“O Exército sempre foi o sonho dele, assistia essas propagandas de convocações para o serviço militar com os olhinhos arregalados. Eu só quero justiça pelo meu filho, para que nenhuma mãe passe pelo que eu passei. Eles [o Exército] torturaram e mataram o Dudu”.
O desabafo que abre esta reportagem é da professora mineira Conceição Barbosa Torres da Costa, que viu o filho Eduardo Barbosa Torres da Costa, de 23 anos, entrar em depressão, ser espancado e torturado na carreira militar. Ao BHAZ, a mãe do sargento Costa, o Dudu, pede que os culpados sejam punidos exemplarmente.
A família é de Além Paraíba, na Zona da Mata, mas mora em Juiz de Fora, na mesma região. Além de Eduardo, Conceição e o marido têm outros dois filhos, um outro de 23 anos e um de 13. “A nossa vida era complicada, a gente sem emprego, meus filhos passaram uma infância difícil. Às vezes não tínhamos pão para dar, eles tinham que merendar na escola mais de uma vez. Me doía não poder dar o que comer”, conta a mulher.
A mãe da vítima lembra que o filho sempre foi muito inteligente. “Ele decidiu realizar o sonho de entrar para o Exército, mesmo estudando em colégio público, que não era muito bom. Em 60 mil candidatos, ele passou na posição 214, em 2016. Além de realizar o sonho, ele também queria uma forma de conseguir um dinheiro rápido para nos ajudar em casa. Como a nota dele foi alta, ele conseguiu fazer o básico no quartel de Juiz de Fora”, relata.
O jovem formou no básico em 2018 e decidiu tentar ser paraquedista, no Rio de Janeiro. “Ele fez o teste e passou, estava muito animado com tudo. Ele chegou no curso, alugou um apartamento para dividir. Um amigo contou para ele sobre as dificuldades do Exército, em relação a hierarquia. Ele me contou que quem usava o coturno preto era humilhado, só marrom era bom. O amigo contou que sempre era humilhado pelos colegas, o que sensibilizou o Eduardo”.
Conceição Barbosa Torres da Costa/Arquivo pessoal
Primeiro trauma
Em um dia de sol forte no Rio de Janeiro, os militares se exercitavam correndo, de farda, em uma pista, por volta das 11h. “O amigo dele não aguentou, caiu muito cansado e meu filho parou para ajudá-lo. O superior dele já ficou com raiva, disse que deveria ter deixado ele lá. Os outros militares começaram a ridicularizar o Dudu, falaram que ele era um fraco, viado, bicha. E esse amigo morreu três dias depois, por conta do esforço extremo”.
Eduardo sempre contava tudo que ocorria para a mãe, já que eram grandes amigos. Em janeiro de 2019, ele disse que estava com a perna ruim, e se desligou do curso de paraquedista. “Achei ele meio triste, diferente, mas achei que era por conta do desligamento mesmo. Depois disso, ele precisou se apresentar novamente ao Exército, e foi enviado para Joinville (SC). Ele foi servir na Infantaria e lá que as coisas pioraram muito”, desabafa Conceição.
Depressão aumentou
“O quadro de depressão foi aumentando. Ninguém falava com ele, não tratavam ele bem. Um dia ele me ligou e disse: ‘Mãe, eu estou ficando deprimido, estou pensando cada coisa ruim’. Meu coração apertou na hora, perguntei se ele queria que eu fosse pra lá, mas ele achou melhor não. Disse para ele ir ao médico do quartel, explicar o que estava sentindo”, continua a mãe de Eduardo.
O filho seguiu o conselho da mãe, procurou o médico e contou tudo. “Ele me disse que o médico ouviu tudo, foi bem solícito e orientou sobre o que fazer. Mas, no dia seguinte, o quartel inteiro sabia do que ele tinha conversado com o médico. Falaram que ele era gay, que estava sofrendo por um rapaz, que ele tinha um caso. As coisas só pioravam”, continua Conceição.
