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Golpe

Discurso de Dilma Rousseff, em festa na Espanha, é ovacionado por milhares de pessoas presentes

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Por Bruno Falci, de Madrid , especial para os Jornalistas Livres

A Festa do Partido Comunista de Espanha (PCE) aconteceu nos dias 27, 28 e 29 de setembro, em Madrid, envolvendo diversos debates e atrações culturais, seguindo o formato dos grandes festivais de partidos comunistas da Europa. Milhares de pessoas estavam presente na festa quando a ex-presidenta Dilma Rousseff fez um discurso ao lado do Secretário Geral do PCE, Enrique Santiago em um Palco montado no centro do festival.

Diversas barracas com artesanatos, comidas e bebidas de diversos países do mundo estavam espalhadas pela festa, cada uma representando um partido de esquerda de sua nação, o Brasil esteve representado pelo Núcleo do Partido dos Trabalhadores (PT) de Madrid, presente nos 3 dias de festa recolhendo assinaturas do abaixo assinado pela liberdade do Lula.

Dilma Rousseff em visita ao stand do PT na festa do PCE. Foto: Bruno Falci / Jornalistas Livres

Muitas lideranças políticas estiveram presentes como o Deputado do Congresso Espanhol pelo Podemos, Rafael Mayoral, que mandou sua saudação para o Jornalistas Livres e exigiu a liberdade do ex-presidente Lula.

Dilma foi saudade por milhares de jovens comunistas em um desfile em comemoração de sua presença, veja abaixo:

https://www.instagram.com/p/B2-fAEch8vC/

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Dilma, em sua Fala, comentou o golpe de Estado de 2016, a perseguição ao ex-presidente Lula, a chegada do fascismo ao poder e a política neoliberal que está em vigor. Depois de França e Bélgica, Dilma prosseguiu com sua agenda na Espanha, discutindo o contexto brasileiro de aprofundamento do processo antidemocrático, veja a fala completa da Dilma :

Inicialmente, Dilma ressalta que os conflitos que estão sendo vividos na América Latina e no Brasil são  caracterizados pelo que alguns chamam de guerras híbridas e que outros chamam de manipulação dos princípios jurídicos, para fazer guerra, ou seja, lawfare:

           “Nesses momentos, a primeira vítima é a verdade, e a verdade tem que ser reafirmada sempre porque é um instrumento de transformação. No caso do Brasil, nós estamos vivendo um momento muito grave. Temos um governo neofascista, porque nem fascista é, uma vez que o fascismo sempre se caracterizou por alguns aspectos nacionais e o governo de Bolsonaro está submetido de forma humilhante aos Estados Unidos. Nunca um governo do Brasil teve esta postura em algum momento de nossa história”

Dilma observa que a característica do fascismo de Bolsonaro é ter uma agenda ultra moralista, discriminatória  contra as mulheres, contra as populações negras e contra os  indígenas:

“O fascismo se caracteriza também pela defesa de uma visão de nossa história que pretende mudar a compreensão do passado, enfatizando que não houve ditadura militar no Brasil, como sabemos que houve. Além disso, defendem a tortura e o assassinato político. Defendem uma violência  cruel para os mais pobres do país, contra os negros, pune com a morte a vereadora Marielle Franco porque sabemos perfeitamente que foram os grupos paramilitares, que são próximos, que a mataram. Eles defendem o uso dos policias como arma de matar cidadãos e deixam impunes também aqueles que matam crianças de oito anos”.

“Esse fascismo – prossegue Dilma – foi a única forma que no Brasil pode implantar a agenda neoliberal porque com nossas quatro eleições – duas do Lula e duas minhas – nós barramos a perda de direitos dos trabalhadores. Não permitimos reformas trabalhistas e laborais que tornassem o trabalho desprotegido, precário, intermitente. Não permitimos reformas da Previdência que acabassem com acesso dos mais pobres às aposentadorias, porque se o trabalho for intermitente nenhum trabalhador brasileiro continuará sem trabalhar continuamente até conseguir uma aposentadoria. Nós não deixamos que se destruíssem os sindicatos e, sobretudo, fizemos os programas sociais que, pela primeira vez, tiraram o Brasil do mapa da fome da ONU. Superamos a miséria extrema que é diferente da pobreza. A miséria extrema são as pessoas que vivem com recursos quase impossíveis de superar a subsistência”.
Dilma esclarece:

