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Orçamento seletivo

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Por Maria Carolina Trevisan 

Há quase três meses no poder, o governo provisório decidiu adotar a lupa do equilíbrio das contas públicas para determinar suas prioridades. Esse caminho tem implicações importantes, não apenas em impactos econômicos. As consequências serão sentidas pela parcela mais vulnerável de brasileiros. São mudanças de recursos e acesso à Saúde e Educação – direitos sociais garantidos pela Constituição –, nas ações de combate à pobreza, segurança pública, segurança alimentar e agricultura familiar, entre outras.

A justificativa é uma retórica simplista que afirma que “a Constituição não cabe no Orçamento”. 
A tendência conservadora vai além das contas públicas e atravessa todos os ministérios, numa ofensiva (às vezes silenciosa) que se reflete em recuos nos direitos sociais e humanos. Para analisar esses efeitos, a equipe da ex-ministra do Desenvolvimento Social Tereza Campello, que comandou a pasta no governo Dilma Rousseff e é também uma das técnicas responsáveis pela concepção do Programa Bolsa Família, montou uma plataforma que tem como objetivo chamar a atenção para esses retrocessos. É o “Alerta Social – Qual Direito Você Perdeu Hoje?”, que detectou, até o final de julho, mais de 40 ameaças à área social. Cumpre o papel de registrar esses acontecimentos em uma linha do tempo. “Como a velocidade da desestruturação do Estado e do desmonte é muito grande, o ‘Alerta Social’ é uma ferramenta fundamental para contar a história da desorganização do Estado brasileiro”, explica Campello.A ferramenta é uma maneira de expor também sua opinião diante das tentativas de silenciar os ganhos sociais do governo Dilma. “Acho dramático que durante esse período, com tantas mudanças sociais, a imprensa tradicional não tenha me procurado para escutar o contraditório. Não existe a menor preocupação”, revela a ex-ministra. “Não é necessário concordar com a minha opinião. Mas não sou só uma ex-ministra que comandou a área do desenvolvimento social por cinco anos, com reconhecimento no Brasil e no mundo. Fui também a técnica que estava na origem do trabalho do Bolsa Família. Desapareci, a história do Bolsa Família, de 14 anos, desapareceu. Isso é muito grave.”
Infográfico: Revista Brasileiros

Infográfico: Revista Brasileiros

É inquestionável o sucesso do programa Bolsa Família. Quando começou, em 2003, o Brasil tinha 23,6% de sua população em situação de pobreza e 8,2% em contexto de extrema pobreza (famílias com renda abaixo de R$ 77 mensais por pessoa). Os dados mais recentes, de 2014, demonstram que a pobreza caiu a 7% e a extrema pobreza a 2,5% do total de brasileiros. Os que mais sentiram essas mudanças foram as crianças de até 5 anos.

Significa que 36 milhões de pessoas saíram da linha de extrema pobreza e entraram para o sistema de garantia de direitos do Estado: passaram a ter acesso à Saúde, Educação (condicionalidades para integrar o Bolsa Família), Assistência Social e alimentação. É muito mais que a transferência de renda e tem impactos amplos e profundos. Por exemplo, no primeiro semestre do ano passado, 5,5 milhões de crianças receberam atenção médica básica, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário; a mortalidade infantil por desnutrição teve queda de 65% nos municípios onde o Bolsa Família mais se concentra, segundo a ONU; entre 2002 e 2014, a fome no Brasil diminuiu 82%, de acordo com o relatório O Estado da Insegurança Alimentar no Mundo 2015; o déficit de estatura, reflexo da desnutrição, das crianças beneficiárias do programa caiu pela metade, indica estudo dos ministérios da Saúde e Desenvolvimento Social com 360 mil crianças entre 2008 e 2012; cerca de 99% das mulheres inscritas no Bolsa Família recebem acompanhamento pré-natal. Com a melhora nas condições de vida, por volta de 3,1 milhões de famílias se desvincularam espontaneamente do programa.

Do ponto de vista da governança, o Bolsa Família também estabeleceu parâmetros complexos que correm o risco de ser desarticulados. Os programas do governo eleito, de todos os ministérios, eram integrados e transversais. “Há, neste momento, uma tentativa de desmembrar e isolar as ações. Construímos um ambiente sofisticado de ação integrada entre Educação, Saúde e Assistência Social. E isso é muito fácil de desorganizar, desmontar, basta não estar mais atento e não valorizar esse trabalho”, alerta Campello.

Não é o Bolsa Família que pesa sobre o Orçamento da União. A dotação de R$ 28,1 bilhões para o programa foi aprovada em agosto de 2015 por deputados e senadores. Esses gastos representam 0,46% do PIB do País ao ano.

Brasília - DF, 21/06/2016. Presidenta Dilma Rousseff acompanhada da Ministra Tereza Campello durante Face to Face no Palácio da Alvorada. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Brasília – DF, 21/06/2016. Presidenta Dilma Rousseff acompanhada da Ministra Tereza Campello durante Face to Face no Palácio da Alvorada. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

 

Saúde e EducaçãoMovimentos recentes do governo Temer indicam que o que deve guiar os investimentos públicos será o congelamento do teto de gastos, Proposta de Emenda Constitucional (PEC 241/2016) anunciada em 15 de junho pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. A medida será votada no Congresso e propõe congelar despesas em todas as áreas por 20 anos. Os gastos do ano seriam corrigidos pela inflação do ano anterior. Segundo Meirelles, caso não seja aprovada, haverá aumento de impostos.

As despesas em Saúde e Educação também seriam reguladas pela PEC. Para investir acima da inflação, o governo teria de remanejar recursos de outra área. “Haverá vinculação das despesas da saúde e educação a esse teto”, afirmou Meirelles. Atualmente, esses gastos da União são vinculados a percentuais mínimos da receita.

É uma medida de austeridade. Tende a cortar benefícios sociais e a compreender o desenvolvimento com foco na redução de gastos e não na diminuição da desigualdade. Essa corrente defende que a dívida pública não pode aumentar mais, sob pena de reduzir investimentos e catapultar para gerações futuras prejuízos graves de emprego e renda. O outro lado sustenta que há ajustes tributários que poderiam preservar os programas e políticas sociais e ao mesmo tempo ajudar a reduzir a dívida pública.

“Ao congelar o gasto federal, a PEC 241 desestrutura o financiamento da política social brasileira ao eliminar a vinculação de receitas destinadas à educação e ao orçamento da seguridade social, que compreende as políticas de saúde, previdência e assistência social”, escreveu o professor de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Paulo Daniel Arias Vazquez, doutor em Desenvolvimento Econômico pela Unicamp, em artigo publicado na Plataforma Política Social. “Trata-se de um duro golpe que quebra a espinha dorsal da Proteção Social no Brasil, estabelecida na Constituição de 1988 e ainda em consolidação”, concluiu, a partir de um estudo que simulou os efeitos da proposta.

O governo Temer dá também outros indícios de um viés conservador. Ideias como um plano de saúde popular, que ameaça a universalidade do sistema público de saúde, vão marcando os primeiros meses de governo interino. Para o ministro da Saúde, Ricardo Barros (PP-PR), o conceito de direito à Saúde também precisa se adequar aos limites orçamentários e essa seria uma maneira de desafogar os gastos com o Sistema Único de Saúde (SUS). “Quando uma pessoa tem um plano, ela está contribuindo para o financiamento da Saúde no Brasil”, disse Barros. “Ela participa dos custos de atendimento da Saúde. Como os planos terão menor cobertura, parte dos atendimentos continuará sendo feita pelo SUS.”