Conceição Barbosa Torres da Costa/Arquivo pessoal
Família consegue psiquiatra
Sem auxílio dentro do Exército, a família resolveu procurar um médico indicado por conhecidos, que atua com jovens militares. O psiquiatra Bruno Cruz explica que o primeiro contato com Eduardo foi em agosto de 2019.
“Ele foi diagnosticado com transtorno de estresse pós-traumático ou de adaptação. Muito se deu ao fato da revivência do trauma, da intensidade que ele vivenciava aquela situação, as questões da lembrança à medida que ele via algo referente ao Exército”, explica o médico ao BHAZ.
Logo na primeira consulta, pelo estado do paciente, o médico já pediu um afastamento de 40 dias. “Ele foi trazido ao consultório, foi feito o diagnóstico que era muito óbvio, que ele não poderia ter contato com o ambiente militar, o trauma dele era vinculado a essa circunstância. Na minha experiência com o ambiente militar, e com outros jovens que sofreram questões semelhantes, me dizia isso muito claro. Pedimos o afastamento, que não foi cumprido. A consequência foi a morte dele”, relata o médico.
Conceição Barbosa Torres da Costa/Arquivo pessoal
Mais humilhações
Segundo a mãe de Dudu, o pedido de afastamento também previa a suspensão do porte de arma, mas somente o segundo item foi cumprido. “Ele continuou trabalhando, mas agora sem a arma, o que aumentou ainda mais a humilhação sofrida por ele. Eles [oficiais do Exército] acharam que ele estava fingindo, fazendo corpo mole”, relata Conceição.
Eduardo tomava remédios controlados, como antidepressivos, antipsicóticos e estabilizadores de humor. “No dia 7 de junho ele tentou suicídio dentro do quartel. Nos laudos falaram que ele não poderia ficar em ambiente militar, por conta do estresse pós-traumático. Isso já tinha sido diagnosticado uma vez, e depois novamente pelo Dr. Bruno, mas novamente não fomos atendidos”, continua a mãe de Eduardo.
Conceição Barbosa Torres da Costa/Arquivo pessoal
Surto e prisão em Juiz de Fora
No dia 31 de dezembro, Eduardo teve um surto. “Ele saiu correndo pelas ruas de Juiz de Fora, se jogando nas frentes dos carros. A polícia interveio, prendeu meu filho e bateu muito nele. Quando chegamos na delegacia, já tinha um coronel do Exército lá. Meu filho estava batendo a cabeça na parede, muito descontrolado. Eu peguei e deitei ele no meu colo, para se acalmar um pouco”, conta Conceição.
Eduardo conversou com a mãe e disse que não queria sair da delegacia algemado. “Ele virou e falou comigo: ‘Mãe, não sou bandido’. Eu disse que ele iria para o hospital, para se cuidar. Ele havia se acalmado. Mas aí o coronel apareceu e começou a agredir meu filho verbalmente, falou que ele era um lixo para o Exército. Eles se atracaram, bateram muito no meu filho, na minha frente. Deram voz de prisão para meu filho, meu marido e meu outro filho. O Eduardo desmaiou, ninguém fez nada”, desabafa.
Para o psiquiatra que o acompanhava, Eduardo teve um quadro de ansiedade muito intenso, que desencadeou o surto. “Ele pode ter tido uma revivência do trauma. Com isso, ele teve uma atitude mais agressiva, que culminou no ocorrido e na prisão dele”, explica Bruno Cruz.
Conceição filmou o momento em que o filho foi preso. “Falaram que quando chegasse no quartel, iriam ‘moer’ ele. Já cheguei filmando, gritando, xinguei tudo que pude”, lembra a mãe de Eduardo.
Em uma audiência de custódia, no mesmo dia, ficou definido que o jovem não poderia deixar Juiz de Fora. Contudo, o Exército teria levado Eduardo, sem permissão, para o HCE (Hospital Central do Exército), no Rio de Janeiro. “Ele ficou preso, algemado em uma cama, durante quatro dias. Só tiravam a algema para ele tomar banho e fazer suas necessidades. Ele acabou perdendo a sensibilidade de uma das mãos”, conta.