“Isso significou 36 milhões que saíram da miséria extrema, significou 42 milhões que chegaram às classes médias. Fizemos programas de habitações, fizemos programas de saúde, e, sobretudo, demos total importância às nossas empresas públicas. Tínhamos um Banco de Desenvolvimento maior que o Banco Mundial e uma empresa de petróleo que era a sétima maior do mundo. É isso que todos neoliberais queriam se apropriar como forma supostamente de fazer uma melhoria no país. Como não conseguiram por eleições, na última eleiç&atilde ;o, mudaram sua estratégia. Passaram a construir as condições para que assumissem o poder. Para isso, precisaram fazer várias coisas, uma delas era nos destruir politicamente, destruir o Partido dos Trabalhadores, destruir a mim e, sobretudo, destruir Luís Inácio Lula da Silva”

Acrescentando que a chegada do neoliberalismo ao poder passa por diversas etapas, Dilma Rousseff menciona o impeachment sem crime de responsabilidade, fraudulento e a operação Lava Jato, que persegue implacavelmente Lula:

“Como isso não impactava seu apoio popular foi ao julgamento, à  condenação, depois à prisão e, por último, à interdição, sendo que ele era o que tinha mais apoio da população brasileira em todas as pesquisas. Foi impedido de candidatar-se. Até aquele momento, muitos diziam que Lula estava preso por corrupção, até aquele momento utilizaram de todas as armas para desmoralizá-lo sem conseguir”.

Segundo a ex-presidente, um acontecimento inesperado que vai abalar a  narrativa dominante é o papel desempenhado pelo jornalista Glenn Greenwald no site The Intercept  Brasil, que revela diálogos entre aqueles que julgaram Lula, principalmente o juiz Moro, e  os procuradores, que visavam uma operação específica cujo objetivo era destruir o Partido dos Trabalhadores:

“Essas revelações mostram um juiz parcial, político, uma investigação que tem interesses obscuros e escusos e que foram responsáveis por condenar Lula sem provas. Essa é uma das  consequências da campanha contra Lula, a outra é que o sistema de justiça brasileiro, por causa disso, foi corroído porque se a justiça fundamentalmente em nossa sociedade queira manter um caráter imparcial, tem que respeitar o devido processo legal, a presunção de inocência, sobretudo essa senhora que é a justiça tem os seus olhos vendados e uma balança na mão porque não pode ser política e parcial e com Lula,  se sabe hoje, com  ricos  detalhes que foram  parciais, como foram políticos ao condenarem sem a menor prova, sabendo que ele era inocente. O que acontece contra Lula é um complô, é uma perseguição política porque eles sabiam perfeitamente que jamais permitiríamos que derrubassem  a democracia e se implantassem determinadas agendas neoliberais”. Para Dilma, o que está em questão hoje é a soberania nacional, primeiro pela Amazônia:

“A soberania brasileira está em questão quando Bolsonaro quer abrir a Amazônia a qualquer custo, destrói a fiscalização, a acaba com o controle por satélites dos desmatamentos, manipula dados que se referem às queimadas e os incêndios involuntários que estimulam todos os métodos  ilegais de devastação da Amazônia. Ele faz isso porque querem explorar as grandes reservas minerais que estão no solo amazônico, porque querem explorar as madeiras, querem usá-las para produzir carvão vegetal.  E isso é muito grave porque a Amazônia é o coração do Brasil. É bom que todos saibam que em todos os anos do governo de Lula e do meu reduzimos o desmatamento de forma sustentável e sistemática.  A ONU reconheceu isso em 2014 porque levávamos o melhor programa de combate ao desmatamento e proteção da Amazônia”. Dilma enfatiza a política predatória de Bolsonaro, inteiramente voltada para a destruição do patrimônio público brasileiro:

“Nós temos uma quantidade de território que é onze vezes o Reino Unido e sete vezes a Espanha. Só se faz isso através de monitoramento de satélites e Bolsonaro demite o cientista, físico e engenheiro, que dirigia o Instituto e que denunciava as queimadas como forma de dar acesso às explorações minerais. Por isso, é muito grave o que faz Bolsonaro porque tem coisas que poderão ser revertidas, outras que não poderão, e Amazônia é uma delas. A outra é a venda das estatais e a privatização das escolas superiores, das universidades e dos institutos, porque no Brasil, sem educação, não se pode tirar as pessoas da pobreza e, ao mesmo tempo, não se consegue acessar as riquezas do solo e a economia do conhecimento. Lula representava tudo isso – a luta antineoliberal e a luta contra o fascismo. Lula representa a junção, a síntese dessa dupla luta.  Lula está preso e todos sabem que ele é um prisioneiro político e um inocente”.

