Para que serve o 1 de maio?

1 de maio de 1980 - reprodução abcdeluta.org.br

A verdade é que, nesse início do ano 3 do golpe, temos bem pouco para celebrar. O produto do nosso trabalho continua sendo alienado de nós. Uma exceção que anima é constatar o orgulho que transborda dos trabalhadores ligados ao MST, em suas feiras da reforma agrária. Porém a expropriação relatada na canção “Cidadão”, gravada por Zé Geraldo e composta por Lúcio Barbosa há cerca de 40 anos, continua sendo a regra:

Tá vendo aquele edifício moço?
Ajudei a levantar
Foi um tempo de aflição
Eram quatro condução
Duas pra ir, duas pra voltar

Hoje depois dele pronto
Olho pra cima e fico tonto
Mas me chega um cidadão
E me diz desconfiado, tu tá aí admirado
Ou tá querendo roubar?

Meu domingo tá perdido
Vou pra casa entristecido
Dá vontade de beber
E pra aumentar o meu tédio
Eu nem posso olhar pro prédio
Que eu ajudei a fazer

 

Ao continuar a busca por uma razão para comemorar nas pesquisas do IBGE, nos deparamos com o aterrorizante número de 13,7 milhões de desempregados no país no primeiro trimestre de 2018. Ao comparar com a desocupação média de 2014, que foi de 6,7 milhões de pessoas, constatamos que temos o dobro de pessoas sem emprego. Além disso, o número de trabalhadores com carteira assinada, que superava 36 milhões nos mesmos trimestres de 2014 e 2015, hoje se encontra abaixo de 33 milhões.

Quem sabe encontramos boas novas na “Modernização das Leis Trabalhistas”? Não precisamos de muito esforço: se pararmos dois minutos para avaliar as mudanças promovidas após o golpe ficará muito claro que as novas regras são uma modernização às avessas, um retrocesso de mais de 50 anos, uma retirada em massa de direitos e enfiada goela abaixo da classe trabalhadora sem qualquer negociação ou discussão.

Talvez a data se preste, apenas, para registrar e disseminar o empenho da elite dominante em transformar a educação, a saúde, a água, as florestas, as aldeias e os quilombos em mercadorias. Da mesma forma já operada com a força de trabalho, como nos relembra Marx:

Por modo de produção, ele [Marx] não se referia apenas ao estado da técnica – ao que chamou de estágio de desenvolvimento das forças produtivas – mas ao modo pelo qual se definia a propriedade dos meios de produção e às relações sociais entre os homens que resultavam de suas ligações com o processo de produção. Desse modo, o capitalismo não era apenas um sistema de produção para o mercado – um sistema de produção de mercadorias, como Marx o denominou – mas um sistema sob o qual a própria capacidade de trabalho “se tornara uma mercadoria” e era comprada e vendida no mercado como qualquer outro objeto de troca. Seu pré-requisito histórico era a concentração da propriedade, dos meios de produção em mãos de uma classe, que consistia apenas numa pequena parte da sociedade, e o aparecimento consequente de uma classe destituída de propriedade, para a qual a venda de sua força de trabalho era a única fonte de subsistência. (Em Maurice Dobb, A Evolução do Capitalismo, p. 17)

Estendendo nossa visão para um pouco além, constatamos que o modo de produção capitalista predomina em nossa sociedade há 3 ou 4 séculos. Esse espaço de tempo não é tão significativo ao compararmos com o tempo que a raça humana habita este planeta. Como nos ensina Marx:

Uma coisa… está clara: a natureza não produz, de um lado, possuidores de dinheiro ou de mercadorias e, do outro, meros possuidores das próprias forças de trabalho. Esta relação não tem origem na natureza, nem é mesmo uma relação social que fosse comum a todos os períodos históricos. Ela é, evidentemente, o resultado de um desenvolvimento histórico anterior, o produto de muitas revoluções econômicas, do desaparecimento de toda uma série de antigas formações da produção social. (O Capital, livro 1, p. 199)

Assim, em que pesem todos os percalços desses anos, é preciso lembrar a cada dia, especialmente a cada 1 de maio, que o capitalismo não existe desde sempre e não existirá para sempre.

Notas

1 Canção “Cidadão”, de Lúcio Barbosa, interpretada por Zé Geraldo: https://youtu.be/cCnr8bpe6hI

2 PNAD contínua https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/20994-pnad-continua-taxa-de-desocupacao-e-de-13-1-no-trimestre-encerrado-em-marco.html

COMENTÁRIOS

POSTS RELACIONADOS

MST: Tirando leite da pedra

Por frei Gilvander Moreira¹ Se prestarmos bem atenção em certas notícias, veremos como uma brutal injustiça socioeconômica se reproduz diariamente no Brasil. Eis algumas notícias

Há futuro para a esquerda brasileira?

Por RODRIGO PEREZ OLIVEIRA, professor de História da Universidade Federal da Bahia O 1° turno das eleições municipais confirma o ciclo de derrotas que marca