O advogado José Carlos Stephan, especialista em direito militar há 29 anos, que atendeu Eduardo desde agosto, diz que participou da audiência de custódia. “Informei em ata ao juiz que ele não poderia ser entregue ao Exército e muito menos voltar ao Rio de Janeiro, pois ele poderia tentar novamente contra a própria vida e morrer”, explica.
“Não foi me dado ouvido e ele foi conduzido ao hospital de Juiz de Fora, onde a gente esperava que fosse feito o tratamento. No meio do caminho, sem autorização judicial, sem informar a família, sem notificar a mãe, sem me informar, já que sou o procurador, o levaram para o HCE, no Rio de Janeiro. Lá ele ficou isolado, não se sabe o tipo de tratamento que teve, provavelmente nenhum. Aí aconteceu a morte dele”, relata Stephan.
De acordo com a mãe de Eduardo, o psiquiatra Bruno Cruz teria advertido que Eduardo precisava ser internado. “Mas ele não foi. Colocaram meu filho em uma prisão dentro do Exército, não colocaram na ala psiquiátrica. Era uma prisão, dentro de uma cela olhando para o teto. Não estava tomando a medicação correta”, continua.
Conceição Barbosa Torres da Costa/Arquivo pessoal
O jovem ficou no local até o dia 30 de janeiro deste ano, quando a família foi informada da morte, por suicídio. A família contesta a versão do Exército. “Não tinha nada dentro daquele quarto que ele pudesse usar para se matar. Só entregaram o corpo quase três dias depois. Meu filho estava todo maquiado, conseguimos ver um corte na sobrancelha. Eles mataram meu filho dentro do exército, eu afirmo isso. A ditadura existe ainda dentro dos quartéis”, relata.
Para a mãe que perdeu o filho, o sentimento é de ódio. “Muita revolta. Eu quero que eles sejam punidos. A polícia do Exército espancou, torturou meu filho. Quero vingança, quero justiça. Eu preciso mostrar isso para as outras famílias. Eu não tenho medo, não tenho mais nada a perder. Ficam rondando a porta da minha casa, um carro com insulfilme. Sei que são eles, mas não vou desistir de ter justiça”.
Pedro Henrique, filho de Conceição, que também tem 23 anos, entrou para o Exército por incentivo do irmão. “Eu temo muito por ele. O Pedro fala que quer honrar o irmão, que vai ser sargento por ele. Só tememos pela vida dos meus dois filhos. Comigo e com o meu marido pode acontecer qualquer coisa”, completa.
Violência física e psicológica
O psiquiatra explica que, durante a passagem de Eduardo pelo Exército, ele sofria muita violência psicológica. “Também tinha a violência física dele contra si, uma auto-agressividade. Ele sofria muito com a culpa que ele tinha de que não conseguir servir aquilo que ele sempre amou. Ele vivia sonhando com o Exército. Foi uma decepção daquilo que ele desejou e, de repente, se transformou no abismo da vida dele”, lembra.
De acordo com o médico, a doença do jovem era mais grave que a depressão em si. “Tem uma característica e reversibilidade pior que a depressão. É uma doença muito difícil de tratar que, infelizmente, tem crescido no Brasil pela questão da violência”, relata.
Para o médico, o termo que devemos tratar é a psicofobia. “Se ele estivesse com a perna quebrada, ninguém questionaria nada, ninguém pensaria que ele estava tentando enganar ou levar vantagem de alguma forma. A impressão que fica é que em todo momento ele foi questionado a esse respeito, como se ele tivesse querendo tirar vantagem. Isso é muito frequente nas doenças mentais, precisamos quebrar o preconceito em relação a isso. A família dele aceitou e acolheu bem, mas o ambiente profissional falhou muito”, completa.