Em suas conclusões, Dilma assegura que “no Brasil estamos resistindo e iremos resistir  e que só a resistência de todas as pessoas do mundo do trabalho, da cultura, da produção, o mundo que defende o direito das mulheres, que luta pelo meio-ambiente, será o que poderá  transformar novamente o Brasil em uma grande democracia e em um país desenvolvido”.

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Campinas

Ocupação Mandela: após 10 dias de espera juiz despacha finalmente

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Depois de muita espera, dez dias após o encerramento do prazo para a saída das famílias da área que ocupam,  o juiz despacha no processo  de reintegração de posse contra da Comunidade Mandela, no interior de São Paulo.
No despacho proferido , o juiz do processo –  Cássio Modenesi Barbosa –  diz que  aguardará a manifestação do proprietário da área sobre eventual cumprimento de reintegração de posse. De acordo com o juiz, sua decisão será tomada após a manifestação do proprietário.
A Comunidade, que ocupa essa área na cidade de Campinas desde 2017,   lançou uma nota oficial na qual ressalta a profunda preocupação  em relação ao despacho  do juiz  em plena pandemia e faz apontamento importante: não houve qualquer deliberação sobre as petições do Ministério Público, da Defensoria Pública, dos Advogados das famílias e mesmo sobre o ofício da Prefeitura, em que todas solicitaram adiamento de qualquer reintegração de posse por conta da pandemia da Covid-19 e das especificidades do caso concreto.

Ainda na nota a Comunidade Mandela reforça:

“ Gostaríamos de reforçar que as famílias da Ocupação Nelson Mandela manifestaram intenção de compra da área e receberam parecer favorável do Ministério Público nos autos. Também está pendente a discussão sobre a possibilidade de regularização fundiária de interesse social na área atualmente ocupada, alternativa que se mostra menos onerosa já que a prefeitura não cumpriu o compromisso de implementar um loteamento urbanizado, conforme acordo firmado no processo. Seguimos buscando junto ao Poder público soluções que contemplem todos os moradores da Ocupação, nos colocando à disposição para que a negociação de compra da área pelas famílias seja realizada.”

Hoje também foi realizada uma atividade on-line  de Lançamento da Campanha Despejo Zero  em Campinas -SP (

https://tv.socializandosaberes.net.br/vod/?c=DespejoZeroCampinas) tendo  a Ocupação Mandela como  o centro da  discussão na cidade. A Campanha Despejo Zero  em Campinas  faz parte da mobilização nacional  em defesa da vida no campo e na cidade

Campinas  prorroga  a quarentena

Campinas acaba prorrogar a quarentena até 06 de outubro, a medida publicada na edição desta quinta-feira (10) do Diário Oficial. Prefeitura também oficializou veto para retomada de atividades em escolas da cidade.

 A  Comunidade Mandela e as ocupações

A Comunidade  Mandela luta desde 2016 por moradia e  desde então  tem buscado formas de diálogo e de inclusão em políticas  públicas habitacionais. Em 2017,  cerca de mais de 500 famílias que formavam a comunidade sofreram uma violenta reintegração de posse. Muitas famílias perderam tudo, não houve qualquer acolhimento do poder público. Famílias dormiram na rua, outras foram acolhidas por moradores e igrejas da região próxima à área que ocupavam.  Desde abril de 2017, as 108 famílias ocupam essa área na região do Jardim Ouro Verde.  O terreno não tem função social, também possui muitas irregularidades de documentação e de tributos com a municipalidade.  As famílias têm buscado acordos e soluções junto ao proprietário e a Prefeitura.
Leia mais sobre:  
https://jornalistaslivres.org/em-meio-a-pandemia-a-comunidade-mandela-amanhece-com-ameaca-de-despejo/

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#EleNão

EDITORIAL – HOJE É DIA DE LUTO! PERDEMOS O MENINO GABRIEL

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Gabriel e Lula: aniversário no mesmo dia: 27/10

Gabriel e Lula: aniversário no mesmo dia: 27/10

Gabriel e Lula: aniversário no mesmo dia: 27/10

Perdemos um camarada valoroso, um menino negro encantador de feras, um sorriso no meio das bombas e da violência policial, um guerreiro gentil que defendeu com unhas e dentes a Democracia, a presidenta Dilma Rousseff durante todo o processo de impeachment, e o povo brasileiro negro e pobre e periférico, como ele.

