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A antecipação do voto útil e a tragédia política brasileira

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Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História da Universidade Federal da Bahia (UFBA), com ilustração de Al Margen

 

Sem a foto de Lula na urna, as eleições de 2018 se encontram diante de um impasse: a antecipação do voto útil para o primeiro turno da corrida presidencial.

Na situação que temos hoje, não importa o que aconteça, não importa quem vença, o governo que sairá das urnas será eleito mais pelo veto do que pelo voto. Isso significa uma tragédia política para o Brasil. É disso que quero falar neste ensaio.

Na prática, o voto útil funciona como veto. O eleitor vota em X para evitar que Y vença. No segundo turno, quando sobram apenas dois candidatos e a polarização é normal, o voto/veto é natural. Acontece sempre, no Brasil e em qualquer outra parte do mundo que tenha um sistema eleitoral parecido com o nosso.

Mas no primeiro turno isso não deveria acontecer, de jeito nenhum.

O primeiro turno é o momento em que o eleitor precisa estar à vontade para fazer o voto propositivo, programático.

O primeiro turno é o momento de votar no aerotrem de Levy Fidelix, nas promessas soviéticas do Zé Maria, nos devaneios líricos do poeta Mauro Iasi, na bomba atômica do Enéas. É o momento de escolher uma terceira via, aquela candidatura que fica ali, sempre com algo entre 15 e 20% e que se apresenta como alternativa às forças hegemônicas.

Não teremos esse momento nessas eleições, o que é muito ruim para o Brasil, muito ruim mesmo. Péssimo.

A pessoa que em 1º de janeiro de 2019 subirá a rampa do Palácio do Planalto terá sido eleita quase que exclusivamente pelo veto e não pelo voto. Haverá um déficit de legitimidade. O novo governo já nascerá fragilizado.

Explico melhor:

Hoje, existem na cena política brasileira duas forças que são capazes de assombrar eleitores nos dois lados da fronteira ideológica: Lula e Jair Bolsonaro.

Não se trata exatamente de uma polarização, pois falar em “polarização” significa sugerir alguma igualdade entre os polos, o que não é verdade. Há meses que todas as pesquisas mostram que Lula tem o dobro de intenções de voto de Jair Bolsonaro, e com uma rejeição ligeiramente menor.

Lula e Bolsonaro, portanto, ao mesmo tempo em que são os mais amados, são, também, os mais odiados. A política sempre foi e sempre será território fértil para os afetos.

A dose de amor e ódio não é igual, que fique claro. Bolsonaro tem uma margem de fidelidade que não é menor que 15%, mas que também não é muito maior que 20%, o que o torna praticamente inelegível, como mostram as simulações para o segundo turno feitas por todos os institutos de pesquisa. Bolsonaro é o adversário dos sonhos. Todos os outros querem disputar o segundo turno com ele.

Já Lula tem uma fidelidade que não é menor que 35% e um teto que chega na casa dos 40%. Se pudesse concorrer, Lula venceria com facilidade e da urna sairia um governo legitimado pela soberania popular. Essa seria a única possibilidade de termos uma eleição capaz de nos tirar do caos institucional em que estamos vivendo. Mas Lula não estará na urna. O golpe não nadaria tanto para morrer na praia.

Fernando Haddad representará o lulismo e aqui começa, prematuramente, a disputa pelo voto útil.

À direita vencerá a candidatura que conseguir se apresentar com mais potencial para derrotar o lulismo num eventual segundo turno.

À esquerda, sairá vitoriosa a candidatura que conseguir convencer o eleitorado progressista de que pode derrotar Jair Bolsonaro no segundo turno.

Acho muito difícil que direita e esquerda cruzem suas espadas já no primeiro turno. A competição será endógena, acontecerá dentro de cada trincheira ideológica, onde o que estará em jogo será a disputa pela capacidade de vetar o outro lado.