Conceição Barbosa Torres da Costa/Arquivo pessoal
Medidas judiciais
De acordo com o advogado José Carlos Stephan, serão três ações judiciais. “A primeira é por crime militar, na Justiça militar, pois entendo que aconteceu abuso de autoridade e crime de maus-tratos. Outra ação será na Justiça comum, pois entendo que o judiciário também errou por entregar ele de volta aos militares. A última na Justiça federal, referente ao próprio falecimento e interrompimento da carreira dele, com indenização da família, pensão e etc”, conta.
“Temos a documentação referente a isso tudo, os laudos médicos dizendo que ele não deveria ir de forma alguma para o Rio de Janeiro. Ele não poderia sair de perto da família, pois poderia causar a morte dele. E, ainda assim, o quartel sabendo dessa recomendação, que eu enviei, que estava nos autos, ignorou por conta própria. Não sei qual foi o oficial que determinou isso”, continua o defensor.
Para o advogado, o suicídio de Eduardo é colocado, agora, “entre aspas” e passa a ser duvidoso. “Tudo foi bem dito e tenho um ofício em mãos que o quartel diz que o HCE seria o local que ele seria melhor atendido, que estaria protegido e bem cuidado, o que não foi verdade. Entendo que existem crimes militares, que serão apurados. Acho que foi uma covardia o que foi feito, essa morte poderia ter sido evitada. Houve um total descaso e despreparo da administração militar”, completa.
Procurado pelo BHAZ, o Exército informou, por meio de nota (leia abaixo na íntegra), que foi “instaurado Inquérito Policial Militar (IPM), a fim de se apurar o fato ocorrido no interior do Hospital Central do Exército”. Além disso, a instituição se limitou a dizer que “lamenta a morte do militar e está prestando toda a assistência necessária à família”.
Nota do Exército
“A Seção de Comunicação Social do Comando Militar do Leste (CML) informa que foi instaurado Inquérito Policial Militar (IPM), a fim de se apurar o fato ocorrido no interior do Hospital Central do Exército.
O CML lamenta a morte do militar e está prestando toda a assistência necessária à família.
Cabe reiterar que o Exército Brasileiro não compactua com qualquer tipo de irregularidade, repudiando veementemente atitudes e comportamentos em conflito com a lei, com os valores militares ou com a ética castrense”.
Escutar notícias, ouvir uma narração e ser levado por uma trilha sonora… O que antes poderia ser um programa de rádio, hoje talvez seja um episódio de podcast. Esse fenômeno que invadiu a internet há poucos anos, continua em constante crescimento no número de ouvintes e se expande também na variedade de assuntos oferecidos. Atualmente, grande parte dos temas de podcasts estão relacionados à pandemia da COVID-19 ou ao contexto sócio-político decorrente do bom ou mau enfrentamento dos governos a essa crise mundial sanitária. No nosso país, a pandemia escancara as desigualdades ao evidenciar os problemas sociais que separam as classes econômicas da população.
Diante desse contexto, as jornalistas Raquel Baster e Joana Suarez decidiram mergulhar no mundo do podcast para contar histórias de mulheres brasileiras que enfrentam a pandemia, além dos desafios diários vividos cotidianamente. “A gente tem certeza que as mulheres sempre tem as melhores soluções. Ao reunir essas histórias, trazemos muitas ideias e inspirações, formando uma grande ciranda. Daí veio o nome do podcast: Cirandeiras“, conta Joana.
Para conhecer melhor esse espaço de webrádio e feminismo, os Jornalistas Livres fizeram um bate-papo com as jornalistas que contam sobre o processo de produção, a pandemia e a relação desse projeto com a democratização da comunicação.
Como começou
Raquel Baster e Joana Suarez já dividiam afinidades pelas pautas feministas e bastou apenas uma semana de quarentena para que colocassem o projeto do podcast em ação. Joana, que vem do jornalismo de redação, conta que já vinha se aproximando da rede de podcasts, refletindo sobre a acessibilidade do áudio e seu poder de democratizar: “A maioria dos textos que eu faço são textos enormes e tenho a certeza que muita gente não lê, principalmente as mulheres sobre quem eu falo. O áudio me atraía muito porque leva as pessoas a imaginarem, criar cenários e ir para outra dimensão. Agora na pandemia onde as pessoas estão confinadas, o podcast virou uma companhia, uma forma de sair de casa.”
Já Raquel trouxe ao universo do podcast, sua experiência com a comunicação popular: “Eu sempre trabalhei muito com rádio comunitária e me interesso por essa forma de comunicação que está mais próxima das pessoas. Por mais que ainda seja um novo tipo de mídia, o podcast traz as características do rádio, como as histórias contadas através de uma narração.”
Como é produzido
Muitas vezes, quem escuta um podcast não imagina o que pode estar por trás de sua produção. Segundo as jornalistas, a primeira coisa a fazer é pensar no tema e escolher as mulheres para as entrevistas, por elas chamadas de “cirandeiras”.
“Geralmente o episódio tem a ver com uma pauta que já trabalhamos anteriormente e assim, procuramos mulheres que já tivemos contato. Por coincidência, toda vez que decidimos uma pauta, acontece algo nacionalmente que se conecta ao programa.” Joana lembra que o episódio recente Pandemia na internet sobre segurança digital foi ao ar na mesma semana em que o Senado brasileiro discutia o projeto de lei que combate fake news, enquanto outra discussão acontecia nas redes sobre a exposição de dados pessoais dos usuários do aplicativo FaceApp.
Após o primeiro contato, elas fazem uma pesquisa sobre a cirandeira, enviam as perguntas e dão algumas dicas à entrevistada de como fazer uma boa gravação utilizando o próprio WhatsApp. Como essa orientação, muitas vezes, não é suficiente, nem sempre os áudios tem a melhor qualidade, “mas na pandemia tá tudo justificado”, comenta Joana.
Com as respostas da entrevistada, o roteiro chega a ter mais de 10 páginas e leva de 20 a 30 horas para sua elaboração. A cada episódio, uma delas toma à frente a função de escrever o roteiro, incluindo referências pessoais, e em seguida, a parceira acrescenta a sua parte. “A gente percebe que às vezes um tema muito comum para uma, pode ser muito complexo para a outra. A gente vai se complementando para facilitar o entendimento de quem escuta”, conta Raquel.
Depois do roteiro, vem a hora da gravação que exige algumas preparações, como escolher um horário silencioso do dia para gravar, desligar a geladeira e armar um pequeno estúdio caseiro com edredons. “O legal do podcast é que é uma mídia barata. Basta ter um celular, internet e gambiarras”, conta Joana dando risadas.
Retorno dos ouvintes
As jornalistas contam que 75% das pessoas que ouvem o podcast são mulheres e pertencem ao grupo social que elas convivem. Além do desafio de expandir a rede de ouvintes, elas relatam que ainda é uma grande dificuldade fazer com que o podcast retorne às pessoas entrevistadas e a outras mulheres que não estão acostumadas a esse tipo de mídia.
Raquel conta que a cirandeira Lia de Itamaracá, entrevistada no episódio Pandemia na Ilha, só pôde escutar o podcast após seu produtor viajar até a ilha onde mora para mostrá-la pessoalmente em seu celular. Lia é uma das mulheres brasileiras que ainda não fazem parte dessa grande rede de internet em 2020.
Um infográfico produzido pelo site iinterativa utilizando as fontes do IBOPE, Spotify Newsroom e ABPod, mostra que cerca de 45% do público dos podcasts é formado por homens, do sudeste do país, que pertencem às classes A e B e tem entre 16 e 24 anos. Segundo a pesquisa feita em 2019, 32% dos entrevistados nem sabiam o que é um podcast.
