DO ILÊ QUE ONDEIA.

Estava em Gôiania vendo imagens das margens  em mim quando a notícia entrou extraordinária na tela. Arbitrária TV de hotel viola minha sede ou fome, meu descanso das unhas e couro. Tal manchete corta a alma entre capitais: ASSASSINATO NO RIO. Rio que não sacia, um janeiro sem ano novo, águas de março se tom.

Era noite em Goiás e anunciaram tal Marielle, seu crime, morte na voz dos que não falam ou pena impune que não tinge. Morte diversa, tudo é rascunho, alcova ou brado, explosão de estrela, puro respeito eleito, mulher, preta, diversa.

Tantos ratos na água flutuando amanhecem entre Goiânia, Brasília, Rio ou São Paulo.  Meu avião se atrasa, mas não afoga, tudo é escândalo, o mistério que devassa. Imergir não é questão de sorte, mas condenação. Emerção é coisa de santos, pega-se o embarque, mas o destino é a chegada pura, em gesto e configurado aos mártires.

 

Mariella, descubro, emergir é pura predestinação da morte, um óbvio, um fato . Um tiro, uma gota, um raio. Teu pensamento é pranto, tua cor é tempestade e carne, leito e margem.

Das águas na memória que trouxe em espera, vidro invisível na água, uma borboleta, onça a pegar jacaré na areia branca, uns pêlos, um Drummond de pé na terra: gastei uma hora pensando em um verso que a pena não quer escrever. No entanto ele está cá dentro inquieto, vivo. Ele está cá dentro e não quer sair.  Mas a poesia deste momento inunda minha vida inteira.

Entre si arcos de aventuras que leio em almanaque, dor, mas sede também se mata com lágrimas.

Tudo se oculta em arco, é preto, é índio é pobre, é mulher.

 

https://www.letras.mus.br/caetano-veloso/1330993/

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

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