De um lado, a campanha de Alckmin vai investir na desconstrução de Bolsonaro, dizendo que o PSDB ainda é capaz de rivalizar com o PT. A campanha de Alckmin vai tentar convencer o eleitorado que odeia o PT de que o antipetismo ainda é capital político monopolizado pelos tucanos. Para isso, Alckmin terá a TV. É aqui que veremos se a TV ainda é determinante para o convencimento eleitoral.

Bolsonaro vai continuar fazendo o jogo de formulações facilmente digeridas pelo seu eleitorado cativo. “Bandido bom é bandido morto”, “ideologia de gênero”, “sou honesto” e por aí vai. Bolsonaro joga pelo empate. Quanto menos falar, quanto menos aparecer, melhor pra ele.

Amoedo corre por fora e pode tirar votos tanto de Bolsonaro como de Alckmin. Se a disputa for apertada, isso pode significar algum protagonismo para o candidato do banco Itaú.

Do outro lado, a campanha de Ciro Gomes vai tentar mostrar ao eleitorado progressista que Haddad não é viável, que não é o herdeiro ideal. Ciro já começa a defender Lula com veemência, algo que ele não fez até aqui. Quarenta por cento dos votos válidos é motivo suficiente para inspirar algumas mudanças na estratégia.

O grande trunfo da campanha de Ciro são as simulações de segundo turno, que mostram Haddad como o único candidato que não consegue derrotar Bolsonaro. Enquanto estiverem disponíveis, esses números serão usados à exaustão pela candidatura cirista, com o objetivo de criar uma tendência que beneficie Ciro Gomes.

Só que Ciro não está sozinho. Marina Silva rivaliza com ele nessa disputa pelo veto ao Bolsonaro.

Evocando a imagem da mulher negra, mãe, pobre, seringueira e analfabeta até os 16 anos, Marina ainda atrai votos progressistas, mesmo que sua agenda econômica seja extremamente conservadora. Talvez Marina Silva seja mais capaz que Ciro Gomes de capitalizar o veto a Bolsonaro. Por questões de gênero e raça, ela tensiona melhor com Bolsonaro.

A operação “Todos menos Bolsonaro” pode significar a vitória de Marina Silva. Se eu tivesse dez fichas para apostar, colocaria quatro nela.

Já a candidatura de Haddad tem a seu favor os tais 40%, que sem Lula estão por aí, órfãos, soltos no ar. Ainda não temos dados disponíveis que nos permitam saber se esses votos migrarão para Haddad. A mudança oficial na cabeça da chapa acontecerá nos próximos dias, em um grande ato simbólico a ser realizado, pelo que li na imprensa, em Curitiba. Lula escreverá seu testamento político e abençoará Fernando Haddad. Acho muito difícil que Haddad não consiga herdar uma quantidade mínima de votos que o coloque pelo menos na casa dos 30%, o que fatalmente o levaria ao segundo turno.

Como disse há pouco, as projeções para o segundo turno mostram Haddad muito próximo a Bolsonaro, mesmo sem fazer campanha, mesmo sem ser oficialmente a cabeça de chapa. Haddad tem margem pra crescer, inclusive junto a um eleitorado tucano mais tradicional. Pode ser que o jeitão de bacharel uspiano sirva para alguma coisa. As outras seis fichas, eu colocaria em Fernando Haddad.

A última pesquisa eleitoral, a ser divulgada nas vésperas do 7 de outubro, será determinante. Quem aparecer na frente na disputa entre Alckmin e Bolsonaro atrairá o veto ao lulismo. Quem aparecer na frente na disputa entre Marina Silva, Fernando Haddad e Ciro Gomes atrairá o veto ao Bolsonaro. Ainda não dá pra saber.

Fato, fato mesmo, é que o impedimento de Lula significa uma tragédia política para o Brasil. A eleição em que o favorito disparado não pode concorrer já nasce com aparência de golpe preventivo. Apenas Lula venceria pelo voto. Os outros só podem vencer pelo veto.

Definitivamente, a crise não acabará com a eleição do novo governo. Ainda há muito sofrimento pela frente.