O ex-ministro da Saúde José Gomes Temporão, que ocupou o cargo de 2007 a 2011, considera “uma barbárie” essas sinalizações do governo Temer. “Pela primeira vez temos um ministro que fala de maneira clara que quem vai ditar uma política de Saúde é o mercado”, constata Temporão, que foi um dos criadores do SUS. Grazielle David, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), organização da sociedade civil que trata de direitos humanos, afirma que o resultado será a precarização do sistema. “Enquanto as demandas sociais aumentam, com o crescimento e envelhecimento populacional, e com novas tecnologias de saúde cada vez mais caras, a proposta de um novo modelo fiscal que reduz investimentos no setor destina o povo brasileiro à morte com o sucateamento definitivo do SUS”, alerta Grazielle, mestre em Saúde Coletiva e especialista em orçamento público, direito sanitário e bioética.

Na Educação, o governo Temer também acena com mudanças que parecem privilegiar o setor privado. Dos 12 novos nomes indicados para o Conselho Nacional de Educação pelo presidente provisório, após revogar grande parte das indicações de Dilma Rousseff, quatro são pessoas ligadas à iniciativa privada. “Estamos diante de um processo de focalização sobre um determinado nível escolar e privatização dos demais”, afirma Sergio Haddad, economista, doutor em Educação e coordenador geral da ONG Ação Educativa. “Há também um aceleramento de uma lógica de condenação e vigilância do papel do professor do ponto de vista ideológico e que entende o aluno como mero receptor de conteúdo”, completa. Haddad acredita que um dos resultados será a falta de diversidade nas escolas e universidades.

Diante desse cenário, a situação é preocupante. Tramita no Senado o Projeto de Lei 192/2016, do senador Magno Malta (PR-ES), que implementa a “Escola sem Partido” e impede o exercício do pensamento crítico no ambiente escolar. Apesar de negar que apoia a proposta, o ministro da Educação, Mendonça Filho (DEM-PE), em seu primeiro encontro com representantes da sociedade civil, recebeu o ex-ator Alexandre Frota e participantes do movimento Revoltados Online, defensores da “Escola sem Partido”, tema que teria sido tratado durante a reunião no ministério.

Políticas públicas

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A extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário é um sinal óbvio de escolha de prioridades. Com a mudança, as políticas públicas voltadas à agricultura familiar foram alocadas em secretarias especiais ligadas à Casa Civil, assim como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que antes da admissibilidade do impeachment estava no MDS. “Pelo sucesso na erradicação da fome e pelos avanços conquistados em termos de segurança alimentar, tornando-se uma referência internacional, é fundamental que o Brasil mantenha sua capacidade de executar e aprimorar políticas públicas no campo da agricultura familiar resultantes de diálogo entre governo, movimentos e atores sociais”, diz Jorge Romano, coordenador executivo da ActionAid no Brasil, doutor em Ciências Sociais e Desenvolvimento e especialista em desenvolvimento rural. A Action Aid é uma organização internacional que atua no combate à pobreza. Fundada na Inglaterra em 1979, está no Brasil há 17 anos e atua em 13 estados.

No mesmo caminho, a pasta de Direitos Humanos perdeu status de ministério e está sob direção do Ministério da Justiça. Essa reorganização, com o perfil do ministro, Alexandre de Moraes, coloca os direitos humanos no guarda-chuva da segurança pública, e não o contrário. Traz de volta resquícios de uma política que tratava a questão social como “caso de polícia”, herança do ex-presidente Washington Luís (1926-1930). Sinaliza para a possibilidade de apoio à proposta que aumenta a pena de adolescentes que cometerem crimes hediondos, além de reduzir a maioridade penal nesses casos. A PEC 33/2012, do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), aguarda desfecho no Senado e trata exatamente dessas diretrizes. “No campo dos direitos humanos, o propósito é radicalizar o projeto conservador”, define o economista Eduardo Fagnani, professor da Unicamp, para quem o presidente interino pratica a “democracia de resultados”.

