O diretor regional da Fundação Florestal e o gestor da Estação Ecológica Jureia-Itatins acompanhados de 7 guarda-parques e de 3 policiais ambientais foram até a casa de uma das famílias caiçaras nessa manhã.
O intuito: demolir a casa com pés de cabra sob ordem administrativa da diretoria geral da Fundação Florestal. A nossa comunidade se organizou, fez um empate, e conseguiu resistir a essa tentativa de demolição. Mas desde então a família recebeu o prazo de 72 horas para sair da casa, conforme informado pelo diretor, quando voltarão para concretizar a remoção.
O cumprimento dessa ordem é considerado ilegal por nossa assessoria jurídica e pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo (regional de Registro), consultada após o ocorrido, pois viola princípios e direitos constitucionais e tratados internacionais de direitos humanos consolidados nos artigos 215 e 216 da Constituição Federal, na Convenção 169 da OIT, no Decreto 6.040/2007, no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (consulta prévia) e na Lei da Mata Atlântica que prevê a utilização de recursos naturais por comunidades tradicionais.
O abuso institucional por parte da Fundação Florestal não é de hoje. A expulsão que sofremos na Jureia foi objeto de inúmeras teses acadêmicas e há farta documentação dos órgãos ambientais que demonstram o esvaziamento das comunidades, onde nossas famílias nasceram e foram criadas, plantando, pescando, cuidando do território, da natureza, séculos antes das discussões sobre preservação.
Sobrevivemos à especulação imobiliária na década de 1970, ao projeto de Usina Nuclear no fim do governo militar e, desde 1986, resistimos a uma legislação ambiental aplicada seletivamente para restringir nosso modo de vida, desconsiderando nosso papel para a conservação e defesa da natureza e para a manutenção da biodiversidade.
O argumento do governo do Estado de São Paulo é de que moramos em Estação Ecológica, área totalmente restritiva à habitação, mas não revelam que a lei criada em 1986 ignorou a presença de 22 comunidades na época, tornado-as ilegais da noite para o dia.
Não somos ingênuos, sabemos pela nossa própria tradição que é possível conservar a natureza mantendo as nossas práticas e garantindo a permanência de comunidades tradicionais. Há reconhecimento científico de que conhecimentos e técnicas tradicionais são eficazes na manutenção da biodiversidade na Mata Atlântica e que políticas públicas em todo o mundo permitem a convivência entre comunidades tradicionais e a natureza, da qual inclusive dependemos.
Por isso, depois de décadas tentando dialogar (bastando dizer que o Conselho Consultivo, onde teríamos alguma voz, foi instituído apenas em 2018), sendo impedidos total ou parcialmente de plantar e pescar, de reformar nossas casas, e construir outras às novas gerações, vendo saírem as escolas e postos de saúde, e junto com elas muitos dos nossos parentes, decidimos fazer um Plano de Uso Tradicional Caiçara (PUT).
Propomos com o PUT uma solução ao conflito histórico na Jureia, pautando, por meio de minucioso estudo de grupos de pesquisa da USP, UNICAMP e UFABC, e de assessoria jurídica da Defensoria Pública, que a nossa permanência é sustentável, juridicamente viável, além de justa do ponto de vista das violências que já sofremos.
Contudo, há um ano não temos sequer uma resposta da Secretaria do Meio Ambiente e da Fundação Florestal a quem apresentamos o PUT.
Nossas famílias do Rio Verde se sentem agora mais ameaçadas com a tentativa de demolição da casa de um de nossos parentes e o aviso da Fundação Florestal de que voltarão.
Sabemos que o que está em risco são as nossas famílias, a nossa cultura caiçara, o nosso modo de vida, rico em etnoconhecimento, e, além de tudo, a natureza, com a qual a por enquanto, por conta de questões jurídicas, não estamos revelando a identidade da pessoa diretamente afetada, da qual a permanência
na comunidade está ameaçada.
