O escritor, cineasta e roteirista José Roberto Torero teve hoje (29) o terceiro texto excluido da sua página pessoal na rede do Facebook. As crônicas fazem parte da série @DiariodoBolso publicada com frequência pelo autor e fazem uma sátira do dia-a-dia do presidente Bolsonaro.
Para banir as publicações, o Facebook alega violação dos “padrões da comunidade”. Torero considera a justificativa burocrática. “Os três (textos) têm a palavra “viado”. Pode ser a desculpa deles. Mas o personagem é francamente homofóbico. A palavra faz parte do vocabulário dele”, explica. Segundo o escritor na terceira exclusão não lhe foi dada a chance argumentar em defesa da postagem.
Segundo especialistas em redes sociais ouvidos pelos Jornalistas Livres, o Facebook só apaga conteúdos após ser provocado por alguma denuncia de usuários. Torero diz que os ataques de fãs do Bolsonaro já eram esperados, mas que se surpreendeu que o Facebook tenha aceitado tantas denuncias.
José Roberto Torero é autor de livros, como “O Chalaça”, vencedor do Prêmio Jabuti de 1995. Além disso, escreveu roteiros para cinema e tevê, como em Retrato Falado para Rede Globo do Brasil. Também foi colunista de Esportes da Folha de S. Paulo entre 1998 e 2012.
Para garantir a livre circulação do “Diário do Bolso” de Torero, os Jornalistas Livres passarão a partir de hoje publicar regularmente as crônicas no site da rede.
Leia aqui os textos apagados pelo Facebook
Texto 1
Caro Diário, não morri.
A operação foi um sucesso. Meu intestino já está costurado. Só espero que a emenda não estoure, senão vou ficar que nem Brumadinho, rarrarrá!
Pô, esse desastre vai ser ótimo para o pessoal me esquecer um pouco. Nada como um mar de lama para encobrir outro. E ficar no hospital também vai ajudar. Por mim eu passava quatro anos aqui, sem dar entrevista nem fazer reunião. Mas vão ser só uns dez dias. Que pena…
O chato é que os militares me encheram o saco e eu tive que passar o cargo para o Mourão. Meu medo é que ele pegue gosto pela coisa.
Modéstia à parte, achei que foi uma boa sacada pedir ajuda do Benjamim Nataniel. Mas já tem pentelho dizendo que eu não quis médico cubano mas aceitei soldado israelense. É difícil agradar os esquerdopatas.
Eles estão escrevendo os maiores absurdos na internet. Dizem que eu devia prender o presidente da Vale e que eu devia reestatizar a empresa. Uns loucos! Todo mundo sabe que a Vale nem paga multa. Só no Espírito Santo são umas vinte. E como é que eu vou ser contra mineradora? A Flapa, por exemplo, praticamente obrigou que seus empregados votassem em mim, porque colocou no seu mural que se eu não fosse eleito a empresa fechava. São gente boa, pô.
A saída vai ser pegar um pato qualquer, tipo o auditor que disse que estava tudo ok. Ou então aquele secretário do meio ambiente de Minas Gerais, o tal do Germano Vieira. Se bem que ele deve ser amigo das mineradoras, porque entrou na gestão do petê e continuou com o Zema.
Bom, o que a gente tem que fazer é mostrar pros cidadões (eu falava cidadãos, mas o cara do Enem me explicou o certo) que estamos fazendo uma “colheita de provas” (essa foi o Moro que me ensinou) para apurar o que aconteceu com a bagagem de dejeitos.
Aí, quem sabe?, os vermelhos da internet se acalmam um pouco. Se bem que eles não tem dó de ninguém. Vi gente postando que a minha cirurgia era de alto risco porque separar gêmeos siameses é sempre perigoso.
Eu devia ter um saquinho de plástico só para esses chatos encherem. Em vez de bolsa de colostomia ia ser bolsa de comunistomia, rarrarrá!
Bom, Diário, agora eu vou ler um pouquinho. Eu não gosto muito de livro, que ler é coisa de viado, mas este parece bom. O nome é “Memórias de um sargento de milícias”. Deve ter um monte de tiroteio.