O quadro atual se afasta muito da teoria de um dos grandes intelectuais brasileiros, o economista Celso Furtado. Segundo Furtado, “o que caracteriza o desenvolvimento é o projeto social subjacente. O crescimento, tal qual o conhecemos, funda-se na preservação dos privilégios das elites que satisfazem seu afã de modernização. Quando o projeto social dá prioridade à efetiva melhoria das condições de vida da maioria da população, o crescimento se metamorfoseia em desenvolvimento. Ora, essa metamorfose não se dá espontaneamente. Ela é fruto da realização de um projeto, expressão de uma vontade política.” Entre Celso Furtado e a República Velha, o governo de Michel Temer dá mostras de escolher o segundo caminho no que diz respeito aos direitos e às políticas sociais.

Texto originalmente publicado na Revista Brasileiros: http://brasileiros.com.br/vpWgf

#EleNão

Moradores da Maré são bailarinos em espetáculo com temporada na Suiça

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Foto: Andi Gantenbein, de Zurique, Suíça, para os Jornalistas Livres

Denúncias sobre os atuais tempos de antidemocracia, assassinatos da população preta, pobre e periférica e o da vereadora Marielle Franco aparecem em cartazes erguidos pelos bailarinos de “Fúria”, espetáculo de Lia Rodrigues, considerada uma das maiores coreógrafas brasileiras da atualidade e uma das mais engajadas na realidade política do país.

A foto é da noite deste sábado (16), durante apresentação do grupo brasileiro no ‘Zürcher Theaterspektakel’, em Zurique, Suíça.

No Brasil, Fúria estreou em Abril, no Festival de Curitiba. A montagem evidencia, de maneira crítica, relações de poder, desigualdades, e as interligações entre racismo e capitalismo.

O espetáculo foi concebido no Centro de Artes da Maré, na Maré, RJ. O local foi inaugurado em 2009, e o projeto nasceu do encontro de Lia Rodrigues Companhia de Danças com a Redes da Maré. Os bailarinos são moradores da favela e de periferias do RJ.

Fruto dessa mesma parceria é a Escola Livre de Dança da Maré que resiste, em meio ao caos do governo violento de Witzel contra as favelas do RJ.

 

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Destaques

Temer/Kassab preparam ataque ao seu direito à Internet

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O método Temer de solapar direitos dos cidadãos brasileiros tem novo alvo: a Internet. Sem qualquer discussão prévia, os golpistas querem mudar a composição do Comitê Gestor da Internet.

A consulta pública determinada pelo governo, sem diálogo prévio com os membros do Comitê e com apenas 30 dias de duração, certamente pretende aumentar o poder e servir apenas aos interesses das empresas privadas. As operadoras de telefonia têm todo o interesse do mundo em abafar as vozes de técnicos, acadêmicos e ativistas que lutam pela neutralidade da rede, por uma Internet livre, plural e aberta.

Veja, abaixo, a nota de repúdio ao atropelo antidemocrático da consulta pública determinada por Temer/Kassab. A nota é da Coalizão Direitos na Rede que exige o cancelamento imediato desta consulta.

Nota de repúdio

Contra os ataques do governo Temer ao Comitê Gestor da Internet no Brasil

A Coalizão Direitos na Rede vem a público repudiar e denunciar a mais recente medida da gestão Temer contra os direitos dos internautas no Brasil. De forma unilateral, o Governo Federal publicou nesta terça-feira, 8 de agosto, no Diário Oficial da União (D.O.U.), uma consulta pública visando alterações na composição, no processo de eleição e nas atribuições do Comitê Gestor da Internet (CGI.br).

Composto por representantes do governo, do setor privado, da sociedade civil e por especialistas técnicos e acadêmicos, o CGI.br é, desde sua criação, em 1995, responsável por estabelecer as normas e procedimentos para o uso e desenvolvimento da rede no Brasil.