Se o podcast ainda é limitado a uma pequena parcela da população, o WhatsApp talvez possa ser um lugar mais democrático para a sua difusão. As jornalistas contam que decidiram fazer os episódios em formatos pequenos de até 30 minutos para conseguir enviar pelo aplicativo de mensagens e garantir que o podcast alcance o maior número de pessoas.
Democratização da comunicação
Para a jornalista Raquel Baster, é inevitável discutir o alcance dos podcasts sem pensar na democratização dos meios de comunicação no Brasil. Apesar do surgimento das novas mídias, grande parte das informações veiculadas é controlada por um conglomerado de grandes empresários que atendem os interesses privados dessa própria elite.
Segundo ela, “não adianta inventar a roda do podcast, sem falar da estrutura da comunicação no Brasil. Para tornar (a comunicação) mais acessível, precisamos discutir a concentração midiática. A internet ainda não é acessível para grande parte da população brasileira. Precisamos que o maior número de pessoas tenham acesso, mas que possam também alcançar os meios de produção.”
No episódio sobre trabalhadoras rurais, a entrevistada Verônica Santana fala sobre a dificuldade das agricultoras em conseguir se comunicar durante a pandemia, visto que o trabalho sempre foi presencial. “A gente tem muita dificuldade, tanto no domínio dessas ferramentas, como no desafio de que a internet não funciona na maioria dos nossos territórios rurais. No campo, a internet ainda não é uma realidade.”, diz Verônica.
Segundo a pesquisa TIC Domicílios, apenas 50% da população rural tem acesso a internet e esses números podem diminuir ainda mais de acordo com o recorte social e econômico.
Por outro lado, Joana revela seu otimismo no poder das novas mídias: “Acho que o podcast vai se democratizar como aconteceu com o Instagram. Quando a gente poderia imaginar ter acesso a sotaques das pessoas do sertão do Cariri?” Joana se refere ao podcast BUDEJO, de Juazeiro do Norte, e cita ainda o Radionovela produzido por alunos da UFPE em Caruaru, no agreste pernambucano, que narra em formato de radionovela O Alto da Compadecida em Tempos de Pandemia, adaptação da obra de Ariano Suassuna.
Para onde vai essa Ciranda
O podcast Cirandeiras teve início durante a pandemia, portanto grande parte dos seus episódios tem esse tema como contexto. No entanto, as jornalistas Raquel Baster e Joana Suarez pretendem continuar os episódios futuramente, indo a diferentes locais do Brasil para entrevistar de perto as mulheres que conduzem “as cirandas”.
Os episódios das Cirandeiras estão disponíveis nas plataformas mais conhecidas de podcast e tem a cada quarta-feira um novo episódio. Também estão presentes no Instagram, onde ocorrem as lives com as outras mulheres dentro das temáticas dos programas.
Não há em Belo Horizonte, gente negra de mais de 40 anos, envolvida com o Movimento Negro ou com a cultura negra da dança que desconheça o significado do nome Marlene Silva para a cena da dança afro local e brasileira. E que alegria, senhora, saber que as devidas homenagens lhe foram prestadas em vida.
Artistas negros da dança na cidade, na casa dos 40 anos ou mais, se não foram formados por Marlene Silva, passaram por suas mãos, receberam sua orientação, seu carinho e sua benção. Os mais jovens também, pois um currículo de dança rico e respeitável precisava abrigar os ensinamentos da mestra maior da dança afro.
Marlene Silva, seu nome e seu legado povoam meu imaginário há 35 anos. Discípulos seus são amigos queridos e sempre me contaram de seu alto nível de exigência, compensado pelo sorriso largo.
Pedimos desculpas, querida Marlene Silva, mas nossa responsabilidade uns com os outros nesse tempo de pandemia não permitirá que lhe prestemos a última homenagem com um gurufim à sua altura, repleto de história contada e cantada, uma cachacinha e comida de angu com rabada, pra dar sustança aos que comporiam seu cortejo fúnebre pela Afonso Pena, Praça Sete, Amazonas. Liderado por djembês, congas, atabaques, agogôs, seus alunos e alunas de todas as gerações, em lindas roupas coloridas, à frente de um corpo dançante que puxaria o caminhão do corpo de bombeiros que transportaria seu corpo para o descanso final.
