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O racismo não bateu à porta, mas entregou uma carta

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Não é novidade que o Brasil é um país racista. A falsa impressão de superação desta realidade por meio de avanços legítimos do direito dos negros e das discussões em torno da igualdade étnica no país é sempre demonstrada nos casos cotidianos de racismo e intolerância religiosa. Agora, o alvo foi o Ilê Asè Osalá, casa de energias dedicada ao orixá Oxalá localizada em São Carlos (SP).
Exatamente na madrugada após o Dia da Consciência Negra, na segunda feira (21 de novembro), uma carta anônima foi deixada na caixa do correio do Ilê contendo forte teor racista, agressões às práticas religiosas da casa e também ameaças de morte. O material, que já foi entregue à polícia, deixou a Yalorixá Luciana e o Babalorixá Junior de Odé (zeladores de santo da casa) e todos os seus filhos-de-santo indignados. A casa é frequentada por muitas crianças e famílias inteiras que até hoje estão perplexas com tamanho ódio dedicado.

Cartas enviadas para o terreiro de candomblé Ilê Asè Osalá em São Carlos (SP).

Cartas enviadas para o terreiro de candomblé Ilê Asè Osalá em São Carlos (SP).

Na carta, que não tem assinatura, as famílias são chamadas de “família de macacos” e os autores ameaçam matar nas esquinas os frequentadores da casa, adeptas do Candomblé da Nação Ketu, uma das diversas culturas religiosas dos Povos Tradicionais de Matriz Africana no Brasil.
O caso, apesar de assustador, revela a faceta do racismo ainda muito presente no país. Descendente de escravos que trabalharam nas fazendas de café que deram origem à cidade de São Carlos, a Yalorixá Luciana tem uma trajetória de lutas por igualdade e pela liberdade religiosa. Participou de movimentos negros na cidade e foi a partir daí que descobriu que “o negro é lindo”. “O candomblé é uma religião que prega a liberdade. Nossos membros são livres. Mas as pessoas não querem que os outros sejam livres. Vivem da culpa e do sofrimento. Aqui somos felizes e é isso que mantém nossa casa aberta”, destaca ela. E arremata “queremos fazer uma realidade melhor. Devolver para as pessoas todo o bem que recebemos dos nossos santos. Queremos respeito, que os meu filhos tem prazer de usar o branco e o direito de louvar os meus ancestrais”.


Por compreenderem que têm amparo legal, a Yalorixá Luciana e o Babalorixá Junior de Odé decidiram registrar um Boletim de Ocorrência (B.O.) por crime de racismo religioso, racismo, crime contra a integridade física e ameaça de morte, exigindo assim do poder público uma postura efetiva para o combate ao racismo e ao racismo religioso na região. A ausência de um autor na carta impediu que o B.O. fosse feito no dia do ocorrido. O documento foi expedido três dias depois no 2º Distrito Policial de São Carlos após apoio e presença de agentes de diversos movimentos sociais da cidade.
Embora as religiões afrobrasileiras (como a Umbanda e o Candomblé, entre outras) sejam marcadas pela luta e resistência histórica do povo negro, enfrentando desde sempre a discriminação, a intolerância e o racismo no Brasil, casos de ataques como esse ocorrido em São Carlos, infelizmente, têm sido cada vez mais noticiados no país: terreiros criminosamente incendiados, atos de vandalismo e depredação ao patrimônio cultural e religioso das Casas, agressão física e também assassinatos de adeptos dessas religiões.
Há pouco mais de um mês, o Templo Religioso Hermínio Marques, terreiro de Umbanda localizado no distrito de Bueno de Andrada, na região de Araraquara-SP, no interior do Estado de São Paulo, teve seu prédio incendiado e seu patrimônio religioso depredado, ficando completamente destruído. No ano passado, em cerca de três meses, cinco terreiros de religiões de matriz africanas foram atacados em Brasília-DF e cidades vizinhas.
Dados da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH) mostram que, de 2011 a 2014, foram registrados no Brasil 462 casos de intolerância religiosa contra pessoas ligadas às religiões, por meio do Disque 100, central de atendimento para denunciar violações de direitos humanos.


