Enquanto os mais velhos aplicam um golpe travestido de impeachment, os jovens secundaristas colocam em prática conceitos de construção coletiva, representatividade e, até de, democracia nas recentes ocupações das escolas públicas estaduais de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Talvez, se o interino Michel Temer e seu ministério tivessem vivido estas experiências quando estudantes, o Brasil não veria mais uma vez a história se repetir com a oligarquia ignorando a vontade da maioria.
Tal como tem acontecido nas escolas do Rio de Janeiro, São Paulo, Ceará e Mato Grosso do Sul, os secundaristas da capital gaúcha têm ocupado as unidades de ensino para cobrar investimentos na educação. Desde a última quarta-feira (11), as escolas estaduais deixaram de ser espaço apenas para o ensino tradicional e passaram, a ser um espaço aberto ao diálogo com alunos, professores, comunidade e governo que, segundo próprios ocupantes, ainda não deu indícios de que haverá negociação.
De portas abertas a quem quiser contribuir com o movimento, a ideia dos estudantes é que todos possam entender a necessidade da ocupação e a cobrança em cima do executivo estadual, que tem José Ivo Sartori (PMDB) como chefe. Escolas com estruturas defasadas, ausência de funcionários, professores com salários parcelados, instituições de ensino sendo fechadas e estudantes sem merenda são apenas algumas das irresponsabilidades que caem sobre o governo e motivam o movimento.
Na capital gaúcha, até este domingo, 15, são cinco escolas ocupadas. A primeira a se tornar sede do movimento dos estudantes, na quarta-feira,11, foi o Colégio Coronel Afonso Emílio Massot que estava sem professores, merendeiras e sem dinheiro para a manutenção da escola. Em seguida, na quinta-feira, 12, estudantes ocuparam a Escola Agrônomo Pedro Pereira onde, segundo eles, existe a possibilidade de privatização parcial da educação pelo governo gaúcho.
Uma das mais tradicionais escolas estaduais de Porto Alegre, o Colégio Júlio de Castilhos, também foi ocupado. Na zona sul da capital gaúcha, a Escola Estadual de Ensino Médio Padre Réus precisa de melhorias na estrutura e está ocupada. Segundo os ocupantes, nunca houve uma reforma no colégio. A última unidade a ser ocupada, na noite de sábado, 14, foi a Escola Estadual Paula Soares.
Nas ocupações, adolescentes de 15, 16 e 17, em sua maioria, dão um belo exemplo de como seguir resistindo e lutando pela educação. Todos são iguais, têm liberdade para discordar e propor suas ideias, prevalecendo sempre o que o grupo discute em assembleias. Ou seja, há um regime democrático. Todos se dividem para os cuidados com a alimentação, segurança, limpeza, comunicação, contabilidade, administração e demais atividades. Ou seja, há construção coletiva. Meninas, meninos, homossexuais, negros, pobres, ricos, pais, professores, voluntários e demais interessados estão discutindo o que deve ser feito. Ou seja, há representatividade.
Tudo o que falta no recém-iniciado governo Temer tem de sobra nas escolas ocupadas. Inclusive, eles estão de portas abertas para os movimentos sociais que desejarem utilizar os espaços para formações, oficinas e palestras. Feminismo, cultura, representatividade de setores ignorados pela elite branca estão em pauta nas escolas. Uma nova escola está se formando.
Greve por tempo indeterminado
Na última sexta-feira, 13, os professores da rede estadual entraram em greve por tempo indeterminado. Os secundaristas organizaram grupos pelas redes sociais e preveem mais ocupações para esta semana que inicia. O objetivo é que o movimento todo apoie as reivindicações dos professores. Entre as pautas que levaram os docentes a optar pela paralisação estão o fim do parcelamento de salários, o reajuste de 13,1% nos vencimentos, o fim do fechamento de turmas e escolas, disponibilidade de merenda para todos e cumprimento da lei do piso que, de acordo com o sindicato, está 69,44% defasado.
Ajuda
Todas as escolas ocupadas estão precisando de ajuda de materiais para limpeza e alimentação. Pelo Facebook, os alunos têm divulgado tudo o que precisam.