Aos transeuntes que perguntassem que autoridade era homenageada naquele cortejo, nós, suas admiradoras e as amigas responderíamos felizes e agradecidas: É Marlene Silva, Rainha da Dança Afro em Minas Gerais.
EM
https://jornalistaslivres.org/cadeira-de-miss-davis/
DO BLOG da autora:
https://medium.com/@cidinhadasilva/salve-sua-for%C3%A7a-marlene-silva-obrigada-5c2ff1fcf967
A partir desta sexta-feira, 20, os bares, restaurantes, shoppings e cinemas de Belo Horizonte estarão com o alvará de funcionamento suspensos temporariamente, para evitar aglomeração de pessoas e o avanço da Covid-19. A medida foi anunciada pelo prefeito Alexandre Kalil (PSD) por meio de decreto e vale por tempo indeterminado, contrariando o governador Romeu Zema (do Novo).
A medida vale para:
– Casas de shows e espetáculos de qualquer natureza;
– Boates, danceterias, salões de dança;
– Casas de festas e eventos;
– Feiras, exposições, congressos e seminários;
– Shoppings centers, centros de comércio e galerias de lojas;
– Cinemas e teatros;
– Clubes de serviço e de lazer;
– Academia, centro de ginástica e estabelecimentos de condicionamento físico;
– Clínicas de estética e salões de beleza;
– Parques de diversão e parques temáticos;
– Bares, restaurantes e lanchonetes.
O decreto não afeta o funcionamento de supermercados, farmácias, laboratórios, clínicas, hospitais e demais serviços de saúde em funcionamento no interior de suas instalações. Permite também a atividade de empresas que trabalhem com entrega de alimentos ou ofereçam retirada de produtos no local, embalados e para consumo fora do estabelecimento. O funcionamento de bares, restaurantes, lanchonetes e estabelecimentos congêneres no interior de hotéis, pousadas e similares, também poderão ser mantidos para atendimento exclusivo aos hóspedes.
Nesta quinta-feira, 19, a capital mineira já começava a parar. Com a suspensão das aulas em todos os níveis de ensino, era pequeno o movimento de carros nas ruas e avenidas, muitas ruas estavam desertas, inúmeros estabelecimentos comerciais fechados e restaurantes vazios. Em alguns bairros, como o Santa Efigênia, de classe média, destacava-se apenas o som da kombi da pamonha a anunciar o “delicioso mingau de milho verde” e outros derivados do milho.
Nação Conservadora se lasca
O decreto assinado pelo prefeito Alexandre Kalil acabou livrando Belo Horizonte de sediar o Iº Congresso da Nação Conservadora neste fim de semana. O evento teria como palestrantes o mineiro Salim Mattar, fundador da locadora de carros Localiza, o empresário e jornalista Allan dos Santos, do canal Terça Livre; deputado estadual pelo PSL de SP, Gil Diniz, o Carteiro Reaça; a também bolsonarista deputada estadual Ana Caroline FamFampagnolo, do PSL/SC, entre outros. Estes mais aqueles que se sujeitariam a pagar ingressos entre R$ 82,50 a R$ 165,00 teriam direito, como aperitivo, a assistir uma vídeo conferência do autoproclamado filósofo e astrólogo Olavo de Carvalho, o guru do Bozo.
Bate-boca
Segundo o portal BHAZ, “o prefeito Kalil subiu o tom contra o governador, na tarde desta quarta, 18, após Zema anunciar, em coletiva, as medidas para conter o avanço da doença no Estado. O motivo da irritação seria o recuo em medidas já alinhadas entre o Governo e a prefeitura. ‘O Governador me ligou. Já tínhamos combinado… Uma pena. Preocupado com votos e não com vidas’, escreveu Kalil no Twitter após o fim da coletiva de Zema”.