Em cenários assim tão temerosos, é sempre válido (e extremamente importante) lembrar que a Constituição de 1988 garante o tratamento igualitário de todos e todas, independente de crenças religiosas. Garante também um Estado laico, que não possua uma religião oficial e tenha como obrigação a garantia de que os seus cidadãos possam preservar suas culturas e suas práticas tradicionais. Há ainda outros amparos legais, como a Lei nº 9.459, de 1997, que considera crime a prática de discriminação ou preconceito contra religiões. Os cultos das religiões de matriz africana no Brasil fazem parte daquilo que se afirma: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias” ( Art. 5 da Constituição da República Federativa do Brasil).
Assim, cabe às autoridades legais e representativas das diferentes partes da sociedade civil uma resposta para alguns questionamentos: O povo-de-santo (não só do Ilê Asè Osalá, mas de todo o Brasil) está sozinho nessa luta pela própria vida e pela liberdade de exercer a sua cultura? Os negros nesse têm direitos e são também eles os cidadãos de quem a Constituição Federal brasileira fala em assegurar a liberdade religiosa.
Quantos incêndios mais terão que ocorrer? Quanto mais de destruição do patrimônio cultural e religioso afrobrasileiro? Quantas agressões físicas? Quantos assassinatos a mais serão o suficiente para que esse estranho paladar institucional, que parece tomar com gosto o sangue do povo de descendência africana, combata o racismo nesse país em que mais da metade da população é negra?
O racismo religioso coloca carta anônima na caixa do correio, às vezes, mas depreda e atea fogo em muitas outras. O racismo religioso ainda agride e mata. RACISMO MATA. RACISMO É CRIME.

#EleNão

Moradores da Maré são bailarinos em espetáculo com temporada na Suiça

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Foto: Andi Gantenbein, de Zurique, Suíça, para os Jornalistas Livres

Denúncias sobre os atuais tempos de antidemocracia, assassinatos da população preta, pobre e periférica e o da vereadora Marielle Franco aparecem em cartazes erguidos pelos bailarinos de “Fúria”, espetáculo de Lia Rodrigues, considerada uma das maiores coreógrafas brasileiras da atualidade e uma das mais engajadas na realidade política do país.

A foto é da noite deste sábado (16), durante apresentação do grupo brasileiro no ‘Zürcher Theaterspektakel’, em Zurique, Suíça.

No Brasil, Fúria estreou em Abril, no Festival de Curitiba. A montagem evidencia, de maneira crítica, relações de poder, desigualdades, e as interligações entre racismo e capitalismo.

O espetáculo foi concebido no Centro de Artes da Maré, na Maré, RJ. O local foi inaugurado em 2009, e o projeto nasceu do encontro de Lia Rodrigues Companhia de Danças com a Redes da Maré. Os bailarinos são moradores da favela e de periferias do RJ.

Fruto dessa mesma parceria é a Escola Livre de Dança da Maré que resiste, em meio ao caos do governo violento de Witzel contra as favelas do RJ.

 

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Temer/Kassab preparam ataque ao seu direito à Internet

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O método Temer de solapar direitos dos cidadãos brasileiros tem novo alvo: a Internet. Sem qualquer discussão prévia, os golpistas querem mudar a composição do Comitê Gestor da Internet.

A consulta pública determinada pelo governo, sem diálogo prévio com os membros do Comitê e com apenas 30 dias de duração, certamente pretende aumentar o poder e servir apenas aos interesses das empresas privadas. As operadoras de telefonia têm todo o interesse do mundo em abafar as vozes de técnicos, acadêmicos e ativistas que lutam pela neutralidade da rede, por uma Internet livre, plural e aberta.

Veja, abaixo, a nota de repúdio ao atropelo antidemocrático da consulta pública determinada por Temer/Kassab. A nota é da Coalizão Direitos na Rede que exige o cancelamento imediato desta consulta.

Nota de repúdio

Contra os ataques do governo Temer ao Comitê Gestor da Internet no Brasil

A Coalizão Direitos na Rede vem a público repudiar e denunciar a mais recente medida da gestão Temer contra os direitos dos internautas no Brasil. De forma unilateral, o Governo Federal publicou nesta terça-feira, 8 de agosto, no Diário Oficial da União (D.O.U.), uma consulta pública visando alterações na composição, no processo de eleição e nas atribuições do Comitê Gestor da Internet (CGI.br).

Composto por representantes do governo, do setor privado, da sociedade civil e por especialistas técnicos e acadêmicos, o CGI.br é, desde sua criação, em 1995, responsável por estabelecer as normas e procedimentos para o uso e desenvolvimento da rede no Brasil.

Referência internacional de governança multissetorial da Internet,

o Comitê teve seu papel fortalecido após a

promulgação do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014)

e de seu decreto regulamentador, que estabelece que cabe ao órgão definir as diretrizes para todos os temas relacionados ao setor. A partir de então, o CGI.br passou a ser alvo de disputa e grande interesse do setor privado.

Ao publicar uma consulta para alterar significativamente o modelo do Comitê Gestor de forma unilateral e sem qualquer diálogo prévio no interior do próprio CGI.br, o Governo passa por cima da lei e quebra com a multissetorialidade que marca os debates sobre a Internet e sua governança no Brasil.

A consulta não foi pauta da última reunião do CGI.br, realizada em maio, e nesta segunda-feira, véspera da publicação no D.O.U., o coordenador do Comitê, Maximiliano Martinhão, apenas enviou um e-mail à lista dos conselheiros relatando que o Governo Federal pretendia debater a questão – sem, no entanto, informar que tudo já estava pronto, em vias de publicação oficial. Vale registrar que, no próximo dia 18 de agosto, ocorre a primeira reunião da nova gestão do CGI.br, e o governo poderia ter aguardado para pautar o tema de forma democrática com os conselheiros/as.

Porém, preferiu agir de forma autocrática.

Desde sua posse à frente do CGI.br, no ano passado, Martinhão – que também é Secretário de Política de Informática do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações – tem feito declarações públicas defendendo alterações no Comitê Gestor da Internet. Já em junho de 2016, na primeira reunião que presidiu no CGI.br, após a troca no comando do Governo Federal, ele declarou que estava “recebendo demandas de pequenos provedores, de provedores de conteúdos e de investidores” para alterar a composição do órgão.

A pressão para rever a força da sociedade civil no Comitê cresceu,

principalmente por parte das operadoras de telecomunicações,

apoiadoras do governo.

Em dezembro, durante o Fórum de Governança da Internet no México, organizado pelas Nações Unidas, um conjunto de entidades da sociedade civil de mais de 20 países manifestou preocupação e denunciou as tentativas de enfraquecimento do CGI.br por parte da gestão Temer. No primeiro semestre de 2017, o Governo manobrou para impor uma paralisação de atividades em nome de uma questionável “economia de recursos”.

Martinhão e outros integrantes da gestão Kassab/Temer também têm defendido publicamente que sejam revistas conquistas obtidas no Marco Civil da Internet, propondo a flexibilização da neutralidade de rede e criticando a necessidade de consentimento dos usuários para o tratamento de seus dados pessoais. Neste contexto, a composição multissetorial do CGI.br tem sido fundamental para a defesa dos postulados do MCI e de princípios basilares para a garantia de uma internet livre, aberta e plural.

Por isso, esta Coalizão – articulação que reúne pesquisadores, acadêmicos, desenvolvedores, ativistas e entidades de defesa do consumidor e da liberdade de expressão – lançou, durante o último processo eleitoral do CGI, uma plataforma pública que clamava pelo “fortalecimento do Comitê Gestor da Internet no Brasil, preservando suas atribuições e seu caráter multissetorial, como garantia da governança multiparticipativa e democrática da Internet” no país. Afinal, mudar o CGI é estratégico para os setores que querem alterar os rumos das políticas de internet até então em curso no país.

Nesse sentido, considerando o que estabelece o Marco Civil da Internet, o caráter multissetorial do CGI e também o momento político que o país atravessa – de um governo interino, de legitimidade questionável para empreender tais mudanças –

a Coalizão Direitos na Rede exige o cancelamento imediato desta consulta.

É repudiável que um processo diretamente relacionado à governança da Internet seja travestido de consulta pública sem que as linhas orientadoras para sua revisão tenham sido debatidas antes, internamente, pelo próprio CGI.br. É mais um exemplo do modus operandi da gestão que ocupa o Palácio do Planalto e que tem pouco apreço por processos democráticos.

Seguiremos denunciando tais ataques e buscando apoio de diferentes setores,

dentro e fora do Brasil,

contra o desmonte do Comitê Gestor da Internet.

 

8 de agosto de 2017, Coalizão Direitos na Rede

 

Notas

1 A Coalizão Direitos na Rede é uma rede independente de organizações da sociedade civil, ativistas e acadêmicos em defesa da Internet livre e aberta no Brasil. Formada em julho de 2016, busca contribuir para a conscientização sobre o direito ao acesso à Internet, a privacidade e a liberdade de expressão de maneira ampla. O coletivo atua em diferentes frentes por meio de suas organizações, de modo horizontal e colaborativo. A nota está em https://direitosnarede.org.br/c/governo-temer-ataca-CGI/ .

2 Para ouvir a entrevista, à Rádio Brasil Atual, de Flávia Lefévre, conselheira da Proteste e representante do terceiro setor no Comitê Gestor da Internet, que afirma que as mudanças visam a atender interesses do setor privado e ferem caráter multiparticipativo do Comitê: https://soundcloud.com/redebrasilatual/1008-enrevista-flavia-lefevre

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Artigo

FRAGMENTO E SÍNTESE

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Ligar a tv logo cedo num pequeno quarto de hotel no interior do país é desentender-se dos fatos nos telejornais matutinos. Abre-se a janela e uma menina vai à escola à beira do rio, um menino faz gol de bicicleta entre guris e o homem ergue a parede de sua casa.  Tudo tão distinto das ruas em alvoroço de protestos urbanos ou políticos insanos.  No rincão o que se busca é continuar vivo entre chuvas e trovões, sem não ou talvez. Tudo é certo. Sem modernidades calam ou arremedam nossa urbanidade, gente que se defende com pimentas e ervas, oração e vizinhança. Voz sem boca, boca sem voz, essa gente não é parte nas notícias selvagens dos jornais distantes.  Se resolvem entre cozidos, arte, bola e santos. No país de tantos cantos, muitos voam fora da asa e sem golpes entre si vão tocando suas mazelas e graça.

Mas vivemos tempos obscuros, a noite persiste em nossos avançados quinhentos e tantos anos e muitos santos. Dizem que burro velho é difícil se corrigir nos hábitos. Em manhã chuvosa na grande São Paulo, ligo a tv e o notbook, as janelas se abrem antes que a cortina deixe entrar o novo dia. Surpreendente ver na tv o deputado Jair Bolsonaro afirmando em um clube israelita na cidade do Rio, que se presidente for, não teremos mais terras indígenas no país. Ao mesmo tempo o computador expõe na rede social a opinião de meu amigo Ianuculá Kaiabi Suiá, jovem liderança do Parque Indígena do Xingu, onde leio ao som do deputado que ladra:

Jair Bolsonaro, obrigado por você existir. Graças a você, hoje, temos noção de quanto a população brasileira carece de conhecimento, decência, consciência, juízo, amor e que carrega um imenso sentimento de ódio sem saber o porque. Sim, sim, não sabem. Um exemplo? Veja a bandeira de quem te aplaude, é de um povo que, assim como nós, sofreu as piores atrocidades cometidas pelas pessoas que pensavam como você. Enfim, eu não sei se essa parcela do povo brasileiro pode ser curada, mas vou pedir para um pajé fumar um charuto sagrado e revelar se o espírito maligno que se apossou da tua alma pode ser desfeita com uma grande pajelança.

Ianuculá sabe o que diz, sabe de todo martírio vivido pelos povos originários, e mesmo assim se propõe a consultar o mundo dos espíritos.

 

É deus e diabo na terra do sol, a mesma terra que ofende também abriga e anuncia uma mostra de cinema indígena nos próximos dias. Terra de etnias e corpos na terra, a cidade maravilhosa do Rio não se calará diante do fascismo desses tempos sombrios, acompanhe.

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