Referência internacional de governança multissetorial da Internet,

o Comitê teve seu papel fortalecido após a

promulgação do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014)

e de seu decreto regulamentador, que estabelece que cabe ao órgão definir as diretrizes para todos os temas relacionados ao setor. A partir de então, o CGI.br passou a ser alvo de disputa e grande interesse do setor privado.

Ao publicar uma consulta para alterar significativamente o modelo do Comitê Gestor de forma unilateral e sem qualquer diálogo prévio no interior do próprio CGI.br, o Governo passa por cima da lei e quebra com a multissetorialidade que marca os debates sobre a Internet e sua governança no Brasil.

A consulta não foi pauta da última reunião do CGI.br, realizada em maio, e nesta segunda-feira, véspera da publicação no D.O.U., o coordenador do Comitê, Maximiliano Martinhão, apenas enviou um e-mail à lista dos conselheiros relatando que o Governo Federal pretendia debater a questão – sem, no entanto, informar que tudo já estava pronto, em vias de publicação oficial. Vale registrar que, no próximo dia 18 de agosto, ocorre a primeira reunião da nova gestão do CGI.br, e o governo poderia ter aguardado para pautar o tema de forma democrática com os conselheiros/as.

Porém, preferiu agir de forma autocrática.

Desde sua posse à frente do CGI.br, no ano passado, Martinhão – que também é Secretário de Política de Informática do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações – tem feito declarações públicas defendendo alterações no Comitê Gestor da Internet. Já em junho de 2016, na primeira reunião que presidiu no CGI.br, após a troca no comando do Governo Federal, ele declarou que estava “recebendo demandas de pequenos provedores, de provedores de conteúdos e de investidores” para alterar a composição do órgão.

A pressão para rever a força da sociedade civil no Comitê cresceu,

principalmente por parte das operadoras de telecomunicações,

apoiadoras do governo.

Em dezembro, durante o Fórum de Governança da Internet no México, organizado pelas Nações Unidas, um conjunto de entidades da sociedade civil de mais de 20 países manifestou preocupação e denunciou as tentativas de enfraquecimento do CGI.br por parte da gestão Temer. No primeiro semestre de 2017, o Governo manobrou para impor uma paralisação de atividades em nome de uma questionável “economia de recursos”.

Martinhão e outros integrantes da gestão Kassab/Temer também têm defendido publicamente que sejam revistas conquistas obtidas no Marco Civil da Internet, propondo a flexibilização da neutralidade de rede e criticando a necessidade de consentimento dos usuários para o tratamento de seus dados pessoais. Neste contexto, a composição multissetorial do CGI.br tem sido fundamental para a defesa dos postulados do MCI e de princípios basilares para a garantia de uma internet livre, aberta e plural.

Por isso, esta Coalizão – articulação que reúne pesquisadores, acadêmicos, desenvolvedores, ativistas e entidades de defesa do consumidor e da liberdade de expressão – lançou, durante o último processo eleitoral do CGI, uma plataforma pública que clamava pelo “fortalecimento do Comitê Gestor da Internet no Brasil, preservando suas atribuições e seu caráter multissetorial, como garantia da governança multiparticipativa e democrática da Internet” no país. Afinal, mudar o CGI é estratégico para os setores que querem alterar os rumos das políticas de internet até então em curso no país.

Nesse sentido, considerando o que estabelece o Marco Civil da Internet, o caráter multissetorial do CGI e também o momento político que o país atravessa – de um governo interino, de legitimidade questionável para empreender tais mudanças –

a Coalizão Direitos na Rede exige o cancelamento imediato desta consulta.

É repudiável que um processo diretamente relacionado à governança da Internet seja travestido de consulta pública sem que as linhas orientadoras para sua revisão tenham sido debatidas antes, internamente, pelo próprio CGI.br. É mais um exemplo do modus operandi da gestão que ocupa o Palácio do Planalto e que tem pouco apreço por processos democráticos.