Um dos principais motivos para a irritação de Kalil seria o fechamento de bares e restaurantes em Belo Horizonte, estudado pela PBH e pelo Governo, para reduzir a aglomeração de pessoas. A possível adoção da medida causou receio em empresários, que temem pelo fechamento de empresas,conforme ainda o BHAZ.
Íntegra do decreto
“DECRETO Nº 17.304, DE 18 DE MARÇO DE 2020.
Determina a suspensão temporária dos Alvarás de Localização e Funcionamento e autorizações emitidos para realização de atividades com potencial de aglomeração de pessoas para enfrentamento da Situação de Emergência Pública causada pelo agente Coronavírus – COVID-19.
Art. 1º – A partir do dia 20 de março de 2020, por tempo indeterminado, ficam suspensos os Alvarás de Localização e Funcionamento – ALFs – emitidos para realização de atividades com potencial de aglomeração de pessoas, em razão da Situação de Emergência em Saúde Pública declarada por meio do Decreto nº 17.297, de 17 de março de 2020, especialmente para:
I – casas de shows e espetáculos de qualquer natureza;
II – boates, danceterias, salões de dança;
III – casas de festas e eventos;
IV – feiras, exposições, congressos e seminários;
V – shoppings centers, centros de comércio e galerias de lojas;
VI – cinemas e teatros;
VII – clubes de serviço e de lazer;
VIII – academia, centro de ginástica e estabelecimentos de condicionamento físico;
IX – clínicas de estética e salões de beleza;
X – parques de diversão e parques temáticos;
XI – bares, restaurantes e lanchonetes.
1º – Caso tenham estrutura e logística adequadas, os estabelecimentos de que trata este artigo poderão efetuar entrega em domicílio e disponibilizar a retirada no local de alimentos prontos e embalados para consumo fora do estabelecimento, desde que adotadas as medidas estabelecidas pelas autoridades de saúde de prevenção ao contágio e contenção da propagação de infecção viral relativa ao Coronavírus – COVID-19.
2º – A suspensão prevista neste artigo não se aplica aos supermercados, farmácias, laboratórios, clínicas, hospitais e demais serviços de saúde em funcionamento no interior de shoppings centers, centros de comércio e galerias de lojas, desde que adotadas as medidas estabelecidas pelas autoridades de saúde de prevenção ao contágio e contenção da propagação de infecção viral relativa ao COVID-19.
3º – O funcionamento de bares, restaurantes, lanchonetes e estabelecimentos congêneres no interior de hotéis, pousadas e similares, poderá ser mantido para atendimento exclusivo aos hóspedes, desde que adotadas as medidas estabelecidas pelas autoridades de saúde de prevenção ao contágio e contenção da propagação de infecção viral relativa ao COVID-19.
4º – As atividades administrativas e os serviços essenciais de manutenção de equipamentos, dependências e infraestruturas referentes aos estabelecimentos cujas atividades estão incluídas nos incisos do caput poderão ser realizadas com adoção de escala mínima de pessoas e, quando possível, preferencialmente por meio virtual.
Art. 2º – A partir do dia 20 de março de 2020, por tempo indeterminado, todas as demais atividades com potencial de aglomeração de pessoas, não incluídas nas restrições do art. 1º, deverão funcionar com medidas de restrição e controle de público e clientes, bem como adoção das demais medidas estabelecidas pelas autoridades de saúde de prevenção ao contágio e contenção da propagação de infecção viral relativa ao COVID-19.
Art. 3º – Ficam suspensas enquanto perdurar a Situação de Emergência em Saúde Pública:
I – autorizações para eventos em propriedades e logradouros públicos;
II – autorizações de feiras em propriedade;
III – autorizações para atividades de circos e parques de diversões.
Art. 4º – A fiscalização quanto ao cumprimento das medidas determinadas neste decreto ficará a cargo dos órgãos de segurança pública, com apoio da Subsecretaria de Fiscalização, caso necessário.
Art. 5º – Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.