 

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1 Comment

1 Comments

  1. Inácio da Silva

    07/09/18 at 19:36

    Quer dizer que o autor tenta convencer a patuleia que existe voto melhor que outro voto, se for no Lula é bom…se não for é ruim…menos …cada cidadão vota em quem quiser e pelas razões que são de foro privado do votante…chega desses artigos escritos por pseudo intelectuais…

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LUTA ANTIRRACISTA PRECISA ACERTAR A ‘CABECINHA’ DE WILSON WITZEL

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Há anos a tática sobre segurança pública no Rio se concentra em operações espetaculares que resultam, de tempos em tempos, em um derramamento de sangue, com direito a traficantes, moradores de comunidades e policiais mortos.

O roteiro todos já conhecem. Unem-se policiais de diversos batalhões, eles invadem determinada localidade com poder de fogo muito superior, e terminam matando principalmente a ponta da cadeia do tráfico, a base da estrutura das facções, enquanto seus líderes comandam tudo de longe ou de dentro dos presídios, e no dia seguinte um novo comando paralelo se instala no mesmo lugar.

É uma máquina de moer gente. Mata-se loucamente, e no dia seguinte é como se nada tivesse mudado.

A situação é esta porque em certos locais do Rio a única chance de um jovem criado em situação de miséria comprar um tênis da moda é segurando uma arma que ele não sabe atirar direito. A parcela da população favelada que sobra do espaço da cidadania, por motivos que vão desde abandono familiar, déficit educacional ou imposição de terceiros, é seduzida por uma rede comércio ilegal que promete dignidade no contexto da extrema exclusão e sacrifica a vida destas pessoas como copos descartáveis.

São quase sempre jovens negros, no tráfico, na polícia ou nas casas vizinhas ao confronto entre eles. E suas mortes não comovem nem de perto tanto quanto o cãozinho morto na porta do Carrefour.

É assim desde que a abolição foi seguida pela recusa em absorver os negros no mercado formal de trabalho e a imigração de estrangeiros brancos para substituí-los. A pobreza se perpetuou a partir da negligência em gerar oportunidades e condições de vida saudável, e nela a criminalidade floresceu desde sempre.

Se soubesse da história do Rio, Wilson Witzel, o novo governador eleito no estado, que repete a palavra matar o tempo todo para agradar os ouvidos de uma classe média tanto preocupada com roubos quanto é racista, adepta de praias segregadas, odienta do funk, do samba e de pagode, faria algo para interromper a espiral macabra que corrói sua sociedade por dentro.

Alteraria o atraso social com políticas públicas inteligentes de ensino integral, cooperativas de trabalho, reforma do sistema penitenciário, investimento em tecnologia da informação e preparo de suas polícias. Enfrentaria o racismo com mais educação e cultura, e não faria coro com privilegiados que gostam de se remeter aos negros com termos tipicamente usados para animais, como “abate”.

Em 2010, o Rio viu Sérgio Cabral vencer Fernando Gabeira aproveitando-se, em parte, da crença de que o adversário era veado e maconheiro. Dali seguiu-se uma bandalheira que resultou, nos últimos anos, no colapso total das contas públicas. Já não há mais espaço de tempo para novos demagogos. E nem a população suporta mais mentiras no lugar de competência. Algo melhor que matar precisa vir à cabeça do novo governador. E eu sugiro que superar o seu racismo entranhado seja o melhor começo.

Por: Rodrigo Veloso – Colaborador dos Jornalistas Livres morador do Rio do Janeiro formado em Relações Internações

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OS BACHARÉIS DA RESISTÊNCIA

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Artigo de Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História da Universidade Federal da Bahia, com ilustração de Duke

 

O ano de 2005 é chave para a compreensão da crise brasileira contemporânea. Foi aí, no chamado “mensalão”, que se desenhou pela primeira vez aquela que, na minha percepção, é a característica mais importante da crise: o ativismo político dos profissionais da lei.

