O juiz Marcos Vieira de Morais, da 26ª Vara Criminal de São Paulo, absolveu a dirigente do movimento de moradia Carmem da Silva Ferreira do crime de extorsão contra moradores da ocupação do Hotel Cambridge. Segundo o magistrado, as provas apresentadas, e que visavam a provar que Carmem ameaçava moradores para obter ilicitamente benefícios financeiros, não foram eficazes para gerar uma condenação.
“Com efeito, o quadro probatório é conflitante e inconcludente, sendo insuficiente para comprovar que a acusada realmente exigiu, mediante violência ou grave ameaça, das vítimas protegidas Alfa e Beta os valores mencionadas na denúncia e seu aditamento, muito menos que obteve para si ou para outrem vantagens econômicas indevidas.”
O juiz ensinou em sua sentença de 88 páginas:
“É patente a impossibilidade de configurar a extorsão, neste caso, quando a [suposta] vítima não se comporta como se atemorizada estivesse, tampouco sofre as consequências que sustentou ser inexoráveis. Oras, não se tipifica a extorsão, se a vítima não ficou atemorizada.”
Em outro ponto da sentença, o juiz apontou a falta de “credibilidade” na “prova da acusação”. Ele escreveu:
“As contradições e divergências existentes na prova da acusação, desprestigiam a sua credibilidade, mormente se confrontadas com o valor probante advindo das oitivas das testemunhas de defesa inquiridas no contraditório judicial, assim como do convincente interrogatório da acusada.”
“Se, para o recebimento da denúncia, exige-se apenas a narrativa geral da imaginada e suposta empreitada criminosa, no julgamento derradeiro deve revestir-se o decisum de fundada certeza, a partir dos elementos probatórios, de que a denunciada concorreu para a prática das infrações penais a ela imputada, e em qual medida se deu tal a sua participação.”
O xeque-mate veio nesta frase, extraída da melhor jurisprudência:
“A verossimilhança, por maior que seja, não é jamais a verdade ou a certeza, e somente esta autoriza uma sentença condenatória. Condenar um possível criminoso é condenar um possível inocente”.
(Ainda bem que nem todos os juízes são seguidores da estapafúrdia tese Lava-jatista, segundo a qual convicções podem substituir provas…)
A defesa de Carmem foi feita pelos advogados especialistas em Direitos Humanos e Movimentos Sociais, Ariel de Castro Alves e Francisco Lucio França. Para eles, o objetivo da promotoria, que apresentou a acusação, foi tão somente “criminalizar os movimentos de moradia”.
“As contribuições dos moradores são de fato recolhidas na ocupação, mas nunca em benefício de Carmem ou de seus parentes, mas sim porque são essenciais nas ocupações para a manutenção dos locais ocupados, já que viabilizam reformas, limpezas, projetos habitacionais e segurança, inclusive para evitar tragédias como a que ocorreu no ano passado na ocupação do edifício Wilton Paes, no Largo do Paissandu. A absolvição de Carmem consiste em decisão importante e emblemática contra a criminalização dos movimentos sociais e de moradia!”, afirmou Castro Alves.
Jornalistas Livres, que acompanham de perto a trajetória de Carmem da Silva Ferreira e da Frente de Luta por Moradia, desde 2015, jamais presenciaram qualquer atitude que desabonasse a grande dirigente. Parabenizamos, portanto, o movimento social por esta importante vitória na Justiça. Seguiremos juntos porque, como diz o lema sempre lembrado nas ocupações, “Quem Não Luta Tá Morto!”
Uma resposta
Existe um juiz que faz justiça no Brasil. Que Deus o conserve com boa saúde. Isso traz alento pra este meu coração que anda cansado de tanta injustiça e iniquidade.