Gabriel Rodrigues dos Santos era onipresente. Esteve em Brasília, na frente do Congresso durante o golpe, em São Paulo, nas manifestações dos estudantes secundaristas; em Curitiba, acampando em defesa da libertação do Lula. Na greve geral, nas passeatas, nos atos, nos encontros…

O Gabriel aparecia sempre. Forte, altivo, sorrindo. Como um anjo. Anjo Gabriel, o mensageiro de Deus

Estamos tristes porque ele se foi hoje, no Incor de São Paulo, depois de um sofrimento intenso e longo. Durante três meses Gabriel enfrentou uma infecção pulmonar que acabou levando-o à morte.

Estamos tristíssimos, mas precisamos manter em nossos corações a lembrança desse menino que esteve conosco durante pouco tempo, mas o suficiente para nos enriquecer com todos os seus dons.

Enquanto os Jornalistas Livres estiverem vivos, e cada um dos que o conheceram viver, o Gabriel não morrerá.

Porque os exemplos que ele deixou estarão em nossos atos e pensamentos.

Obrigada, querido companheiro!

Tentaremos, neste infeliz momento de Necropolítica, estar à altura do Amor à Vida que você nos deixou.

 

 

Leia mais sobre quem foi o Gabriel nesta linda reportagem do Anderson Bahia, dos Jornalistas Livres

 

Grande personagem da nossa história: Gabriel, um brasileiro

 

 

 

 

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Golpe

Presidência cavalga para fora dos marcos do Estado de Direito

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Por Ruy Samuel Espíndola*

O Governo, num Estado de Direito, deve ser eleito, e, depois de empossado, deve ser exercido de acordo com regras pré-estabelecidas na Constituição. Essas são as regras do jogo, tanto para a tomada do poder, quanto para o seu exercício, como ensina Norberto Bobbio. Governo entendido aqui como o conjunto das instituições eletivas, representadas por seus agentes políticos eleitos pelo voto popular. Governo que, numa República Federativa e Presidencialista como a brasileira, é exercido no plano da União Federal, pela chefia do Executivo, pela Presidência da República e seus ministros, como protagonistas e pelo Congresso Nacional, com os deputados federais e senadores, como coadjuvantes.

Ao Governo, exercente máximo da política, devem ser feitas algumas perguntas, para saber de sua legitimidade segundo o direito vigente: quem pode exercê-lo e com quais procedimentos? Ao se responder a tais questões, desvela-se o mote que intitula este breve ensaio.

Assim, pode-se dizer “Governo constitucional” aquele eleito segundo as regras estabelecidas na Constituição: partido regularmente registrado, que, em convenção, escolheu candidato, que, por sua vez, submetido ao crivo do sufrágio popular, logrou êxito eleitoral. Sufrágio que culminou após livre processo eleitoral, no qual se assegurou, em igualdade de condições, propaganda eleitoral e manejo de recursos para a promoção da candidatura e de suas bandeiras, e que não sofreu, ao longo da disputa, nenhum impedimento ou sanção do órgão executor e fiscalizador do processo eleitoral: a justiça eleitoral. Justiça que, através do diploma, habilita, legalmente, o candidato escolhido nas urnas, a se investir de mandato e exercê-lo. Um governo constitucional, assim compreendido, merece tal adjetivação jurídico-politica, ainda que durante o período de campanha ou antes ou depois dele, o candidato e futuro governante questione o processo de escolha, coloque em dúvida sua idoneidade, ou mesmo diga que não estará disposto a aceitar outro resultado eleitoral que não o de sua vitória, ou, após conhecer o resultado da eleição, diga que o conjunto de seus adversários podem mudar para outros países, pois não terão vez em nossa Pátria e irão para a “ponta da praia” .