Desde 2005 que juízes, desembargadores, ministros dos tribunais superiores e procuradores são personagens recorrentes na crônica política. Depois de 2014, a Operação Lava Jato se tornou palco para a fama desses profissionais. Mais do que nunca, o Brasil é a República dos Bacharéis.

Os marqueteiros da Operação Lava Jato afirmam que pela primeira vez na história do Brasil os empresários milionários sentiram na pele o peso da lei. É uma meia verdade. Se é meia verdade, por consequência lógica, é meia mentira também.

Os empresários presos atuavam no ramo da construção civil e de obras de infraestrutura. Os agentes econômicos envolvidos com atividades financeiras e especulativas não foram incomodados. Somente os mais ingênuos são capazes de acreditar que Marcelo Odebrecht ou Léo Pinheiro são mais corruptos que os executivos do Itaú ou do Santander, que também financiavam campanhas eleitorais, que também estabeleciam relações nada republicanas com a classe política.

Por que uns foram presos, enquanto os outros estão aí, lucrando bilhões todos os anos?

A seletividade da Operação Lava Jato é óbvia e salta aos olhos de qualquer um que queira enxergar a realidade. A narrativa do combate à corrupção está sendo utilizada como pretexto para o desmanche do Estado e dos investimentos públicos em infraestrutura, o que favorece os interesses ligados ao capital financeiro nacional e internacional. A comunidade jurídica brasileira colaborou com esse projeto, ajudou a desmontar parques industriais, levando empresas nacionais à falência, sempre com o pretexto do “combate à corrupção”.

Como bem disse Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça, a Justiça brasileira “prometeu acabar com os cupins, mas acabou ateando fogo à casa”.

Porém, seria um erro dizer que a comunidade jurídica é um bloco homogêneo, que todos os seus integrantes se movem na mesma direção. Alguns momentos na cronologia da crise mostram que o cenário não é tão simples, que há bacharéis dispostos a confrontar a hegemonia daqueles que entregaram seus serviços aos interesses do capital financeiro internacional.

Destaco aqui três nomes: Rodrigo Janot, Rogério Favreto e Marco Aurélio de Mello.

Em algum momento da crise, os três contrariaram interesses hegemônicos. Meu objetivo aqui é relembrar esses episódios e sugerir que a resistência democrática não pode abrir mão da institucionalidade. Ir às ruas e disputar o imaginário das pessoas não significa deixar de operar por dentro das instituições burguesas, explorando suas contradições. Uma coisa não exclui a outra. Uma coisa complementa a outra.

 

Rodrigo Janot

Rodrigo Janot foi empossado pela presidenta Dilma Rousseff como procurador geral da República em 2013, sendo reconduzido ao cargo, também por Dilma, em 2015. Janot foi personagem protagonista em alguns dos momentos mais agudos da crise brasileira, no período que compreendeu a derrubada de Dilma Rousseff e a ascensão de Michel Temer.

Sinceramente, não sou capaz de definir a identidade ideológica de Rodrigo Janot, de dizer se ele é de esquerda ou de direita. Talvez ele não pense a realidade nesses termos. Antes de se tornar procurador geral da República, Janot tinha atuação engajada na defesa dos direitos da população carcerária. No segundo turno das eleições presidenciais de 2018, Janot se manifestou a favor da candidatura de Fernando Haddad.

26 de agosto de 2015. Sabatina de recondução de Janot à chefia da Procuradoria Geral da República. Senado Federal. A crise institucional se aprofundava e começava a se desenhar no horizonte o golpe parlamentar que meses depois derrubaria Dilma Rousseff.

A oposição, liderada por senadores do PSDB e do DEM, colocou Janot contra a parede. Ana Amélia, Aécio Neves, Aloísio Nunes, Antonio Anastasia exigiam que a PGR denunciasse a presidenta Dilma Rousseff. Foram quase 12 horas de uma sabatina tensa e atravessada pelo partidarismo político. Por inúmeras vezes, Janot disse que não havia indícios suficientes para fundamentar uma denúncia contra a presidenta da República.

Janot não denunciou Dilma enquanto ela estava no exercício do mandato.