As pessoas mais velhas nas fotos são seus avós, que estiveram pessoalmente para defender o neto. A autoria do texto é das Comunidades do Rio Verde do Grajaúna.
16 de outubro é o Dia Mundial da Alimentação Saudável e em todo o Brasil estão ocorrendo ações em defesa da soberania alimentar. A política de governo de Jair Bolsonaro, marcada pelo desmonte dos direitos dos trabalhadores, aumento histórico da taxa de desemprego e a não valorização da vida do povo têm contribuído diretamente para o aumento da fome entre os brasileiros.
Em Goiânia, o Fórum Goiano em Defesa dos Direitos da Democracia e da Soberania, Fórum que reúne diferentes movimentos sociais e entidades sindicais, distribuiu alimentos da agricultura familiar na movimentada Praça A, região central da capital, local onde fica um terminal de ônibus.
Foto: Alex Catira
Apesar de Jair Bolsonaro tentar se gabar pela produção de alimentos para 1 bilhão de pessoas durante discurso da ONU, o presidente não citou que a fome se alastra pelo Brasil. A insegurança alimentar é uma realidade desde 2017-2018 para 84,9 milhões de brasileiras/os (IBGE), sendo 10,3 milhões de pessoas residentes em domicílios com insegurança alimentar grave, ou seja, falta comida em casa com frequência. O número não leva em consideração os moradores em situação de rua.
Segundo a Central Única dos Trabalhadores de Goiás (CUT-GO), os alimentos da ação solidaria em Goiânia, durante o ato pela soberania alimentar, foram produzidos pelos assentados da Reforma Agrária ligados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) e o Movimento Camponês Popular (MPC).
Foto: Jornalistas Livres
Conforme conta Jéssica Silva Brito, do Movimento Camponês Popular de Goiás, presente no ato em Goiânia, o fato de poucas empresas atuarem no controle dos preços dos alimentos, apesar de cerca de 70% da alimentação que chega na mesa dos brasileiros vir da agricultura familiar camponesa, é o monopólio criado pelas empresas que acaba por controlar os preços dos alimentos.
Segundo o IBGE, o arroz ficou quase 20% mais caro desde o início do ano, o preço do feijão subiu 32,6%, da abobrinha, 46,8%; e da cebola, 50,4%. O desemprego já atinge 13,7 milhões de pessoas.
Os pequenos produtores vêm sofrendo com fim das políticas públicas para o setor e o consequente aniquilamento dos programas que garantiam comida de qualidade e acessível na mesa do povo.
“O estado deveria mediar, controlar o mercado, mas não o faz e ainda não tem investido na agricultura familiar camponesa”, explica. Ainda, com a pandemia, “os agricultores perderam cerca de 40% da sua renda, por conta do fechamento dos comércios e dos pontos de venda”, afirma.
Os dados do IBGE de 2018 sobre a fome no Brasil mostram que a pandemia da covid-19, apesar de acentuada no Brasil pela negligência do governo federal e muitos governos estaduais em enfrentar a crise sanitária, esta pode ser considerada o único vilão da pandemia da fome que se espalha pelo Brasil. O aumento no preço dos alimentos combinado com desemprego estão a refletir diretamente para este retrocesso enquanto Nação e o possível retorno do país para o Mapa da Fome.
Os avanços na erradicação da fome se deveram, no passado, à implantação de uma política de segurança alimentar e nutricional a partir de 2003, no primeiro governo Lula, com a aplicação de políticas públicas, com os aumentos do salário mínimo acima da inflação, com a geração de empregos e com a implementação do programa Fome Zero.
O trabalhador e sindicalista Mauro Rubem, importante liderança do estado de Goiás, afirma, em entrevista ao Jornalistas Livres, que o incentivo à plantação de monocultura que é dado no país é também o causador do flagelo da fome e lembra que está destruindo o meio-ambiente. “Esse modelo é destruidor da terra, é um modelo onde eles querem esgotar toda a riqueza natural, transformar a classe trabalhadora em escravos e jogar as pessoas em um conflito social sem tamanho”.
