POR QUE MOVIMENTOS COMO O SEMINÁRIO “RACISMO E ANTIRRACISMO NO BRASIL: O CASO DOS POVOS INDÍGENAS” SÃO IMPORTANTES?

Eliane Potiguara, Kabengele Munanga e Ailton Krenak na mesa de abertura do seminário. Foto: Adrielly Novaes

Ocorreu durante os dias 14, 15 e 16, o seminário “Racismo e antirracismo no Brasil: o caso dos povos indígenas”. O evento aconteceu no Centro de Artes, Humanidades e Letras da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia na cidade de Cachoeira e contou com a presença de indígenas de todo o país.

Cachoeira se encontra na margem esquerda do Rio Paraguassu, a 116km da capital Salvador. Sua história é baseada, principalmente, no genocídio do povo indígena e na escravidão do povo negro. A cidade foi um importante polo econômico da Bahia no século XIX e o berço de muitas lutas – como a luta pela independência do Brasil, por exemplo.

Alvaro Tukano e sua sabedoria. Foto: Adrielly Novaes

Os três dias do seminário me fez refletir de que forma a cidade, a história e a luta podem servir como ponto de partida para debater opressões que ainda estão intrínsecas na nossa realidade.

Do machismo à inserção de estudantes indígenas no Ensino Superior, as discussões pautaram, de forma clara e coesa, a importância de resistir e, sobretudo, existir; colocando em evidência os conhecimentos dos mais velhos e a preservação do saber tradicional como emancipação e como caminho para a construção de uma sociedade mais justa.

O ponto principal do seminário foi compreender que o Racismo aos povos indígenas existe e a forma em que ele se dá ainda é latente e refletido no dia-a-dia. Isso pode ser facilmente visualizado com as notícias de genocídio dos povos tradicionais, com a exclusão das pautas indígenas da agenda do Estado, a invisibilidade, ou até mesmo, a folclorização da cultura indígena – inserida no nosso imaginário pela literatura, e transformada em objetos de consumo ou de contemplação pela realidade midiática.

Como afirmou o antropólogo indígena, Felipe Tuxá: “Elas [representações] não são meros estereótipos calcados no desconhecimento, elas são a racialização operando hoje, no presente. Isso é o racismo operando. É um conhecimento sistematicamente construído e arquitetado.” e reiterou: “A racialização indígena opera para nos invisibilizar e dizer que não existimos ou que somos menos numericamente. Sempre com uma vigilância imensa sobre nossos corpos, dizendo quem é ou quem não é indígena. O tempo todo e o extermínio é isso, é o que ta no cerne desse processo. A nossa existência, hoje, é uma falha desse processo de racialização que foi tão bem arquitetado.”

A insurgência de um seminário como o ocorrido, eleva também a discussão sobre o direito à terra e sobre estratégias de luta como valorização da vida e dos costumes originários, enquanto ainda não se encontra alternativas que preservem à integridade total do povo indígena e o reconhecimento da sua organização estrutural dentro e fora dos territórios.

Coletivo de Estudantes Indígenas da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB). Foto: Adrielly Novaes

Ter um evento como esse, em uma cidade de diáspora, é entender que os povos indígenas, quilombolas/negros e camponeses estão conectados de alguma forma, seja ela espiritual, de luta, da busca pelo reconhecimento, pela descentralização do poder, do conhecimento e pela valorização da sua cultura enquanto legado propulsor de uma realidade que não é tão simples assim.

Ter como centralidade a discussão indígena é poder pensar novas maneiras de avançar, preservar os direitos já alcançados e de ocupar os espaços, antes não ocupados. É poder dizer que o povo indígena existe, mantém suas tradições e produz conhecimento.

Assim, movimentos como esses são importantes porque nos fazem refletir sobre os nossos processos de organização e de luta e nos ensina que ouvir e respeitar a sabedoria dos mais velhos é perpetuar nossa história frente todas as opressões que enfrentamos todos os dias. Na política, nas escolas, universidades e nas ruas.

Esse seminário demarca na história dos 900 mil indígenas de 305 etnias diferentes que existem no Brasil, mais uma página da resistência e da autodeterminação.

*Giovane Alcântara é estudante de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

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