Até amanhã.
Texto 2
Diário, que dia…
Esse negócio de discurso não é comigo. O meu foi escrito durante o voo. Eu tinha 45 minutos para falar. Mas meu estilo é mais tuíter. Então rabisquei um negócio que dizia assim: “In my govern go to be all diferent, is ok?”. Bem resumidinho e já estava até em inglês.
Mas o pessoal que estava no avião disse que era curto demais. Aí cada um deu uma mexida. Quando o Moro mexeu pôs o nome dele, quando o Ernesto mexeu pôs o nome dele e quando o Paulo Guedes mexeu pôs o nome dele. Ficou um negócio meio puxa-saco, mas pelo menos ficou mais comprido. Deu quase sete minutos. Meu recorde!
Na internet falaram que eu parecia um robô, sem nenhuma emoção. Mas emoção é coisa de viado.
Depois almocei num restaurante bem fubeca. Acho que pega bem se fazer de pobre. Mas por pouco não tomei um suco de laranja. Sorte que lembrei que o pessoal podia fazer piada e troquei por um refrigerante.
Falando em laranja, estão dizendo que vai ter um boneco “Inflávio” na Paulista. E já estão chamando a gente de Família Embolsonaro, Bolsotralhas e outras porcarias. A maldade das pessoas não tem limite.
Olha, Diário, acho que até que eu não me saí mal na minha primeira viagem internacional. Opa! Primeira, não, que eu levei os garotos pra Disney. E lá foi um inferno, porque os três corriam o tempo todo brincando de milícia, polícia e ladrão.
Falando em milícia, parece que o negócio. Agora vai feder. E esse ano nem no carnaval vai dar para esquecer do assunto, porque tem aquele samba da Mangueira que fala da Marielle. Tem gente que nem morta morre!
No ano que vem tem que acabar com isso aí. Em vez de escolas de samba, as igrejas evangélicas é que deviam fazer desfiles. Tudo sobre a Bíblia. Gostei dessa ideia! Vou ligar para o Crivella!
Ou não.
Porque estou começando a desconfiar que no ano que vem posso não ser mais presidente. Vi agora a edição de ontem do Jornal Nacional. Os caras detonaram o Flávio e logo depois fizeram uma matéria toda simpaticona sobre o Mourão. Como se ele fosse um estadista.
Que isso tá com cara de golpe, tá.
A maldade das pessoas não tem limite.
Texto 3
Porra, Diário, eu vou ter que começar a te chamar de Madrugário, porque eu não escrevo mais de dia, só escrevo de madrugada. Que insônia do cacete!
Também, como é que dá para dormir com um barulho desses? A Janaína falou contra o foro privilegiado, a Regina Duarte quer saber quem é quem em Brasília e até o Olavo xingou o PSL (que já está sendo chamado de Partido do Suco de Laranja).
Mas o pior é que o Mourão já está mostrando as garras. Ele falou na cara dura contra o Ernesto Araújo, está se encontrando com uns líderes estrangeiros e ainda recebeu elogio de índio. Será que o Mourão vai ser o meu Temer? Bem que me disseram que general não gosta de ser mandado por capitão. Aquele dia que eu cheguei no gabinete e ele estava sentado na minha cadeira foi bem estranho. Na hora até acreditei quando o Mourão disse que só estava deixando a cadeira quentinha por causa da minha hemorroida, mas não sei não…
O que eu sei é que está foda. Liberei as armas e eu que estou no meio do tiroteio!
Daqui a pouco vão começar a perguntar com quem que o Flávio aprendeu a fazer a Rachadinha. E vão dizer que foi comigo. E se começam a fuçar as minhas contas, a do Eduardo e a do Carlinhos?
Mas quem é que não faz essas tretas? O Onyx não pegou a verba de gabinete com aquelas notas frias? Eu não embolsei os 33 mil da verba de mudança e continuei em Brasília? Isso prova que a gente é honesto, pô. Neste bolso não entra dinheiro da Petrobrás!
