Líder do MSTC, Carmem Silva é inocentada pela 2ª vez em processo de extorsão; nova ação segue em andamento

Foto: Edouard Fripont

A principal liderança do Movimento dos Sem Teto do Centro (MSTC) Carmem Silva foi inocentada pela segunda vez nesta quarta-feira (14) no processo no qual era acusada de extorquir os moradores na ocupação do hotel Cambridge.

Os desembargadores da 12ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo mantiveram a decisão de 1ª instância, expedida em janeiro de 2019 pelo juiz Marcos Vieira de Moraes. O magistrado concluiu, já na época, que o Ministério Público não conseguiu comprovar a acusação.

Os desembargadores Paulo Rossi (relator) e João Morenghi votaram pela absolvição. Já o desembargador Amable Lopez apresentará seu voto nas próximas sessões.

Apesar da vitória importante, a luta de Carmem Silva para provar sua inocência continua em outro processo aberto a partir de investigações realizadas após o desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida, em 1º de maio de 2018. Ela e mais 9 militantes do movimento por moradia tiveram o pedido de prisão preventiva decretada há uma semana também sob a acusação de extorsão em ocupações do centro da cidade, incluindo a 9 de julho, coordenada por Carmem Silva. Dois dos presos são filhos da própria Carmem, Preta Ferreira e Sidney Ferreira.

Assim como o processo em que Carmem Silva foi absolvida na primeira e segunda instância, a denúncia apresentada pelo promotor de Justiça Cássio Conserino é frágil, sem prova documental, baseada em fofocas e denúncias anônimas.

Após o julgamento, os advogados Ariel de Castro Alves e Lúcio França comemoravam a decisão do TJSP:

 “Foi uma decisão importante e emblemática contra a criminalização dos movimentos sociais e de moradia, e suas lideranças. Não há extorsão. Nos prédios mantidos pelo MSTC, todo dinheiro arrecadado com contribuições coletivas é investido em manutenção, pintura, fiação elétrica, hidráulica, reformas, retirada de lixo e entulhos, dedetização, instalação de extintores, pagamento de água e luz, contratação de porteiros e assistentes sociais para apoio às famílias”, afirmaram.

Promotor defende Carmem

Durante o julgamento, um dos depoimentos que mais chamou a atenção dos desembargadores e do público que acompanhava a sessão foi do promotor de Justiça Maurício Ribeiro Lopes. Ex-titular da promotoria de Educação e Urbanismo, ele conhece de perto os movimentos que lutam por moradia em São Paulo e fez uma defesa enfática tanto do movimento como da própria Carmem Silva, destacando o perfil de luta e de liderança social:

– A luta pela moradia, a necessidade de se buscar todos os meios de acesso da moradia é o primeiro direito do homem no meio urbano. Isso foi enxergado pelos governos de Cali, Medelín, mas aqui em São Paulo demora mais um pouco, mas um dia chegará. Conheço Carmem da Silva Ferreira, ela é uma dessas lutadoras pelos movimentos por moradia”, disse.

Ribeiro Lopes foi didático também ao explicar como é o funcionamento de um movimento por popular. E deixou claro que a arrecadação de dinheiro, junto aos moradores ocupantes, não é ilegal:

– Todo movimento de moradia tem um princípio: não recebe verba, não tem orçamento. Então como é que se mantém uma ocupação ? Da mesma forma que se mantém um condomínio em Alphavile, um condomínio horizontal ou vertical. Todo lugar onde houver convivência múltipla de pessoas em habitações que são múltiplas, se mantém a partir de uma taxa condominial”, comentou.

Outra ponderação do promotor foi endereçada aos colegas do Ministério Público. Maurício Ribeiro Lopes citou o poema “No caminho com Maiakóvisk” antes de citar que parte do MP trabalha para criminalizar os movimento populares:

– Quem gera condições de segurança (dentro das ocupações) não é o poder público, mas os moradores que vão ocupar. (A ocupação do Hotel Cambridge) É uma situação diferente do Wilton Paes de Almeida. Tentar aproximar essas duas (ocupações) é de uma vilania sem igual. (Fico) Preocupado com comportamento de parte do MP de criminalização dos movimentos sociais. E merece toda a repulsa. Se começarmos a criminalizar todos os movimentos sociais, de educação, de saúde, previdência… o movimento social nunca é de uma causa só”, afirmou.

 

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