabilidade social e a necessidade de encaminhamento das famílias à rede socioassistencial.
A resposta não veio a tempo.
A situação da Moradia
De acordo com o Censo 2010, a capital paulista possui cerca de 290 mil imóveis que não são habitados, o mesmo estudo diz ainda que o déficit habitacional na cidade chega a 712 mil famílias, em habitações irregulares ou precárias, como favelas e cortiços.
Milhares de imóveis que não cumprem sua função social. Os movimentos sociais ressaltam que a ocupação é uma solução temporária de moradia, e denuncia o desmonte das políticas públicas de habitação. De acordo com o Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilios), de 2015, o enxugamento de programas sociais como o Minha Casa, Minha Vida e a recessão do setor da construção civil, tiveram como resultado, entre 2013 e 2015, a redução de quase 400 mil unidades habitacionais.
Ocupar e resistir
De acordo com o Observatório de Remoções, projeto desenvolvido pela FAU USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo) e pela Universidade Federal do ABC, em outubro de 2017 havia cerca de 720 ocupações irregulares na cidade de São Paulo.
Escombros do prédio que desabou no Largo do Paissandu na madrugada de hoje. 01/05/2018. Foto: João Wainer.
“Nasci no escadão da Vila Solange, Guaianazes e tudo que sei sobre a vida aprendi aqui.”
Assim começa o bate papo online que tive, na tarde desta sexta (19/06), com Pamela Vieira, bióloga e gerente de baladas que encontrei num grupo de Whatsapp.
A postagem que estimulou esse contato trazia uma série de fotos de crianças da zona Leste de São Paulo estudando juntas, dentro de uma casa simples, como se fosse uma sala de aula improvisada. As imagens, em ampla maioria, mostravam mulheres negras da comunidade orientando as crianças em atividades recreativas e educacionais. Vi ali um cenário tão organizado – ou até melhor – que uma sala de aula de escola particular de um bairro de classe média da capital. O post havia sido publicado no grupo pelo professor de artes negro João Tody.
Imediatamente, lembrei do Ensino à Distância tão vangloriado por João Doria, governador de SP, e que tem sido seriamente criticado não só por pais e professores como, também, por estudantes que desde o início da pandemia do novo Coronavírus denunciam dificuldades absurdas para acessar as aulas.
Além do improviso pedagógico e da falta de estrutura para amparar educadores nessa nova modalidade de ensino, não foram levados em consideração problemas inerentes à uma proposta de ensino universal; como a falta de acesso a computadores pelos alunos ou as péssimas conexões de internet, especialmente, em bairros das periferias de São Paulo.
Tudo feito pela comunidade
Aquelas fotos que retratavam a iniciativa em Guaianases me emocionaram. Resolvi saber mais sobre aquelas crianças e os métodos de organização das atividades. De cara, descobri que tudo é completamente autônomo, sem o incentivo de nenhuma empresa e subsidiada pelos próprios moradores do local. Algumas doações de materiais escolares vieram de pessoas próximas ao bairro.
A bióloga, Pamela Vieira é a idealizadora do projeto
Quando perguntei a Pamela o porquê de ter iniciado a atividade, ela trouxe a realidade de sua infância. “Parei um dia para observar a vida das crianças ao meu redor, inclusive do meu filho, e vi que por mais que ainda existam as brincadeiras, faltava educação de escola mesmo. Lembrei que quando pequena eu sempre brincava de escolinha com minhas primas e assim aprendia muitas coisas. No início dessa pandemia, me sentia muito triste e para não me entregar a uma depressão, decidi me ocupar dando amor e atenção a essas crianças e recebendo em dobro.“
A iniciativa educativa atende cerca de 25 crianças e adolescentes que vivem nessa região da cidade e muitas ainda não são alfabetizadas. Algumas famílias têm mais de 5 filhos, todos crianças pequenas e muitos pais não conseguem, durante a pandemia, manter em seus lares o ritmo de aprendizado das escolas onde estudam. Assim, Pamela conta que o intuito do projeto é fazer com que esse tempo fora das “salas de aula oficiais” seja produtivo. Ela acha imprescindível ensinar e reforçar de forma divertida e criativa o papel da escola. As aulas acontecem entre 10h e 14h, de segunda a sexta.