O Governo constitucional, sob o prisma de seu exercício, após empossado, é aquele que respeita a mínimas formas constitucionais, enceta suas políticas mediante os instrumentos estabelecidos na Constituição: sanciona e publica leis que antes foram deliberadas congressualmente; dá posse a altas autoridades que foram sabatinadas pelas casas do congresso; não usa de sua força, de suas armas, a não ser de modo legítimo, respeitando a oposição, as minorias e os direitos fundamentais das pessoas e de entes coletivos; administra os bens públicos e arrecada recursos públicos de acordo com a lei pré-estabelecida, sem confisco e de modo impessoal; acata as prerrogativas do Judiciário e do Legislativo, ainda que discorde ou se desconforte com suas decisões; prestigia as competências federativas, tanto legislativas, quanto administrativas, etc, etc. Promove a unidade nacional, em atitudes, declarações públicas e políticas concretamente voltadas a tal fim.

O “Governo constitucionalista”, por sua vez, além de ascender ao poder e exercê-lo, tendo em conta regras constitucionais, como faz um governo constitucional, defende o projeto constitucional de Estado e Sociedade, através do respeito amplo, dialógico e progressivo do projeto constituinte assentado na Constituição. Respeita a história política que culminou no processo reconstituinte e procura realizá-lo de acordo com as forças políticas e morais de seu tempo, unindo-as, ainda que no dissenso, através da busca de consensos mínimos no que toca ao projeto democrático e civilizatório em constante construção sempre inacabada. E governo constitucionalista, no Brasil, hoje, para merecer esse elevado grau de significação político-democrática e civilizatória, precisa respeitar a gama de tarefas e missões constitucionais descritas em inúmeras normas constitucionais que tutelam, entre outros grupos sociais, os índios, os negros, os LGBT, os ateus, os de inclinação política ideológica à esquerda, ou a à direita, ou ao centro, sem criminalização ou marginalização no discurso público de quaisquer tendências ideológicas. É preciso o respeito ao pluralismo político e aos princípios de uma democracia com níveis de democraticidade que não se restringem ao campo majoritário das escolhas políticas, mas, antes, se espraiam para as suas dimensões culturais, sociais, econômicas, sanitárias, antropológicas e sexuais etc, etc.

Governos que ascenderam sem respeito a normas constitucionais, como foi o de Getúlio Vargas em 1930 e o que depôs João Goulart em 1964, são inconstitucionais. E governo que se exerce fechando o congresso e demitindo ministros do STF, como se fez em 1969, com a aposentação compulsória dos ministros da Corte Suprema Evandro Lins e Silva, Hermes Lima e Victor Nunes Leal, são governos inconstitucionais, arbitrários, autocráticos, fora do projeto civilizatório e democrático de 1988.

O ponto crítico de nosso ensaio é que um governo pode ascender de modo constitucional, mas passar a ser exercido de modo inconstitucional e/ou de modo inconstitucionalista. O governo do presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, é um exemplo deste último e exótico tipo: consegue ser inconstitucional e inconstitucionalista no seu exercício, embora investido de maneira constitucional.

E o conjunto de declarações da reunião ministerial de 22/4, dadas a conhecer em 22/5, é um exemplo recente a elucidar nossa asserção: na fala presidencial, a violação ao princípio da impessoalidade (art. 37, caput, CF) ressoa quando afirma que deseja agir para que familiares seus e amigos não sejam prejudicados pela ação investigativa de órgãos de segurança (polícia federal). Na fala do ministro da Educação, quando afirma “que odeia” a expressão “povos indígenas” e os “privilégios” garantidos a esses no texto constitucional, o que indica contrariar o constitucionalismo positivado nos signos linguístico-normativos “população”, “terras”, “direitos”, “língua”, “grupos” e “comunidades indígenas”, constantes nos artigos 22, XIV, 49, XVI, 109, XI, 129, V, 176, § 1º, 215, § 1º, 231, 232 da CF e 67 do ADCT. Essa fala ministerial, aliás, ressoa discurso de campanha de 2018, quando o então candidato disse, no clube israelita de São Paulo: “No meu governo, não demarcarei nenhum milímetro de terras para indígenas. Também há inconstitucionalismo evidente na fala do Ministro do Meio Ambiente quando defendeu que se fizessem “reformas infralegais” “de baciada”, “para passar a boiada”, “de porteira aberta”, no momento em que o País passa pela pandemia de covid-19, pois o foco de vigília crítica da imprensa não seria o tema ambiental, mas o sanitário e pandêmico, o que facilitaria os intentos inconstitucionalistas contra a matéria positivada nos arts. 23, VI, 24, VI e VII, 170, VI, 174, § 3º, 186, II, 200, VII, 225 e §§ da CF.

