Artigo de Dani Braz, mestre em Ciência Política e ativista das causas feministas e culturais, com ilustração de Al Margen
Nos últimos anos a palavra feminismo foi pauta no mundo inteiro. Mulheres nas mais diversas áreas passaram a ocupar espaços importantes e a falar sobre o que enfrentaram para chegar até lá, denunciando, inclusive, situações de abuso. Nos espaços decisórios da política, no entanto, o avanço foi ínfimo, ainda somos pouco mais de 10% ocupando as cadeiras.
Para além dos mitos já conhecidos, que vão desde “mulher não vota em mulher” até “mulher não se interessa por política”, quero lançar luz aqui sobre as dificuldades reais que uma mulher candidata enfrenta ao “ousar” se aventurar na política institucional. São reflexões que partem da minha própria experiência nestes espaços e se utiliza de três elementos de análise: o fator temporal, a estrutura e um outro elemento que vou chamar aqui de simbólico.
Na última semana, uma matéria da imprensa de Cascavel/PR elencou os nomes daqueles que já se colocam como pré-candidatos a deputado estadual e federal. Para minha surpresa, apenas um nome apareceu como candidatura feminina entre os mais de 30 nomes levantados dos mais diversos partidos. Isto não quer dizer que não teremos outras candidaturas femininas aqui na cidade e em outros lugares. Conforme a lei, ao menos 30% da chapa precisa ser feminina, sob pena de nomes masculinos serem cortados. O problema é: em que momento essas candidaturas irão aparecer? Provavelmente lá perto do prazo para o registro da candidatura, brotando da cartola como um passe de mágica.
E aqui o elemento tempo é essencial. Afora as limitações cotidianas de dupla e tripla jornada feminina, o tempo a que me refiro é o tempo da política. Não é à toa que os candidatos estão pensando suas campanhas desde já. A política possui seu próprio tempo e uma candidatura precisa ser semeada e amadurecida para render bons frutos. Ainda mais quando se trata de uma candidatura sem estrutura – como são a grande maioria das candidaturas femininas. Um bom planejamento estratégico é condição mínima para o sucesso da campanha.
No entanto, nossas lideranças femininas não estão nos núcleos de decisão dentro dos partidos, ou quando muito, nossa presença é só um factoide. Não temos acesso aos debates sobre financiamento de campanha, não participamos das articulações internas e externas, desconhecemos até mesmo avaliações simples de conjuntura política partidária que seriam preciosas para qualquer estratégia eleitoral. Somos lançadas no tabuleiro deste jogo às cegas, posicionadas em casas muito atrás das dos demais jogadores e sem qualquer tática que nos permita equilibrá-lo. E ainda esperam de nós bons resultados.
O mais importante, porém, está no elemento simbólico, presente de forma sutil no imaginário de todas as mulheres e que é responsável por limitar a própria vontade feminina de entrar nesse jogo. É algo que começa ainda na infância, com o questionamento de uma menina de quatro anos perguntando aos adultos se ela pode ser prefeita quando crescer, já que ela nunca viu nenhuma prefeita em sua cidade; passa por assédios e cantadas baratas dentro dos espaços de poder e termina com risos de subestimação daqueles que lá estão há muito tempo.
No final é um círculo vicioso que se retroalimenta com mais do mesmo, ao passo que exclui qualquer tentativa feminina – e aqui poderia ser jovem, negra, periférica etc – de entrar no jogo ou mesmo de se manter dentro dele. A falta de representação, neste contexto, se torna mais um forma de violência silenciosa à medida que cala nossa voz e nos invisibiliza. Entender quais são as barreiras estruturais e simbólicas para as mulheres na política é um primeiro passo para romper esse círculo e caminhar para uma sociedade onde todos e todas estejam lá.