Reduzir gastos tem sido a marca da política econômica do governo do MDB e do PSDB, com Temer na presidência. A principal ação foi a Emenda Constitucional 95, chamada de PEC do Fim do Mundo, que comprime as despesas e os investimentos públicos por 20 anos. Embora tenham sido muitos os cortes, fiquemos nesse teto de gastos.
Antes do impedimento de Dilma, o MDB lançou o programa Ponte para o Futuro, fortemente amparado nas crenças dos economistas do PSDB. Esse programa explica que a lógica por trás dos cortes era que os empresários, ao perceberem finanças públicas saudáveis, teriam mais confiança no futuro, fariam os investimentos necessários para voltarmos a crescer, o emprego aumentaria (com piores condições para os trabalhadores, mas aumentaria) e seríamos felizes para sempre.
Mas não foi bem assim que os eventos se sucederam.
Em primeiro lugar, é preciso reforçar que sem estabilidade política, sem alguma previsibilidade, não há confiança. Além disso, os empresários só tomam a decisão de investimento quando há perspectiva de lucro. Eles, habitualmente, adiam seus projetos de crescimento se percebem que terão dificuldades para vender seus produtos. Cortes e mais cortes nas despesas e nos investimentos do governo não inspiram muito lucro futuro para as empresas, não é verdade?
Vejamos, como exemplo, os cortes nos investimentos públicos:
Esse primeiro gráfico mostra o investimento público de 1947 até 2017. Atingimos o menor valor da série em 2017, quando os governos federal, estaduais e municipais investiram 1,85% do PIB. Esse percentual equivale a cerca de 120 bilhões de reais. Se compararmos com os 13 anos dos governos de Lula e Dilma, chegamos ao fato que, sob Temer/Meirelles, o governo investiu, em 2017, cerca de R$ 100 bilhões a menos do que a média (3,4%) dos anos de governo petista. Sob aplausos dos economistas do mercado financeiro e dos meios de comunicação conservadores, foram retirados 100 bilhões de reais do organismo econômico. Notem que estamos nos referindo somente à linha investimentos, o arrocho não parou por aí.
Ao perceberem esses e outros cortes nos dispêndios do governo, além da falta de horizonte político, os empresários se retraíram. Somou-se a retração dos empresários aos cortes do governo. O resultado foi que a taxa de investimento da economia brasileira despencou nos últimos anos.
A taxa de investimentos total da economia brasileira ficou em 15,63% do PIB em 2017. Essa é a menor taxa de investimento desde 1965. Repetindo o mesmo cálculo anterior, percebemos que, em 2017, o investimento total da economia brasileira foi 200 bilhões de reais menor que a média (18,86% do PIB) dos 13 anos de governos Lula e Dilma.
Ou seja, o governo deixou de investir 100 bilhões de reais, os empresários se retraíram e também deixaram de investir outros 100 bilhões. Um dos setores mais afetados pela queda brusca nos investimentos foi a construção, como nos mostra o gráfico abaixo, extraído do Boletim Trabalho e Construção na Região Metropolitana de São Paulo. Reparem que o setor fechou 139 mil postos de trabalho nos últimos três anos só na grande São Paulo, o que totaliza uma queda de 18,8%.
Mas e os consumidores? Bem, com o número de desempregados oscilando entre 12 e 14 milhões, não se pode esperar que o consumo fique aquecido. Os trabalhadores que conseguiram manter seus empregos, especialmente aqueles de renda mais baixa, reduziram seu consumo aos produtos de subsistência. Não é por outro motivo que a queda principal nas vendas se verificou nos automóveis, motos e bens de consumo durável.
E assim resta, mais uma vez, demonstrado o ciclo vicioso da austeridade em um momento de recessão: o governo quer demonstrar para todo mundo seu compromisso com o equilíbrio fiscal, então corta despesas e investimentos. Os empresários sabem que a falta de dinheiro em circulação vai complicar suas vendas e seus lucros. O que fazem? Cortam investimento e custos. Imitam o governo. Os trabalhadores que perderam seus empregos são alijados do mercado de consumo. Aqueles que conseguiram permanecer trabalhando, receosos, cortam seus gastos ao mínimo. Os impostos caem e o governo arrecada menos. O ministro da Fazenda reafirma que equilibrará as contas públicas e corta mais um pouco. E o ciclo se realimenta. O termo austericídio é bem adequado a essa política econômica.
E o que propõe o programa do Partido dos Trabalhadores?
Em uma frase: o PT quer fazer tudo ao contrário do que fizeram os aliados MDB e PSDB. A começar pela revogação da Emenda Constitucional 95, o Plano Lula de Governo assume que, em momentos de recessão, o único motor com capacidade para retirar a economia do atoleiro é o governo. O Plano se propõe a fazer isso em duas vertentes: aumentar os investimentos e os recursos para o consumo nas mãos dos mais pobres.
As iniciativas emergenciais, delineadas no Plano, para a economia voltar a criar oportunidades de emprego são: a retomada das obras inacabadas, dos investimentos da Petrobras e do Programa Minha Casa Minha Vida. Além de reforçar o programa Bolsa Família e criar linhas de crédito com melhores condições para famílias endividadas.
A lógica do Plano é que ao perceber a disposição do governo em empurrar para que a economia “pegue no tranco” e ao sentir os efeitos do retorno dos fluxos de recursos na economia, empresários e consumidores voltem a se animar, voltem a ter expectativas positivas quanto ao futuro.
Mas existe dinheiro para retomar investimentos? No primeiro momento será necessário aumentar a dívida pública, pois a arrecadação caiu fortemente com a recessão. No entanto, o retorno do crescimento permitirá que a arrecadação cresça e a administração da dívida a faça retornar aos níveis em que estavam antes da crise. O crescimento real do PIB, 45%, dos anos 2003 a 2015, fez com que a dívida líquida do setor público chegasse a um nível bastante baixo: 35,64% do PIB em dezembro de 2015.
O último dado da dívida líquida, de junho de 2018, é de 51,41% do PIB. O crescimento foi de 16 pontos percentuais, que equivale a um acréscimo na dívida do governo de 1,3 trilhão de reais. Note-se que, mesmo com um discurso oficial, do MDB/PSDB, de austeridade e compromisso com as finanças públicas, a dívida subiu assustadoramente. Isso é a demonstração cabal de que a política de cortes não deu certo. Bem ao contrário, ajudou na recessão ao mesmo tempo em que provocou um salto na dívida do governo. Aliás, a experiência internacional, aceita atualmente até mesmo pelo Fundo Monetário Internacional, é que a austeridade preconizada há algumas décadas somente fazem agravar a recessão e a dificultar a vida dos mais pobres.
O Plano Lula de Governo para reativar a economia brasileira não para por aqui. Envolve planejamento, reindustrialização, desenvolvimento regional, compromisso do Banco Central com o emprego e com a inflação, reforma tributária para tornar o sistema mais simples e socialmente mais justo, entre outros projetos. Mas esses assuntos serão tratados em um próximo texto.
Notas
1 Para ver o Plano Lula de Governo: http://www.pt.org.br/plano-lula-de-governo-2018-e-apresentado-ao-pais/
2 Para ver Boletim Trabalho e Construção na Região Metropolitana de São Paulo do Dieese: https://www.dieese.org.br/boletimtrabalhoeconstrucao/2018/pedBoletimTrabalhoConstrucaoSAO.html