Trata-se de uma região agrícola e área de proteção ambiental situada no pequeno povoado de Notre-Dame-des-Landes, onde há mais de 40 anos o governo francês deseja construir um moderno e grande aeroporto para atender às populações do noroeste francês. A proposta ambiciosa durante todo esse tempo já teve suas razões justificadas, abandonadas e mais uma vez reformuladas para que esse grande empreendimento — ligado a grandes empresas — seja realizado. Em oposição ao projeto, pequenos agricultores, a comunidade local e defensores da causa se juntaram para impedir diversas vezes o início das obras e protestar nas rodovias e nos centros urbanos.
Em 2012, a forte repressão policial a um protesto resultou na morte do militante ecologista Rémi Fraisse. Desde então a área é ocupada por militantes de diversas causas, tornando o local uma grande reunião de pequenas comunidades autônomas, criando assim La ZAD (Zone A Défendre) de Notre-Dame-des-Landes.
Ao entrar no território ocupado fica evidente que o governo francês abandonou a região que mais se assemelha a um cenário de guerra civil. As barricadas que obrigam o visitante a fazer o zigue-zague na estrada são feitas com pedaços de madeira, placas de ferro, pneus, carros abandonados e qualquer outro objeto que sirva. Lá dentro, cada squat (ocupação) ocupa um terreno e possui sua maneira própria de conviver. Não há um estilo comum. Há ocupações bem estruturadas com água, eletricidade e construções sólidas, enquanto há outras mais simples com cabanas feitas com materiais encontrados na natureza e banheiros ao ar livre.
Não sei como seria um verdadeiro sistema anarquista, mas acredito que La ZAD de Notre-Dame-des-Landes se aproxima a essa ideia. Lá não existem leis. O governo francês não tem acesso, nem o domínio da área. Todas as decisões em La ZAD são tomadas em assembleias gerais e cada grupo é responsável por seu próprio espaço.

Desde novembro de 2015, quando houve o ataque terrorista no Bataclan e em outros lugares de Paris, o presidente François Hollande decretou o estado de emergência e prolongou seus dias após os seguidos ataques. Além de suspender direitos e liberdades garantidos pela constituição, um dos pontos criticados pelos franceses é de que o estado de emergência permite que a polícia prenda qualquer pessoa considerada suspeita, sem a necessidade de um mandato judicial. O estado de emergência não coloca apenas os terroristas na mira, mas também todos cidadãos franceses que não estão de acordo com as medidas tomadas pelo governo. Desde a sua vigência, vários militantes estão presos aguardando julgamento, entre eles pessoas que se posicionaram contra a construção do aeroporto de Notre-Dame-des-Landes.
O pouco tempo que estive ali, pude perceber que o clima de bem-estar e leveza da vida simples de uma comunidade em meio à natureza, às vezes contrastava com a energia de um lugar preparado para confrontar, à espera das tropas policiais. Escutei histórias de pessoas que decidiram viver em La ZAD pois ali encontraram o espaço ideal para uma vida tranquila e outras pessoas que viram nessa resistência uma causa que vale a pena defender.




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