No próximo dia 15 de novembro, a população vai às urnas eleger os próximos parlamentares municipais, prefeitas e prefeitos. Ainda que a batalha por garantias de direitos plenos, como soberania alimentar, não se limite à disputa eleitoral, eleger candidatos comprometidos com a luta de classes cria condições para avançar rumo a este norte.
“A população tem que ser atenta ao processo eleitoral municipal de agora, porque as eleições para vereança e prefeitura criam caminhos para começar mudanças”, afirma Mauro Rubem.
Uma rede de voluntários e militantes que atuam da produção ao preparo de alimentos orgânicos, saudáveis e da agricultura familiar tem feito a diferença na vida e na saúde de moradores em situação de rua e em condição de vulnerabilidade da cidade de São Paulo, por meio do projeto Lute como quem cuida. Elaborado e colocado em prática de maneira coletiva pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento Sem Teto do Centro (MSTC) de São Paulo, o projeto distribui aproximadamente 300 marmitas todos os dias há mais de três meses.
A ideia é criar uma rede de solidariedade contínua, que atenda essas populações em um momento delicado, com a crise causada pelo coronavírus. A falta de recursos e trabalho pode agravar ainda mais a insegurança alimentar e nutricional. No Brasil, o acesso a alimentos cultivados sem veneno ainda é limitado. Em parte, pelo preço que as grandes redes varejistas praticam, mas também pela falta de incentivo à agricultura familiar.
A dirigente do MST no estado de São Paulo Daiane Ramos explica que a campanha teve início no âmbito da Brigada Estadual de Solidariedade Zilda Camargo, formada por militantes de diversos municípios, e cresceu com foco na coletividade. Segundo ela, a intenção é chegar à doação de 30 mil marmitas entre julho e agosto.
“Essa brigada está desde o dia 20 de abril participando desse trabalho intenso de solidariedade para a Rede Rua e o Prédio dos Imigrantes (que abriga pessoas de outros países em situação de vulnerabilidade). No fim ela se estendeu, na parceria com o MSTC. As organizações se unem por uma causa única, de trazer esse alimento saudável e orgânico para essas pessoas mais vulneráveis. Infelizmente, com a covid, vem aumentando esse número.”
Mais que a simples doação dos produtos, o projeto tem cuidado especial com a garantia de que essas pessoas vão receber o melhor da produção orgânica do país. Todo o preparo – da higienização ao embalo – segue normas sanitárias criteriosas, que ficaram ainda mais rígidas com a pandemia. O cardápio é definido entre os militantes, mas leva em consideração também as sugestões de quem recebe as marmitas.
Moradores de rua do centro de São Paulo recebem os alimentos. / Arquivo Brigada Zilda Camargo Ramos
Os mais de 200 quilos semanais de arroz, por exemplo, vêm de assentamentos do Rio Grande do Sul, que hoje são os maiores produtores do grão na América Latina. A Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), em Guararema (Região Metropolitana de São Paulo), fornece as hortaliças e o pão. Assentamentos e acampamentos de outros municípios enviam em média por semana 90 quilos de feijão, 30 quilos de macarrão, 230 quilos de carne, 120 dúzias de ovos e 150 quilos de legumes.
O trabalho é totalmente coletivo e dividido. Cada voluntário tem a oportunidade de passar por diferentes etapas do processo, para ampliação da experiência e dos laços criados entre quem está na colheita e atrás do fogão e as pessoas que recebem os alimentos. Oscar do Nascimento Teles, militante do MST e morador do Assentamento Dom Tomás Balduíno, no Pontal do Paranapanema (SP), faz parte dessa rede. Ele relata o cuidado existente em todo o processo.
“Os companheiros estão fazendo isso com muito amor e carinho, porque a gente viu a realidade na rua de quem tá recebendo o alimento. Você ver as pessoas na fila, erguendo as mãos para pegar aquela comida. Isso fortalece demais nosso trabalho na cozinha, em fazer isso com amor, carinho e preparar os alimentos com todo um protocolo de higiene e cuidado. Nessa grandeza que é São Paulo, é um pouquinho que a gente está fazendo, mas de grande proporção. A gente sabe da importância”, finaliza.