A maioria das crianças vive o dia inteiro em seus quintais, algumas são órfãs de pai ou mãe ou às vezes dos dois. Algumas moram com avós. O perfil predominante é daqueles que não têm o pai presente e, neste caso, suas mães trabalham em casa mesmo. Em tempos de pandemia, crise e fome crescentes, a situação anda cada vez mais trágica.
A bióloga defende que o projeto vai fortalecer a educação dessas crianças, não só no tema da alfabetização, mas filosoficamente, pois uma visão sobre quem eles são e tudo que podem ser começa a ser ampliada.
O professor João Tody vai doar para as crianças suas experiências na arte
O professor João Tody, que me alertou sobre a iniciativa, também vai se juntar às crianças e na próxima semana, iniciará aulas de artes para a molecada por lá. “Antes nós achávamos que a revolução seria feita quando algum senhor de terno, barba e óculos aparecesse na quebrada e criasse um projeto social, mas ninguém com essas características chegou por aqui e percebemos que a revolução teria de ser uma iniciativa de nós mesmos.” diz, Tody
Importante dizer que além de aprender, as crianças recebem o lanchinho todos os dias. “A gente faz um pão com manteiga e nescau, ou bolacha com suco. A maioria das coisas que eles comem eu mesma compro e outros doam bolachas e doces. Para arrecadar algum dinheiro eu vendo geladinhos aqui em casa. As vezes, acham que somos salvadores dessas crianças, mas são elas é quem nos salvam.” Finaliza, Pamela
Importante: no retorno às suas casas, crianças e pais cumprem rigorosamente todos os protocolos de assepsia e cuidados contra o COVID-19
Financiamento coletivo emergencial para apoiar mestres de cultura popular durante a pandemia
A iniciativa “Salve Mestras e Mestres!” é uma campanha de financiamento coletivo que tem como objetivo auxiliar mestras, mestres, brincantes e espaços de cultura popular de diversas localidades do Brasil. Devido à COVID-19, esses fazedores de cultura ficaram impedidos de realizar seus trabalhos e festividades, o que significa praticamente a paralisação total de suas atividades, bem como de toda a cadeia produtiva em volta destas manifestações. Associado a isto, observa-se uma lacuna estrutural no processo de inclusão digital de diversas comunidades, o que dificulta ou torna inexistente a realização de atividades online que possam prover alguma renda, como lives, ou inscrição em editais.
A iniciativa “Salve as Mestras e Mestres!” pretende juntar R$ 36.000 (incluindo taxas da vakinha e transações bancárias), para serem distribuídos da seguinte forma:
R$ 500 para 20 mestras e 20 mestres;
R$ 300 para 10 brincantes da cultura popular;
R$ 1.000 para 10 espaços de coletivos de cultura tradicional.
O projeto foi lançado na última quarta-feira (27) e contará com atividades online em suas redes sociais, como Instagram e Facebook, incluindo lives com artistas e fazedores de cultura de diversas partes do país durante as sextas, sábados e domingos do mês de junho. As atrações confirmadas para este final de semana são Marcelo Jeneci (SP), (sábado, 30/5 às 20h) e Bumba Boi da Floresta de Mestre Apolônio (MA) (domingo, 31/5 às 17h e às 20h) . A Programação completa será informada em nossas redes sociais ao longo do mês.
O movimento é uma iniciativa autônoma independente de brincantes envolvidos em diversas manifestações populares. “Se para toda sociedade esse é um momento difícil, como estão nossos mestres, que tanto nos ensinaram, que tanto podem ensinar e tem se dedicado a manter as tradições populares pelo país por toda suas vidas? Esse foi o pensamento que gerou este projeto e que conta com a sensibilidade de todos os que puderem contribuir para ajudar nossos mestres”.
Idealização: Juba Carvalho, Luiza Fernandes, Juliana Bueno, Leandro Dias, Júlia Coelho, Savana Regina, Telita Arantes, Sofia Fajersztajn e Daniel Brás.
A que ponto chegamos. Em meio a uma praga que diariamente fulmina milhares de vidas mundo afora, lemos, ouvimos, assistimos __até pelo confinamento compulsório__, supostos luminares preocupados com o que virá depois.
Uma pergunta: e o que está acontecendo agora?