Já com Temer, o comportamento de Rodrigo Janot foi completamente diferente. Foram duas denúncias, em pleno exercício do mandato. A primeira denúncia foi apresentada em junho de 2017. A segunda veio três meses depois, em setembro.

Michel Temer precisou acionar suas bases na Câmara dos Deputados para barrar as duas denúncias. Precisou liberar verbas para os deputados aliados. Precisou gastar capital político. Acabou lhe faltando fôlego político para aprovar a Reforma da Previdência, que era a grande agenda do seu governo. Capital político tem limite, igual a peça de queijo: diminui um pouco a cada fatia retirada.

Se Temer não conseguiu aprovar a Reforma da Previdência, parte da derrota pode ser explicada pelas flechas disparadas por Rodrigo Janot, que acabou colaborando para defender os direitos previdenciários dos trabalhadores brasileiros do ataque do capital especulativo.

Qual era o seu objetivo? Comprometimento com uma agenda social-democrata? Um republicanismo genuíno que parte do princípio de que não pode existir seletividade na aplicação da lei? As duas coisas juntas?

Não dá pra saber. Fato mesmo é que ao desestabilizar Michel Temer, Janot contrariou os interesses do rentismo.

 

Rogério Favreto

Quem acompanha a trama da crise brasileira lembra bem do dia 8 de julho de 2018. Era manhã de domingo e o país foi sacudido pela notícia que dividiu a sociedade, deixando metade da população em estado de graça e a outra metade babando de ódio.

“Lula vai ser solto!”. Assim, estampado em letras garrafais em todos os veículos da imprensa.

Rogério Favreto, desembargador do Tribunal da 4° Região em diálogo direto com lideranças petistas, autorizou um habeas corpus de urgência, determinando a soltura imediata de Lula.

Todos os envolvidos sabiam que Lula não seria solto. Lula nem fez as malas. O objetivo ali era tático: levar as instituições burguesas a extrapolar os limites da própria legalidade.

Sérgio Moro despachou estando de férias e negou o habeas corpus, o que ele não poderia fazer. Moro contrariou a ordem de um superior, subvertendo a hierarquia do Poder Judiciário.

Thompson Flores, presidente do Tribunal da 4° Região, cassou a decisão de Favreto, o que somente poderia ser feito pelo colegiado dos desembargadores.

Em um ato de resistência, Rogério Favreto deixou claro para o mundo que Lula é um preso político que a todo momento inspira atos de exceção.

 

Marco Aurélio Mello

Marco Aurélio Mello, tendo mais coragem que juízo, vem sendo a voz da resistência no Supremo Tribunal Federal. Eu poderia dar vários exemplos de ações de Marco Aurélio em defesa da Constituição, da legalidade democrática e da soberania nacional. Fico apenas com dois.

1°) Em 19 de dezembro de 2018, na véspera do recesso do Judiciário, Marco Aurélio soltou um bomba: em decisão autocrática determinou que a Constituição fosse respeitada, ordenando a libertação de todos os presos condenados em segunda instância, o que beneficiaria o presidente Lula.

É que a Constituição é clara. Só pode prender depois do trânsito em julgado. Se está errado ou não é outra discussão. Constituição não se questiona, a não ser para fazer outra Constituição.

Liminar pra cá, liminar pra lá. Procuradores da Lava Jato convocando entrevista coletiva para dizer como STF deveria agir. Mais uma vez a sociedade dividida. Novamente, Lula nem fez as malas, pois experimentado que é, sabia muito bem que não seria solto.

Dias Toffoli, presidente do STF, derrubou a decisão de Marco Aurélio, contrariando o regimento interno da Casa, que diz que somente a plenária do colegiado é legítima para anular ato autocrático de um ministro.

Se Lula não estivesse preso, o regimento seria respeitado. Lula não é um preso comum.