Pela “manutenção imediata da vida”, a iniciativa “Lute como quem cuida” convida a sociedade civil para também colaborar. As doações podem ser realizadas por meio do site da campanha na internet.
Há pouco mais de sete anos, dezenas de famílias transformaram a terra improdutiva do fazendeiro José Ivan Cassaro, no município de Gália, no Centro-Oeste de São Paulo. A área foi reflorestada e hoje os moradores do assentamento Luiz Beltrame de Castro são responsáveis pelo abastecimento de inúmeros alimentos à população da região. Pois bem, depois do renascimento produtivo da área, o latifundiário cresceu o olho na terra e agora luta para tê-la de volta. E, pior, encontrou uma juíza que lhe deu ganho de causa. Por isso os assentados estão em luta para se manterem produzindo naquele pedaço de terra e, para isso, querem seu apoio. Pedem que você faça como o ator Marcos Palmeira e manifeste ao desembargador Hélio Nogueira seu apoio e solidariedade aos sem-terra que desejam se manter trabalhando no local ao lado de suas famílias.
As cartas solicitando a suspensão definitiva do despejo devem ser enviadas para o seguinte endereço, podendo usar o texto apresentado abaixo: Gabinete do Desembargador Federal Hélio Nogueira: gab12410@trf3.jus.br
Nós , ________, vimos através deste, solicitar justiça às famílias assentadas do assentamento Luiz Beltrame de Castro, no município de Gália, estado de São Paulo. A área onde estão morando, produzindo e contribuindo com a economia da região e contribuindo também para a melhoria dos hábitos alimentares das pessoas que consomem seus produtos, recebeu a classificação de terra improdutiva pelo Incra há sete anos atrás. Uma vez assentadas, as famílias reflorestaram a área transformando-a em belíssimos pomares. Tal atitude trouxe ganhos ambientais incalculáveis para a região. Através do suor derramado de seus rostos, a terra se tornou produtiva. De lá saem mandioca, banana, feijão, doces, geleias, legumes , hortaliças, temperos, queijo, ovos e leite pra alimentar as cidades do entorno. As famílias assentadas conquistaram sonhos, entre eles, o da casa própria. Casa essa que de forma cúmplice guarda os segredos do futuro pensado durante um almoço, jantar ou durante um cafezinho às pressas. Esses sonhos dizem respeito ao aumento da roça, do plantel de galinhas ou porcos, melhorar a alimentação do gado e obter um leite melhor. Nesse processo não existem motivos inconfessos a não ser o de trabalhar mais e mais para contribuir com o desenvolvimento do país alimentando a parte que lhes cabe nessa imensa nação. Portanto, é imensamente injusto ceifar essas vidas, retirando-as das terras que essas famílias fizeram renascer. É um plano de muito mau gosto devolver a terra ao senhor José Ivan Cassaro, que inclusive na época da desapropriação alegou não produzir pois a terra não prestava.
Pois bem, esses trabalhadores que lutaram pra conquistar terra, transformaram a improdutividade num espaço pulsante de vida. A partir da terra nua transformaram-na num organismo com vida, com árvores que já estão produzindo frutos e, principalmente cumprindo a função social da terra: colaborar com a economia da região, aumentar o emprego e produzir alimentos. Isso por si só já lhes garante o direito de permanecer na terra, que por um gesto arbitrário de uma juíza, deu ganho de causa ao latifundiário. Solicitamos que analise esse processo à luz das leis, da Constituição Federal e dos interesses difusos de forma a restabelecer a credibilidade do sistema Judiciário. Sem mais para o momento, subscrevemos.
O desembargador responsável em julgar o processo do assentamento Luiz Beltrame no TRF-3 é o juiz Hélio Nogueira.