É impressionante ver “especialistas” contabilizarem mortos “inevitáveis”. Chegou-se ao cúmulo de uma assessora de Bolsonaro, Solange Vieira, registrar que os óbitos de agora são velhos em sua maioria e aliviam as contas da Previdência.Assim informam os noticiários, embora ela agora tente desesperadamente desmentir.
Justiça seja feita, não se trata apenas do Brasil. Na maioria dos países dominados pelo grande capital, a grande preocupação é com o fim dos isolamentos, das quarentenas, com a reabertura do comércio, a reativação da indústria e a “retomada da economia”.
Mortos? E daí?
Detalhe: briga entre Moro e Bolsonaro, ambos walking deads, rusgas com o Supremo, Congresso, embates com governadores, claro, têm sua importância. Mas o que o povo quer e precisa saber é o seguinte:
Cadê o auxílio miserável de R$ 600 que 1 em cada três brasileiros ainda não recebeu? Cadê os testes? Cadê os leitos de UTI? Cadê os respiradores? Cadê a esperança? Cadê?
Tantas perguntas sem respostas criam fogueiras de angústia e desassossego: Quem vai morrer amanhã? Qual parente ou amigo vou ver num caixão à distância? E quando for comigo? Com as pessoas que amo?
É uma vergonha.
Poucos dos endinheirados se importam com as mortes que se acumulam HOJE. Em plena avenida Brasil, em São Paulo, o drive thru do chiquérrimo Laboratório Fleury tem fila de carros de luxo na porta. Dentro deles, pessoas que fazem os testes para Covid-19: R$ 450 para saber se você está com o vírus agora; R$ 420 para saber se você já foi contaminado e, portanto, tem anticorpos para a doença. Total: R$ 970 por cabeça. Enquanto isso, os pobres morrem sufocados, afogando-se no seco, sem nem ao menos terem confirmada a causa de tanto sofrimento. É por essas que a doença hoje está matando o povo mais carente na imensa maioria dos casos.
Porta-vozes dos tubarões do 1% mais rico da população nem enrubescem ao afirmar que, não fossem as favelas, a situação já estaria sob controle (Guilherme Benchimol, sócio do Itaú, criador da XP investimentos, o caça níqueis dos incautos, milionários lavadores de dinheiro e que tem como garoto propaganda gente como Luciano Huck).
Sei que prego no deserto dominado pela mídia oficial e seus comparsas. Mas a verdade tem que ser dita.
Os bilhões e bilhões de dólares nas mãos de uns poucos seriam mais do que suficientes para socorrer os milhões que hoje estão à míngua, sem direito a um tratamento digno.
Tem mais: a tecnologia high tech, capaz de tantas proezas, certamente tem condições de encontrar em tempo recorde uma vacina contra um vírus que não passa de uma sequência de outros que já surgiram.
Mas não. O que se observa é uma disputa entre laboratórios farmacêuticos poderosos para ver quem chega primeiro a um remédio ou a uma vacina eficaz para, assim, disparar nas bolsas de valores. Pura especulação. Não há colaboração entre cientistas de ponta. Tampouco os grandes conglomerados multinacionais sentem-se obrigados a reorientar sua produção para equipamentos voltados a salvar as milhares de vida perdidas diariamente. Estão mais preocupados em demitir e cortar salários sob o argumento de que “a economia parou”.
Agora, virou moda falar em “novo normal”. Uma estupidez à altura dos cínicos que engordam seus cofres à custa das vidas dos mais pobres e do sucateamento dos sistemas públicos de saúde promovido pelo neo-liberalismo atroz.
O que precisamos é inaugurar um tempo em que a solidariedade e o respeito aos desvalidos falem mais alto que a ganância desmedida imposta pelo capitalismo imperialista.
*Ricardo Melo, jornalista, foi editor-executivo do Diário de S. Paulo, chefe de redação do Jornal da Tarde (quando ganhou o Prêmio Esso de criação gráfica) e editor da revista Brasil Investe do jornal Valor Econômico, além de repórter especial da Revista Exame e colunista do jornal Folha de S. Paulo. Na televisão, trabalhou como chefe de redação do SBT e como diretor-executivo do Jornal da Band (Rede Bandeirantes) e editor-chefe do Jornal da Globo (Rede Globo). Presidiu a EBC por indicação da presidenta Dilma Rousseff.
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