O negócio é saber o que eu faço agora. Mando o garoto manter a história até o fim? Mas o que a gente pode inventar? Que ele vendeu uma frota de Brasília 75 e todas custavam dois mil reais?
Ou será que eu tenho que sacrificar o meu próprio filho, feito o Abraão (ou foi o Moisés?)?
Olha, Diário, não é fácil ser pai. Um foi pego na Rachadinha, outro tem pinto pequeno e chamam o terceiro de viado.
Estou engasgando de tanto rir com esses textos do Diário do Bolso! Muito criativos! Uma coisa é certa: a direita pode ser mais perfumada, mas a esquerda é muito mais inteligente e divertida!
“A Nossa Bandeira Jamais será Vermelha” é o filme da desgraça brasileira. E a culpa é da Globo!
Documentário do jornalista Pablo Guelli culpa a grande mídia e, em especial, a Globo, pela vitória do fascismo e pela derrocada do projeto popular. Foi tudo feito com mentiras, fraudes e manipulação sem limites
O documentário “A nossa bandeira jamais será vermelha”, dirigido pelo jornalista Pablo Guelli, é mensagem na garrafa lançada no mar de desesperança em que se transformou o Brasil. Só daqui a anos, quando o País recuperar a capacidade de se indignar, será possível entender, em toda sua extensão, a gravidade das denúncias contidas no filme.
Fraudes, empulhação, mentiras. O trabalho sujo da grande mídia brasileira. É essa a matéria-prima de que é feito o filme – todo ele dedicado a tentar explicar como chegamos a essa nauseante indiferença em relação à barbárie representada por Jair Bolsonaro (e daí essas 156 mil mortes por covid-19?); por fundamentalistas religiosos que preferem a morte de uma menininha estuprada a salvá-la de uma gravidez que não cabia nela; por incendiários do cerrado, da floresta Amazônica e do Pantanal, aos quais o sofrimento da natureza é apenas cena de videogame; e por fascistas em geral, que agora (Graças a Deus! Amém, Jesus!) podem comprar fuzis do Exército, cuja venda acaba de ser facilitada pelo governo federal.
Não adianta a Rede Globo, a Folha, a Veja fingirem ser oposição a tudo o que aí está. Eles são parte do monstro bolsonarista. Foram elas, e a desmoralização que provocaram com seu turbilhão de mentiras, despejado 24 horas por dia, todos os dias, ao longo de 16 anos, que criaram a desconfiança na Democracia, na Política, na Imprensa, na Justiça, no País, nos Brasileiros. Só podia dar no que deu.
Tornamo-nos um caso clínico de doença social, de fobia às diferenças, de maníaca disposição para o ridículo, de negação da realidade e da consequente denúncia dessa conspiração internacional chamada… Ciência.
“A nossa bandeira jamais será vermelha” é como uma sala do Instituto Médico Legal. Está lá, esticado na mesa de autópsia, o corpo do Brasil alegre e inzoneiro, do Brasil lindo e trigueiro, do Brasil, samba que dá, bamboleio que faz gingar, da terra de Nosso Senhor – e de Lula também.
O filme convocou uma junta de médicos legistas encarregados de investigar a causa-mortis daquele Brasil. Dos depoimentos consternados de Glenn Greenwald, Noam Chomsky, Luís Nassif, Xico Sá, Jessé Souza, Ricardo Melo, Ana Magalhães, Igor Fuser, Tales Ab’Saber e Rodrigo Vianna, emerge uma só conclusão. Foi a Rede Globo que matou o Brasil generoso que era o ideal de País saído da Constituinte de 1988. Foi a Rede Globo e seus comparsas menores, representados pela Editora Abril, pela Folha de S.Paulo, pela TV Record etc.
“Eu nunca vi um país com uma mídia dominante tão fraudulenta quanto a mídia brasileira”, resumiu Glenn Greenwald, do alto de seu prêmio Pulitzer, a suprema glória da imprensa ocidental.