Seguiremos denunciando tais ataques e buscando apoio de diferentes setores,

dentro e fora do Brasil,

contra o desmonte do Comitê Gestor da Internet.

 

8 de agosto de 2017, Coalizão Direitos na Rede

 

Notas

1 A Coalizão Direitos na Rede é uma rede independente de organizações da sociedade civil, ativistas e acadêmicos em defesa da Internet livre e aberta no Brasil. Formada em julho de 2016, busca contribuir para a conscientização sobre o direito ao acesso à Internet, a privacidade e a liberdade de expressão de maneira ampla. O coletivo atua em diferentes frentes por meio de suas organizações, de modo horizontal e colaborativo. A nota está em https://direitosnarede.org.br/c/governo-temer-ataca-CGI/ .

2 Para ouvir a entrevista, à Rádio Brasil Atual, de Flávia Lefévre, conselheira da Proteste e representante do terceiro setor no Comitê Gestor da Internet, que afirma que as mudanças visam a atender interesses do setor privado e ferem caráter multiparticipativo do Comitê: https://soundcloud.com/redebrasilatual/1008-enrevista-flavia-lefevre

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Artigo

FRAGMENTO E SÍNTESE

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Ligar a tv logo cedo num pequeno quarto de hotel no interior do país é desentender-se dos fatos nos telejornais matutinos. Abre-se a janela e uma menina vai à escola à beira do rio, um menino faz gol de bicicleta entre guris e o homem ergue a parede de sua casa.  Tudo tão distinto das ruas em alvoroço de protestos urbanos ou políticos insanos.  No rincão o que se busca é continuar vivo entre chuvas e trovões, sem não ou talvez. Tudo é certo. Sem modernidades calam ou arremedam nossa urbanidade, gente que se defende com pimentas e ervas, oração e vizinhança. Voz sem boca, boca sem voz, essa gente não é parte nas notícias selvagens dos jornais distantes.  Se resolvem entre cozidos, arte, bola e santos. No país de tantos cantos, muitos voam fora da asa e sem golpes entre si vão tocando suas mazelas e graça.

Mas vivemos tempos obscuros, a noite persiste em nossos avançados quinhentos e tantos anos e muitos santos. Dizem que burro velho é difícil se corrigir nos hábitos. Em manhã chuvosa na grande São Paulo, ligo a tv e o notbook, as janelas se abrem antes que a cortina deixe entrar o novo dia. Surpreendente ver na tv o deputado Jair Bolsonaro afirmando em um clube israelita na cidade do Rio, que se presidente for, não teremos mais terras indígenas no país. Ao mesmo tempo o computador expõe na rede social a opinião de meu amigo Ianuculá Kaiabi Suiá, jovem liderança do Parque Indígena do Xingu, onde leio ao som do deputado que ladra:

Jair Bolsonaro, obrigado por você existir. Graças a você, hoje, temos noção de quanto a população brasileira carece de conhecimento, decência, consciência, juízo, amor e que carrega um imenso sentimento de ódio sem saber o porque. Sim, sim, não sabem. Um exemplo? Veja a bandeira de quem te aplaude, é de um povo que, assim como nós, sofreu as piores atrocidades cometidas pelas pessoas que pensavam como você. Enfim, eu não sei se essa parcela do povo brasileiro pode ser curada, mas vou pedir para um pajé fumar um charuto sagrado e revelar se o espírito maligno que se apossou da tua alma pode ser desfeita com uma grande pajelança.

Ianuculá sabe o que diz, sabe de todo martírio vivido pelos povos originários, e mesmo assim se propõe a consultar o mundo dos espíritos.

 

É deus e diabo na terra do sol, a mesma terra que ofende também abriga e anuncia uma mostra de cinema indígena nos próximos dias. Terra de etnias e corpos na terra, a cidade maravilhosa do Rio não se calará diante do fascismo desses tempos sombrios, acompanhe.

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