Domingo de frio e garoa na Av Paulista. Um grupo de manifestantes chega em silêncio ao vão do Masp disputando espaço com a feira de antiguidades.
Vestidos de preto, a boca amordaçada, em silêncio, segurando velas que logo serão acesas, com camisetas e faixas com a pergunta estampada — Quem matou 19?
Organizada pela Ong Rio de Paz — base São Paulo esse grupo se reuniu para “prestar solidariedade as famílias das vítimas, cobrar das autoridades a elucidação do caso e também auxílio as famílias. Auxílio financeiro, psicológico, social, médico e chamar a atenção para o que tem acontecido nas periferias, essa cultura de que o pobre é matável, isso não pode mais ocorrer” — palavras de Claudio, um dos organizadores da manifestação.
A cena era impactante, 19 cruzes enfileiradas na calçada, com os nomes de cada uma das vítimas. Mesmo assim pouca gente parecia se importar com o que acontecia ali. Em pouco mais de três horas de protesto poucas foram as pessoas que pararam para se perguntar do que se tratava.
Uma mulher se destacava dos demais, trazia na mão direita uma vela e na esquerda a foto de um rapaz negro, sorridente, com uma camisa do time do São Paulo. Seu nome, Dona Zilda. O rapaz da foto era Fernando, seu filho, pintor, 35 anos, que saiu de casa aquele dia para cortar o cabelo e não voltou mais.
Naquela noite Dona Zilda ouviu os tiros mas achou que eram fogos, já está acostumada com esse tipo de barulho na região onde mora, conforme disse, mas ao ouvir os gritos que vinham da rua saiu e se deparou com o corpo de seu filho, morto, ensanguentado, cena a qual jamais irá esquecer.
Difícil esquecer também a cena dessa guerreira, que num momento de tanta dor encontra forças para denunciar a situação, que mesmo sem esperanças de que o caso seja esclarecido decidiu não se calar, porque como mesmo disse isso seria omitir a morte de seu filho.
E disse mais — “Mas eu acho que é por causa desse silêncio que as coisas chegaram aonde chegaram e daqui para pior.”
Dona Zilda tem razão, provavelmente os que puxaram os gatilhos nunca sejam descobertos e punidos, mas ela sabe, todos nós sabemos quem matou 19.
Quem matou 19 foi o silêncio conivente de uma sociedade que se cala contra a violência cotidiana que massacra quem vive nas periferias e que apóia secretamente (alguns setores nem tanto) esse tipo de acontecimento.