Greenwald foi o jornalista responsável pelo desnudamento da Operação Lava Jato e do juiz Sérgio Moro, em reportagens publicadas pelo “The Intercept Brasil”, e o cara que tornou pública a imensa operação de espionagem global da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA). Ele mostrou que o Grande Irmão existe e a privacidade, não. Que ninguém está a salvo dos olhos do Império.
Todos os depoimentos colhidos no filme tratam do caráter fraudulento da cobertura jornalística da grande imprensa brasileira, interessada antes de mais nada em assassinar as reputações dos integrantes do Partido dos Trabalhadores – e de Lula, em particular. E, depois, em criminalizar, processar, prender e, por fim, fazer desaparecer o maior partido de esquerda do Ocidente. E tudo bem que isso ocorresse ao arrepio da lei, em conchavos com o juiz Sérgio Moro e com os golden boys treinados por agentes americanos especializados na desestabilização de governos democraticamente eleitos.
A Globo hoje resmunga que está sendo atacada por Bolsonaro. Tadinha! Isso acontece porque ela mesma cavou a imensa cratera em que sua reputação de “mídia profissional e isenta” foi enterrada. Cavou com manipulações, com desfaçatez, com âncoras fazendo caras e bocas de indignação, a cada vez que pronunciavam as palavras PT, Lula ou Dilma. Cavou quando orquestrou uma manipulação em massa que destruiu a confiança da população na imprensa tradicional e jogou o país em direção ao fascismo.
Bolsonaro, que de bobo não tem nada, não perderia a oportunidade de solapar o incontrastável poder que a Globo tem sobre o Brasil (por que se manteria sob o tacão, podendo livrar-se dele?). E o presidente fascista também engrossou o coro brizolista: “O Povo Não é Bobo. Abaixo a Rede Globo!”
Não deixa de ser irônico: Bolsonaro, o maior beneficiário de todas empulhações, fraudes, falsificações, ardis, desonestidades e tapeações cometidos pela grande imprensa brasileira, agora se transforma no maior algoz do algoz do PT, de Lula e de Dilma.
E o resultado está aí: A Globo demitindo suas maiores estrelas do noticiário e da teledramaturgia, pra fazer caixa! O agravamento da crise eterna do SBT, a circulação decrescente dos grandes jornais e revistas. A falência da Editora Abril. Sobram a TV Record e o lumpesinato em forma de televisão, que é a RedeTV ou a Bandeirantes.
O jornalista Pablo Guelli, diretor de “A Nossa Bandeira Jamais Será Vermelha” – Foto Divulgação
Foi o jornalista Pablo Guelli quem me chamou a atenção para o nome do documentário que o inspirou a realizar o filme que acaba de apresentar. Era um filme produzido pela britânica BBC, chamado “Muito Além do Cidadão Kane”, de Simon Hartog, exibido em 1993 pelo Channel 4, emissora pública do Reino Unido. O documentário mostra as relações entre a mídia e o poder do Brasil, focalizando a figura de Roberto Marinho e comparando-o a Charles Foster Kane, personagem criado em 1941 por Orson Welles para o filme “Cidadão Kane”, drama baseado na trajetória de William Randolph Hearst, magnata da comunicação nos Estados Unidos.
O nome escolhido para o documentário sobre Roberto Marinho foi “Muito Além do Cidadão Kane”. A chave está no “Muito Além…”, ressaltando que o poder de manipulação e controle de Marinho sempre foi muito maior do que o do próprio Cidadão Kane. E foi, já que Hearst viveu em um país com milhares de jornais, revistas, TVs e rádios, competindo entre si, enquanto Marinho tornou-se o maioral entre apenas seis outros chefões da mídia brasileira – um caso espetacular de hiper-concentração da propriedade de meios de comunicação.
Mas talvez os herdeiros de Roberto Marinho tenham exagerado na fórmula, tornando-a antieconômica, algo que nunca ocorreu com Hearst. Os jornais de Hearst eram sensacionalistas? Eram. Mentiam? Mentiam. Manipulavam? Sim. Mas todo o espetáculo que propiciavam tinha como objetivo aumentar as tiragens, a receita publicitária e, ao final, a margem de lucro do negócio.
