por Gustavo Aranda
Foi um dia das mães estranho no Largo do Paissandu.
Pela manhã, as mães que estão acampadas com seus filhos, após a tragédia que deixou mais de 150 famílias desabrigadas, se organizaram para comemorar o dia das mães em um almoço no Sesc, próximo ao acampamento.
Domingo também foi o dia que os bombeiros encerraram as atividades de busca pelos desaparecidos e o recolhimento dos escombros do prédio condenado. O governador apareceu cercado de policiais para homenagear a corporação, não as mães sobreviventes. A prefeitura também compareceu, mas não com a finalidade de oferecer atenção e as políticas públicas de atenção social. Ao contrário, sabendo da organização das mães, ameaçaram desocupar o acampamento na ausência dos que resistem. O resultado foi o evento cancelado para proteção do local de abrigo.
Mais, boatos davam conta de que a tropa de choque da Polícia Militar poderia invadir a área e desalojar os sobreviventes sem uma alternativa de abrigo para quem está acampado. Isso, porém, não seria possível com a presença de tantas crianças no local. A estratégia para essa variável que o poder não controla foi acionar o Conselho Tutelar municipal, que, segundo os acampados, passou a ameaçar as famílias com a retirada da guarda dos filhos das mães que ocupam a praça, para a posterior “limpeza do terreno”.
A pressão para desocupar a Ocupação SOS Paissandu tem sido enorme por parte da prefeitura. Banheiros químicos foram negados, o bar que oferecia auxílio aos resistentes foi fechado, mas nada que se compare ao temor de terem seus filhos afastados do convívio das mães pelo poder público. As famílias chegaram a procurar o Conselho Tutelar logo depois do incêndio, na tentativa de buscar apoio para aquisição de materiais escolares que acabaram incendiados junto com o prédio abandonado pelo governo federal. O Conselho se negou a ajudar as famílias e, de novo, segundo os moradores, deu início as ameaças. As crianças não ficaram sem material, a população fez o papel do estado falho e doou cadernos, lápis, canetas, livros, mochilas. As crianças estão frequentando, regularmente, as aulas mesmo com o abandono público.
Ontem, os moradores que resistem no local à espera de uma solução que não seja provisória, como o auxílio aluguel de 400 reais oferecido pela prefeitura, escreveram uma carta pública narrando o cotidiano de descaso e prometendo resistir às arbitrariedades, entendidas pelos sobreviventes como injustas.
Leia a carta: