Moro que se cuide: juíza de São Paulo desconfia de quem usa “vestes escuras”

O juiz Sergio Moro e suas camisas escuras: "para evitar ser identificado quando da prática de eventual crime"? - Foto: Aner

 

A juíza Cecilia Pinheiro da Fonseca, da 3ª Vara Criminal, resolveu levar em frente a denúncia apresentada pelo promotor Fernando Albuquerque Soares de Souza, do Ministério Público de São Paulo, contra 18 dos 21 manifestantes presos no dia 4 de setembro de 2016, antes de uma manifestação “Fora Temer”, em São Paulo. Os 21 jovens foram abordados e presos pela polícia no Centro Cultural São Paulo (CCSP) em companhia de um homem que, se soube depois, tratava-se de capitão do Exército infiltrado em movimentos sociais. Leia a decisão na íntegra.

 

Ao serem presos, os manifestantes estavam acompanhados por um capitão do Exército que se havia infiltrado no grupo, e que dizia se chamar Balta Nunes
Balta Nunes, no Tinder

 

William Pina Botelho, então capitão, posteriormente promovido a major, havia se infiltrado entre os manifestantes usando o codinome de Balta Nunes, entre outras mentiras. Fingindo-se simpatizante da esquerda, ele abordava jovens ativistas por intermédio do aplicativo de encontros Tinder. Também frequentava reuniões de organizações e movimentos, para cumprir seu propósito de espionagem. A infiltração, em flagrante ilegalidade, posto que não autorizada formalmente por qualquer autoridade, foi ignorada pelo despacho da juíza.

Ao serem presos, os jovens, vestidos com roupas escuras, portavam vinagre, máscaras antigases e até um skate.
Escreve a juíza sobre esses apetrechos:

 

“Certamente, como alegado pela defesa, portar máscara para se defender de gás de pimenta, capuzes e frascos contendo vinagre não pode caracterizar crime. Entretanto, quando tal conduta está supostamente ligada à associação visando a prática de danos qualificados, consistentes na destruição, na inutilização e na deterioração do patrimônio público e privado, e lesões corporais em policiais militares, não há como caracterizar, prima facie, a posse de tais objetos como meros atos preparatórios. Pelos indícios constantes dos autos, o acusado Victor, em tese, se utilizaria do capuz e das vestes escuras para evitar ser identificado quando da prática de eventual crime.”

 

A defesa dos jovens corretamente alegou que o uso de máscara antigases e a posse de frascos de vinagre como forma de redução dos danos causados pelo gás de pimenta tornou-se voga entre frequentadores de atos e protestos políticos, já que a Polícia Militar usou e abusou dessas armas contra o direito de manifestação e expressão. Se procurasse se informar melhor, a juíza saberia que, nas manifestações contra o golpe, até mesmo professoras e profissionais liberais já idosos (nada a ver com baderneiros ou vândalos), orgulhosamente ostentavam seus vidrinhos de vinagre e/ou máscaras de gás, como forma de defesa contra os abusos da PM.

Mas o despacho da juíza vai além.

Não lhe bastou criminalizar de novo o vinagre (o ridículo já havia sido apontado em 2013, quando um jornalista foi detido por portar o perigosíssimo tempero de saladas, fato que acabou batizando os protestos contra o aumento das tarifas de ônibus e metrô de Revolta do Vinagre). A juíza Cecilia Pinheiro da Fonseca também achou por bem colocar sob suspeita quem se atreva a usar vestes escuras. Segundo ela, esses trajes servem apenas “para evitar ser identificado quando da prática de eventual crime”.

Sergio Moro, o homem dos ternos escuros e das camisas pretas, deve ser achado que era com ele. Será?

Perseguir meninos e meninas reunidos no Centro Cultural São Paulo, sem que eles tenham cometido qualquer delito, nem mesmo cuspir no chão, pode parecer apenas uma piada ruim. Não é. Se condenados, os jovens podem ser apenados com até 9 anos de prisão. Interessante o contraste da lei. A denúncia contra os jovens foi assinada pelo promotor de justiça Fernando Albuquerque, um homem de dois metros de altura, nacionalmente conhecido desde 2011, “quando foi processado por esmurrar (não é brincadeira!) um advogado durante um tribunal do júri. O processo chegou ao fim dois anos depois, com Albuquerque aceitando uma transação penal proposta pela Procuradoria Geral de Justiça e oferecendo o pagamento de dois salários mínimos.” Veja o link aqui: http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,promotor-vira-alvo-de-investigacao-apos-agredir-advogado-em-julgamento,779225

Hugo Albuquerque, advogado de manifestantes no caso, considera que o despacho da juíza “desafia a mais elementar compreensão do direito penal, uma vez que [os jovens] nada fizeram e nem pretendiam fazer do que ir a uma manifestação pacífica.”

 

COMENTÁRIOS

Uma resposta

  1. nos anos 60 era comum nas mmanifestaçoes haver os infiltrados que provocavam agressoes a pratrimonios publicos e privados para quem desconhece a pratica procure informacões do rio center, para entender melhorar,.parece que nada mudou de lá para ca só nao sei se tal pessoa nao estava cumprindo uma missao que tenha sido ordenada por um superior

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