Outras falas e atitudes presidenciais ainda mais recentes, e de membros do governo, contrastam com as normas definidoras da separação de poderes, da federação e da democracia, princípios fundamentais estruturantes de nossa comunidade política naciona. A nota do general Augusto Heleno, chefe do GSI, ao dizer que eventual requisição judicial do celular presidencial pelo STF, levaria à instabilidade institucional, traz desarmonia e agride ao artigo 2º, caput, da Constituição Federal. “Chega, não teremos mais um dia como hoje” e “Decisões judiciais absurdas não se cumprem”. Essas falas presidenciais, após o cumprimento de mandados judiciais no âmbito do inquérito judicial do STF, ordenados pelo Ministro Alexandre Moraes, agridem o mesmo dispositivo constitucional, com o agravante do artigo 85, II e VIII, da CF, que positiva ser crime de responsabilidade do presidente atentar contra o livre exercício do Poder Judiciário. E o atentado contra a democracia poderia ser também destacado na fala do filho do Presidente, deputado federal Eduardo Bolsonaro, que declarou estarmos próximos de uma ruptura e que seu pai seria chamado, com razão, de ditador, a depender das atividades investigativas do judiciário, tomadas como agressões ao governo de seu genitor. E o atentado contra a federação se evidencia nas falas presidenciais contra os governadores e prefeitos que estão a tomar medidas sanitárias no combate a covid-19, em que o presidente objetiva desacreditá-los e incitar suas populações contra esses chefes dos executivos estaduais e municipais, para que rompam o isolamento social, com agressão patente aos artigos 1º e 85, II, da Constituição. Os ataques diários aos órgãos de imprensa e a jornalistas, assim como sua atitude contra indagações de repórteres, também afrontam o texto da constituição da República: 5º, IX e XIV, 220 §§ 1º e 2º, protegidos pelo art. 85, III, da CF.

Em nossa análise temporalmente situada e teoricamente atenta, o conjunto de declarações públicas conhecidas do então deputado federal Jair Bolsonaro, desde seu primeiro mandato parlamentar, alcançado em 1990, portanto após o marco constitucional de 1988, embora constituam falas inconstitucionais e inconstitucionalistas, não servem para descaracterizar a “constitucionalidade” de sua eleição em 2018. Embora ainda reste, junto ao TSE, o julgamento de ação de investigação judicial eleitoral por abuso dos meios de comunicação social, que poderão ganhar novos elementos de instrução resultantes da CPI no Congresso sobre fake news e do inquérito judicial do STF com objeto semelhante. Sua eleição presidencial se mantém válida, assim como sua posse, enquanto essa ação eleitoral não for julgada definitivamente  pela Suprema Corte eleitoral brasileira.

Algumas de suas falas públicas inconstitucionalistas e inconstitucionais pré-presidenciais devem ser lembradas: “Erro da ditadura foi torturar e não matar”; “O Brasil só vai mudar quando tivermos uma guerra civil, quando matarmos uns trinta mil, não importa se morrerem alguns inocentes”; “Os tanques e o exército devem voltar às ruas e fechar o congresso nacional”, etc. E durante o processo eleitoral de 2018, falas inconstitucionalistas também foram proferidas: “No meu governo, não demarcarei um milímetro de terras para indígenas”. “O Brasil não tem qualquer dívida com os descendentes de escravos. Nossa geração não tem culpa disso, mesmo porque os próprios negros, na África, escravizavam a si mesmos”, entre outras.

A resposta a nossa indagação: embora tenhamos um governo eleito de modo constitucional – até decisão final do TSE -, ele está sendo exercido de modo inconstitucional e de modo inconstitucionalista. A Presidência da República atual, caminha, inconstitucionalmente para fora do marco do Estado de Direito. E o passado pré-presidencial do presidente da República demonstra que o seu inconstitucionalismo governamental não é episódico e sim coerente com toda a sua linha de pensamento e ação desde seu primeiro mandato parlamentar federal.

  • Advogado – mestre em Direito UFSC Professor de Direito Constitucional – Presidente da Comissão de Direito Constitucional da OAB-SC – Membro Consultor da Comissão de Estudos Constitucionais do Conselho Federal da OAB – Imortal da Academia Catarinense de Letras Jurídicas, cadeira 14, Patrono Advogado Criminalista Acácio Bernardes. 

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