Dois anos após o acidente Dr. Guilherme de Sá Meneghin, Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais da Comarca de Mariana, comenta sobre o maior crime ambiental do Brasil cometido pela Samarco, em que momento se encontra o processo, sobre as indenizações e a atuação do ministério público no caso com os atingidos de Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo, Paracatu de Cima, Ponte do Gama, Campinas, Pedras e Camargos.
As ações coordenadas por um promotor público pelo direito humano
O nome dele é Guilherme de Sá Meneghin, titular da 2ª Promotoria de Justiça da comarca de Mariana, Minas Gerais, especializado em direitos humanos. A data é 05 de novembro, 16:20. Toca o telefone, o promotor atende e é informado que a Barragem de Fundão havia rompido.
Ninguém sabia ao certo o que estava acontecendo, informações desencontradas chegavam aos montes. O promotor resolve ir até a arena, local onde as pessoas seriam recebidas. Poucos chegavam, estavam ilhados nas florestas ao redor dos locais atingidos pela lama química da Samarco.
“Só entendemos direito o que aconteceu na manhã seguinte, quando os carros e ambulâncias conseguiram chegar aos locais do desastre. Começou a chegar muita gente na arena, foi então que, ouvindo as histórias de quem viveu o terror, nos demos conta da gravidade e da dimensão do que tinha acontecido. O maior desastre ambiental e humano do Brasil causou 19 mortes, prejuízos incalculáveis e modificou a vida de centenas de atingidos de Mariana e outros municípios”, diz Dr. Meneghin.
E foi no mesmo dia que o promotor especializado em direitos humanos, começou a tomar os depoimentos dos atingidos e instaurou os primeiros inquéritos. “As pessoas eram transferidas da arena para hotéis e pousadas, mas elas só estavam com a roupa do corpo, muitas delas não portavam documentos e nem dinheiro. Era preciso tomar atitudes a curto, médio e longo prazo para assegurar o protagonismo dos atingidos no processo de reparação dos direitos”.
No decorrer dos dias o promotor expediu diversos documentos, dentre eles era exigido que a Samarco fizesse o cadastro de todos os afetados, fornecesse o subsídio mensal e casa alugada para as famílias que haviam perdido renda e moradia.
Outra medida executada pelo ministério público foi a ação que bloqueou R$ 300 milhões em bens da Samarco e de acordo com o promotor foi preciso mover outra ação para atingir o patrimônio da Vale e da BHP. “Desde domingo, dia 8 de novembro de 2015, estava pronta uma ação cautelar para bloquear os recursos necessários para pagar as indenizações e a reconstrução das comunidades. No dia 10 propus a ação e o juiz determinou a indisponibilização de R$ 300 milhões de reais da Samarco, mas nas contas só tinham R$ 8,5 milhões. Pedi ao juiz para desconsiderar a pessoa jurídica e atingir o patrimônio da Vale e da BHP. O dinheiro finalmente apareceu”, completa Meneghin de forma indignada.
Durante esses dois anos as atuações do Ministério Público visam promover a participação dos atingidos no processo legal de reparação dos direitos violados e ajudá-los na construção de uma representação legítima para que todas as medidas adotadas pelo MP estivessem de acordo com o interesse dos atingidos, em ações coletivas.
Mas nem sempre foi possível, em 04 de fevereiro de 2016 o processo sofreu um revés e por decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que, ao examinar um recurso da Samarco, decidiu que as causas relacionadas ao rompimento da barragem, especialmente a ação civil pública principal, deveriam ser deslocadas para a justiça federal. Durante esse tempo até a volta do processo para a comarca de Mariana, o processo ficou paralisado, foram seis meses de luta para trazer a ação de volta a Mariana, fato ocorrido em 23 de agosto de 2016.
Para a maioria dos atingidos dos distritos de Mariana, o Dr. Guilherme de Sá Meneghin está muito próximo, todas as conquistas alcançadas desde o desastre foram bastante desafiadoras e decorreram das ações ajuizadas pelo MPMG.
E como Dr. Meneghin é especializado em direitos humanos ele tem também ficado atento aos impactos psicossociais causados por um desastre como esse. Perda de vida, desaparecimento e desalojamento de comunidades inteiras e consequente desagregação e ruptura de vínculos sociais. Tradições culturais e comunitárias, lembranças, histórias e modos de vidas atingidos também foram aniquilados.
Quanto a Samarco e seu posicionamento em relação ao crime que cometeu, Meneghin na entrevista abaixo deixa claro que a empresa só atua sob ordens judiciais, tenta jogar a população de Mariana não atingida contra os atingidos e ainda usa termos marqueteiros para diminuir o impacto do crime que cometeu.
Jargões utilizados pela Samarco como impactados são usados para substituir o correto que seria atingido e vítima. “Se um trator passasse por cima do seu carro você diria que seu automóvel foi impactado ou destruído? Outro termo midiático e utilizado pela Samarco é o nome do cartão alimentação que dão aos atingidos, o cartão leva o nome de benefício, o que viola totalmente a motivação pelo qual o cartão foi dado. Não é benefício é direito, é reparação pela Samarco ter destruído a vida de diversos distritos de dois diferentes Estados brasileiros. Realmente não é um benefício e sim uma obrigação para tentar minimizar o impacto do crime que cometeu”, completa o promotor.
Uma resposta
A quem interessou, interessa e vai continuar interessando, ignorar a absurda diferença de comportamento (inclusive o legal / penal) no trato do Desastre de Mariana e o de Brumadinho? É muito triste acreditar que os órgãos públicos responsáveis pela análise das duas significativas agressões ambientais tenham adotado práticas tão diversas. E o pior é que, pouco a pouco, se induz o processo de esquecimento do caso Mariana e vai se reduzindo os efeitos das ações em Brumadinho.