No Brasil, a espetacularização do linchamento da esquerda e do PT, de Lula e de Dilma, se foi eficiente para arrancar do poder o partido vencedor em quatro eleições consecutivas, ao mesmo tempo rasgou as relações de confiança que precisam existir entre mídia e consumidor. E isso foi feito a um ponto em que o negócio, tendo-se tornado deficitário, está em xeque. Ou seja, a continuidade até o limite da exaustão do espetáculo farsesco destruiu boa parte da credibilidade da grande mídia. E a culpa é dela mesma.
Do filme de Pablo Guelli só sobra a mídia independente, multifacetada, carente de equipamentos, pobre. São os pequenos veículos-quixotes, que sobreviveram à indiferença do PT para com a centralidade das narrativas na definição do projeto coletivo de País. Sobram blogs e sites de esquerda, que sobrevivem hoje às redes de ódio mantidas pelo fascismo bolsonarista. Sobra a vontade desesperada de deixar para o futuro uma explicação generosa com o povo brasileiro, que não acabe depositando mais uma vez sobre os ombros desses milhões de homens e mulheres pobres, oprimidos e manipulados, a responsabilidade por sua própria desgraça. Não, não é culpa do povo. É dos mentirosos compulsivos e poderosos, em primeiro lugar a TV Globo. Por isso, mais uma vez: “O Povo Não é Bobo! Abaixo a Rede Globo!”
Serviço:O filme “A Nossa Bandeira Jamais Será Vermelha” estreou no dia 22 de outubro, nas plataformas NOW, iTunes, Vivo, Microsoft e Looke.
Avaliação:Imprescindível
Veja aqui a entrevista exclusiva feita com o diretor do filme “A Nossa Bandeira Jamais Será Vermelha”. Pablo Guelli:
Escutar notícias, ouvir uma narração e ser levado por uma trilha sonora… O que antes poderia ser um programa de rádio, hoje talvez seja um episódio de podcast. Esse fenômeno que invadiu a internet há poucos anos, continua em constante crescimento no número de ouvintes e se expande também na variedade de assuntos oferecidos. Atualmente, grande parte dos temas de podcasts estão relacionados à pandemia da COVID-19 ou ao contexto sócio-político decorrente do bom ou mau enfrentamento dos governos a essa crise mundial sanitária. No nosso país, a pandemia escancara as desigualdades ao evidenciar os problemas sociais que separam as classes econômicas da população.
Diante desse contexto, as jornalistas Raquel Baster e Joana Suarez decidiram mergulhar no mundo do podcast para contar histórias de mulheres brasileiras que enfrentam a pandemia, além dos desafios diários vividos cotidianamente. “A gente tem certeza que as mulheres sempre tem as melhores soluções. Ao reunir essas histórias, trazemos muitas ideias e inspirações, formando uma grande ciranda. Daí veio o nome do podcast: Cirandeiras“, conta Joana.
Para conhecer melhor esse espaço de webrádio e feminismo, os Jornalistas Livres fizeram um bate-papo com as jornalistas que contam sobre o processo de produção, a pandemia e a relação desse projeto com a democratização da comunicação.
Como começou
Raquel Baster e Joana Suarez já dividiam afinidades pelas pautas feministas e bastou apenas uma semana de quarentena para que colocassem o projeto do podcast em ação. Joana, que vem do jornalismo de redação, conta que já vinha se aproximando da rede de podcasts, refletindo sobre a acessibilidade do áudio e seu poder de democratizar: “A maioria dos textos que eu faço são textos enormes e tenho a certeza que muita gente não lê, principalmente as mulheres sobre quem eu falo. O áudio me atraía muito porque leva as pessoas a imaginarem, criar cenários e ir para outra dimensão. Agora na pandemia onde as pessoas estão confinadas, o podcast virou uma companhia, uma forma de sair de casa.”
Já Raquel trouxe ao universo do podcast, sua experiência com a comunicação popular: “Eu sempre trabalhei muito com rádio comunitária e me interesso por essa forma de comunicação que está mais próxima das pessoas. Por mais que ainda seja um novo tipo de mídia, o podcast traz as características do rádio, como as histórias contadas através de uma narração.”
Como é produzido
Muitas vezes, quem escuta um podcast não imagina o que pode estar por trás de sua produção. Segundo as jornalistas, a primeira coisa a fazer é pensar no tema e escolher as mulheres para as entrevistas, por elas chamadas de “cirandeiras”.
“Geralmente o episódio tem a ver com uma pauta que já trabalhamos anteriormente e assim, procuramos mulheres que já tivemos contato. Por coincidência, toda vez que decidimos uma pauta, acontece algo nacionalmente que se conecta ao programa.” Joana lembra que o episódio recente Pandemia na internet sobre segurança digital foi ao ar na mesma semana em que o Senado brasileiro discutia o projeto de lei que combate fake news, enquanto outra discussão acontecia nas redes sobre a exposição de dados pessoais dos usuários do aplicativo FaceApp.
Após o primeiro contato, elas fazem uma pesquisa sobre a cirandeira, enviam as perguntas e dão algumas dicas à entrevistada de como fazer uma boa gravação utilizando o próprio WhatsApp. Como essa orientação, muitas vezes, não é suficiente, nem sempre os áudios tem a melhor qualidade, “mas na pandemia tá tudo justificado”, comenta Joana.
Com as respostas da entrevistada, o roteiro chega a ter mais de 10 páginas e leva de 20 a 30 horas para sua elaboração. A cada episódio, uma delas toma à frente a função de escrever o roteiro, incluindo referências pessoais, e em seguida, a parceira acrescenta a sua parte. “A gente percebe que às vezes um tema muito comum para uma, pode ser muito complexo para a outra. A gente vai se complementando para facilitar o entendimento de quem escuta”, conta Raquel.
Depois do roteiro, vem a hora da gravação que exige algumas preparações, como escolher um horário silencioso do dia para gravar, desligar a geladeira e armar um pequeno estúdio caseiro com edredons. “O legal do podcast é que é uma mídia barata. Basta ter um celular, internet e gambiarras”, conta Joana dando risadas.
Retorno dos ouvintes
As jornalistas contam que 75% das pessoas que ouvem o podcast são mulheres e pertencem ao grupo social que elas convivem. Além do desafio de expandir a rede de ouvintes, elas relatam que ainda é uma grande dificuldade fazer com que o podcast retorne às pessoas entrevistadas e a outras mulheres que não estão acostumadas a esse tipo de mídia.
Raquel conta que a cirandeira Lia de Itamaracá, entrevistada no episódio Pandemia na Ilha, só pôde escutar o podcast após seu produtor viajar até a ilha onde mora para mostrá-la pessoalmente em seu celular. Lia é uma das mulheres brasileiras que ainda não fazem parte dessa grande rede de internet em 2020.
Um infográfico produzido pelo site iinterativa utilizando as fontes do IBOPE, Spotify Newsroom e ABPod, mostra que cerca de 45% do público dos podcasts é formado por homens, do sudeste do país, que pertencem às classes A e B e tem entre 16 e 24 anos. Segundo a pesquisa feita em 2019, 32% dos entrevistados nem sabiam o que é um podcast.
Se o podcast ainda é limitado a uma pequena parcela da população, o WhatsApp talvez possa ser um lugar mais democrático para a sua difusão. As jornalistas contam que decidiram fazer os episódios em formatos pequenos de até 30 minutos para conseguir enviar pelo aplicativo de mensagens e garantir que o podcast alcance o maior número de pessoas.
Democratização da comunicação
Para a jornalista Raquel Baster, é inevitável discutir o alcance dos podcasts sem pensar na democratização dos meios de comunicação no Brasil. Apesar do surgimento das novas mídias, grande parte das informações veiculadas é controlada por um conglomerado de grandes empresários que atendem os interesses privados dessa própria elite.
Segundo ela, “não adianta inventar a roda do podcast, sem falar da estrutura da comunicação no Brasil. Para tornar (a comunicação) mais acessível, precisamos discutir a concentração midiática. A internet ainda não é acessível para grande parte da população brasileira. Precisamos que o maior número de pessoas tenham acesso, mas que possam também alcançar os meios de produção.”
No episódio sobre trabalhadoras rurais, a entrevistada Verônica Santana fala sobre a dificuldade das agricultoras em conseguir se comunicar durante a pandemia, visto que o trabalho sempre foi presencial. “A gente tem muita dificuldade, tanto no domínio dessas ferramentas, como no desafio de que a internet não funciona na maioria dos nossos territórios rurais. No campo, a internet ainda não é uma realidade.”, diz Verônica.
Segundo a pesquisa TIC Domicílios, apenas 50% da população rural tem acesso a internet e esses números podem diminuir ainda mais de acordo com o recorte social e econômico.
Por outro lado, Joana revela seu otimismo no poder das novas mídias: “Acho que o podcast vai se democratizar como aconteceu com o Instagram. Quando a gente poderia imaginar ter acesso a sotaques das pessoas do sertão do Cariri?” Joana se refere ao podcast BUDEJO, de Juazeiro do Norte, e cita ainda o Radionovela produzido por alunos da UFPE em Caruaru, no agreste pernambucano, que narra em formato de radionovela O Alto da Compadecida em Tempos de Pandemia, adaptação da obra de Ariano Suassuna.
Para onde vai essa Ciranda
O podcast Cirandeiras teve início durante a pandemia, portanto grande parte dos seus episódios tem esse tema como contexto. No entanto, as jornalistas Raquel Baster e Joana Suarez pretendem continuar os episódios futuramente, indo a diferentes locais do Brasil para entrevistar de perto as mulheres que conduzem “as cirandas”.
Os episódios das Cirandeiras estão disponíveis nas plataformas mais conhecidas de podcast e tem a cada quarta-feira um novo episódio. Também estão presentes no Instagram, onde ocorrem as lives com as outras mulheres dentro das temáticas dos programas.
Que me perdoe Dacio Malta, um dos mais destacados jornalistas do país e produto de uma linhagem que vem de Octavio Malta, co-fundador da Última Hora e um dos mais brilhantes profissionais da grande imprensa quando ela podia ser chamada deste nome.
Mas o último artigo de Dacio aqui publicado, sobre o impeachment de Bolsonaro, ficou no meio do caminho.
Ele tem toda razão ao afirmar que Bolsonaro merece o impeachment diante da atitude do genocida, expulso do exército como terrorista, frente à Covid-19. Mas oscila quando diz que seus outros crimes foram “absolvidos” porque foi eleito em 2018.
Ora, Bolsonaro não foi eleito sob regras democráticas. Primeiro, beneficiou-se do impeachment irregular de uma presidenta legitimamente eleita. Depois, contou com o apoio sórdido de uma ação judicial conduzida contra Lula pelo seu futuro ministro, hoje “desafeto”, o infecto Sérgio Moro. Qualquer dúvida a respeito desaparece quando se consultam os diálogos trazidos a público pelo “The Intercept Brasil”. Lá se revela o caráter criminoso e parcial com que o Marreco de Curitiba manipulou o processo. Não bastasse isso, Bolsonaro beneficiou-se de uma máquina milionária de mentiras, orientada por assessores americanos e financiada por empresários brasileiros para espalhar fake news contra seus adversários.
Não fosse tudo isso, Lula teria ganho as eleições com folga ainda no primeiro turno. Até a rampa do Planalto sabe disso.
Bolsonaro é um presidente fraudulento, ilegítimo, com ou sem covid-19. Um usurpador. Sua trajetória neofascista, misógina, homicida, armamentista,desenvolvida durante 30 anos no Congresso, só se tornou “maioria nominal” graças a expedientes liberticidas e, sobretudo, porque contou com o apoio da elite apodrecida que prefere qualquer coisa, menos governos com algum viés social.