2°) Na última semana, vimos outro embate entre Marco Aurélio e Dias Toffoli. Dessa vez, o motivo foi a venda dos ativos da Petrobras. Marco Aurélio, outra vez em decisão autocrática, proibiu a venda, num ato de defesa da soberania nacional. Dias Toffoli autorizou a venda, se alinhando aos interesses privados e internacionais.

Apresentei três exemplos, de três profissionais da lei que em algum momento da crise contrariaram os interesses que hoje ditam os rumos da política brasileira. Não existiu nenhuma articulação entre eles. Os exemplos mostram apenas que as instituições burguesas não são homogêneas, que existem contradições que devem ser exploradas.

A resistência democrática, portanto, precisa se equilibrar sobre dois pés. Um nas ruas, agitando e apresentando soluções para o nosso povo, que já vai começar a sentir na pele as consequências de um governo ultraliberal, autoritário e entreguista. O outro pé deve estar bem fincado nos corredores palacianos, onde se desenrolam as tramas institucionais.

Precisamos, sim, de líderes populares, de líderes que saibam falar ao coração do povo, que entendam as angústias da nossa gente. Precisamos também de articuladores, de conhecedores da lei e dos regimentos, de lideranças versadas no jogo jogado nos bastidores. Resistência democrática é trabalho de equipe.

 

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Armai-vos uns aos outros

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Por José Barbosa Junior
O presidente da República Fundamentalista de Vera Cruz (antigo Brasil – porque agora nada pode ser vermelho), decretou nesta terça-feira algumas flexibilizações na Lei que regulamentava a posse de armas, o que, na prática, significa que ele liberou geral. A proposta anterior, de no máximo duas armas por cidadão, passou para quatro armas, sendo liberadas outras mais, conforme a necessidade apresentada pelo futuro portador.
Em resumo, a barbárie está liberada oficialmente em nosso país. “Cidadãos de bem” agora vão poder, finalmente, matar os bandidos que lhe atormentam a vida. Por bandidos leia-se pobres, pretos, pardos e párias, que de já tão coisificados, tornaram-se sem valor e pessoalidade em sua existência.
O que mais me choca, porém, é que Bolsonaro foi eleito e é apoiado, inclusive e principalmente nesta questão, por gente que se afirma cristã. Isso mesmo! Gente que diz seguir aquele nazareno marginal que afirmou que “bem-aventurados são os pacificadores, pois eles serão chamados filhos de Deus”, aliás o mesmo que afirmou que “quem vive pela espada, morrerá pela espada”.
Parece estranho. E é.
Mais estranho ainda porque em toda a campanha do atual presidente, ele fez questão de repetir o versículo que diz “e conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”.
A verdade é que a liberação de armas só gerará mais violência num país que respira violência.
A verdade é que mais mulheres serão vítimas de feminicídio, já que seus maridos machões agora poderão ter suas armas para suprirem seus outros fracassos.
A verdade é que mais LGBT’s morrerão nas mãos de homofóbicos que disfarçam seus preconceitos em discursos machistas e religiosos.
A verdade é que agora fica mais fácil planejar o suicídio, endêmico numa sociedade cada vez mais doente e adoecedora, refém de um sistema que empurra pessoas à depressão (sem contar as depressões que independem de fatores externos) e num país onde adolescentes cada vez mais se matam por conta de bullying e outras coisas mais. Ah! E sem falar no alto índice de suicídio entre pastores, tema cada vez mais recorrente nos últimos anos.
A verdade é que as brigas de trânsito, de bares, de baladas agora serão resolvidas na base do “quem saca primeiro”, porque com essa liberação a ideia de que o outro possa estar armado será sempre evidente e, entre ele e eu, é melhor que eu saque antes dele.
A verdade é que temos um governo violento, que ampara e incita à violência, que não esconde o prazer na tortura e na morte dos inimigos. Isso legitima e legitimará a barbárie!
Em nome da verdade… no governo mais mentiroso que já temos! E eu aguardo o dia da liberdade! Ela virá… mais cedo ou mais tarde!

*Teólogo e Pastor da Comunidade Batista do Caminho em Belo Horizonte.

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