Sim, estes traços tenebrosos ganham tintas mais carregadas quando ele age como homicida assumido diante de uma pandemia devastadora. Transformou o Ministério da Saúde dirigido por militares desqualificados em um esconderijo de cadáveres.
Mas isso é apenas o ápice da trajetória de um desequilibrado a serviço do grande capital e seus asseclas na grande mídia, nas Forças Armadas, no Judiciário e no Legislativo. Bando de acólitos anti-Brasil. O conjunto da obra já é mais do que suficiente para expulsar Bolsonaro e sua gangue do poder que ele e sua turma de milicianos tomaram de assalto, pisoteando meios democráticos elementares.
Paradoxalmente, esse alucinado só está de pé por causa do isolamento que ele tanto ironiza. Estivesse segura de sair às ruas sem colocar em risco a própria vida, a população já teria dado cabo deste excremento. Isto já começou a mudar como mostraram as manifestações de domingo.
Este será o curso inevitável dos próximos momentos.
*Ricardo Melo, jornalista, foi editor-executivo do Diário de S. Paulo, chefe de redação do Jornal da Tarde (quando ganhou o Prêmio Esso de criação gráfica) e editor da revista Brasil Investe do jornal Valor Econômico, além de repórter especial da Revista Exame e colunista do jornal Folha de S. Paulo. Na televisão, trabalhou como chefe de redação do SBT e como diretor-executivo do Jornal da Band (Rede Bandeirantes) e editor-chefe do Jornal da Globo (Rede Globo). Presidiu a EBC por indicação da presidenta Dilma Rousseff.
Jorge
30/01/19 at 2:00
Começou a censura, porque estado de exceção já está faz tempo com direito a preso político
LUIS VENTURA
30/01/19 at 8:27
Show.
Aqui não tiram do ar tb?
Laura Capriglione
31/01/19 at 4:19
Quem tirou foi o Facebook. Aqui, o site é nosso!
Claudia Caparroz
30/01/19 at 15:36
Ufa, ainda bem que temos aqui o Dario de Bolso, a única coisa boa desse governo são os diários!!! Torero é muito bom!!!
Katia jaimovich
30/01/19 at 18:26
Parabéns pela iniciativa de publicar os textos censurados!!!!!!!!
Ana Cláudia
30/01/19 at 19:21
Não acredito que este diário é dele, ele não conseguiria formular nem escrever um texto tão extenso, kkkk
João Bosco Fontes Carvalho
30/01/19 at 23:58
Muito bem escrito e mostra bem a cara do Brasil atual.
LIZANDRA GONCALVES PINTO
31/01/19 at 0:33
Simplesmente sensacional.
Laércio martuchelli
31/01/19 at 2:12
Totalmente genial !!!
Rosangela Maria Barrenha
31/01/19 at 6:10
Ri muito, mas e caso de chorar….
Ana Maria Silveira
31/01/19 at 10:12
Estou engasgando de tanto rir com esses textos do Diário do Bolso! Muito criativos! Uma coisa é certa: a direita pode ser mais perfumada, mas a esquerda é muito mais inteligente e divertida!
LUIZ ARAUJO
31/01/19 at 11:21
MUITO BOM… !!!! VOU MANDAR PARA OS MEUS AMIGOS.
Charlene Araújo
31/01/19 at 11:57
Já virei fã! Sensacional!!!!
Ivo Silva
31/01/19 at 12:45
Muito bom o diário do bolso;
Vanessa
31/01/19 at 12:50
O presidente deveria ler os seus textos. Quem sabe ele aprende alguma coisa. Esperando ansiosamente pelo próximo texto!
Luiz Carlos P. Oliveira
01/02/19 at 7:21
Já estão disponíveis todos os textos. Ao que parece são 15 ou 16. Como é diário, talvez uns 18.
Alzira Araujo
25/04/19 at 15:57
Faz muito bem para o nosso fígado